sexta-feira, 2 de setembro de 2016

David e Golias, ou como a cimeira dos pequenos pode mudar a Europa



A Grécia exige à Alemanha €279 mil milhões, incluindo €10.3 mil milhões relativos a empréstimos forçados, por reparações de Guerra pela ocupação nazi, de acordo com os cálculos do General Accounting Office, o equivalente ao Tribunal de Contas português. A notícia, que não é de agora, foi avançada pelo primeiro ministro em Abril de 2015 quando foi criado um comité especial para avaliar este assunto.

Como é sabido, o Acordo de Londres de 1953 adiou para o futuro, pós-unificacão das Alemanhas, a realização de uma conferência que encerrasse a questão das reparações de guerra, empréstimos e contribuições forçadas impostas aos territórios ocupados, embora tenha havido um pagamento inicial de DM115 milhões em 1960 destinado a compensações individuais, faltando por isso o custo da reposição das infraestruturas destruídas, os crimes de guerra e o empréstimo forçado.

Depois da unificação, em Setembro de 1990, foi assinado o Acordo 2+4 entre a Alemanha e os países aliados – EUA, Reino Unido, França e União Soviética - no qual estes países renunciavam a quaisquer reivindicações sobre as reparações de Guerra. Porém, a Grécia ficou de fora deste acordo, tendo sido inclusive o único país a formalizar queixas contra a Alemanha, acções individuais nos tribunais alemães, e uma acção colectiva no tribunal grego de primeira instância de Livadia, confirmado por decisão do Supremo Tribunal grego. Embora para a Alemanha aquele acordo de 1990 encerre o assunto, o mesmo não se passa com o povo Grego que foi profundamente humilhado e devastado durante a 2a Grande Guerra e com o governo Grego.

No passado dia 18 de Agosto este assunto voltou a ser debatido na RT Internacional num debate que reuniu Eike Hamer, comentador politico alemão e Marina Prentoulis, membro do Syriza (vídeo acima).

Agora que se avizinha a Cimeira de Líderes do Sul, que reúne, no próximo dia 9 de Setembro, Portugal, Espanha, França, Itália, Chipre e Malta em Atenas a convite do primeiro ministro grego para debater a forma como os países do Sul podem ganhar poder de influência numa Europa dominada pelos interesses dos países do centro, este debate é interessante na medida em que é revelador da atitude da Alemanha perante a zona Euro, o papel que se autoatribui, bem como o desafio que é colocado aos líderes do Sul na criação de uma Europa justa e solidária.

Assim, na perspectiva da Alemanha:
a) A atitude da Grécia é insana e completamente despropositada dado que houve um pagamento em 1960 e a Alemanha unilateralmente encerrou o assunto em 1990 com o Acordo 2+4. Mais ainda,
b) A atitude grega constituí uma ameaça à paz na Europa ao reabrir um dossier que tem mais de 70 anos, sendo vital que a paz na Europa não seja ameaçada em tempos tão conturbados;
c) A Alemanha é vítima de grande injustiça porque é ela o maior contribuidor líquido para a União Europeia, em geral, e para o resgate Grego em particular;
d) O problema é a Grécia, isto é, não é um problema de dinheiro mas de má política, maus governantes e uma elite corrupta que desvia o dinheiro pago pela Alemanha para o exterior, especificamente para a city em Londres (desta vez a preguiça do povo grego não foi mencionada).

Esta análise apresenta graves equívocos quanto à Grécia, nomeadamente:
1.relativamente às reparações de guerra,
a) que os crimes contra a humanidade nunca prescrevem;
b) que a Grécia nunca assinou nenhum acordo no qual abdicava das reparações de guerra, existindo uma nota verbal da embaixada alemã em Atenas, de 31 de Março de 1967, que se refere ao pagamento de DM115 milhões por compensações individuais adiantando que o “governo federal nunca assumiu que o governo Grego tinha intenções de formalmente abdicar dos seus direitos legais relativos à ocupação durante a 2a Grande Guerra”;
c) que o supremo tribunal grego reconheceu recentemente a obrigatoriedade da Alemanha pagar €28.6 milhões à pequena vila de Distomo que perdeu 218 concidadãos em virtude da ocupação nazi, no massacre de 10 Junho de 1944, permitindo o arresto de bens, o qual requer a autorização do governo;

2. relativamente ao destino dos pagamentos feitos pela Alemanha
a) que estes tiveram por contrapartida da emissão de dívida bilateral e dívida multilateral intermediada pelas autoridades europeias, a qual é remunerada com o pagamento de juro e deverá ser paga mediante um calendário de amortizações;
b) que esta nova dívida, apresentada como uma injeção de liquidez para resgatar a Grécia mais não foi que uma forma encapotada de resgatar os investidores financeiros privados alemães e franceses;
c) que a restruturação de dívida que se seguiu foi muito superior e mais penalizadora para os investidores gregos residuais por culpa da falta de reconhecimento da insolvência Grega e das medidas de austeridade impostas pelos credores oficiais; d) que a nova dívida emitida não se destinou aos gregos e a recuperar o país. Na verdade, de acordo com o Comité para a Absolvição da Dívida do terceiro mundo (CADPM), dos €330 milhões recebidos ao longos dos 3 resgates, mais de metade destinou-se ao pagamento do serviço da dívida anterior, €173.5 milhões; mais de um quinto, €73.5 milhões foi para resgatar a banca; 10% para a restruturação de 2012 e apenas 7%, 24.6 milhões para cobrir o défice orçamental;

3. relativamente à eleição do Syriza, que representa uma quebra de estrutura, especialmente porque este partido e o seu governo não se identificam, e combatem, as elites corruptas gregas.

Esta análise ignora também a questão da superestrutura económica, especificamente as graves implicações intrínsecas à arquitetura institucional do Euro, o papel das autoridades europeias na proteção dos interesses do sector financeiro e dos países do centro no formato escolhido para a resolução da crise financeira de 2007-2010, desresponsabilizando a Alemanha pelas suas políticas neo-mercantilistas que em muito tem contribuído para os graves desequilíbrios macroeconómicos da zona Euro que culminaram na crise de dívida soberana.

Porém, ela representa, acima de tudo, uma total falta de solidariedade por parte da Alemanha que beneficiou de uma generosa restruturação em 1953 na qual, não só se reduziu o capital em dívida em mais de 50% (entre 50-65%, em rigor); os juros tiveram um período de carência de 5 anos, enquanto que o juro atrasado teve uma taxa simbólica de 1%; o serviço da dívida estava condicionado à evolução do comércio externo, não devendo ultrapassar 5% da balança de transações correntes; mas acima de tudo, deixando espaço para a monitorização do desempenho do país e para a revisão dos termos do acordo caso estes se revelassem excessivos para o justo desempenho económico.

Em suma, a Cimeira dos Líderes do Sul, de 9 de Setembro, é um acontecimento fundamental para o futuro da Europa. Espera-se que seja um primeiro passo para a resolução do problema da dívida no âmbito de uma conferência multilateral à escala Europeia.

15 comentários:

Jose disse...

Entre gregos e turcos venha o diabo e escolha!

Jaime Santos disse...

Contrariamente ao que outros autores neste blog advogam, estas iniciativas, assim como outros eventos recentes, como a vitória em toda a linha do Governo Português relativamente à recapitalização da CGD, mostram que a UE não está bloqueada, e que as clivagens são sobretudo de natureza ideológica. Depois, cada qual luta com as armas que tem, e sem dúvida que (pelo menos na minha modesta opinião) os Gregos têm razão relativamente à exigência do pagamento de dívidas e reparações de guerra. Parece que Tsipras terá mesmo aprendido alguma coisa quanto à melhor maneira de levar a água ao seu moinho...

Jose disse...

Reparações de guerra.

A Itália invadiu a Grécia, os alemães foram em socorro da Itália e invadiram a Grécia.
A Itália tem as contas em dia?

A Alemanha iniciou a guerra depois de acordar repartir a Polónia com a Rússia.
A Rússia tem as contas em dias?

E os outros aliados da Alemanha? Têm as contas em dia?

pvnam disse...

A Grécia exige à Alemanha milhões... relativos a reparações de Guerra pela ocupação nazi.
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Povos nativos na América do Sul, na América do Norte, na Austrália - VÍTIMAS DE HOLOCAUSTOS MASSIVOS - dispensam dinheiro... basta que lhes sejam devolvidos territórios roubados!...
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Todos diferentes, todos iguais... isto é: todas as Identidades Autóctones devem possuir o Direito de ter o SEU espaço no planeta.
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Os Nazis-Económicos (nazis-à-USA) terraplanam Identidades atrás de Identidades Autóctones de forma insaciável...
-» Quando se fala no (legítimo) Direito à Sobrevivência de Identidades Autóctones {nota: Inclusive as de 'baixo rendimento demográfico'... Inclusive as economicamente pouco rentáveis...} nazis-económicos - desde há séculos com a bênção de responsáveis da Igreja Católica - proclamam logo: «a sobrevivência de Identidades Autóctones provoca danos à economia...»
[nota: os nazis-económicos (nazis-à-USA) provocaram holocaustos massivos em Identidades Autóctones]
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Pelo Direito à Sobrevivência das Identidades Autóctones:
---» http://separatismo--50--50.blogspot.com/

Anónimo disse...

Vitória em toda a linha da recapitalização da caixa?

Jaime Santos parece que não anda a ler as notícias ou confunde os desejos com a realidade.

E que tal ler um pouco mais?

Anónimo disse...

Ah.

Verdadeiramente dramático este choradinho misturado com uma tremenda irritação da parte de Herr Jose.

Ficou desarmado. Ficou sem palavras. E como tem que defender a Alemanha , como a sua alma ainda hoje chora pela derrota do nazi-fascismo, o que faz o simpatizante do eixo e de Pétain?

Tenta esconjurar, de forma um pouco idiota é certo, a responsabilidade para a Turquia e para a Grécia. ( coisa que, se se permite a linguagem é no mínimo abjecto)

Mas há mais. Não contente com o facto e enraivecido por chamarem o nome aos bois, retorna herr jose à arena. E de que se lembra o pobre coitado? Numa manobra própria dum verdadeiro cúmplice com os crimes dos nazis, tenta arrastar a Itália primeiro e depois a Rússia como se o direito internacional se escrevesse à medida dos interesses de extrema-direita derrotada na segunda grande guerra.

Coitado do tipo? Ou cuidado com o tipo?

Porque, como não há suporte para o delírio deste autêntico sofredor pela derrota do reich, parece que vai subscrever um pedido de reparações aos países que tiveram o desplante de derrotar o nazismo.

O que se esconde atrás deste paleio de herr jose é verdadeiramente sinistro. Desculpabilizador do nazismo? Cúmplice dos seus crimes? Branqueador do terror nazi?

É altura de pedir as contas a estes canalhas

Anónimo disse...

Quem anda a dizer que a europa não está bloqueada é quem ainda não percebeu que o que se passa já está muito para lá da UE.
Tanto da parte do directório, como da parte dos países da periferia.

É aguardar para ver. Como se o Capital permitisse que lhe roubassem a menina dos ovos de ouro de braços cruzados e sem fazer sangue.

Jose disse...

Cuco mantém o seu delírio que me faz vítima de todas as perturbações emocionais que o consomem. Pobre diabo!

Todo o esquerdopata tem o especial talento de dirigir a sua 'indignação' para o lado donde possa jorrar dinheiro. É parte essencial da patologia.

Anónimo disse...

Esta cimeira já devia era ter acontecido há mais tempo. Uma vergonha o que se passou!
A pretensa "superioridade moral" deste credor está à vista: quando na posição de devedor, não lhe ocorreu respeitar essa "superioridade moral" dos credores de então e não pagou!
Qual é o limite da pretensa "superioridade moral" do credor? Guerra? Escravatura? A esta pergunta o José (por exemplo) não responde.
E agora, o que pretendem agora os alemães? Causar a 3.ª guerra mundial? Duas não foram suficientes? Francamente!

Protestaratéàmorte disse...

Claro que os donos da Europa não vão dar nada de mão-beijada... Ou quando, em toda a História, os ricos deram alguma coisa aos pobres? Há contudo que lutar, lutar sempre!

Anónimo disse...

A Grécia é um protectorado da Inglaterra.

Anónimo disse...

A pstologia do jorrar dinheiro ê afinal a desculpa última para Herr Jose tentar branquear o nazismo. Confirma-se.

A Grécia e s Turquia. A Italia e a Russia.Já passaram à historia.

Agora é do dinheiro, de que jose gosta tanto, que serve de desculpa. Mas a choradeira histérica deste por quem não paga o devido? Oh Herr Jose e então o seu paleio sobre o dever moral do pagamento da dívida? Esboroou-se como a sua defesa mal parida dos crimes dos nazis?

Mas há mais. Se este tivesse lido com atenção o muito bem fundamentado post teria percebido que o saque, os crimes, os assaltos, as pilhagens, as execuções, a destruição, a ruína, os massacres, os genocídios praticados pelos nazis constituíram crimes e foram alvo de resoluções internacionais. Mais, o trabalho escravo a que os nazis sujeitaram os seus prisioneiros tem que ser alvo de compensações. Se Jose ideologocamente se revê em Bolsonaro e em Petain e se lastima também desta forma pela derrota do nazi-fascismo, não lhe será permitido, sem a devida oposição, nem a propaganda de tal ideologia nem o apelo ao roubo descarado do que é devido. A posse do produto so roubo não constitui suporte legal para o manter, pesem as teses dos ladroes de alto coturno, dos seus cúmplices e dos coniventes de tais barbaridades. Os pulhas dos esclavagistas também diziam que os que lutavam contra a escravatura queriam o dinheiro dos patrões destes. Os colonialistas sujos e canalhas dizism o mesmo de quem lutava pela sua liberdade.

E agora Herr Jose tenta repetir o método para justificar o horror e o saque.

Anónimo disse...

Há mais um pormenor curioso. Também os nazis consideravsm como patológico quem não se formatava de acordo com a sua ideologia de extrema-direita. Muitos deficientes mentais foram também executados de acordo com as teorias eugénicas dos nazis , teorias essas partilhadas pelos darwinistas sociais.

Como se vê, os velhos métodos e hábitos persistem

Anónimo disse...

"Em suma, a Cimeira dos Líderes do Sul, de 9 de Setembro, é um acontecimento fundamental para o futuro da Europa."
Desta cimeira vai resultar o que sempre resulta: palavreado, ou seja, ... nada.

Anónimo disse...

A disputa pela hegemonia, onde quer que ela exista e a diversos níveis e´ sempre prejudicial aos povos, em especial aos trabalhadores.
Decerto esta cimeira não trará no imediato nada de novo, mas ainda assim, faz mexer a água estagnada do pântano.
Sem o “caso grego” não haveria “Tremeliques” neste lado da Europa em que vivemos. A continuação do rame-rame seria certa. Sendo que os próprios gregos nem se aperceberam do movimento por si causados…
O “efeito borboleta” em política causa perturbações de tal ordem que podem levar tanto a guerra como a paz… Presumo que o objectivo desta cimeira seja uma maior equidade entre as nações europeias. De Adelino Silva