quinta-feira, 22 de agosto de 2019

Ser socialista

Video de campanha eleitoral do PS, 2019
Algo está mal no socialismo português.

Sobretudo quando um governo socialista interpreta como um ataque ao seu desempenho e ao país a vantagem negocial que certos grupos de trabalhadores têm face à sua entidade patronal, fruto da sua actividade ter impacto na vida dos portugueses e dos estrangeiros.

Já se assistira durante a greve dos motoristas a uma tentativa - bem conseguida - de esvaziar a eficácia da greve marcada, raiando a violação da lei da greve e sem que o Governo seja sensível aos problemas que estão na base da greve, alguns deles violando a lei laboral.

O Governo decretou serviços mínimos abusivos, mobilizou forças de segurança e mesmo as forças armadas(!), aumentou as compras de combustível em Espanha (algo que corresponde a uma substituição de grevistas, proibida pela lei nº 7/09 proíbe, art 535), o que já fora feito na greve dos estivadores, com apoio público e até policial.

Agora, temos mais um déjà vu com a greve dos trabalhadores da Ryanair. E mais uma vez o Governo acha que pode ficar ao largo do problema de fundo da greve, em que os grevistas acusam a companhia de violar a lei portuguesa, quanto ao pagamento de subsídios de férias e de Natal, e mesmo contra a lei da greve.

O despacho dos secretários de Estado Alberto Souto de Miranda (Infraestruturas e Comunicações) e Miguel Cabrita (Emprego) parece estar mais preocupado com outras coisas, que, na realidade, fazem Governo colar-se ao lado patronal. Na definição dos serviços mínimos, foi tido em conta:

1) a  “duração relativamente longa da greve (cinco dias)”;
2) a  “estação do ano abrangida – verão – em que se verifica um crescimento considerável da procura do transporte aéreo, que os cidadãos e cidadãs cada vez consideram mais imprescindível”;
3) ser importante “evitar o aglomerado de passageiros nos aeroportos nacionais durante os meses de verão, dado que tal pode potenciar riscos para a segurança de pessoas e bens”;
4) “o facto de para os portugueses residentes no Açores e na Madeira o transporte aéreo ser a única forma de garantir o direito à deslocação de uma forma célere e eficiente”;
5) “existirem em Inglaterra, França e Alemanha significativas comunidades de emigrantes cidadãos portugueses deslocados, para quem agosto é tipicamente o mês eleito para visitar as suas famílias em Portugal”;
6) e finalmente o facto de “Portugal ser cada vez mais um destino de eleição para os turistas europeus, com particular enfoque na época estival”.

Ora, estes critérios podem ser uma forma ínvia de corresponder ao espírito da lei.


O seu artigo 537º estabelece que os "serviços mínimos indispensáveisdevem ser assegurados no caso da empresa em que se verifica a greve "se destine à satisfação de necessidades sociais impreteríveis". E consideram-se essas "necessidades sociais impreteríveis" como: 

"a) Correios e telecomunicações;
b) Serviços médicos, hospitalares e medicamentosos;
c) Salubridade pública, incluindo a realização de funerais;
d) Serviços de energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis;
e) Abastecimento de águas;
f) Bombeiros;
g) Serviços de atendimento ao público que assegurem a satisfação de necessidades essenciais cuja prestação incumba ao Estado;
h) Transportes, incluindo portos, aeroportos, estações de caminho-de-ferro e de camionagem, relativos a passageiros, animais e géneros alimentares deterioráveis e a bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respectivas cargas e descargas;
i) Transporte e segurança de valores monetários."

A companhia em questão, enquadra-se nos "transportes" de "passageiros", mas é discutível que, pelo facto de ser considerado o "período estival", se esteja na presença de "necessidades sociais impreteríveis", nomeadamente dos turistas que vêm a Portugal. Ou será que o governo socialista está - e estaria bem - tão preocupado com as férias dos cidadãos como estaria com a prestação do trabalho dos passageiros?

Na prática, o Governo socialista está - de facto - a reescrever a lei da greve: qualquer greve que seja demorada (ou seja, cinco dias já é demorada), que envolva serviços muito procurados, e que prejudique a vida de cidadãos nacionais e estrangeiros - nomeadamente franceses, britânicos e alemães - obrigará à fixação de serviços mínimos que reduzam ou anulem essa mesma greve.

Um governo socialista que se preze de ser português e socialista devia ter outra visão do mundo.
Mais um pouco e assistiremos ao envio de tanques pelo governo socialista para esmagar uma greve, tal como aconteceu em França no pós-guerra.

12 comentários:

Jose disse...

Para já o socialista só vem ao caso se se tratar daquele 'socialismo só há um' que propõe a ditadura do proletariado; de outro modo é social-democracia pelo que resulta prejudicada essa alegação, salvo o expediente geringonço.
Por outro lado, as receitas de turismo são ' bens essenciais à economia nacional, abrangendo as respectivas cargas e descargas'; é um pouco esticado o sentido da lei? Seja!
As greves relativas a despedimentos colectivos, extinção de postos de trabalho (caso do fecho no Algarve) haveriam de ser proibidas. Se o despedimento é legal, haveria de ser ilegal oporem-se a acções legais.
Só serve para satisfazer a esquerdalhada, ameaçar mais postos de trabalho e incomodar um montão de gente.

Anónimo disse...

No actual momento em que a greve, se tornou um acto do nosso dia-a-dia, criando até uma espécie de banalização, que acaba por criar até o efeito perverso de algum descrédito na sociedade. O que nos deve levar a reflectir sobre as causas e efeitos pretendidos num processo de greve. Pois a sociedade contemporânea, liga e analisa com este processo com uma rapidez maior. Deixava uma questão para que se pudesse meditar, deixando, desde logo a ideia que estamos ainda num processo ajustamento e de saída da troika, e a questão é? - E se o Governo não actuasse da forma que actuou? Será que os efeitos para todos (grevistas, população, Governo) não seria piores, do que alguns desfasamento, ao direito À greve.?

Geringonço disse...

"Um governo socialista que se preze de ser português e socialista devia ter outra visão do mundo."

Pois, mas esse é o problema.
O PS não é socialista, é "socialista", e não é português, é europeísta...

Anónimo disse...

"Na prática, o Governo socialista está - de facto - a reescrever a lei da greve..."
Dir-se ia que o Governo está a ignorar a presente Lei da Greve.

Rão Aeques disse...

E parece que consideram uma ilegalidade a substituição de grevistas durante a paralisação, ou será que ouvi mal?
No ar ou em terra parece que não é literalmente a mesma coisa.

DFerreira disse...

"Mais um pouco e assistiremos ao envio de tanques pelo governo socialista para esmagar uma greve, tal como aconteceu em França no pós-guerra. "

Ou como em Tianamen pela China Comunista, ou na Alemanha pela Russia Comunista, ou em Caracas pela Venezuela de Esquerda.

Ou aí a história é diferente?

Manuel Galvão disse...

Que frustração! o país não ter parado com a greve dos motoristas que andavam a fugir ao fisco e à SSocial...
Felizmente vai haver eleições em breve e o povo vai mostrar ao partido no Governo com quantos paus se faz uma canoa.

Anónimo disse...

Quando se tenta defender o indefensável, tipo clube de futebol, dá sempre cagada,e, o que está em causa, no caso da companhia de aviação, é tão só o "Estado a que isto Chegou".Ou não?
Chatice, quando nos metemos a comparar... dá sempre dominó para os dois lados.
Ai, a historiazinha é tramada! E o problema,é quando ela é "pretensamente discutida"... por grunhos.
Note-se: "Será que os efeitos para todos (grevistas, população, Governo) não seria piores, do que alguns desfasamento, ao direito À greve." Desfasamento!!?? eheheheheh, é só rir... a sério?Desfasamento!eheheheh que chatisse o Futuro! é já ali!! e ser aquele " local onde temos um dia de Viver"!!! será ou seria?
E para " Todos"! é obra! é profundo! Dá para PENSAR!ui,ui...lindo!
Mas, o que dizer doutra pérola:" Se o despedimento é legal, haveria de ser ilegal oporem-se a acções legais." é verdade : O Mundo é uma Batata! Ganda zézito. Vai longe.Seguramente.





Lucílio F. B.Toscano disse...

O propósito do Sr. Pardal ao anunciar uma greve em período de eleições que tem o potencial de criar o caos no país é nem mais nem menos, de penalizar de forma acentuada o partido do governo. Não se trata pois de reescrever a lei da greve mas sim de combater a esperteza saloia de um pseudo-sindicalista oportunista.

João Ramos de Almeida disse...

Caro DFerreira,
Tem toda a razão em suscitar essa discussão, embora esse argumento pareça mostrar da sua parte que está a tornar-se um adepto da real politik.

Eu só queria aceitar que o socialismo democrático e de rosto humano fosse isso mesmo: mais humano. Queria acreditar que havia realmente uma nova forma de olhar para a sociedade, para as relações sociais e para as questões de poder. Se compara os tanques socialistas franceses com os chineses ou soviéticos, parece que não haverá futuro para uma terceira via.

Como - creio - estaremos todos de acordo que os tanques são de evitar como forma de resolver "problemas" grevistas, vamos pensar numa forma mais correcta de resolver o que está na base dos protestos sindicais.

estevesayres disse...

Por muito que venham as carpideiras apoiar este governo de direita do PS do Costa, e com apoio das suas muletas, mais tarde ou mais cedo serão responsáveis e criminosos, para o futuro dos nosso jovens trabalhadores, e do nosso País.

Este governo no seu mandato, e com apoio das suas muletas teve ao longo do seu mandato, teve atitudes terroristas para com os trabalhadores.

Os partidos em questão, não merecer o voto dos operários e de mais trabalhadores…

Por fim; o ex-governo de traição-nacinal de Passos/Portas e Cristas tutelado por Cavaco, foi um menino de coro, comparada com este governo de "esquerda"!

Anónimo disse...

Já se sabia

O partido da dupla durao barroso/ Arnaldo Matos tem sempre uma preferência pela direita assim tipo Passos portas Cavaco

Já antes no pós 25 de Abril demonstraram e bem. Já se sabe onde foram parar

O sr Aires não é de todo um menino de coro. Mas quer fazer-nos passar como tal