quarta-feira, 7 de maio de 2025

Os tempos da educação e as obsessões de Crato

De tempos a tempos, Nuno Crato vem a público com a banha da cobra habitual: no desempenho dos alunos portugueses em testes internacionais, «Portugal teve uma notável subida até 2015, seguida de uma preocupante descida». Sim, 2015, o «ano em que obtivemos os nossos melhores resultados internacionais de sempre», acrescenta, em auto-aclamação infundada, o ministro da Educação da maioria de direita que governou entre 2011 e 2015.

De facto, assim que o PISA 2015 foi divulgado, Crato e a direita tentaram apropriar-se dos resultados, contornando sem pudor uma impossibilidade cronológica factual: como o PISA avalia apenas alunos com 15 anos de idade, a larga maioria dos que participaram no exercício desse ano fez o seu percurso escolar sem «beneficiar» das medidas do ex-ministro, como oportunamente aqui assinalou Maria João Gouveia. Ou seja, os tais «melhores resultados de sempre» não foram obtidos por «alunos de Crato», mas sim por alunos da por si designada «década perdida» na educação.


Como demonstra Maria João Gouveia, apenas 21% dos alunos que integraram a amostra do PISA 2015 foram abrangidos pelas Metas Curriculares de Crato para a Matemática (ver gráfico), subindo esse valor para 89% em 2018 (ano em que se mantém os 492 pontos alcançados em 2015), tendo já o total de alunos sido abrangidos pelas metas do ex-ministro no PISA 2022, quando Portugal cai para os 472 pontos de que Crato se queixa e que associa, convenientemente, às políticas educativas seguidas após o seu mandato. Ou seja, o ex-ministro que se apropria dos bons resultados que não são seus é o mesmo que rejeita os resultados mais baixos que refletem as suas políticas.

A obsessão de Nuno Crato com o «declínio da educação», perfilhada, aliás, pelo seu acólito João Marôco, tem dois problemas essenciais. Por um lado, como aqui assinalou Pedro Abrantes, «as políticas educativas (...) demoram vários anos entre o desenho (...) e a implementação nas escolas», não sendo sério «extrair conclusões imediatistas dos seus resultados». Por outro, a associação estrita e linear dos resultados a períodos de governação é analiticamente pobre, ao desvalorizar a riqueza das trajetórias cumulativas e dos tempos e contextos. No fundo, a mesma pobreza, falácia e falta de rigor em que assenta o racional dos rankings de escolas - como João Costa aqui assinalou -, e que Nuno Crato, curiosamente, tanto aprecia. Mera coincidência, claro.

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