sábado, 9 de junho de 2007

Desabafo

As elevadíssimas taxas de objectores de consciência dizem muito acerca da classe médica que formámos no nosso país. Acho que os médicos podiam apontar baterias para outras vergonhas que se passam na saúde, bem mais susceptíveis de objecção de consciência do que um aborto. Ver 80% dos médicos a declararem-se objectores de consciência depois de uma clara maioria de portugueses e portuguesas terem legalizado a interrupção voluntária de gravidez só pode ser encarado como um insulto a todas as mulheres que já abortaram ou que ainda venham a fazê-lo. Mas tenho a certeza que a minoria de médicos tolerantes deste país vai ser suficiente para responder às aflições das mulheres portuguesas! Essa é a nossa grande vitória.

8 comentários:

rack disse...

importa agora saber quem é objector de consciência no privado. porque o governo, e mal, fez com que os serviços que não garantam o aborto o paguem no privado. mas no privado também têm de lá estar médicos. quem são uns e outros ? Não deviam os serviços ser obrigados a ter não objectores ? e Pode um não objector ser "obrigado" a ficar quase exclusivamente dedicado ao aborto, quando isso até é tecnicamente desinteressante para um ginecologista-obstectra ?

Fernando Alves Gomes disse...

Abstraindo-nos do privado e do público e sendo simplista:
80% médicos portugueses = cientistas + católicos.
Um oximoro que me faz desconfiar da classe.

Dário Nemésio disse...

Confesso que pensei que a taxa fosse elevada, mas nunca 80%. É o país que temos, infelizmente.

Ana Matos Pires disse...

Percebo a irritação, mas calma com os números veículados.

1. nunca seriam 80% dos médicos, quanto muito 80% dos ginecologistas/obstetras.

2. NINGUÉM pode afirmar com certeza a % de objectores, é desconhecida. Até aqui o direito à objecção de consciência era exercido caso a caso, pelo que não havia uma listagem de objectores.

3. a objecção de consciência quase não tinha regulamentação.

4. não pondo as mãos no lume pela classe, acho que estas notícias são uma manobra de manipulação a muito poucos dias da saída da regulamentação da nova lei...

Deixo algum articulado que é capaz de fazer luz sobre o assunto.

artigo 6º da Lei nº 16/2007 de 17 de Abril
(...)
3.“Uma vez invocada a objecção de consciência, a mesma produz necessariamente efeitos independentemente da natureza dos estabelecimentos de saúde em que o objector preste serviço” (Nota minha: público ou privado)

4. “A objecção de consciência é manifestada em documento assinado pelo objector, o qual deve ser apresentado, conforme os casos, ao director clínico ou ao director de enfermagem de todos os estabelecimentos de saúde onde o objector preste serviço e em que se pratique interrupção voluntária da gravidez" (Nota minha: não existia previamente)

artigo 5º da Portaria 189/98, de 21 de Março, ainda em vigor: “Os estabelecimentos em que a existência de objectores de consciência impossibilite a realização da interrupção da gravidez nos termos e prazos legais devem desde já providenciar pela garantia da sua realização, adoptando as adequadas formas de cooperação com outros estabelecimentos de saúde ou com profissionais de saúde legalmente habilitados, assumindo os encargos daí resultantes”.(Nota minha: pode ser outro serviço do SNS, nada obriga a que seja privado)

Desculpem a forma telegráfica, mas estou com pouco tempo.

Cumprimentos
Ana Matos Pires

juribaldo_farinha disse...

Muito sinceramente, não vejo porque tens de encarar isso como um "insulto" às mulheres que abortaram.
Tem de se respeitar as opiniões dos outros, dos que abortam, e dos profissionais que reclamam objecção de consciência para não o fazer (80%?!? hmm...).

Anónimo disse...

Esses 80%, se não estou em erro eram só no Hospital Santa Maria.

A maternidade Alfredo da Costa dizia ter só alguns objectores, e que estava pronta para cumprir a lei.

Samir Machel disse...

A noticia e mais alguma discussao encontra-se aqui:

http://obitoque.blogspot.com/2007/06/precisamos-de-novos-mdicos.html

Miguel Carvalho disse...

Há um enorme erro lógico que tem rodeado este debate: declarar-se como objector de consciência não significa ser contra o aborto!
Coloquem-se na pele de um obstetra que tem a escolha entre fazer o seu trabalho habitual, ou dedicar grande parte do seu a realizar IVGs. Reparem que a escolha é livre.
Claramente a maioria dos obstetras pró-aborto optará por declarar-se objector de consciência, para se poupar a um trabalho pouco gratificante.
(Sei de fonte segura que a quase totalide dos obstetras da Maternidade Alfredo da Costa votou sim, vamos lá a ver quem se vai dar ao frete de o pôr em prática)