Há duas ideias que tenho aqui divulgado de forma insistente, de alguma forma ligadas pela questão da soberania, e que procurei sistematizar no capítulo que escrevi para o livro do blogue, Economia com Todos (síntese do argumento nesta crónica do Público): (1) o neoliberalismo é uma forma de mobilização selectiva e pós-democrática do poder estatal para construir novos mercados, para reforçar o poder capitalista, em múltiplas áreas e escalas, mas que procura mascarar ideologicamente tal facto (na verdade, se se ler muitos autores desta tradição plural e que vem de longe, as coisas até estão lá expostas de forma relativamente transparente); (2) uma das razões intelectuais para a fraqueza das oposições políticas a esta razão ainda desgraçadamente dominante radica na impotente natureza globalista da maioria do pensamento sobre as supostas alternativas, que também desta forma nunca vêem a luz do dia.
Apesar de ainda minoritários, creio que são cada vez mais os que nas ciências sociais e humanas, incluindo a economia política crítica, têm vindo a elaborar e a popularizar ideias destas. Até numa das publicações da principal vítima ideológica do neoliberalismo, a social-democracia europeia, chamada Social Europe, estas ideias fazem o seu caminho, por exemplo pelas mãos de William Mitchell e de Thomas Fazi, num artigo excelente e que merece tradução e ampla divulgação por cá: “A guerra à soberania foi na essência uma guerra à democracia. Este processo foi levado às suas conclusões mais extremas na Europa ocidental, onde o Tratado de Maastricht incrustou o neoliberalismo no centro da mecânica da UE, proibindo as políticas ditas keynesianas que tinham sido comuns nas décadas anteriores”.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
22 comentários:
Já me irrita a treta do expansionismo keynesiano a propósito de anos de desbunda orçamental - o que nunca passou pela cabeça do Keynes.
Soberania, democracia, políticas keynesianas.
O políticos soberanos usam a democracia para dizer ao povo quem é capaz de dar mais; roubam e endividam-se quanto baste para cumprir as promessas e chama-lhe ciência keynesiana.
Noutros tempos usavam as armas quando necessário, agora têm ido pelos mercados e apelos à solidariedade...a ambição maior é que acabem socialistas a trabalhar com senhas de racionamento.
Socialismo, terra e banca: 2017 comparado a 1917
Autor: Michael Hudson
Os mercados não recuperaram para os produtos da indústria e trabalho americano desde 2008. Capitalismo industrial foi sacrificado por um capitalismo financeiro que se parece cada vez mais com um pré-capitalismo (ou simplesmente oligarca ou neofeudal) a cada ano que passa.
A polarização resultante obriga cada economia – incluindo a China – a escolher entre salvar os banqueiros e outros credores ou libertar os devedores.
Vai o governo forçar os interesses dos bancos e accionistas, ou vai dar prioridade à economia e à população. Esta é a eterna questão que vai do pré-capitalismo, capitalismo ao pós-capitalismo.
O artigo completo em inglês
https://www.counterpunch.org/2017/10/20/socialism-land-and-banking-2017-compared-to-1917/
(Há por aí um tipo que lhe irrita Keynes. Um dia insultou-o de forma soez.
Agora quase que choraminga de irritação.)
A desbunda de que se fala deve ter muito a ver com o assalto ao estado social praticado pela canalha neoliberal. Enquanto desbundavam os donos de portugal mais os Borges que não pagavam impostos e os patrões que punham os lucros das negociatas e das trafulhices nos offshores,vulgo bordéis tributários.
Era fartar vilanagem.
Mas a propósito da "ambição maior" dum ideólogo neoliberal destrambelhado a fazer o choro dos mercados:
"O capital financeiro sempre se opôs à utilização de medidas orçamentais para estimular uma economia. Isto acontece porque este estímulo orçamental mina a legitimidade social do capitalismo – e especialmente aquele segmento dele que constitui o mundo da finança e que está povoado com "investidores inúteis" ("functionless investors") nas palavras de Keynes ou "cortadores de cupões" nas palavras de Lenine, ou seja, de entidades que não desempenham qualquer papel no processo de produção. Se a intervenção do Estado chegar a ser vista como necessária para estimular a economia, então pode-se levantar a seguinte questão na mente do público: por que necessitamos nós destas entidades? Por que o próprio Estado não assume o comando e dirige toda a economia instituindo a propriedade pública?"
Está explicado o choradinho idiota do fulano das 10 e 27
Jose,
Larga o vinho.
"De acordo com a Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a Jerónimo Martins, dona de superfícies comerciais na Colômbia, na Holanda e em Portugal – Pingo Doce e Recheio –, aumentou os seus lucros (descontadas operações financeiras dentro do grupo) em 7,1% nos primeiros três semestres do ano. Entre Janeiro e Setembro, os lucros chegaram a 285 milhões de euros.
Esta é outra das empresas sobre as quais incide a taxa máxima da derrama estadual, que deverá subir de 7% para 9% no debate na especialidade do Orçamento do Estado para 2018.
Neste caso, o risco de fuga da empresa de Portugal – um dos argumentos dos que (no PS, no PSD, no CDS-PP e no patronato) rejeitam o aumento do imposto sobre os mega-lucros – nem uma viragem se pode considerar. É que na passagem do ano 2011 para 2012, a Sociedade Francisco Manuel dos Santos (a empresa familiar que domina a Jerónimo Martins) transferiu-se para a Holanda, beneficiando do regime fiscal feito à medida das grandes empresas.
A mudança foi feita durante a vigência do anterior governo e nem a redução do IRC (quatro pontos percentuais entre 2014 e 2015) faz regressar a Portugal a dona da Jerónimo Martins.
O que e dona da Jerónimo Martins não fez foi levar consigo para a Holanda as 413 lojas do Pingo Doce, que facturam anualmente mais de 3,5 mil milhões de euros. Essas continuam em território nacional e a pagar os impostos devidos – só a apropriação dos lucros pela família Soares dos Santos é que deixou de contribuir em Portugal"
(abrilabril)
Todas estas considerações se baseiam numa premissa que a realidade se encarrega se desmentir, a saber, que os governos podem sistematicamente incorrer em deficits significativos, algo que não poderia ser mais estranho ao pensamento original de Keynes, aliás. Tudo isto rui pela base se colocarmos uma questão simples: quem é que, com Euro ou sem Euro, com UE ou sem ela, nos vai emprestar dinheiro para incorrermos nesses deficits?
Já se sabe, fala-se em repressão financeira sobre os bancos, mas isto é um nome agradável para o esbulho dos aforradores (e não dos ricos, note-se, que esses têm outros mecanismos de investimento). Cabe-me lembrar-lhe que a primeira intervenção do FMI em Portugal se deveu aos desmandos daquilo que gosta de chamar 'políticas de Abril' (e a segunda devido aos desmandos do governo AD, pontificava então nas Finanças um certo Cavaco Silva)...
Esqueça, João Rodrigues, isso não vai acontecer, pelo menos não num mundo em que taxas de crescimento de 2-3% já se consideram altas. A Esquerda dita soberanista continua a viver na ilusão de que é possível um retorno aos gloriosos 30 anos do pós-guerra e à reconstrução do proletariado industrial que lhe dava os votos.
E para além de faltarem os meios financeiros para fazer tal coisa, a própria tecnologia se encarrega de negar isso... Há uns anos, tive a oportunidade de assistir a uma apresentação sobre o melhoramento dos processos de produção, que incluía uma simulação do dito processo, em que os operadores humanos eram representados por figuras de tipo Lego, no melhor estilo dos 'Tempos Modernos'. Quando no final inquiri a pessoa que fez a apresentação sobre a razão de a simulação incluir esses operadores e porque não era tudo automatizado, já que o processo era completamente determinista e como tal, os operadores humanos só introduziam entropia no sistema, a resposta foi bastante esclarecedora: 'sabe, em Portugal os salários ainda são suficientemente baixos para não compensar fazer a dita automatização...'
Aliás, o principal problema da social-democracia foi que não perdeu apenas a batalha ideológica com o neo-liberalismo, mas também a batalha da tecnocracia. E, relativamente ao socialismo ao estilo soviético, esse faliu pela base, coisa que vale sempre a pena recordar-lhe, não vá cair na ladainha de que pelo menos era bom para manter o capitalismo em sentido...
Vale a pena ler aliás um outro artigo do Social Europe sobre isso, já mais antigo: https://www.socialeurope.eu/nobel-economics-versus-social-democracy.
Por isso é que, tirando algumas honrosas exceções, a discussão económica à Esquerda em Portugal se concentra tanto nos princípios e nos objetivos e tão pouco nos meios (o diabo está nos detalhes). E aí, o Doutor Centeno é mesmo o mais radical de todos. As suas políticas funcionam, mesmo que para isso tenha que recorrer ao Excel...
É uma tristeza.
Independentemente de todo o texto, a ideologia ou as opiniões é uma pena que Jaime Santos não tenha o mínimo pudor ao qualificar assim Centeno.
O diabo está mesmo nos detalhes. E a apropriação do significado das palavras é um deles.
Considerar de radical alguém cujas políticas "funcionam" é ao mesmo tempo violar o significado das palavras e violentar a inteligência dos demais.
E demonstra alguma ausência de escrúpulos quer na propaganda política directa à política de Centeno , quer na tentativa de "arrumar" os demais que ousam dizer que Centeno é apenas o que é.
O diacho está nos detalhes. E este assim tão burilado ( e repetido ) por JS não passa impune, a bem dos detalhes e da decência. Para quem anda a fala tanto nos meios,este "meio" de deturpar o real significado das coisas não passa mesmo
(Pese o esforço humorístico de JS mais a sua folha de Excel)
Jaime Santos,
O balanca fiscal de um pais e uma variavel endogena. O resto do seu texto, e conversa, de treta.
Fala-se em repressão financeira sobre os bancos...
E Jaime Santos não gosta. Não quer que as tropelias banqueiras sejam investigadas e julgadas. Não quer que os lucros da banca sejam mexidos. Quer que quando haja prejuízos estes sejam socializados. Quererá sobretudo o respeito pelo capital financeiro e pela financeirização da economia.
Jaime Santos abandona o discurso dos hossanas ao Capitalismo. Confessa a derrota da social-democracia ( omitindo os que a traíram) e vai por aí impante a proclamar coisas tão radicais como nos rendermos a crescimentos tão altos como 2 a 3%
Num provável involuntário descuido insinua que a esquerda "dita soberanista" quer voltar aos gloriosos 30 anos do pós-guerra por uma questão de arranjar votos pelo proletariado industrial. Mostra assim que não gosta da esquerda ( a esquerda quer voltar ao tempo das vacas-gordas) como confessa que também não gosta de crescimentos altos resultantes da luta das esquerdas.
Agastado com o facto dos regimes de leste terem contribuído para manter o "capitalismo em sentido", Jaime Santos repete uma sua ladainha. Era bom que confirmasse tal. Não se discute ( aqui e agora ) o motivo da queda a leste. O que se discute é um facto considerado válido pela generalidade dos observadores ( até por de direita, com um mínimo sentido de independência). Se em vez de nos mostrar pedaços da Social europe, onde se acoitam alguns dos mais assumidos neoliberais, nos mostrasse alguns relatórios da própria inteligência americana e a abundante reflexão teórica sobre o tema seria bem mais sério. Não vale assim a pena este tipo de intervenções axiomáticas. A realidade do dia a dia mostra-o, tal como mostra a situação internacional que está cada vez mais caótica e perigosa,desmentindo o paraíso celeste propagandeado pela queda do muro de Berlim
Jaime Santos
Resumindo o seu escrito destaco a simples mensagem de que as coisas são como são e de nada vale as Esquerdas estrebucharem com ideologias e ou panfletos reivindicativos de incentivo à soberania pois as coisas são como são e se Churchil dizia que "A democracia é a pior forma de governo, com excepção de todas as demais" o Jaime aponta para o mesmo sentido mas com o realce da ideia de que o Capitalismo se sobrepõe á democracia na frase de Churchil.
As crises serão sempre um momento ideal para a reflexão, uma oportunidade de se repensar as prioridades entre a economia financeira e a economia real ... mas não para o Jaime Santos que se perdeu nos detalhes.
Sendo assim, nada há de muito mais a debater pois o Jaime faz tábua rasa da própria evolução da economia acreditando que a economia chegou a um estádio de maturidade tal que não se vislumbra qualquer lampejo de evolução e que Centeno é um demagogo que se baseia na fortuna e nos "búzios" ao melhor estilo de um pai de santo do Excel.
Como se pode debater os meios se o Jaime S. exclui a partida os princípios e objectivos?
Centeno, desde que mantenha a mama a jorrar sempre será louvado.
A História não acabou. A próxima crise espreita. Aí em cima alguém conta uma história edificante sobre personagens Lego, não se sabe se num convite a salários baixos em Portugal , se um brado de rendição à dita "automatização". Mas as relações de produção não se vão alterar e entretanto a fogueira vai crescendo, prometendo novas e violentas disrupções num sistema já conturbado.
Ora se o futuro é negro para quem trabalha e se não há trabalho para quem dele necessita, se a procura se reduz e se continuam a registar-se acumulações de capital da ordem a que assistimos, cabe perguntar a quem é ou a quem vai ser sacrificado pelo sistema, se este sistema lhe serve. E se não vale mesmo a pena directamente questionar o poder e a economia ao serviço do capital financeiro, de forma assumidamente radical.
Vale a pena questionar, passar a palavra, experimentar e lutar
A esquerda afunda-se no wishful thinking e cria cenários que ignoram o futuro e recuperam cenários do passado:
Recuperar a produção industrial nacional - que nem no seu melhor tempo era particularmente inovadora e cuja competitividade se estribava em baixos salários e mercados condicionados (entre eles os dos territórios em África)- e acrescentam-lhe altos salários.
Recuperar a soberania monetária - a ser montada em cima de uma dívida brutal e uma balança comercial periclitante - e ora batem o pé aos credores ora apelam à caridade de quem tem o poder de condicionar o euro.
Recuperar os instrumentos de política económica - que para além da moeda seguramente inclui alterar os acordos comerciais - provavelmente visando obter um qualquer estatuto de favorecimento comercial de países donde são originários os nossos credores.
E por aí fora num delírio cuja lógica funda a suspeição de que .......a ambição maior é que acabem socialistas a trabalhar com senhas de racionamento.
PS: no meio disto tudo nunca se houve um apelo ao esforço, seja pela produtividade seja pela aquisição de saberes que confiram com a evolução provável do mercado de trabalho.
Dado e arregaçado, assim se configura o pensamento de esquerda.
O que anda sempre com a mama na boca viveu, vive e quer continuar a viver à mama?
Não a larga e quer ser louvado por isso
-"A esquerda afunda-se" etc etc etc
Arrependeu-se da boçalidade do seu comentário anterior sobre a mama? E agora vai de afundar-se mais a mama que não o larga.
"A esquerda ...cria cenários que ignoram o futuro e recuperam cenários do passado"
O futuro é o quê? A bola de cristal que adorna os mantras neoliberais?
O passado recuperado é o quê? Os berros dos viva la muerte que este tipo considera como românticos?
https://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/10/perto-do-fogo.html
"Dado e arregaçado" é outro mantra religioso, assumido declaradamente por um patronato boçal e medíocre. Quer cumprir assim dois objectivos: uma mão de obra à custa da água da chuva por um lado. O chapéu protector do Estado para os seus negócios e negociatas por outro
Dado e arregaçado
O das 19 e 02 não gosta:
-Da recuperação da produção industrial nacional - Cavaco e a CEE deram um contributo decisivo para a sua aniquilação. Que diabo, o empobrecimento do país é necessário para que se continue a vender por tuta e meia o que possuímos. Então lá se iam as oportunidades de negócio
-Da recuperação da soberania monetária - então as ordens de Bruxelas já não seriam ordens? Então e a submissão aos senhores que têm o poder de condicionar o euro? Então e a farsa da dívida como processo para fazer-nos voltar ao século XIX e os juros da dívida para justificar o ajuste de contas com Abril?
-Recuperação dos instrumentos de política económica - então e o risco que nos escapássemos do controlo dos Mercados? Então e os perigos que os proventos dos credores e agiotas não fossem parar exactamente ao bolso dos mesmos agiotas e credores, com o salpico das migalhas para os seus capatazes?
Espanta sempre de como um assumido salazarista, terno romântico dos Viva la Muerte das hordas fascistas espanholas, convicto defensor dum colonialismo sanguinário se bandeia desta forma para o lado dos vende-pátrias vulgares.
Claro que o que está sempre em causa é o Capital ( que não tem pátria) e o aumento da taxa de lucro. E se no tempo de Salazar a exploração mais selvagem da mão de obra nacional e o saque das colónias levava aos berros pela África dita portuguesa ("Angola é nossa" e outras tretas do género) , agora é o directório europeu que lhes garante os mecanismos que lhe asseguram a maior fatia do bolo e que os leva a gritar "Deutschland über alles"
Claro que isto leva a suspeitar que a ambição maior destes tipos é de nos verem sem trabalho ou a trabalhar ao preço da uva mijona; ou então emigrados e humilhados; ou então com seis palmos de terra porque isso de querer saúde é mesmo só para quem a possa pagar
Ou que a ambição maior destes tipos seja mesmo acabar com os socialistas, comunistas, esquerdalhadas, outros democratas, tal como sonhou Franco na Guerra civil espanhola
https://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/10/perto-do-fogo.html
As senhas de racionamento não são um processo muito do seu agrado. Dá nas vistas e deixa vestígios. Antes as filas diante da sopa dos pobres organizadas pelas senhoras da caridade , tipo madame Jonet, ou pela máfia legionária de tão grata memória ao das 19 e 02
Jose,
Entao tu fazes a apologia do botas dia sim dia sim e depois dizes que os outros recuperam cenarios do passado? Larga o vinho...
Enviar um comentário