sábado, 19 de abril de 2008

Regulação e cepticismo

Vale a pena ler o artigo de Vital Moreira no Diário Económico. É sobre a necessidade de regular o capitalismo financeiro global: «A verdade, porém, é que há mais modalidades de economia de mercado do que o liberalismo radical quer admitir e que as grandes esperanças numa economia essencialmente entregue a si mesma, como manda a ortodoxia dominante, não se tornaram realidade. Em especial no que respeita ao moderno capitalismo financeiro global, ou ele é adequadamente regulado pelos Estados e/ou por instâncias internacionais, ou corre sérios riscos de crises mais ou menos agudas e prolongadas». O capitalismo financeiro global tem gerado um cortejo de crises «mais ou menos agudas e prolongadas» e se não for superado vai continuar certamente a fazê-lo. Para além disso, está associado, como já várias vezes aqui argumentei, às tendências fortes de polarização social e de corrosão da democracia. É por isso crucial falar de regulação e de controlo das actividades financeiras. Trata-se agora de saber que formas de acção pública devem ser adoptadas. Não me parece que seja suficiente alargar o âmbito da chamada regulação prudencial que se limita a tentar enquadrar as aventuras do capitalismo financeiro global, aceitando mais ou menos passivamente a sua existência e os seus mecanismos de funcionamento. Estou do lado dos «cépticos financeiros». A evidência que se vai acumulando mostra a sensatez de uma posição que até há pouco tempo era ultra-minoritária e apodada de irremediavelmente anacrónica pelo coro de entusiastas dos «mercados»: «[os cépticos financeiros] não estão tão convencidos que a recente inovação financeira tenha criado ganhos significativos (excepto para o próprio sector financeiro) e duvidam que a regulação prudencial possa alguma vez ser suficientemente eficaz. A verdadeira prudência exige que os reguladores beneficiem de um conjunto mais amplo de instrumentos de acção, tais como tectos quantitativos, taxas sobre transacções, restrições à securitização, proibições ou outras inibições directas às transacções financeiras - sendo todos eles um anátema para a maioria dos intervenientes dos mercados financeiros» (Dani Rodrik no Jornal de Negócios).

5 comentários:

NC disse...

«Estou do lado dos «cépticos financeiros»»

A sério? Não se nota nada. Se não o tivesse dito...

Que o lê fica a pensar que o capitalismo financeiro só gera crises "agudas e prolongadas". Então e os períodos de expansão "agudos e prolongados"? Que também os há.
Ou fica tudo na gaveta da "especulação selvagem e irracional"?

Enquanto não introduzir um pouco de equilíbrio nos seus posts ninguém já convertido ao anti-capitalismo o vai ler. A não ser eu claro que tenho esta veia masoquista de cá vir espreitar regularmente :-)

NC disse...

Nem de propósito, o César das Neves (que vocês devem adorar) saiu-se co esta:

"a esquerda só admite um sistema onde as Bolsas só subam"

Eu acho que ele está a ser simpático em admitir que a esquerda (mais intransigente) estaria disposta a permitir sequer a existência de bolsas.

L. Rodrigues disse...

Gostaria de ver o gráfico que demonstra as virtudes do capitalismo financeiro deixado à solta, se o Tarzan tiver um por aí.
Um que não seja uma bolha.
O período mais prolongado de crescimento do século 20 é o mais "keynesiano", entre 1950 e 70, mais coisa menos coisa. Antes e depois é só altos e baixos, bolhas e crashes, de maior ou menor ordem.
Isto que eu saiba, que não sou propriamente especialista.

NC disse...

Essa bolha "keynesiana" que refere tem a ver com a reconstrução do pós-guerra. Tipicamente, depois de uma bolha estoirar segue-se um período de crescimento que culmina numa nova bolha (muito mais alta que a anterior) e num crash (que termina num nível superior ao do último crash). Quer uma "bolha" maior que que uma guerra mundial? Naturalmente que depois de se arrasar um país, que não há estrutura económica que sobreviva por si e aí as políticas keynesianas são desejáveis. Mas uma pessoa não quer viver para sempre numa cadeira de rodas por mais que isso tenha sido necessário e "produtivo" durante a convalescência.

Mas, aqui nos meus manuais de história os anos 70 não são própriamente conhecidos pela sua pujança económica mas sim pela sua pujança socialista. Você discordará talvez.

João Rodrigues disse...

Tarzan,
O capitalismo financeirizado tende a gerar um padrão instável de «boom and bust». Com consequências negativas para as economias. Acho que já aqui defendi que a especulação pode ser altamente racional do ponto de vista individual. O resultado global é que pode não ser o mais desejável. E o padrão do pós-segunda guerra mundial não explicável apenas pela "reconstrução". Durou muito mais tempo do que isso e sem crises financeiras de maior. Questão de enquadramento do capitalismo. O que se passava nas bolsas tinha pouco impacto. O "casino" era inócuo. Os problemas da instabilidade e da fragilidade financeira recomeçaram com o esforço para liberalizar de forma crescentemente irrestrita os fluxos de capitais e para alargar a margem de manobra dos agentes financeiros. JCN tem uma grande propensão para o disparate e para a caricatura. Sempre que posso evito. Prefiro ler outros liberais-conservadores mais sérios.

L. Rodrigues,
Aqui está uma bela figura (a 2). De economistas «equilibrados» (liberais):
http://www.voxeu.org/index.php?q=node/1067