Entrevista de Mário Centeno, Público, 18/7/2018 |
Presentemente, parece iniciar-se em Portugal um debate - que se espera seja sério e profundo - sobre o que fazer à arquitectura europeia e os seus tratados.
O primeiro-ministro já assumiu a sua posição no debate parlamentar do Estado da Nação: "Eu não concordo com o Tratado Orçamental. Não concordava, não concordo e desejo que um dia seja mudado. Até que seja mudado, nós temos de cumprir o Tratado Orçamental".
Recorde-se: o Tratado Orçamental obriga os países cujas contas públicas estão longe das estúpidas metas (Vítor Constâncio dixit) do Tratado de Maastricht (défice de 3% do PIB e dívida pública de 60% do PIB) a assumir uma trajectória constante anual até chegar lá, o que obriga a uma política de austeridade violenta, sobretudo para os países que foram intervencionados e que viram, por isso, a sua dívida subir significativamente.
Centeno entrou para o Governo em 2015 criticando o carácter erróneo da política de austeridade, para agora achar que tem de cumprir "as regras". O ministro adjunto do primeiro-ministro Pedro Siza Vieira, em quem Costa deposita confiança, foi mesmo mais além, ao fechar o debate do Estado da Nação, defendendo o virtuosismo das "boas contas" públicas e colocando o Estado no centro do problema. O Estado não estará bem fomentando ou promovendo políticas mobilizadoras ou impulsionadoras, mas sim com as suas contas austeras, amigas do crescimento e do emprego. Um encadear de ideias em tudo semelhante ao que faria um Vítor Gaspar, uma Maria Luis Albuquerque ou um Cavaco Silva.
A direita por sua vez tem a mesma atitude de António Costa, mas simétrica. Algo como: "Eu sou a favor do Tratado Orçamental, sempre fui e sempre serei, até quis colocar um limite de despesa na Constituição, mas não quero que seja aplicado enquanto não estiver no governo". Basta ouvir Rui Rio, todos os deputados do PSD e do CDS para acreditar que, para eles, faz sentido esta dissonância, incongruência, divergência ou populismo.
Tudo isto lembra aquela posição dúplice do actual presidente da República, caricaturada pelos Gato Fedorento, sobre a despenalização da interrupção voluntária da gravidez. Nesse caso, a duplicidade foi vencida em referendo em 2011, mas Marcelo Rebelo de Sousa acabou em Presidente...
Mude-se as palavras.
Está contra o Tratado? "Estou". Mas continua a aplicá-lo. "Sim". Mas está contra? "Estou". Mas continua a aplicar. "Continuo".
Ou à direita: É favor do Tratado? "Sou". Mas acha que o Estado deve gastar mais? "Acho" Mas é a favor do Tratado? "Sou". Mas com Tratado devia gastar-se menos. "Devia" Mas quer gastar mais? "Quero". Mas é a favor do Tratado. "Sou".
Ridículo, não é? É o que há e o que temos.
8 comentários:
Na mouche
E é um achado esta repescagem dos Gato Fedorento
Com tratado e crescimento pode gastar-se mais.
Sem tratado não há crescimento.
Com tratado e treta também não o há.
Regras? Quais regras?
http://www.positivemoney.eu/2018/07/ecb-smp-profits-billions-lost-for-greece/
S.T.
A juntar ao contínuo abaixamento do nível de bem-estar, este é só mais um dos muitos sintomas da decadência acentuada do regime.
Já tínhamos ouvido dos "dotes" poéticos de vitor joão pimentel ferreira.
Agora os de jose, em forma de versos cantadeiros, em prol do tratado? Tal qual um publicitário a arengar os mantras de qualquer produto um pouco rasca?
Esta é nova.
E este agora está a promover o gasto em vez da poupança e da herança ?
Estará o próprio mais gasto, em processo de paragem do crescimento?
Estará a arriscar outro TINA, assim tipo andanças do diabo, que andou a pregar durante dois anos?
Estará já a desculpabilizar este tratado perante as evidências que este não passa de uma trampa e a atribuir a responsabilidade desta às "tretas" que acompanham perpetuamente o seu discurso?
Que se passa?
As regras são aquelas que são impostas pelo centralismo burocratico de Bruxelas e que o Sr. Ministro das Finanças já demonstrou ser um seguidor.
Vamos lá ver, se eu for um médico que discordo da posição da Direita e do PCP sobre a eutanásia, ganho com isso o direito a aplicá-la? Nem por sombras, João Ramos de Almeida. O que se pode duvidar isso sim, é da sinceridade com que Costa diz o que diz, mas ele tem sido bastante eloquente sobre a necessidade de mudar as regras e não foi só cá dentro.
Experimente tentar fazer o que a Grécia fez e vai ver o que lhe acontece e vai ver quanto tempo demora até que a devolução dos rendimentos seja revertida, muito simplesmente porque não haverá dinheiro nos bancos para pagar aos Portugueses. Quando não se tem força para esticar a corda, a atitude inteligente é não a esticar, muito simplesmente.
Portugal tem um problema com a sua dívida excessiva e que deveria ser renegociada. Mas como lá fora ninguém quer ouvir falar disso (e as renegociações acarretam sempre deveres para os incumpridores, que é uma verdade que aqueles que as defendem convenientemente esquecem) o melhor é irmos andando como pudemos...
A Grécia e mais uma vez a Grécia. A traição assumida e ainda por cima elogiada
É o melhor irmos andando. Como pudermos?
Esperemos que por motivos higiénicos, Jaime Santos não venha pedir o voto em quem quer que seja
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