Muito pelo contrário: vivem sob a espada do desemprego iminente - e que vai acontecer com estas medidas - que os faz aceitar essas baixas condições de trabalho, em tempo de sacrifício colectivo; ou do risco de redução salarial caso a sua entidade patronal decida recorrer aos apoios públicos de lay-off. E mesmo assim nada lhe garante que, passado esse apoio, o desemprego não lhes bata a porta. Os apoios públicos irão socorrer as empresas - que se libertam dos "custos" salariais - mas não socorrem devidamente os seus trabalhadores que ficarão com um remuneração a dois terços do seu valor durante seis meses. E ver-se-á, no futuro, como é que as empresas vão aproveitar a conjuntura para criar o novo normal das baixas remunerações:
Partidos à esquerda e centrais sindicais têm feito eco de inúmeras situações de despedimento ocorrido antes das novas normas do lay-off terem entrado em vigor. A CGTP critou uma linha de denúncia distrital e avança com 1600 despedimentos nos últimos dias. Os sites das principais organizações sindicais têm relatados muitos casos. Imposição de férias no grupo Calzedonia, a Loja O Gato Preto recorre ao lay-off simplificado por um mês quando possui recursos; o mesmo na Sacoor Brothers onde o rendimento bruto dos trabalhadores vai muito além do salário base apoiado; a Primark não deu ainda garantias de pagamento salarial; o encerramento das clínicas do SAMS e do centro clínico a coberto da pandemia; a REN que adia negociação de aumentos salariais para depois da crise sanitária; a CNS/Fiequimetal suspende as negociações, apesar de os lucros serem conhecidos; no ramo dos transportes, empresas de trabalho temporário aproveitam a pandemia para despedir promotores de vendas e motoristas, que já deveriam estar nos quadros da CarrisTur, pois lá laboram há mais de 3 anos; a Martifer, que contratou com a Petrogal a manutenção regular na refinaria de Sines, manda a sua subcontratada CMN despedir 90 trabalhadores, entre os quais está um dirigente do SITE Sul. O PCP e o Bloco nas suas páginas de denúncia de despedimentos (aqui e aqui respectivamente) já referiram vários casos. Na Alliance healthcare e na Cimpor/Sacopor se alterou unilateralmente horários; na Celtejo e Navigator passou-se para um horário concentrado de 12 horas; na Randstad, cortou-se o subsídio de alimentação e prémios a quem está em teletrabalho; na Ansiel, não se aceita a dispensa para assistência a filhos; na Visteon em Palmela, houve despedimentos dos trabalhadores de empresas de trabalho temporário; na PSA Peugeot de Mangualde e Huff em Tondela vai se recorrer ao lay-off sem haver necessidade; Visabeira, lojas EDP sem material de protecção; na Caeteno Aeronaltic (Gaia), Essilor Portugal, Renault Cacia e Bosch (Aveiro) impõe-se tempos de paragem como tempo de férias; mais recentemente, referencioau-se o afastamento de 500 trabalhadores na TAP que irá colocar os seus pilotos em regime de lay-off. Isto mau grado a empresa ter condições para suportar esses custos. E a lista poderia prossegue...
Nada disto faz sentido. Toda a esquerda à esquerda do PS coincide na análise: o apoio aos salários será a melhor forma de combater a recessão por asfixia da oferta que tende a provocar uma redução da procura. O Bloco propõe-no. O PCP vai propô-lo no Parlamento na próxima quinta-feira. E tudo isto se passa apesar de o senhor Presidente da República - que os considera de heróis - nada referir em vésperas da sua decisão de renovar ou não o Estado de Emergência. Sobre isso, o decreto apenas obliterou o direito de greve e de manifestação...
Tudo isto acontece porque o lay-off autorizado pelo Conselho de Ministros foi pensado, sobretudo, na lógica de funcionamento das empresas. E não na vida das pessoas que dependem do trabalho numa situação excepcional como a que se vive.
Ora veja-se.