sábado, 9 de agosto de 2014

E depois do BPN e do BES?


Ainda não sabemos quantos milhões de euros nos custou a bancarrota do BPN. Serão muitos, sobretudo porque o governo nacionalizou apenas o banco, deixando de fora a parte boa do grupo. Com a bancarrota do BPN por encerrar, hoje a pergunta mais frequente é esta: quanto nos irá custar a do BES? A resposta depende da capacidade do Estado de aplicar o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, convenientemente alterado no passado domingo. Se o Estado recuperar o montante que emprestou ao Fundo de Resolução, o custo directo da bancarrota do BES será nulo. Uma vez vendido o Novo Banco, provavelmente por um valor muito inferior aos 4,4 milhões de euros do empréstimo - a pressa em vender não ajuda nada -, o empréstimo de emergência feito pelo Estado será reembolsado pelo valor da venda, acrescido das contribuições extraordinárias dos bancos para perfazer a diferença. A contestação dos banqueiros já começou e anuncia um braço-de-ferro político interessante e de desfecho incerto. Mira Amaral já disse à comunicação social que, se o resgate correr mal, não quer perder o dinheiro. Os outros não dizem, mas pensam. Está em jogo a autoridade do Estado e a capacidade de encaixe do conjunto do sistema financeiro.

Ao mesmo tempo, também está em jogo o sucesso da primeira experiência de resolução de uma crise segundo o guião da união bancária, há poucos meses aprovada. Como explicou na altura Elisa Ferreira, negociadora por parte do Parlamento Europeu, "é um acordo que salvaguarda os contribuintes, que garante que o mecanismo será financiado pelos bancos". Foi assumido que as contribuições dos bancos para um fundo comum têm a natureza de um seguro obrigatório, tendo em conta que a actividade bancária comporta riscos para a sociedade que devem ser suportados pelo sector. Como é evidente, Mira Amaral e os restantes banqueiros não parecem dispostos a aceitar as regras da união bancária ainda em instalação. Querem continuar a criar moeda - é o que significa conceder crédito - com o menor constrangimento do Estado, mas com a garantia de que os custos financeiros, económico e sociais das bancarrotas são suportados pelo conjunto da sociedade.

Evidentemente, esta união bancária é um faz-de-conta. A Alemanha não quer gastar um cêntimo com as crises bancárias dos outros mas teve de ceder algo, até porque muitos dos seus bancos estão fragilizados. O Fundo de Resolução europeu virá um dia a dispor de 55 mil milhões de euros, o que mal dá para tapar um pequeno buraco no balanço de 2 biliões do BNP Paribas, o maior banco francês, "demasiado grande para falir" (ver Why are TBTF banks so happy with the EU Banking Union?). Por outro lado, os grandes bancos olham para este mecanismo de resolução como uma boa oportunidade para, à custa dos despojos aproveitáveis dos falidos, crescerem a baixo preço. Os grandes bancos espanhóis já começaram a falar com Carlos Costa sobre um possível contributo para o aumento da concentração no sector, ou seja, sobre as vantagens (para eles) em se tornarem demasiado grandes para falir.

Infelizmente, a esquerda perde-se no argumento da factura a pagar pelos contribuintes, enquanto omite o essencial: o sistema financeiro tornou a sociedade refém das suas bancarrotas. Quais são as propostas da oposição de esquerda para resgatar a sociedade portuguesa da sua captura pelo sistema financeiro? A questão é incómoda, sobretudo para os europeístas, porque rapidamente fica à vista que nada de sério pode ser feito enquanto a soberania monetária do país não for, também ela, resgatada. Permanecendo na zona euro, estamos condenados a pagar, de uma maneira ou de outra, as crises bancárias decorrentes da presente depressão, com mais ou menos polícia à mistura. Só quem não conhece a história da globalização financeira, ou quer desviar a discussão do papel que o euro nela desempenhou, reduz as bancarrotas a uma crise de supervisão e de ganância dos banqueiros. A bancarrota do BES torna visível a falta de uma esquerda socialista e eurocrítica que urge criar.

( O meu artigo no jornal i)

15 comentários:

Anónimo disse...

O caso BES já não é nenhuma novidade em Portugal . desde a privatização da banca que surgiram casos idênticos , só que agora trata-se do 3º maior banco no global e o 2º maior privado . Até aqui apenas tinha acontecido com pequenas instituições . O primeiro caso surgiu com um pequeno banco açoreano , depoi foi o BPN e o BPP e agora o BES Se continuar-mos com esta política económica financeira e social nada nos garante que não venham a acontecer mais casos.
A solucão encontrada poderá ter uma alta probabilidade de fracasso , até porque se está a viver na Europa uma recessão económica que alguns consideram muito semelhante ao intervalo entre as duas guerras.

Diogo disse...

«A Alemanha não quer gastar um cêntimo com as crises bancárias dos outros mas teve de ceder algo, até porque muitos dos seus bancos estão fragilizados…»


Caro Bateira, será assim tão difícil compreender que existe apenas um Único Banco Mundial que tudo controla? Pode deitar o seu artigo para o lixo – não vale um chavo!

H da Luz disse...

Boa noite; dos pilares institucionais que sustentam a democracia, os três corroídos pelo mesmo "mal" que todos conhecemos e, do qual - invariavelmente - todos sofremos, é justo perceber que é ao da representatividade política o que a imperiosidade de escrutínio é vital. O da Justiça merece ser ele próprio regedor e assente no que de melhor se possa encontrar na contemporaneidade de um determinada sociedade, para que o execute.
Mas para que um e outro se revigorem mutuamente - como se pretende, e não como acontece - é imperioso que o terceiro pilar exista livre, crítico e,imprescindivelmente, corajoso.
E esse é o da investigação jornalistica, os media grosso modo, seja lá o que isso for hoje em dia.
Não pode haver uma sociedade que aspire à justiça inter pares se a autonomia de quem critica é validada por balizas de pensamento aflitivamente afuniladas tal qual acontece hoje. As pessoas que nos sedam hoje são exatamente as mesmas que permitiram que o veneno se espalhe a seu belo prazer; e incluo TODOS OS QUE NÂO TEM CORAGEM DE PERDER PRIVILÉGIOS (ENCÔMIOS), OS QUE CALAM CONTRA CONSCIÊNCIA. TODOS COLABORACIONISTAS COM A INJUSTIÇA É O QUE SOMOS.

Anónimo disse...

"A bancarrota do BES torna visível a falta de uma esquerda socialista e eurocrítica que urge criar."

Tretas. Isso já existe há muito tempo. Chama-se é PCP e Bateira tem-lhe o ódio e sectarismo que brota de muitos simpatizantes do Bloco e que assustados perante essa evidência e da possibilidade do seu crescimento (acompanhado pela solidificação do BE em torno de resultados viáveis e não inflaccionados como em 2009) se assustaram e correram a lançar-se nos livres, nos 3D e do P«S», preferencialmente do também «socialista» António Costa.

António Geraldo Dias disse...

As crises do regime económico -da banca,da relação salarial,do Estado,da inserção internacional da economia,do investimento- está a pôr a descoberto a crise mais geral do regime de que a crise dos
partidos dominantes é uma consequência que se está a tornar insuportável e que mais cedo que tarde vai obrigar a uma reconfiguração do sistema de partidos que à esquerda deverá ir muito para além dos arranjos em torno do PS que pouco ou nada têm contribuído para a alteração do "status quo" pelo que concordo em absoluto com a sua proposta de uma esquerda socialista e eurocrítica que urge (re)criar,parêntesis meus.O bes é só mais um caso do capitalismo bestial de uma rapaziada que o regime criou e já não pode alimentar.

Anónimo disse...

Também acho que essa esquerda socialista (no conteúdo, não na designação, isto é, que luta verdadeiramente pelo socialismo) e eurocrítica (que compreende e denuncia a natureza de classe da União Europeia) já existe há muito.

Mas o tom e as acusações descabidas e injustas do anónimo das 9:40 a Jorge Bateira, democrata de esquerda consequente, que tem dado valiosos contributos para o debate da libertação nacional do euro e de outros constrangimentos da arquitetura supranacional capitalista europeia, são inadequados e bem reveladores de quem padece afinal do pecado do sectarismo.

Afirmações infelizes de quem ainda não adquiriu a maturidade política de reconhecer, apesar das naturais diferenças, os aliados fundamentais dos grandes combates a travar nos próximos tempos.

Só não são contraproducentes, porque o autor do artigo terá certamente a sabedoria de reconhecer essa imaturidade e a consciência de que quem assim fala, como sucede com qualquer comentador (anónimo) de caixa de comentários, fala por sua própria conta sem comprometer e envolver mais ninguém nos seus disparates.

meirelesportuense disse...

O BCE obrigou o BES a liquidar em 3 dias, 10 Mil Milhões de Euros que lhe tinha emprestado!...
-Afinal quem obrigou o BdP e o Governo a atirar a responsabilidade de uma dívida de cerca de 5 Mil Milhões sobre o Estado Português, foi tão só e apenas o Banco Central Europeu!...
-Estou a gostar IMENSO deste NeoLIBERALISMO, eles emprestam aos Privados a juros baixíssimos, e depois, se os Bancos por incapacidade não cumprem, pagam os Portugueses na sua generalidade...
-Se fossem os Portugueses a socorrem-se destes apertos mas por necessidades Sociais, o BCE emprestaria, mas ao triplo dos juros e ainda por cima, impondo regras e sacrifícios incomportáveis.
Também podemos constatar que afinal o BCE, só está em Portugal -através da Troika- para a tratar dos seus CréditosMalParados aos Bancos Portugueses.
E que o BCE é gerido por uma cambada de incompetentes -tipo Moedinhas- que não sabem sequer avaliar os riscos que decidem correr, como se percebe fácilmente por este enorme ROMBO.
-Mas também fica explícito porque eles emprestam dinheiro à confiança, pois dominam políticamente quem está na Governação política dos países atingidos pr estas bagunçadas, e estes, abrigam-nos de todos os riscos, fazendo passar as facturas desses CréditosMalParados a todos os seus Governados.
A História da Intervenção da Troika em Portugal está muito mal contada!

Anónimo disse...

Nem descabidas nem injustas.

Descabido e injusto é achar que tanta gente democrata de esquerda consequente - existente nas direcções e entre os militantes e simpatizantes do pcp e do be (e até no PS) - seja deitados borda-fora na frase final de um artigo mais que razoável.

Claro que estranho ver Bateira usar uma linha de argumento sectária e intelectualmente desonesta em tom e conteúdo que que não lhe conhecia a ele, mas apenas a gente como Tavares, Oliveira ou Ana Drago - que não respeito.

Quanto ao anónimo, quero que isso se lixe. Na altura em que começou a mexer o Congresso das Alternativas dirigi-me como anónimo à coisa oferecendo-me para colaborar na organização.
Fui olimpicamente ignorado, nem resposta tive, mas deu para perceber o modo de funcionamento de mais um clube do Bolinha em que anónimo não entra. Se nem com nome me ligaram, vou-me dedicar a assinar para quê?

meirelesportuense disse...

As últimas notícias dizem, que afinal, o BancoBom vai arcar com todas as responsabilidades das "borradas" do BancoMau.Pergunta:Para que serve a divisão?...Levaram para o BancoMau apenas o vírus Ébola?...

Anónimo disse...

Ou Bateira anda distraído ou é intelectualmente desonesto quando afirma que falta uma esquerda socialista eurocritica.

O PCP é de esquerda
O PCP é socialista
O PCP é eurocritico


Alguém pode ajudar o Bateira e lhe enviar a respectiva documentação comprovativa?

Anónimo disse...

"13 de Agosto de 2014 às 10:52"

Já estava de certo modo pedido em pelo menos três dos comentários anteriores ao seu - onde até se integrava o BE e admitia alguma militância sem poder do BE.

Mas pode acrescentar-se a CGTP e outros movimentos e grupos sociais, menos orgânicos.

Anónimo disse...

Lamento, mas o BE é euroingenuo.

Anónimo disse...

no comentário de "13 de Agosto de 2014 às 18:32" onde se lê

"e admitia alguma militância sem poder do BE"

leia-se antes

"e admitia alguma militância sem poder do PS".

Anónimo disse...

Os partidos são a culpa do sistema andar como anda, os casos como o despedimento coletivo do Casino Estoril, FreePort, Sobreiros, Operação Furacão, CasaPia,Bpp. Bpn, Bcp e agora BES+GES em tudo isto onde está Proença de Carvalho, Miguel Judice entre outros ilustres que apodrecem o sistema para seu beneficio.

Não há justiça em Portugal

Anónimo disse...

"Lamento, mas o BE é euroingenuo."

Nalgumas coisas é.

Mas a figura mais proeminente do partido do Bateira não é sequer eurocrítica.

Será quando muito eurototó (se admitirmos a versão bondosa.)