quarta-feira, 18 de junho de 2025

Começar uma guerra para evitar a guerra que se começou


A lógica da guerra preventiva, tão do agrado dos EUA ou de Putin tem, no caso do ataque de Israel ao Irão, uma agravante. Quanto mais a guerra escalar, maior a probabilidade de o Irão realmente optar pela via nuclear, coisa que não fez até hoje. É uma absoluta irresponsabilidade.

O acordo nuclear com o Irão, negociado por Obama e denunciado por Trump, garante a monitorização do programa nuclear do Irão. Israel, que invoca o pretexto do ataque nuclear iminente do Irão há mais de uma década, aproveitou a cumplicidade submissa dos EUA e da UE para atacar.

A IAEA, que tem a responsabilidade monitorizar o Acordo nuclear do Irão, já alertou para as possíveis consequências deste ataque de Israel.

O ataque visa sabotar negociações que decorriam e que permitiriam um novo acordo nuclear, revertendo a decisão dos Estados Unidos de se porem de fora. Trump autorizou o ataque, realizado a poucos dias de uma nova ronda negocial, numa espetacular demonstração de má fé. A credibilidade diplomática dos EUA não valerá um chavo a partir de agora, se é que ainda valia. 

A natureza totalitária do regime iraniano é um pretexto que vale tanto como valeu noutras guerras “preventivas” e “humanitárias”. Este ataque vai provocar a morte de milhares de inocentes (de ambos os lados) e, no fim, o regime iraniano ficará igual ou pior. Já vimos este filme.

Política monetária regressiva

Numa notícia de fim de Maio último, que me tinha escapado, fica-se a saber que o Banco (que não é) de Portugal apresentou as contas de 2024 com um prejuízo de 1.142 milhões de euros.

É um prejuízo que soma às perdas de 1.054 milhões de euros de 2023.


Adicionadas, estas perdas do BdP já totalizam 2.196 milhões de euros.

Segundo a peça jornalística, a “explicação para a apresentação de resultados tão negativos, repetida esta quarta-feira por Clara Raposo, vice-governadora do Banco de Portugal, é a mesma que já foi apresentada no ano passado e que tem sido igualmente referida pela generalidade dos bancos centrais da zona euro que caíram a partir de 2023 nesta situação: com a subida das taxas de juro realizada pelo BCE para combater a inflação, o Banco de Portugal passou, a partir de 2023, a ter de pagar aos bancos comerciais juros bastante mais altos pelos depósitos e reservas que têm no banco central, mas em contrapartida os activos do Banco de Portugal (principalmente títulos de dívida pública portuguesa) não viram a sua remuneração aumentar.”

Neste tempo de pós-verdade, é necessário dizê-lo com todas as letras e repeti-lo as vezes que forem necessárias: quando Clara Raposo diz que “o Banco de Portugal passou, a partir de 2023, a ter de pagar aos bancos comerciais juros bastante mais altos pelos depósitos e reservas que têm no banco central” está literalmente a mentir dado que o banco central não tem que coisa nenhuma. Pagar juros por reservas e depósitos é uma escolha política, para a qual há alternativas (aqui e aqui), e não uma obrigação.

Recordemos a fortuna gigantesca de juros pagos pelo BCE, dinheiro de todos nós, que podia e devia ter tido aplicações alternativas económica e socialmente sufragadas, fortuna que está a ser transferida subrepticiamente para interesses privados de forma discricionária e sem justificação económica credível.

Embora este autêntico bodo de recursos públicos atirado para cima da banca privada tenha vindo a diminuir muito gradualmente desde Maio de 2024, momento em que o BCE decidiu começar a descer de novo uma taxa de juro que, de resto, nunca devia ter subido, ninguém sabe ao certo, enquanto as reservas continuarem arbitrariamente remuneradas, quando cessarão os prejuízos públicos que são a sua contra-parte.

“Eu não esperaria que haja dividendos tão rapidamente para o Estado”, afirma, na mesma notícia, Mário Centeno, do alto da arrogância discricionária que lhe é permitida pelo estatuto de alegada independência do sistema de bancos que compõe o BCE.

Se Mário Centeno já antes devia explicações ao país, agora elas são devidas também por Clara Raposo, por este governo e pelo anterior.

Em 2023, só os quatro maiores bancos privados a operar no país somaram 3.153 milhões de euros de lucro, num aumento de 81,9% face a 2022.

Em 2024, os lucros da banca em Portugal sobem 13% para recorde de 6.300 milhões.

Em 2025, só nos três primeiros meses do ano, as cinco principais instituições financeiras em Portugal apresentaram lucros de 1.220 milhões de euros.

Tudo isto se torna ainda mais moralmente insalubre quando as notícias dão nota que o “Governo quer rever o regime de atribuição e fiscalização do rendimento social de inserção (RSI)” com o não enunciado objectivo de dificultar o seu acesso.

Em 2024 beneficiaram de RSI 175.904 pessoas, o que custou uns meros 357,62 milhões de euros, o que significa 169,42 euros por mês por beneficiário. Valores que comparam com as perdas do Banco de Portugal no valor de 2.196 milhões de euros, perdas que, em quase toda a sua extensão, são um bodo, totalmente evitável, aos bancos.

Tanta largueza com os ricos, tanta pobreza e punição imposta aos mais frágeis dos mais frágeis. Depois interrogam-se das razões de crescimento da extrema-direita.

Para finalizar, uma última perplexidade. Neste quadro, como pode um think-tank que se quer progressista, como o Causa Pública, expurgar a integração monetária, fonte primeira desta distopia, dos assuntos que debate e acerca dos quais propõe políticas?

terça-feira, 17 de junho de 2025

Que vida para além das contas certas?

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O programa do Governo conhecido este fim de semana traz novidades, por incluir várias medidas que nunca foram apresentadas nem discutidas durante a campanha eleitoral. Desde as mudanças na legislação laboral e na lei da greve aos cortes nos serviços públicos, são várias as áreas em que se anunciam mudanças em relação à governação dos últimos anos. No entanto, há opções que parecem manter-se e há uma que se destaca: a prioridade de continuar a obter excedentes orçamentais.

Embora, no ano passado, o primeiro-ministro tenha afirmado que “o equilíbrio das contas não é o fim da nossa política” e que “há vida para além do excedente orçamental”, a política seguida não tem correspondido ao discurso. Na análise que a Comissão Europeia publicou com a comparação dos planos de médio-prazo apresentados pelos países, há uma dimensão em que Portugal surge na cauda da Europa: é o país que se compromete a financiar o menor nível de investimento público em toda a União Europeia.

O investimento público foi a principal vítima da estratégia das contas certas na última década. Neste período, o país registou os níveis mais baixos de investimento público da história recente, em nome da prioridade dada à obtenção de excedentes orçamentais. O investimento público “líquido”, que representa o saldo entre a formação bruta de capital fixo (ou seja, o valor investido em obras públicas, equipamentos, I&D, software, etc.) e o consumo de capital fixo (que mede o que se vai perdendo com o desgaste dessas obras públicas e equipamentos), tornou-se negativo neste período. Por outras palavras, o que o Estado investe nem chegou para compensar o desgaste das infraestruturas.

A trajetória do investimento público compara bastante mal com o resto dos países europeus. Na última década, Portugal foi o segundo país da União Europeia em que o Estado menos investiu em percentagem do PIB (sendo que o único país que regista uma percentagem de investimento público inferior – a Irlanda – tem o PIB manifestamente inflacionado, o que faz com que não seja o indicador mais útil para avaliar a situação do país).

Os níveis de investimento público nunca recuperaram verdadeiramente desde o programa de ajustamento da Troika. O desinvestimento tornou-se particularmente visível em áreas como a saúde ou os transportes, onde a degradação da qualidade do serviço prestado contribuiu para descredibilizar o serviço público. Neste aspeto, na governação do último ano e nos planos agora apresentados, não se encontram grandes sinais de mudança.

No caso da saúde, a opção tem sido a de contratualizar serviços com o setor privado e apostar em parcerias público-privado, em vez de reforçar o Serviço Nacional de Saúde. É preciso ter em conta que o investimento público não serve apenas para dotar os hospitais e centros de saúde dos meios necessários, mas também para atrair e manter os profissionais, ao contrário do que tem acontecido. Um relatório elaborado por especialistas para o PLANAPP, que avalia a satisfação dos profissionais de saúde, concluiu que as condições do local de trabalho e a atualização de equipamentos e tecnologia são fatores importantes para motivar e reter médicos e enfermeiros. Canalizar o dinheiro público para o setor privado acentua os problemas em vez de os resolver.

Em relação aos transportes, depois de décadas a encerrar linhas ferroviárias, o governo anunciou um corte do investimento previsto da CP para a alta velocidade, com a justificação de que “é saudável para o mercado [o Estado] não investir tanto em comboios”, além de não se conhecerem medidas para combater a sobrelotação em linhas que servem áreas com grande densidade populacional, como a de Sintra. Novamente, o investimento na ferrovia não serve apenas para melhorar a qualidade de vida de quem utiliza o transporte público para se deslocar diariamente. Também permite reduzir as emissões de carbono através da redução do recurso a automóveis privados, o que contribui para o combate às alterações climáticas e reduz as necessidades de importação de combustíveis fósseis.

Nestas e noutras áreas, o desinvestimento costuma ser justificado com a ideia de que as “contas certas” são necessárias para reduzir a dívida pública. No entanto, não existe uma contradição entre a promoção do investimento público e a sustentabilidade das contas do Estado. A maioria dos estudos sobre o efeito multiplicador – isto é, o impacto que a política orçamental tem no funcionamento da economia – conclui que este é superior a 1: por cada aumento de 1 euro na despesa (e, sobretudo, no investimento) do setor público, o PIB cresce mais do que 1 euro. Ou seja, os benefícios que o investimento gera para a economia não só compensam, como tendem a superar os seus custos iniciais.

Enquanto se acena com reduções de impostos que não trazem ganhos verdadeiros para a maioria das pessoas e estão desenhados para beneficiar essencialmente os mais ricos, o investimento público continua a ser relegado para último plano. O verdadeiro problema não está nos impostos que pagamos, mas sim na forma como o dinheiro é utilizado e na qualidade dos serviços que os impostos devem financiar. Adiar os investimentos necessários é uma escolha que nos tem saído bastante cara.

segunda-feira, 16 de junho de 2025

A velha PAF sem o respaldo da troika


Depois de onze meses de um governo que esteve em campanha do primeiro ao último dia, assumindo como prioridade de desfazer qualquer ideia de regresso às políticas adotadas pela direita entre 2011 e 2015, a apresentação do Programa de Governo no passado sábado dissipou as dúvidas que pudessem subsistir sobre o regresso a esse passado, agora já sem o conveniente alibi das «imposições da troika» (além da qual, recorde-se aliás, Passos e Portas queriam ir).

A dissimulação da verdadeira agenda política para o país, nesse primeiro ano da AD, foi facilitada pelo «excedente» orçamental deixado pelo governo anterior, obtido em ampla medida pelo desinvestimento na valorização da Função Pública e, consequentemente, no próprio Estado Social e serviços públicos. A atualização de carreiras e salários, a que a coligação PSD/CDS-PP deitou mão de imediato, ajudou nessa operação eleitoral de ilusão e cosmética.

Com uma maioria ao seu dispor, resultante da soma de deputados do PSD, CDS-PP, IL e Chega, cujos programas eleitorais revelam indisfarçáveis convergências programáticas, a AD já não precisa esconder ao que vem, podendo ir mais longe em matérias que tratou de não inscrever no Programa Eleitoral. Além da descida de impostos e privatização subreptícia do Estado Social, a coberto da ideia de «sistema» (financiando privados com recursos públicos), o governo juntou, por exemplo, a desregulamentação da legislação laboral e a revisão da Lei de Bases da Saúde.

Sinais desta clara aproximação à IL e ao Chega, PSD e CDS/PP chegam mesmo a incluir no Programa de Governo a gratuitidade de manuais escolares aos alunos da rede privada e cooperativa, recuperando a miséria moral da perseguição aos beneficiários do RSI, através do reforço da fiscalização daquela que é a prestação mais escrutinada, a par da introdução de «obrigações de solidariedade», como se o contrato de inserção não fizesse parte da atribuição da medida. Como as coisas são o que são, dispense-se o pajem: as direitas que se entendam.

Lançamento e debate: Abrandar ou morrer

Na segunda-feira, 23/06, às 18h00, no ISEG, Lisboa (Anfiteatro 24, piso 2, edifício Francesinhas 1), teremos o lançamento da obra Abrandar ou Morrer, de Thimotée Parrique, com a presença do autor, seguido de comentários de Susana Peralta, Irina Castro e Alexandre Abreu e debate com a assistência.

Thimotée Parrique é um economista francês e investigador na HEC Lausanne. Abrandar ou Morrer é o título da sua obra sobre a economia política do decrescimento, agora publicada em Portugal pela Zigurate

Entre outras coisas, debateremos as ligações entre crescimento, mercadorização e capitalismo, bem como as principais críticas habitualmente feitas ao projeto do decrescimento. 

A sessão será em inglês e podem aceder a mais informações aqui. Lá vos aguardamos.


domingo, 15 de junho de 2025

No meio de ruínas


Lá comemos calamares juntos às ruínas romanas de Mérida (os impérios acabam por cair...) e lá me irritei com o El Pais, conforme prometido. Têm um correspondente em Telavive, claro, só os mortos israelitas são chorados, ao que parece. Também um artigo de Lídia Jorge, cuja intervenção no dez de junho foi corajosa, teve esse condão: “el caso de Portugal importa”. O problema é que no artigo no El Pais defende “a nossa democracia liberal”, associando-a ao 25 de abril. Na nossa Constituição não há qualquer referência ao liberalismo e ainda bem. Repito o que escrevi em 2021 no Le Monde diplomatique - edição portuguesa

Para além de atribuir à palavra liberal um prestígio imerecido, os que, à esquerda, usam equivocada e apologeticamente a designação «democracia liberal» para caracterizar a democracia saída da Revolução de Abril, esquecem que o liberalismo histórico sempre foi oligárquico, intrinsecamente desconfiando da participação popular e favorável a um capitalismo desigual, que facilmente desagua em formas autoritárias, particularmente em contexto de crise e nas periferias. A nossa democracia superou originalmente o liberalismo histórico, porque se propôs suplantar uma forma de capitalismo que não dava resposta às aspirações de liberdades reais para todos, incluindo nos espaços onde se trabalha, tantas vezes furtados a avaliação do que se pode ser e fazer. 

Estas origens revolucionárias do nosso regime constitucional democrático, de matriz tão antifascista quanto antiliberal, explicam que na narrativa liberal, «o socialismo» seja o nome da situação em vigor até aos dias de hoje. A contra-revolução neoliberal nunca teria existido. As intervenções do Fundo Monetário Internacional (FMI), a adesão à Comunidade Económica Europeia (CEE) e às suas imposições liberalizadoras totais no campo económico e financeiro, particularmente no quadro da União Europeia, as privatizações maciças desde o cavaquismo, a adesão ao euro, e a correspondente perda de instrumentos de política económica, nunca teriam existido. Enquanto existirem concessões colectivistas no capitalismo português, mesmo que enfraquecidas, da Segurança Social a um mínimo de provisão pública desmercadorizada, esta gente não descansa ideologicamente e daí a insistência convergente da IL e do Chega em projectos de ainda maior descaracterização constitucional.

sábado, 14 de junho de 2025

Haja quem veja as coisas de forma clara


Em pleno genocídio na Palestina, o Estado terrorista de Israel decidiu atacar o Irão, contando com o apoio de sempre dos EUA e da irremediavelmente vassala UE. Somos todos iranianos também. 

Entretanto, António Costa decidiu fingir-se de polícia bom na UE, declarando-se “extremamente preocupado”, sublinhando desta forma, e uma vez mais, que o seu declínio ético-político não tem fim, em linha com a UE. Há quem pense como está estruturado.  

Poderia continuar, mas, francamente, não me sinto capaz de escrever de forma mais clara do que os comunistas portugueses que estão à altura das graves circunstâncias históricas: 

“O PCP considera da maior gravidade e condena veementemente a agressão de Israel ao Irão, na sequência de diversas e graves provocações e ataques que efectuou contra este país, do genocídio do povo palestiniano e dos permanentes bombardeamentos e ocupação por Israel de território libanês e sírio. 

A agressão de Israel ao Irão não podia ter sido realizada sem o apoio dos EUA e a cumplicidade das grandes potências da NATO e da UE, que têm promovido décadas de violações do direito internacional, de ingerência, de desestabilização e de guerra no Médio Oriente.”

sexta-feira, 13 de junho de 2025

Pela jangada de pedra


Fotografia nº 150, tirada por Sebastião Salgado: peregrinos no Santuário de Lamego em Setembro de 1975. Fotografia nº 136, tirada por Alécio de Andrade: manifestação a favor da independência das colónias no verão de 1974. 

São umas poucas centenas de quilómetros de Lamego a Lisboa, mas é como se fossem dois países separados por milhares. Um país sofrido e postergado por décadas de obscurantismo e um país sorridente e pleno de esperança anticolonial. 

Venham mais cinco [O olhar estrangeiro sobre a revolução portuguesa] 1974-1975, a exposição de que Sérgio Tréfaut é curador, começou a ser pensada em 1993, mas só agora viu a luz do dia em Almada. Bastava isto e um filme, Raiva, para lhe estar eternamente agradecido, mas há e haverá muito mais, claro. 

São 200 fotografias iluminadoras, tiradas por fotógrafos estrangeiros, incluindo o economista-fotógrafo Sebastião Salgado, falecido na véspera da inauguração da exposição, como nos informa Pedro Cerejo num artigo no Le Monde diplomatique – edição portuguesa também a não perder. 

Esta exposição emocionou-me profundamente, verti lágrimas, pôs-me a pensar em ligações, em comparações, para lá das que estão explicitadas. Não é só a exposição, nunca é, sou eu, nós, em 2025. Estas duas fotografias marcaram-me. Muitas o fizeram, estou a tentar descobrir como. 


Entretanto, nos próximos seis dias andarei pelo Estado estrangeiro que me é mais familiar, Espanha, com o meu filho, a primeira parte das férias a dois deste ano, de carro entre Mérida e Ávila, passando por Toledo e Madrid. 

A minha nação favorita fora de portas é a Galiza, lá em cima, claro; um dia há-de ser um Estado. O nacionalismo de esquerda galego é uma inspiração político-ideológica desde sempre, desde os economistas Xosé Manuel Beiras e Ramón López-Suevos.

Enfim, vou mostrar-lhe as ruínas romanas, o Alcázar de Toledo, os quadros de El Greco, a Guernica, As meninas de Velásquez, os quadros arrebatadores de Goya, a paixão religiosa de Santa Teresa e assim, com um magnifico livro, escrito por um holandês voador, em punho. O resto das férias, lá mais para a frente, será, como sempre, na geografia sentimental que inclui poemas geológicos

Sim, sou privilegiado, posso ir de férias para fora de casa, ir ao estrangeiro próximo e voltar para o granito familiar, com o xisto logo ali, a seguir a uma curva. Gostaria de ir de comboio, mas já/ainda não é viável. Estamos mais de três décadas atrasados em relação a Espanha, graças à austeridade e a prioridades erradas em relação às ligações ferroviárias de alta velocidade na jangada de pedra. Portugal e mais dois países são os que menos investimento público fazem na UE (em percentagem do PIB), notai

E é como diz Adam Smith, ver tudo como se fosse a primeira vez, graças à capacidade de nos colocarmos nos sapatos de outrem, a tal simpatia, o principal dos sentimentos morais (livro desgraçadamente por traduzir). E irritar-me-ei com o El Pais, claro. Comeremos churros e calamares, comprarei livros. À noite trabalharei. 

Sinto que estou nas pisadas do meu pai. Gosto sempre de pensar em termos de reciprocidade, numa cadeia do tempo sem fim, dar o que recebi. A minha disposição conservadora é só a expressão da sorte. Gosto de pensar que o meu filho também a tem, incuto-lhe isso, combato a ideologia do mérito. 

Ele tem 20 tópicos de conversa para a viagem e fizemos playlists. A minha é intensa e melosa, como Espanha, como eu. A dele será solar, aposto. 

As férias começam hoje, com concerto dos GNR no jardim da Sereia. Nos próximos dias, regressarei à exposição com a ruína da Lisnave à vista, que isto está tudo ligado, ao que ficou dela em mim.

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Logo contra


Tinha quase oito anos quando Portugal aderiu às Comunidades Europeias. Andava na escola primária dos Olivais, na mesma rua onde acabaria a ensinar. Havia contentamento. Declarei-me logo contra. 

O meu melhor amigo na altura, do PSD, era entusiasta. Eu imitava o meu pai e ele o dele. A politização era maior, a democracia mais intensa.

No secundário, com esse grande amigo de doze anos de percurso escolar e discussões comuns, fiz um trabalho na área escola sobre o Tratado de Maastricht. A minha parte foi “contra Maastricht, porquê?”, na linha de Sérgio Ribeiro e de outros economistas do Partido. Estávamos na estimulante Jaime Cortesão, em 1993.

Mesmo no final da licenciatura no ISEG e até aos anos 2010, fui influenciado por economistas eurokeynesianos, como Stuart Holland. Uma palestra sua impressionou-me fortemente, infelizmente. O Erasmus na Erasmus de Roterdão na Holanda pode ter ajudado. 

A troika, já na FEUC e no CES, livrou-me desse interregno para sempre e fez-me regressar em novos moldes ao euroceticismo de sempre, até porque keynesianismo, nas curvas apertadas da história, é nacional, embora tenha de ter uma dimensão internacional duradoura, que nunca será a da supranacional UE. 

O golpe de estado financeiro na Grécia, em 2015, solidificou convicções nacionalistas de esquerda, base para o internacionalismo consequente.

Não, não há nada para celebrar na UE, ordem neoliberal supranacional bem incrustrada. 

Quando historiadores-politólogos, como António Costa Pinto, dizem que a “UE é um projeto de paz”, questiono-me: qual é a narrativa do passado? 

A UE, criada pelo Tratado de Maastricht, é um projeto desdemocratizador de guerra de classe e hoje, evolução orgânica, é um projeto de guerra pura e simplesmente, como bem tem argumentado Paulo Coimbra

A integração europeia, desde os anos 1950, é uma nota de rodapé na paz europeia, esse produto paradoxal da Guerra Fria, como é óbvio. Quando a Guerra Fria acabou, a guerra regressou à Europa, até aos dias de hoje. 

Entretanto, se não fosse a Katastroika, não estaríamos provavelmente nesta ordem neoliberal bárbara, há que reconhecer e nem vos conto o que me custou fazê-lo.

É melhor derrotar o militarismo

“O que eu sei é que, se queremos manter as nossas sociedades seguras... veja bem, se não fizermos isso, se não chegarmos aos 5%, incluindo os 3,5% destinados a despesas essenciais com a defesa, ainda poderemos ter o National Health Service, ou, noutros países, os seus sistemas de saúde, o sistema de pensões, etc., mas é melhor aprender a falar russo”, disse anteontem o secretário geral da NATO, Mark Rutte.


Calam a expansão para leste da NATO

De forma ridícula chutam para debaixo do tapete a sabotagem americana do NordStream, facto que os EUA anunciaram antecipadamente e do qual, repetidamente, se gabam.  

Excluem-se do acesso a energia russa barata. Fazem-no de forma despudoradamente anti-democrática, contra a vontade da maioria parlamentar alemã auxiliados por uma Comissão Europeia em processo acelerado de açambarcamento de competências que os tratados não prevêem, nomeadamente a competência da guerra.

Fizeram os preços subir em espiral. Geraram uma devastadora crise de custo de vida, assimétrica, que penaliza de forma esmagadora os de baixo, enquanto transfere milhares de milhões para os de cima.

Colocaram trabalhadores nacionais contra trabalhadores migrantes e acentuaram a exploração de todos eles. 

Por ação e inação tornam-se cúmplices do Estado Israelita no genocídio do povo Palestiniano. 

Criam leis, que designam por leis anti-ódio, que criminalizaram as manifestações contra este genocídio e sancionam os dissidentes sem lhes assegurar previamente o direito à defesa nos tribunais. 

Pressionam Estados soberanos com o tribunal europeu porque os seus cidadãos, sabendo na pele o que é o poder colonial, não se calam sobre o televisionado massacre a que assistimos. 

Vendem armas aos genocidas. 

Permitem, sem tugir nem mugir, que cidadãos europeus, eurodeputada incluída, sejam maltratados. 

Dizem-nos que as sanções que aplicaram aos russos, que teriam sido obrigados a pilhar chips das máquinas de lavar e dos frigoríficos ucranianos, os colocaram de joelhos. 

E agora, finalmente, dizem-nos que, embora podendo e devendo aldrabar a contabilidade pública para mascarar despesas com a guerra e agradar a quem as impõe, ainda assim, temos de trocar os nossos serviços públicos de saúde, cada vez menos grátis e universais, e as nossas pensões pela possibilidade de resistir aos tais russos que estavam de joelhos. 

E, numa União Europeia que proscreve liminarmente toda e qualquer política económica minimamente keynesiana que seja, ainda nos dizem que foi o socialismo que nos trouxe aqui. 

E, à esquerda, aquela que participa diretamente do extremo-centro que aqui nos trouxe, mas não só, enredados com a fidelidade à ideia de uma UE que não existe e se tornou parte do problema e incapazes de reconhecer que erraram quando não condenaram o cerco da NATO à Rússia, ainda há quem tenha a coragem de defender que é mesmo necessário embarcar nesta óbvia loucura destrutiva que é a corrida armamentista imposta pelos idiotas celerados que puxam os cordelinhos na plutocracia americana e na burocracia vassala e desprovida de qualquer sentido moral e estratégico que desgoverna a irreformável UE. 

Pessoalmente não vejo outro caminho: estarei com aqueles que este sistema colocou de fora, contra a guerra, contra o capitalismo que a impõe, interpelando os que decidem não ver.  

quarta-feira, 11 de junho de 2025

Seguir as ligações bárbaras


João Martins foi um dos atacantes nazifascistas do ator Adérito Lopes, ontem na Barraca. Um ataque feito pelos grupos que o Governo convenientemente removeu de um recente relatório sobre segurança interna.

Este criminoso foi condenado a 17 anos pelo assassinato de Alcindo Monteiro e escreveu um artigo no “esgoto” que dá pelo nome de Observador, para usar o rigoroso termo de Alexandre Severo, com a memória que tem de ser a dos antifascistas. 

Este esgoto é pago pelas mesmas pessoas que bancam a trampa do mais liberdade para explorar, o stink-tank que serve também para financiar os liberais até dizer chega. 

Quem não quiser falar de capitalismo, ou pelo menos de uma certa forma de capitalismo, e da ideologia liberal que o legitima, deve calar-se sobre o fascismo, sabemos há décadas. 

Isto está tudo ligado, não é Luís Amaral e Carlos Moreira da Silva, capitalistas que sabem que não há almoços grátis na luta ideológica rumo à barbárie?

Aqui estamos, antifascistas, não temos medo, ou temos, é humano, mas juntos é como se não tivéssemos. Haja ligações socialistas. Não passarão.

Muita fé na Reforma do Estado


A grande novidade do novo governo da AD foi a criação de um Ministério para a Reforma do Estado. Esta notícia, muito celebrada (como se vê pela parangona do Eco), encerra dois grandes equívocos.
 
O primeiro é a ideia de que pouco tem sido feito para alterar o funcionamento do Estado português nas últimas décadas. Não é preciso puxar muito pela memória para listar várias das iniciativas que, tanto governos do PS como do PSD/CDS implementaram. As privatizações, as Parcerias Público-Privadas (PPP), a empresarialização da gestão dos serviços públicos e a externalização de funções foram uma constante desde a década de 1990. Já neste século tivemos o SIADAP em 2004; o PRACE e o SIMPLEX em 2006; o PREMAC em 2011; a centralização dos contractos e das compras públicas, e a gestão partilhada de recursos pela ESPAP desde 2012; o SIMPLEX+ em 2016; a descentralização de competência para as autarquias em 2019; a criação do PlanAPP em 2021. Identifiquemo-nos ou não com as orientações seguidas em cada caso, reformar o Estado tem sido uma parte central de todos os governos portugueses das últimas décadas.
 
O segundo equívoco é de que a Reforma do Estado é um exercício técnico, que só precisa de profissionais competente à frente para melhorar o país. Na verdade chamamos “reformas do Estado” a animais de espécies muito diferentes, incluindo: a melhoria de processos administrativos (simplificação, desburocratização, digitalização); reformas da função pública (carreiras, avaliação de desempenho, recrutamento, promoções); alterações nas estruturas verticais (relações entre Estado central, regiões e autarquias locais) e horizontais (distribuição de responsabilidades entre ministérios e entre agências públicas; ou alterações substantivas das funções do Estado (articulação com privados e sector social no financiamento e provisão de serviços públicos).
 
Nuns casos, estamos todos muito de acordo: quem não quer processos mais simples e transparentes? Noutros casos, nem por isso: quão longe estamos dispostos a ir na delegação das funções de sociais do Estado em grupos económicos privados? Devemos ou não financiar colégios privados com dinheiros públicos? Deve ser cada município ou antes o Estado central a garantir o acesso universal e de qualidade à saúde e à educação? Estamos dispostos a abdicar de avaliações ambientais para simplificar qualquer tipo de investimento produtivo? Estas e outras são escolhas políticas, que seria bom conhecermos antes de celebrarmos intenções mais ou menos vagas.
 
Não há dúvida de que existe muita margem para melhorar a eficiência e eficácia da acção do Estado português. Mas é preciso algum grau de ingenuidade para acreditar que a criação de um Ministério dedicado ao tema (o que não é sequer original) só pode trazer coisas boas.

terça-feira, 10 de junho de 2025

Três notícias e cinco notas


1. O ressurgimento de bairros de barracas em concelhos da Área Metropolitana de Lisboa, onde se estima vivam hoje cerca de 3.000 famílias (seriam 1.800 num levantamento feito também pelo Expresso em 2019), constitui a evidência mais grave e impressionante do ponto a que chegou a crise de habitação no nosso país. Já não estamos apenas a falar do desfasamento crescente entre preços da habitação e rendimentos das famílias. Estamos perante a incapacidade objetiva de muitas famílias em aceder a um alojamento com condições minimamente dignas de habitabilidade.

2. Têm por isso razão os serviços da Comissão Europeia ao assinalar que as medidas adotadas nos últimos anos em Portugal são incapazes de responder às causas estruturais da crise. Sendo certo, porém, que às medidas propostas (controlo de rendas e restrições ao Alojamento Local), deveriam somar-se mecanismos robustos de regulação das procuras especulativas, externas e internas. Tal como convinha, já agora, que a União Europeia assumisse a sua pesada responsabilidade pelo incentivo às lógicas liberais de mercado, fingindo não saber que este, deixado à solta, é incapaz de assegurar a provisão de habitação (como ainda parece pensar, com insidiosa teimosia, o ministro Castro Almeida).

3. Continuamos, de facto, sujeitos à tese simplista dominante - que a comunicação social trata de difundir e consolidar - segundo a qual tudo se resume a uma mera falta de casas, como se bastasse construir mais para ultrapassar a crise. Ignorando, desde logo, que o número de alojamentos e de famílias pouco se alterou na última década (mesmo nas áreas metropolitanas), a ponto de justificar a subida vertiginosa dos preços desde 2013. Ignorando, em segundo lugar, que a habitação se converteu num ativo financeiro e que a procura deixou de estar delimitada às fronteiras nacionais, gerando efeitos de arrastamento dos preços. Diagnósticos errados geram políticas ineficazes.

4. Como Ricardo Paes Mamede já aqui assinalou, as reações dos liberais cá do burgo às recomendações dos serviços da Comissão Europeia (e que de resto não foram acolhidas pelo Conselho no documento final), não se fizeram esperar. Uma vez mais, voltando a defender a ausência de limites legais à fixação do valor das rendas, num país onde a regulação do arrendamento praticamente não existe, ao contrário da generalidade dos países europeus. E insistindo, uma vez mais também, no falso e eterno mito do congelamento das rendas.

5. Voltemos às barracas. Por razões muito distintas das do passado, bairros de lata voltam a despontar na Área Metropolitana de Lisboa. Não se trata, como então, de uma efetiva escassez de alojamentos para acolher os milhares que rumaram à capital. Trata-se agora, isso sim, da incapacidade de conseguir casa num mercado dinamizado por novas procuras especulativas com elevado poder aquisitivo, num contexto de défice de regulação. O que torna ainda mais repugnantes e inaceitáveis ações de demolição que não acautelam previamente soluções alternativas para os moradores. Tanta determinação demagógica para umas coisas e tanta falta de coragem política para outras.

Ainda o louquismo de Jalles


Volto ao artigo louquista de Jalles, que inclui negacionismo climático liberal, notai: a certa altura, para se armar ao pingarelho, reverte para o lançamento de nomes para o ar (“name droping”, em inglês, ouça), em modo de exemplos a seguir – “Friedman, Hayek, Buchanan, Barro, Acemoglu, Lucas, Duflo, Deaton”. 

Friedman, Hayek, Buchanan, Barro e Lucas são extremistas antikeyenesianos, pena é que a realidade tenha um viés favorável à melhor tradição de Cambridge (Keynes, Robinson, Sraffa, Kaldor, também sou capaz...), da incerteza radical à ação dos bancos centrais, passando pela necessária convergência entre política orçamental e monetária para tirar as economias de crises geradas pela liberalização sem fim. 

Daron Acemoglu é a melhor expressão de que aquilo que é novo na ortodoxia económica não é válido e que o que é válido não é novo, tendo sido, no seu caso, há muito rigorosamente exposto pela tradição marxista. Só pode passar por novo, porque há muito parasitismo intelectual ali, fruto da falta de memória, como já se defendeu aquando da atribuição do mal chamado Prémio Nobel. Por exemplo, já há literatura que o compara com Paul Baran, o do capital monopolista, com Paul Sweezy, e um dos fundadores da teoria da dependência. Acemoglu e os seus coautores não ficam bem na fotografia.

Esther Duflo, entretanto, faz umas experiências ditas controladas em países subdesenvolvidos, de ética e resultados mais do que duvidosos, como Ana Cordeiro Santos e eu já argumentámos. Duflo apela à modéstia dos economistas – “canalizadores” –, recomendando redes de mosquitos para fazer face aos problemas estruturais do subdesenvolvimento e assim. É a Tiririca, neoliberalismo com rosto humano, da economia, pior que está não fica. Felizmente, há o exemplo avassalador da economia mista chinesa e das lições que dela se podem extrair num mundo multipolar, feito de “incoerências produtivas”, para usar a formulação de uma economista do desenvolvimento a sério chamada Ilene Grabel.

Angus Deaton é o nome que vale a pena reter, concessão de Jalles (Hayek, o génio maléfico irresistível, também, mas já lhe dedicámos demasiado tempo). Deaton, coautor da hipótese das “mortes por desespero”, denúncia maior da economia política dos EUA, reconheceu explicitamente que o rei da economia convencional vai nu e, implicitamente, que aqueles a quem Jalles falsamente chama “a nova ortodoxia” – de Piketty a Mazzucato – estão a percorrer pistas promissoras. 

Jalles mente da primeira à última linha, em linha com a acusação de “wokismo”, típica da extrema-direita. Com a exceção tardia de Deaton, e para lá de papaguear nomes do neoliberalismo de rosto mais ou menos humano, Jalles ignora a história da melhor ciência económica do pós-guerra, de Myrdal a Sen. Esta falta absoluta de memória e de cultura económicas é demasiado representativa. Não creio que haja outra ciência social neste estado.

Dia, dias


No dia de Portugal, a nossa República sonhada, trago à tona a sabedoria do intelectual galeguista Otero Pedraio: “Galiza, tanto geograficamente como etnograficamente, e do aspeto lingüístico, é umha prolongaçom de Portugal, ou Portugal umha prolongaçom da Galiza, tanto fai”.


segunda-feira, 9 de junho de 2025

A mensagem de Ventura é eficaz - e profundamente errada


Hoje vi no Facebook um vídeo incrivelmente eficaz de André Ventura. Parte de uma notícia sobre uma escola em Odivelas (cidade onde cresci) que passou a preparar refeições para crianças muçulmanas. Parte daí para dizer que não temos de nos tornar parecidos com aqueles que para cá vêm viver. Que quem usa as nossas escolas e hospitais tem de se adaptar aos nossos hábitos e à nossa língua. Que os médicos e professores não têm de falar línguas que não sejam a nossa, têm de ser os imigrantes a falar português. E que se não querem, devem voltar para onde vieram.

A mensagem é eficaz porque usa ideias que são intuitivas – como o facto o português ser a nossa língua e não se poder exigir que os cidadãos nacionais abdiquem da sua língua e dos seus hábitos – para promover uma ideia errada – a de quem não tem à partida os mesmos hábitos da maioria não é bem-vindo.

A obrigação da escola pública numa sociedade democrática é garantir que nenhuma criança deixa de se alimentar como deve ser. Quando eu estava a crescer em Odivelas, nas décadas de 1980 e 1990, as cantinas escolares sempre ofereceram refeições diversificadas – chamavam-lhe o prato de dieta. Ninguém era obrigado a comer o prato de dieta. Como hoje ninguém obrigado a comer o prato que os miúdos de famílias muçulmanas – ou que são vegetarianos, ou alérgicos ao glúten, ou qualquer outra coisa – podem comer.

Não sou a favor do multiculturalismo – entendo que a partilha de alguns valores e de uma língua comuns são essenciais à construção de uma verdadeira democracia. Também não acho que a imigração possa ser ilimitada – as sociedades têm de ter condições para proporcionar as melhores condições de educação, saúde, habitação e protecção social a quem as constitui, o que só é possível quando o volume de imigração é acompanhado dos investimentos correspondentes nos serviços públicos.

Mas, sim, acredito que uma sociedade como a portuguesa precisa e precisará de ser renovada com pessoas oriundas de outras geografias e culturas - e que isso não tem de ser um problema. Se formos responsáveis e sensatos, em vez de convidarmos estes cidadãos a regressarem aos locais de origem porque trazem hábitos diferentes dos nossos, investiremos na sua integração plena – promovendo o ensino do português (não só entre crianças e jovens como já fazemos, mas também entre adultos), evitaremos a concentração de populações imigrantes em guetos, e combateremos a precariedade e a exploração laboral de estrangeiros como combatemos a de portugueses.

A mensagem de André Ventura é eficaz e é também profundamente errada. A quem nela não se revê cabe combatê-la todos os dias.

A Comissão disse mesmo o que muitos preferiam que não tivesse dito

A reacção dos liberais lusos à notícia de que a Comissão Europeia tinha sugerido o controlo de rendas em Portugal foi jurar que nada disso estava escrito no relatório da Comissão, que era incompetência do jornalista que tinha feito a peça sobre o tema.

Quem se der mesmo ao trabalho de ler o relatório da Comissão sobre o assunto vai encontar na p.99 a seguinte passagem: “Portugal should consider long-lasting measures to control the rapid rise in rental prices. This could be achieved by (…) ii) enacting rent regulation measures to protect the most affected groups (…).”

A frase "enacting rent regulation measures to protect the most affected groups" pode ser traduzida para português de Portugal como "adoptar medidas de regulação das rendas para proteger os grupos mais afectados".

Para perceber o que isto significa na prática, basta pesquisar um pouco na internet ou pedir ao ChatGPT que explique (se quiserem ir mais fundo, podem ler, por exemplo, este trabalho). O que vão encontrar será sempre algo parecido com o seguinte.

Adoptar medidas de regulação das rendas para proteger os grupos mais afectados, na prática, significa que o governo ou uma autoridade pública implementa regras para controlar o valor das rendas cobradas pelos senhorios, com o objectivo de proteger as populações mais vulneráveis face ao aumento do custo da habitação.

Estas medidas podem incluir, por exemplo: limites máximos ao aumento das rendas, congelamento das rendas, regulação do valor inicial da renda, reforço da protecção contra despejos, incentivos fiscais ou subsídios para senhorios que mantenham as rendas abaixo dos valores de mercado, ou medidas específicas para grupos vulneráveis (como famílias de baixos rendimentos, pessoas idosas, estudantes ou indivíduos em risco de sem-abrigo).

Ou seja, trata-se de limitar os aumentos das rendas ou oferecer outras formas de protecção para garantir que quem está em maior risco possa continuar a viver na sua casa.

Os liberais cá do burgo podem não gostar (e os governos da UE pelos vistos também não, pois a proposta não consta no documento final do Conselho), mas lá que os serviços da Comissão o sugeriram, não faz grande sentido negar.

O louquismo de Jalles


Não falha: quem usa a expressão “wokismo” não passa de vira-latista de extrema-direita ou a caminho da extrema-direita. O artigo de João Tovar Jalles no Eco patronal, wokismo e economia, é a enéssima confirmação disso mesmo. Sinal dos tempos, confesso que não lia um artigo tão extremista há algum tempo. 

No fundo, Jalles disfarça mal a vontade de imitar Trump nas universidades portuguesas. E isto num contexto, a economia, onde há décadas que está em curso no nosso país uma purga de tudo o que coloque os estudantes de licenciatura a pensar criticamente sobre o mundo que os rodeia, com a progressiva exclusão de todas as ricas áreas, métodos ou correntes que desafiem um neoliberalismo gerador de tantos custos sociais. No fundo, eles não aguentam um debate de igual para igual.

Basta conhecer um pouco da história intelectual e institucional do nosso país, no meu caso por estudo e por introspecção. Até apostaria que o fundamentalismo de Jalles parte de uma ignorância fundamental dessa história, mas, francamente, não tenho vontade de fazer apostas. 

Os resultados estão à vista em tantas licenciaturas, autênticos viveiros de individualismo possessivo, de liberais até dizer chega, com vieses ideológicos notáveis e estudados. Felizmente, há quem insista no pluralismo, quem seja fiel a uma certa ideia de universidade e de economia política, na linha de José Teixeira Ribeiro (história partilhada por António Avelãs Nunes): um estudante disse um dia ao velho Mestre que todos sabiam que ele era de esquerda, porque era o único professor que não fazia política na sala de aulas.

Entretanto, o monopólio do louquismo de Jalles está mesmo a ser desafiado em vários países, com mudanças positivas em curso. Os estudantes merecem melhor.

domingo, 8 de junho de 2025

Tarde piaram


Vinte meses depois do início do genocídio, Pedro Adão e Silva lá se convenceu a escrever um parágrafo tímido sobre a Palestina na coluna que escreve no Público três vezes por semana. Porque o fez só agora? Porque, tal como Macron, não quer ser acusado de cumplicidade. Tarde piaram.

Contra o liberalismo até dizer chega

Crescimento económico, desemprego historicamente baixo, inflação de 2%, ganhos reais dos salários. Lendo estes indicadores, não parece muito surpreendente a vitória e reforço da votação da Aliança Democrática nas últimas eleições. Afinal, depois de um ano de governo, para quê mudar? Todavia, a surpresa foi o segundo lugar da extrema-direita no Parlamento, que se soma ao reforço da restante direita neoliberal. Corrupção, imigração, ciganofobia e racismo, ubiquidade mediática de André Ventura, ressurgimento internacional da extrema-direita são algumas das explicações já oferecidas há um ano, quase sempre elaboradas de forma isolada. Na verdade, na nova geografia do voto no Chega, embora o voto tenha concentrações nas regiões periurbanas, a homogeneidade geográfica mostra que, provavelmente, o voto obedece a várias motivações sobrepostas. Aqui chegados, importa explicar estes resultados num quadro de mudança estrutural da economia portuguesa, com várias contradições conjunturais, refletidas na degradação da vida dos trabalhadores. 

Depois de um período de estagnação, desindustrialização e aumento do desemprego, Portugal tem beneficiado, desde 2015, de crescimento económico e do emprego só interrompidos pela pandemia de Covid-19. Refletindo o seu carácter semiperiférico na economia internacional, o sucesso foi assente na procura internacional por turismo e nos fluxos de capitais externos. Estes, em busca de rendibilidade, num contexto de baixas taxas de juro, aproveitaram os preços baratos dos ativos nacionais pós-Troika. O peso do turismo no produto interno bruto (PIB) quase duplicou no período entre 2013 (5,4%) e 2023 (9,5%). O emprego disparou 68% no setor de alojamento, restauração e similares no mesmo período. O crescimento do turismo conduziu à recuperação do setor do imobiliário e da construção. O emprego no setor da construção aumentou 40% e nas atividades imobiliárias cresceu 120%. Os preços da habitação mais do que duplicaram de 2015 até 2024. Criou-se, assim, um nexo turismo-imobiliário que comanda a acumulação de capital em Portugal. O dinamismo destes sectores, dependentes do acesso à terra, conduziu à criação de vários tipos de rendas fundiárias. A competição entre capitais faz-se pela captura destas, seja através da sua ampliação direta, investindo (por exemplo, na hotelaria, casinos ou habitação), seja pela aposta especulativa futura, por via de alterações regulatórias ou do investimento público e privado num determinado território. 

Esta dinâmica de acumulação de capital não beneficia apenas o capital estrangeiro. Velhos e novos milionários viram as suas fortunas crescer. Segundo o ranking da revista Forbes, algumas das famílias portuguesas mais ricas do país, investidas no imobiliário e turismo, viram o seu património crescer no período de 2019 a 2024: de 4173 para 5400 milhões de euros na família Amorim; de 1192 para 1770 milhões na família Alves Ribeiro; e de 681 para 1750 milhões na família Pestana. Paralelamente, novos capitalistas, também eles lucrando com o nexo turismo-imobiliário, tornaram-se os principais proprietários de meios de comunicação social, como Mário Ferreira, principal acionista da Media Capital (TVI, CNN Portugal, Rádio Comercial) ou Marco Galinha, principal acionista da Global Media Group (TSF, Diário de Notícias, Jornal de Notícias). Em torno destas fortunas foi também dinamizado um conjunto de atividades «profissionais», desde os escritórios de advocacia até à consultoria, com o surgimento de um novo estrato de «profissionais» qualificados e bem remunerados. A estes somam-se os proprietários de habitação, agora valorizada em determinadas localizações, que também beneficiam deste nexo. 

Se o capital e seus serviçais se recompuseram e reforçaram depois da crise de 2011-2013, o mesmo não aconteceu com a generalidade dos trabalhadores. O emprego cresceu muito nos últimos dez anos, mas, sendo o nexo turismo-imobiliário assente nos baixos salários, os ganhos salariais estiveram quase exclusivamente associados à elevação, em termos reais, do salário mínimo. As sucessivas reformas laborais e consequente progressivo desmantelamento de sindicatos e negociação coletiva impediram um aumento generalizado dos salários ou o reequilíbrio de poder entre trabalhador e patrão, naquilo que são os horários e condições do processo de trabalho. Embora o rendimento bruto nominal do trabalho médio tenha crescido 14% entre 2020 e 2023, puxado pelos aumentos de salário mínimo, o rendimento médio real, descontado da inflação, ficou estagnado, resultando na crescente compressão salarial entre o mínimo e o médio.

Se o professor da Universidade Federal da Bahia não vem até ao blogue, vai o blogue até ele: o resto do artigo, absolutamente a não perder, de Nuno Teles pode ser lido no Le Monde diplomatique - edição portuguesa, em papel ou no site. Assinai, apoiai este projeto cooperativo com mais de um quarto de século.

sábado, 7 de junho de 2025

Cúmplices de crimes de guerra

Exorto estes altos e funcionários da UE [Ursula von der Leyen e Kaja Kallas], e outros, a enfrentarem acusações de cumplicidade em crimes de guerra pelo seu apoio ao ataque de 19 meses de Israel contra Gaza. Isto não pode ficar impune.”

“E outros”, certo, António Costa

Transição energética às escuras


Ao final da manhã de 28 de abril de 2025, o sistema elétrico ibérico entrou em colapso total e a Península Ibérica mergulhou numa escuridão inesperada. A eletricidade começou a ser reposta de forma gradual ao longo da tarde, mas só foi restabelecida em várias regiões já durante a noite. O vazio de explicações públicas foi preenchido por especulações e desinformação. 

Embora técnico na sua origem imediata, o apagão permite retirar conclusões políticas significativas: a fragilidade estrutural de um sistema elétrico totalmente privatizado, a despolitização das decisões estratégicas em matéria de energia e o esvaziamento do planeamento democrático, num contexto de ascensão de forças políticas de extrema-direita que se alimentam do descontentamento e da erosão da confiança popular nas instituições políticas. O apagão iluminou — com ironia cruel — a escuridão política que envolve a transição energética portuguesa. 

A transição energética pode ser descrita como a reconfiguração dos sistemas de produção, distribuição e consumo de energia, visando a descarbonização, a mitigação das alterações climáticas e a superação da dependência dos combustíveis fósseis. Longe de representar uma mera substituição tecnológica, envolvendo disputas políticas e escolhas económicas, a transição energética tem sido apresentada pelos sucessivos governos portugueses como um processo exclusivamente técnico, logo, incontestável. Esta transição avança, assim, de forma opaca, desigual e politicamente desmobilizadora, abrindo espaço à mercadorização da energia renovável e à reprodução de desigualdades históricas.

O resto do artigo pode ser lido no Le Monde diplomatique - edição portuguesa, em papel ou no site. Assinem um jornal com luz.

Contrariar o poder ideológico do dinheiro


O chefe do brinquedo ideológico de Alexandre Soares dos Santos do Pingo Doce, uma das encarnações do capitalismo de herdeiros, foi para o governo. Nunca, desde o tempo do fascismo, o grande capital se transmutou em grande poder político com tanta facilidade. O ministro da chamada reforma do Estado, Gonçalo Saraiva Matias, tem por missão entregar aos donos disto tudo o muito que ainda resta do Estado social. 

Para isso, é necessário um combate sem quartel aos sindicatos, como se faz no Pingo Doce. O CESP que o diga, que o diga Vanda Pereira, uma combativa supervisora de frente de loja e sindicalista, que luta nos tribunais e fora deles pela sua reintegração depois do despedimento. Ela não tem medo, mas há medo nos locais de trabalho. Tive o privilégio de partilhar mais uma campanha com ela, podendo contar esta e outras histórias.

Como disse, Luís Bernardo, com quem tenho, por sua vez, o privilégio de partilhar o conselho editorial do Le Monde diplomatique - edição portuguesa, “o DOGE dos outros veio da Tesla; o nosso vem do Pingo Doce”. O muscão odeia os sindicatos, claro, tanto quanto Alexandre Soares dos Santos. Não é defeito, é feitio de classe.

Cá estaremos, como sempre, para fazer face a esta gente, com a pena, com os corpos, atrás do ecrã, nas ruas, em todo o lado, ao mesmo tempo. Só se pode prever a luta, com a força entrelaçada da razão-emoção.

sexta-feira, 6 de junho de 2025

Recordem-se, fui eu que acabei com o Nord Stream 2

“Fui eu que acabei com o Nord Stream 2, indo para um lugar chamado Alemanha, agora que penso nisso. Lamento ter feito isso. Acabei com o Nord Stream 2, ninguém mais fez isso. E depois, quando Biden assumiu, aprovou imediatamente... E, a propósito, temos tanto petróleo e gás que não vão conseguir comprar tudo.”


São declarações destas que me fazem continuar a pensar que, se já tivéssemos as armas que Ana Gomes e outros tanto exigem (e se fossem armas atómicas, tanto melhor), isto não teria sido assim, não teríamos os pescadores noruegueses a fazer de nós gato sapato, os russos ter-se-iam arrependido amargamente de ter encostado o seu país mesmo juntinho ao exército da NATO e ter-lhes-ia saído caro terem andado a vender-nos gás barato

Mais uns radicais de esquerda, amigos da Venezuela


Um jornal com direção

A seguir à primeira austeridade, ligada à crise financeira, Portugal enveredou por uma sobreprodução no turismo e imobiliário que é, ainda hoje, caraterizada por ser intensiva em trabalho, pagar salários particularmente baixos e aumentar a precariedade laboral (ver, nesta edição, o artigo de Nuno Teles, «Turismo-imobiliário e Chega: o nexo a desarmar na economia»). Esta especialização da economia portuguesa, que tem enriquecido novos e velhos capitalistas, nacionais e estrangeiros, permitiu entre outras coisas absorver centenas de milhares de trabalhadores imigrantes sem causar problemas maiores de desemprego, mas não impediu as consequências de um aumento da pressão demográfica sobre serviços públicos há muito insuficientemente financiados e sobre um parque habitacional tomado por lógicas especulativas e mercantis que impedem cada vez mais o acesso de quem trabalha à habitação. 

Não tendo sido ainda encaradas de frente as consequências negativas deste modelo, lesivo dos imigrantes brutalmente explorados e da sociedade no seu conjunto, que tanto favorece a insegurança material e até ontológica de importantes segmentos da população, como é possível que se vá agora investir numa economia de duplo uso, em contexto de rearmamento europeu e orçamentos da Defesa aumentados, em detrimento do Estado social, que anunciam uma segunda austeridade? Alguém ignora que tudo isto constitui o terreno fértil em que a extrema-direita irá continuar a crescer, em particular num país com um campo mediático sem pluralismo político, há muito afunilado à direita e que desde 2019 sobrerrepresenta o Chega nos espaços informativos e de opinião-comentário? Os media em Portugal — e não apenas as televisões, como têm mostrado os estudos do MediaLab do ISCTE — reservaram durante anos um espaço muito maioritário à direita, e depois à extrema-direita, tornando as alternativas de esquerda cada vez mais invisíveis, ou visíveis como saco de pancada. As linhas editoriais dos media tendem a favorecer os interesses políticos e comerciais dos seus proprietários e direções, ou a reproduzir acrítica e irresponsavelmente o que os jornalistas pensam ou sabem ser lucrativo («dá cliques e audiências»). Apesar das exceções, hoje é evidente que os media são uma parte fulcral do problema da democracia, não um seu pilar. 

Em maio de 2002, quando França acabava de passar, no mês anterior, pelo choque da primeira vez que a extrema-direita ficava em segundo lugar numas eleições, o diretor de então deste jornal, Ignacio Ramonet, escreveu num editorial intitulado «A Peste»: «Mas se, passado o momento de susto, os mesmos partidos de sempre continuarem com a sua política liberal de privatizações, de desmantelamento dos serviços públicos, de criação de fundos de pensões, de aceitação dos despedimentos por conveniência bolsista — em suma, se continuarem a opor-se frontalmente às aspirações populares a uma sociedade mais justa (…) —, nada nos diz que o neofascismo, aliado às forças colaboracionistas de sempre, não conseguirá levar a melhor da próxima vez...» Aqui chegados, convinha partirmos noutra direção. Enquanto é tempo.

Sandra Monteiro, Chegadas e partidas, Le Monde diplomatique - edição portuguesa, junho de 2025.

quinta-feira, 5 de junho de 2025

Petição à Assembleia da República


«Os abaixo-assinados não admitem ser testemunhas silenciosas ou passivas destes crimes. Ao condená-los, recordam décadas de violência e humilhações contra o povo palestiniano. Reiteram que apenas o reconhecimento do seu direito a constituir um Estado da Palestina permitirá abrir um horizonte de esperança num futuro de paz para a região. Condenam, assim, a instalação de colonatos e de postos avançados israelitas na Cisjordânia e em Gaza. O reconhecimento do Estado da Palestina por parte de um grande número de países é, hoje, uma forma eficaz de, no plano diplomático, demonstrar a solidariedade para com o povo palestiniano e de pressionar o governo israelita a pôr fim à escalada de violência contra as populações de Gaza e da Cisjordânia.
Assim, promovem a presente petição para uma urgente tomada de posição da Assembleia da República e tornam público um apelo ao Parlamento e ao Governo português para que Portugal, de acordo com a sua Constituição e com os compromissos internacionais que assumiu, designadamente a Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio:
• Reconheça o Estado da Palestina, juntando-se aos 149 países com assento nas Nações Unidas que já o fizeram, designadamente Angola, Brasil, Cabo Verde, Eslovénia, Espanha, Guiné-Bissau, Noruega, Irlanda, Islândia, Moçambique, Suécia e Timor-Leste;
• Se comprometa com as deliberações do Tribunal Penal Internacional, nomeadamente apoiando o cumprimento de mandados de captura contra Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel e Yoav Gallant, ex-Ministro da Defesa de Israel;
• Impossibilite o trânsito e o transbordo de material militar destinado a Israel em território português ou águas territoriais portuguesas e adote as políticas necessárias para garantir que entidades jurídicas privadas registadas na jurisdição portuguesa cessem a prestação de serviços utilizados por Israel nas suas operações militares em Gaza;
• Defenda a adoção destas medidas e posições junto de outros países, nomeadamente países europeus, junto das instituições internacionais relevantes e, em particular, junto da União Europeia, apoiando iniciativas conjuntas no mesmo sentido
».

Dirigida ao Presidente da Assembleia da República, tendo em vista a sua discussão no Parlamento e a aprovação de legislação que consagre as medidas propostas, a petição pode ser subscrita aqui ou impressa aqui, para recolha de assinaturas em papel. Assinem e divulguem. A pressão internacional sobre Israel é mais urgente do que nunca.