segunda-feira, 27 de setembro de 2021

Três notas


1.
Começo pelo que está mais próximo, pelo que me preocupa mais: os comunistas e seus aliados conheceram um novo recuo que merece reflexão e impulso reactivo. Alguns resultados positivos em Lisboa, Porto, Belmonte ou Barrancos não compensam, nem de perto, nem de longe, a perda de municípios, como Loures ou Montemor-o-Novo, ou derrotas, como a de Almada; 

2. A seguir nas preocupações vem o BE: a sua extrema debilidade organizativa confirma-se em mais um resultado residual no poder local. Este péssimo resultado é ainda mais preocupante quando contrastado com o avanço relevante da extrema-direita, por exemplo na área metropolitana de Lisboa ou no distrito de Santarém, traduzido na conquista de dezanove vereadores a nível nacional. 

3. Finalmente, um certo PS de extremo-centro, com arrogância e relevância nacionais, perdeu, não conseguindo, por boas razões, fazer funcionar o voto útil à esquerda. Penso em Coimbra, a terceira cidade do país, mas sobretudo em Lisboa, a primeira; de resto, e não por acaso, são os dois grandes balões de oxigénio de Rui Rio e das direitas. 

19 comentários:

Anónimo disse...

Estes resultados uma vez mais são "fruto" do sectarismo das esquerdas,que não são capazes de criar em conjunto uma Alternativa credivel e mobilizadora.

Francisco disse...

Notas oportuníssimas.
Circunscrever-me-ia ao essencial para dizer e no que mais especificamente ao espaço político da CDU respeita, que haverá por detrás dos maus resultados razões nem sempre coincidentes: algumas especificidades e particularismos próprios das eleições autárquicas, sobretudo fora dos grandes centros urbanos, fornecerão por vezes razões que noutros contextos estão ausentes, o que nos deixa já perante razões divergentes entre si, por natureza.
Mas a par dessas, há também razões que respeitarão, quer a más ou erradas decisões estratégicas, quer a uma barragem ideológica que não conhece limites e que tem, objectivamente, no espaço político da CDU, mas em especial no PCP, o seu principal inimigo. Os exemplos de ostracização política são abundantes e encontram sempre a sua raíz, em critérios de oportunidade editorial; sendo visíveis por exemplo na ausência completa de comentadores residentes desse lado do campo político em qualquer canal televisivo, na omissão noticiosa de iniciativas, propostas e programas, etc., etc., etc. Esse será precisamente um dos principais nós górdios que se impõe ser desatado.

Lowlander disse...

As esquerdas portuguesas sofrem, na minha opiniao, de duas grandes ilusoes perniciosas aos interesses de uma alternativa progressista em portuguesa:

1) a esquerda euro-iludida/euro-entusiasta que continue como sempre a espera de "reformar de dentro" uma UE desenhada de raiz para ser impermeavel a reformas de esquerda - o cemiterio das esquerdas europeias.

2) a esquerda mais euro-lucida apesar de evitar a armadilha anterior vive ainda assim iludida pensando que basta ter razao, que basta ter a leitura mais realista e tecnicamente consistente dos problemas portugueses e o eleitorado, eventualmente lhe dara a razao nas urnas. Vive na ilusao que o ambiente mediatico adverso nao tem forca suficiente para adulterar e confudir a sua mensagem para o seu eleitorado.
E um pouco surpreendente porque em primeiro lugar existe longa bibliografia de autores marxistas sobre o verdadeiro papel dos media em sociedades capitalistas. Em segundo lugar pelo simples evidencia que se a ferramenta mediatica nao fosse util as classes dominantes nao teria razao de existir - um truismo tao evidente que raramente e preciso sequer verbaliza-lo.
Assim sendo, a Esquerda euro-lucida redunda numa ingenuidade infantil quando tenta comunicar com o seu eleitorado usando esta ferramenta.
Projectos comunicacionais, como este excelente Ladroes de Bicicletas sao excepcoes e nao a regra.
A ferramenta mediatica esta inteiramente ao servico da classe dominante. A ideia de que e possivel "reformar por dentro" e tao ilusoria como as ideias da esquerda euro-entusiasta em relacao a UE.
A ferramenta mediatica pode ser (e e') pontualmente subvertida - mas isso sao vitorias pequenas, temporarias sempre sujeitas a reaccao.

Alternativamente podem sempre esperar por um "Deus Ex machina", um evento externo qualquer catalizador de uma alteracao profunda de paradigma. Nao seria mais do que continuar uma certa tradicao Portuguesa ja com alguns seculos de existencia. Servilismo e subalternizacao.

Opcao melhor (na minha opiniao) seria transcender/contornar/superar com outras ferramentas de comunicacao para com o eleitorado.

Anónimo disse...

é o PCP do centro...

Jose disse...

Para quem visa a sociedade sem classes, o PCP é o mais classista, catalogador e definidor de classes, do nosso circo político.
A memória do que ocorre quando a classe 'dos comunistas' está instalada no poder, vai fazendo o seu caminho...

João Rodrigues disse...

Foram apagados dois comentários sem querer. Pedimos desculpas aos seus autores.

Anónimo disse...

O futuro não é muito brilhante, nem isso. E apareceu o Chega, aquilo que já se passava em França ou na Itália industrial há 20 ou 25 anos, e que só não rebenta na Catalunha porque andam entretidos com a independência. Mais abutres... nada que no Barreiro/Moita não estajam habituados, depois de décadas em que o PC viveu dos destroços. Ou em Almada...

Anónimo disse...

"Penso em Coimbra ..."
Conheço Coimbra e aí acho que o fator rejeição de Manuel Machado (esgotado, sem ideias, de uma "tacanhice" sem limite) foi decisivo para a derrota do PS. Prometer aeroportos e marinas, plantar e replantar flores nas rotundas, alcatroar estradas pela enésima vez, reativar a EcoVia (!), colocar "esguichos pacóvios no meio do rio", ... é bem demonstrativo da falta de rasgo.

Francisco disse...

Ainda aqui volto para sublinhar o que tomo por excelente ponto de vista analítico do Anónimo Lowlander, quanto ao papel do espaço mediático na barragem ideológica, que torna o âmago do sistema capitalista (e as eleições são apenas brincos que o capital põe e tira das suas orelhas), mais ou menos impenetrável. Como fazer? Essa é a grande questão. Divergirei talvez um pouco apenas no que toca ao seu "Deus Ex machina", o qual e com o devido enquadramento circunstancial, me parece ser cada vez mais vital, não enquanto espaço de controle "servilista e subalternizador", mas enquanto referencial necessário de experiências de desenvolvimento humano que assentando em bases necessariamente antagónicas daquelas em que assenta o capital, possa constituír-se como referencial de acção colectiva para outras paragens. Dir-me-ão que há nisso uma certa miragem. Mas, pela minha parte, face ao ritmo cada vez mais vertiginoso a que os impactos decorrentes das relações de produção no sei do sistema capitalista se fazem sentir, creio que pode muito bem, mais cedo do que tarde, ser uma miragem palpável.

OakWood disse...

Só uma correção: Coimbra não é a terceira maior cidade do país. Nem sequer a terceira capital de distrito, que é Braga. Coimbra, sendo muito importante, vive essa ilusão de ser mais importante do que realmente é.

Anónimo disse...

João Rodrigues, apenas uma pergunta que acabei de fazer há pouco, ao Vítor Dias, do «Tempo das Cerejas»: Onde está o marketing do PCP, esquecido das décadas dos anos 70 e 80?
Porque não apostar noutro marketing e fazer aquilo que os comunistas chineses fazem: melhor gestão da casa e pagar outro marketing que não o de juntar uma cara nova com duas caras velhas; ou apostar numa candidata já de idade que diz estar ali, porque não tem outro sítio para onde ir (Almada). Na verdade, em Almada, com outros candidatos, a CDU ganhava de longe à aldrabona da Inês de Medeiros.
Porque não rever o filme «No» de Pablo Larraín e compreender que uma coisa é ideologia e partido; a outra é o marketing de uma campanha eleitoral.

Jaime Santos disse...

Curiosamente, em Lisboa o voto útil não funcionou porque João Ferreira tanto se prestou a servir de muleta a Medina que só poderá, com o seu resultado, servir de muleta a Moedas.

O BE também disse que queria impedir a maioria absoluta do PS na capital e acabou a tirar-lhe a maioria, esquecendo-se, ele e também o PCP, que o First-Past-the-Post que vigora nas câmaras faz de Moedas o Presidente num cenário de maioria de Esquerda na CML.

Quem tinha razão era o Livre que dizia que perante uma coligação de Direita só mesmo uma coligação de Esquerda para a defrontar. Extremo-Centro ou não, o Partido de Rui Tavares sabe bem onde estão os adversários, enquanto outros há para quem o adversário é e será sempre o PS...

Aliás, não deixa de ser irónico que se João Ferreira tivesse concorrido em Almada ou em Loures provavelmente teria ganho a Câmara Municipal em qualquer desses conselhos... Isto em vez de ter ido meter areia na engrenagem de Medina em Lisboa, onde o PCP jamais ganharia...

Como dizia uma velha anedota que não se pode contar aqui, sobre uma orgia às escuras, 'organizem-se'...

Francisco disse...

Já desenhei numa folha de papel, um pequeno rabisco com o itinerário de alianças e facadas que o Jaime Santos trouxe à liça, mas sou forçado a uma confissão pública: desisto. Apesar de ter lido imensos policiais da Aghata Christie, a minha imaginação não consegue acompanhar tantas curvas e contra-curvas. A única coisa que se percebe é que o culpado, é mesmo quem não parecia ser. A escritora ficaria orgulhosa de ver que deixou seguidores espalhados pelo Mundo. Mas o grande enigma estava guardado para o fim: Rui Tavares e uma coligação de esquerda. Co'a breca, que o homem é um génio.

Anónimo disse...

Por uma vez estou de acordo com o pensamento do Jaime Santos. Se João Ferreira tivesse sido o candidato em Almada, a CDU ganharia de longe ao PS de Inês de Medeiros.
Apostar em Maria das Dores Meira foi um grande erro.

Anónimo disse...

Os resultados em lisboa são elucidativos que João Ferreira devia ter sido eleito secretário geral no ultimo congresso do pcp.

Anónimo disse...

Rui Tavares prossegue a sua carreira política virada para o êxito e sucesso.
Negou o terceiro deputado da CDU nas eleições europeias de 2009, ao ser confirmado como o terceiro deputado eleito pelo Bloco de Esquerda (um gesto muito apreciado pela ala PS ligada a Fernando Medina).
Defendeu o bombardeamento da Líbia pela NATO: um grande gesto de um democrata que se afirma livre e de esquerda (gesto apreciado pela ala neoliberal do PS).
Saiu do Bloco de Esquerda para fundar (e provavelmente afundar) o partido «Livre».
Nas eleições de 2015, não conseguiu a representação parlamentar que procurava, afim de ajudar o PS a formar governo.
Desta vez, a sua coligação em nada ajudou a salvar Fernando Medina.
Resta perguntar que mais desastres podem acontecer na vida política desta figura tão apreciada no meio socialista burguês virado para gente tão difusa, como Francisco Assis e Sérgio Sousa Pinto?

Anónimo disse...

Ainda vamos ver o pcp a dar a mão na CML ao Moedas. ai vamos vamos.

Anónimo disse...

Não vamos ver nada disso, enquanto Carlos Moedas estiver com pessoas ao seu lado, como António Leitão Amaro. Alguém ainda se recorda dele e das suas intervenções no Parlamento pelo aumento das rendas? Não acredito que haja entendimentos com a CDU. Mais possível, talvez eleições intercalares a meio do mandato.

Refer&ncia disse...

Compreende-se que à direita (psd+cds+il+chega+ppm) seja mais fácil gerar consensos em redor de propostas todas elas neo-liberais que se distinguem apenas no sabor, em eventuais satisfações de diferentes clientelas e possíveis incompatibilidades entre caciques. Já nas esquerdas (ps+be+cdu) as discordâncias são estruturais: gestão participada x clientelar, pdm's estruturantes x submissos à especulação imobiliária, cidade para os habitantes x cidade para a economia (leia-se turismo) e a lista de incompatibilidades poderia continuar.