terça-feira, 9 de novembro de 2010

Quem compra?

Abominando o regime político chinês, não posso deixar de notar a iminente entrada de grandes empresas chinesas, fundamentalmente estatais, como o Bank of China e a eléctrica China Power Internacional, no capital de empresas portuguesas, fundamentalmente privadas, muitas delas privatizadas porque, já se sabe, privado é sempre bom e público é sempre mau e fim da história.

Ironias da história económica em que não se repara porque furam os romances de mercado que nos puseram no buraco, mas que as elites continuam a consumir. Os bancos chineses são quase todos públicos e o seu sistema financeiro não foi no essencial liberalizado e também foi por isso que a China passou, até agora, incólume pelas crises financeiras.

Será que a Europa e os EUA, apostados no processo de liberalização financeira interna nas últimas décadas e tendo conseguido impô-lo a tantos países, via FMI e Banco Mundial, com os resultados que se conhecem – mais crises e menos crescimento, quando comparados com o período dos chamados trinta gloriosos anos do pós-guerra – terão algo a aprender com a China?

O país que mais cresceu nas últimas décadas nunca seguiu o chamado Consenso de Washington em matéria de regime financeiro e de propriedade. Estranho, não é? Será que se dirá no futuro que a chamada financeirização do capitalismo maduro sabotou as bases da hegemonia do centro da economia mundial?

Publicado no Arrastão

7 comentários:

rui fonseca disse...

Como é que, abominando o sistema chinês, lhe reconhece tantos méritos?

Quer esclarecer?

Eduardo disse...

João Rodrigues, faça idêntica analogia entre quaisquer 35 anos do regime de Salazar à sua escolha e os 35 anos de democracia. Estranho, não é? É o que dão as análises simplex.

Manuel Rocha disse...

Pois, é uma hipotese, mas será que estamos a comparar coisas directamente comparáveis ? Salvo melhor opinião os ultimos trinta anos da China têm mais a ver com o perido pós guerra que com os ultimos trinta anos da Europa. Só agora a China se industrializou. Será que o potencial de crescimento dos processos de industrialização não é ele mesmo superior ao de outras dinãmicas económicas ? Fica o desafio para essa reflexão.

José Luiz Sarmento disse...

As democracias desenvolvidas ocidentais não se industrializaram no pós-guerra, já se tinham industrializado antes. Os "trinta anos gloriosos" não resultaram da industrialização, mas sim de políticas económicas pragmáticas que tinham com certeza uma base teórica mas não endeusavam nenhuma ideologia.

O que se conclui daqui é deveras surpreendente: as mesmas políticas económicas que tiveram êxito nos regimes democráticos ocidentais estão agora a ter êxito na ditadura chinesa. O que não torna esta menos abominável, é claro; apenas mais eficaz.

Manuel Rocha disse...

Caro L Sarmento;

Costumo usar como critério de "industrialização" a altura a partir da qual o PIB gerado pelo sector secundário ultrapassa o do sector primário. Em Portugal foi em 1963. Aqui e agora não tenho dados para os restantes paises europeus. Mas julgo que a maioria deles só atingiu esse ponto já na segunda metade do sec XX.

Maquiavel disse...

"O que se conclui daqui é deveras surpreendente: as mesmas políticas económicas que tiveram êxito nos regimes democráticos ocidentais estão agora a ter êxito na ditadura chinesa."

Pois nem mais. Mas näo acho surpreendente, antes pelo contrário! Surpreendente seria adoptarem políticas neoliberais, e elas funcionarem!
Os chineses näo säo parvos, só imitam o que dá resultado. Nunca pegaräo nos "Reagan-Thatchernomics", porque em 30 anos só deram... digamos "ricos mais ricos e o resto que se lixe a pagar as crises", e isso eles dispensam.

A América do Sul só começou a crescer novamente (e pasme-se, com paz social) desde o abandono do "Consenso de Washington" a partir de 2001. Kirchner, Lula, Bachelet, e outros.

O leitor Eduardo é que é muito simplex, porque esquece que Portugal teve a Lei do Condicionamento Económico, para näo industrializar "demais".

Só lê "reconhecimento de mérito ao regime chinês" quem quiser ler. Este artigo é um reconhecimento, no máximo, da validade do modelo kaynesiano-social democrata, indpendentemente de quem o pratica!!!

JP Santos disse...

"até agora"

Sinceramente trat-se de um tema que nunca analisei mas há quem pense que a situação não é assim tão brilhante.

http://www.businessinsider.com/the-chinese-banking-system-is-seriously-at-risk-2010-7