sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

A Itália na encruzilhada


Tradução livre de parte de um artigo de Jean-Luc Gréau na revista Causeur.


É possível salvar os bancos italianos?

A seguir ao referendo de 4 de Dezembro, a nacionalização do banco Monte dei Paschi di Siena estava na ordem do dia. (…) Na realidade, estão em causa oito bancos, dos quais o célebre Monte dei Paschi ocupa o terceiro lugar quanto ao volume de negócios.

Mas porque é que não se pode fazer com a Itália o que já se fez com a Espanha? Bastariam, segundo os contabilistas especializados, entre 70 e 80 mil milhões de euros de dinheiro público. Há dois obstáculos que formalmente o impedem.

Primeiro, um obstáculo financeiro: a Itália apresenta a segunda maior dívida pública europeia, cerca de 133% do PIB, depois da Grécia que está próxima dos 200% ! Um resgate consequente implicaria uma nova deriva na dívida pública que os enormes esforços de austeridade não conseguiram reduzir por falta de crescimento público.

Mas existe também um obstáculo político: a zona euro está sujeita desde 1 de Janeiro de 2016 às novas regras da união bancária. Regras que comportam uma inovação devastadora: o dinheiro público só pode ser injetado se, antes, forem contabilizadas as perdas dos credores do banco, de acordo com uma regra imposta por Berlim. E quem são os credores? Os outros bancos que fizeram empréstimos ao Monte dei Paschi, mas também, e sobretudo, os seus clientesque subscreveram as obrigações do banco. Estes, são milhões de italianos que tinham confiança nos seus banqueiros, no quadro de uma política de poupança que é específica da península da Europa. Na Itália, país com uma fecundidade baixa, as poupanças são um complemento necessário à futura pensão de reforma. Assim, qual é o governo que ousará impor perdas substanciais à massa dos clientes bancários?

O Fundo Europeu de Estabilidade, que permitiu a manutenção no euro da Grécia, Irlanda, Portugal, Espanha e Chipre, poderia ser o último recurso. No entanto, teria de obter o acordo das autoridades europeias, aliás colocadas sob estrita vigilância de Berlim. Porém, a opinião pública alemã já não quer resgatar mais vizinhos falidos. Assim sendo, o resgate dos bancos parece problemático de um duplo ponto de vista, financeiro e político.

O calvário da Itália

(...) O euro teve um duplo papel nesta crise: impediu a desvalorização relativamente aos concorrentes asiáticos e relativamente à Alemanha. O euro é a cruz que a Itália carrega às costas ao longo de um calvário que começou em 1999. O produto italiano por habitante caiu para o nível de 1997. Durante este período, a Itália acumulou, tal como os estados do sul da Europa e a França, défices para com a Alemanha que atingem uma dívida total de 359 mil milhões de euros, enquanto a Alemanha lidera um crédito total de 754 mil milhões sobre o conjunto dos parceiros da zona! Qualquer pessoa entende facilmente que a Itália só tem uma alternativa: carregar a cruz até à sua crucificação final, sob o olhar dos legionários merkelianos, ou rejeitá-la.

Um réveillon sem champanhe

Em vésperas de 2017, a decisão sobre o Monte dei Paschi é o mais importante. O BCE já deu o sinal de alerta sobre “a brutal deterioração da posição líquida” do banco de Siena. O “buraco” nas contas excede largamente o que estava anunciado pelos dirigentes, a saída de depósitos totaliza 20 mil milhões de euros desde 1 de Janeiro, dos quais 2 mil milhões desde 1 de Dezembro. Impõem-se decisões urgentes. Uma coisa é certa: os dirigentes italianos não vão saborear champanhe na noite de São Silvestre.

7 comentários:

Anónimo disse...


Todos os bancos são salvos meu amigo porque são ao mesmo tempo a solvência de outros bancos. Só não se salvarão os bancos que tentam fugir ao esquema montado. Ao certo, tudo indica que se fosse pela confiança nos banqueiros, nenhum banco se salvaria, pois se há alguém que desconfia podemos começar pelos banqueiros. Eles são os próprios a se não confiarem.
Quanto a´ permissão de alguns países continuarem na U.E. tem a ver com as posições geoestratégicas que ocupam no espaço determinado pela OTAN.
Que seria feito da U.E. sem ter o apoio desta organização politica/militar?
Os mais poderosos homens do mundo preferem a banca ao ser humano! De o Catraio com respeito.

Anónimo disse...

Muito bom

Anónimo disse...

"A Alemanha é a Alemanha !
O BCE para mostrar aos alemães que o seu fechar de olhos ao financiamento pelo Estado Italiano do Monte dei Pashi - contrariando as regras europeias em vigor (bail,in) , foi uma excepção decidiu agora mostrar firmeza e , contrariamente a todas as estimativas avançadas , decidiu que este banco precisava de ser capitalizado entre 5 a 8,8 milhares de milhão de euros.
O ministro da economia italiano reagiu negativamente . Disse que recebeu do BCE uma carta com cinco linhas e três números e quer explicações sobre como se chegou àqueles valores .
Esta decisão é ainda mais incompreensível em Itália quando se soube que esta semana o BCE resolveu mostrar se particularmente generoso com o Deutsch Bank baixando a exigência de 10.76 do rácio CET-tier 1 até agora em vigor , para 9,5% .
Esta diminuição , vai permitir ao banco alemão , que conheceu um ano turbulento e sobre o qual há justificadamente as maiores desconfianças quanto à sua solidez , distribuir generosos dividendos e bónus aos seus dirigentes ! Tais prebendas seriam impossíveis sem a decisão do BCE de baixar a exigência do Rácio . Uma vergonha .
Os beatos do Europeísmo não têm comentários a fazer ?
Na Itália compreende-se mal esta generosidade do BCE , face à dureza mostrada em relação ao Monte di Paschi , tanto mais que neste banco os créditos de cobrança duvidosa resultam de empréstimos à economia real em dificuldades enquanto os créditos duvidosos e as dificuldades do Deutsh Bank resultam sobretudo das actividades especulativas,
Dois pesos e duas medidas.
A Alemanha é a Alemanha !"

(pena preta)

Anónimo disse...

"Heiner Flassbeck, economista, ex-secretário de Estado das Finanças:
Flassbeck coloca a Alemanha no coração da origem da crise da moeda única, revela o segredo do crescimento alemão nos últimos 15 anos (“o país tem operado uma política de ‘pedinchar ao vizinho’, mas só depois de ter ‘pedinchado ao seu próprio povo’ essencialmente através do congelamento dos salários - este é o segredo do sucesso alemão dos últimos 15 anos”) e diz que sem um ajustamento da maior economia europeia o fim da União ganha contornos de possibilidade real. A perspetiva de desintegração e o decorrente colapso da união já não podem ser ignorados, defende Flassbeck"

Anónimo disse...

"UEM dirige-se para o desastre
Em meados de 2016, o desemprego na UE continuava nos 10%. Em Espanha e na Grécia, o desemprego estava acima dos 20% e o desemprego jovem era superior a uns extraordinários 50%. Mais do que qualquer outra coisa, estes números mostram o insucesso da UE na luta contra este problema que emergiu como a “crise da zona euro”. Enquanto a queda significativa de crescimento e emprego foi inicialmente provocada pela crise global de 2007-9, após 2010 as nações devedoras da UEM ficaram privadas de meios para combater a recessão e foram forçadas a adotar políticas pró-cíclicas numa escala que não se via desde os anos 30.

O mantra alemão que diz “a austeridade é a única solução” foi aplicado a todos os países, que foram forçados a pedir ajuda quando acabou o seu acesso aos mercados globais, ou quando ele lhes foi vedado de facto pelas altíssimas taxas de juro. A obsessão com os aparentes problemas fiscais dominou o debate e as condições que foram exigidas pela troika e pelo Eurogrupo para abrir os cofres das nações credoras concentrou-se na consolidação a qualquer preço e o mais rápido possível dos orçamentos públicos dos países do défice.

As divergências acumuladas durante os primeiros anos da UEM e a terrível natureza dos programas de ajustamento puseram em questão a própria sobrevivência da UE

Com a persistência do domínio alemão dos mercados de exportação e dada a recusa alemã de ajustar o seu próprio modelo económico, o futuro da zona euro parece sombrio. A falta de instrumentos de política para atacar a recessão, o condicionamento dos programas de ajustamento impostos às economias em crise, o próprio ajustamento “estrutural” disfuncional e a perspetiva de deflação continuada aumentaram os custos de permanecer na UEM ao ponto de a subida política da direita ameaçarem a democracia e a União Europeia. O insucesso na descida das taxas de desemprego e a crescente pobreza abriu caminho aos partidos de direita populistas e antieuropeus, tanto nos países credores como nos devedores. Contra esse perigo, os benefícios de ser membro da UEM são pequenos e, mais importante ainda, estão a diminuir depressa.
Em resumo, as divergências acumuladas durante os primeiros anos da UEM e a terrível natureza dos programas de ajustamento puseram em questão a própria sobrevivência da UE. E, no entanto, os líderes europeus parecem alheios a isso. Parecem ainda menos disponíveis para empreenderem um esforço político para inverter a economia em geral e impedir as divergências crescentes no seio da UEM. A perspetiva de desintegração e o decorrente colapso da união já não podem ser ignorados"

(HEINER FLASSBECK)

Anónimo disse...

É do conhecimento geral que a situação de todos os bancos italianos é muito grave.
A nossa curiosidade é saber como os Autocratas de Bruxelas e o imperialismo do BCE, vão resolver esta situação. Será que vão adoptar uma solução à Chipre ?

Anónimo disse...

Porque é que a imprensa dependente e controlada não aborda com rigor e profundidade a situação em que se encontram os bancos italianos, nomeadamente o Monte dei Paishi, que pode cair numa situação de incumprimento, e também o Deutche Bank alemão cuja situação ,é também bastante má.