quinta-feira, 31 de agosto de 2023
quarta-feira, 30 de agosto de 2023
Quando é o nosso país
Desiludo-me mais quando é o meu país. A negligência, a desorganização, o abandono, os contrastes entre belo e feio, triste e alegre, pobre e menos pobre, que observo quando ando na estrada, ferem-me como não acontece se viajo em países distantes em que as falhas me podem suscitar curiosidade ou até mesmo emoção, mas não me interpelam directamente. Pergunto-me, inevitavelmente, o que posso fazer. Pergunto-me o que diz sobre mim o facto de amar esta paisagem.
terça-feira, 29 de agosto de 2023
Lembrete histórico-político
segunda-feira, 28 de agosto de 2023
Querido diário - Universidades de jovens calados
Público, 2023/8/28 |
Público, 2013/8/28 |
Várias leituras sobressaem destes dois cartoons separados por dez anos. A primeira, é que pouco mudou na cabeça do cartoonista quanto à forma como vê as "universidades de verão". Na verdade, trata-se de eventos sem relevo, uma forma de marcar a agenda mediática quando há pouco na agenda para marcar. E por isso os jovens que lá vão, também pouco têm a aprender. E pouco querem discutir.
Mas até parece que não há problemas juvenis bem reais, a discutir, nomeadamente com os convidados destas "universidades de verão", porque foram precisamente aqueles que estiveram na base das políticas que resultaram nos valores abaixo desenhados:
Fonte: Dados estimados com base em Quadros de Pessoal (MTSSS); INE, IPC |
Resumindo:
Vindima num “poema geológico”
domingo, 27 de agosto de 2023
A seguir
Conheceis o 7Margens, um jornal digital que tem “consciência de que a informação sobre o fenómeno religioso assim entendido constitui um importante instrumento a favor da paz, da justiça social, do conhecimento mútuo, da tolerância e da cooperação entre os mais diversos atores das nossas sociedades”?
sábado, 26 de agosto de 2023
sexta-feira, 25 de agosto de 2023
Escutai e lutai
Através do jornal digital 7Margens, soube de uma boa notícia do Papa Francisco: “Estou a escrever uma segunda parte da [encíclica] ‘Laudato Si‘ para atualizar os problemas atuais”. Precisamos mesmo de escutar “o grito dos pobres e o grito da terra”, de cruzar “o fim do mundo e o fim do mês”, a mesma luta. Aguarda-se então com expetativa este desenvolvimento da economia moral de Francisco, com recorte anti-sistémico.
quinta-feira, 24 de agosto de 2023
Vespas e filmes
E o PCP, continua a não entrar por quê?
Dei hoje com esta imagem do programa «Linhas Vermelhas», da SIC Notícias, que cumprirá em setembro dois anos de existência. Sendo a estética do programa já familiar, chamou-me à atenção a expectável substituição de Mariana Mortágua por Catarina Martins, em representação do BE. Mas também a estranheza de ver representado um partido que já não tem assento no parlamento (CDS-PP), quando outro, tendo assento parlamentar (e não sendo igualmente um partido recente), continua a não ter ninguém no programa (PCP).
Poder-se-á argumentar, é certo, que Cecília Meireles está em dupla representação. Isto é, não só a figurar em nome do moribundo CDS-PP mas também da Iniciativa Liberal (IL), uma vez que até integra a direção do seu stink tank, o +Liberdade. Seja como for, nada justifica a persistente subrepresentação do PCP nos espaços noticiosos (que contrasta com a sobrerepresentação do Chega), nem a sua sistemática exclusão dos espaços de comentário político, que enfraquece o pluralismo do debate. A menos que se trate, claro, de uma questão de intencionais «linhas vermelhas».
quarta-feira, 23 de agosto de 2023
Nada é socialista
Carmo Afonso tem toda a razão: o pacote Mais Habitação não é nada socialista, mas arrisca-se a ser considerado socialista, devido à mediatizada radicalização das direitas.
Querido diário - As doses da austeridade
Público, 21/8/2013 |
Há dez anos, continuava-se a cortar, cortar, em nome dos efeitos positivos que se julgava nascerem desse esforço de austeridade.
A intenção anunciada era reduzir o défice orçamental, porque desses esforço se atingiriam alguns fins, ainda que todos eles discutíveis: 1) reduzir o défice para reduzir a prazo a dívida pública (discutível porque se consegue reduzir mais a dívida pública, nomeadamente o seu peso no PIB, se houver um esforço articulado do Estado para a expansão da capacidade produtiva. Para isso, basta que a economia cresça mais do que a taxa de juro implícita no pagamento da dívida. Nota curiosa: este princípio torna ainda mais evidente os efeitos perversos das decisões do BCE em elevar as suas taxas de juro de referência (as economias tornam-se mais dependentes); 2) reduzir o défice orçamental para que o Estado liberte mais recursos para a esfera privada da sociedade (discutível porque, para reduzir o défice, é necessário - na verdade - retirar mais recursos da esfera privada, via impostos, ou reduzir a intervenção pública, o que corresponde a reduzir o rendimento implícito dos cidadãos, já que sem a despesa pública, os cidadãos terão de desembolsar mais do seu bolso.
Na verdade, e como já o dissemos de outras vezes, as intenções não correspondem aos verdadeiros objetivos da teoria neoliberal subjacente a estas ideias. Na realidade, o objectivo é reduzir, desarticular, desfazer a provisão colectiva do Estado (mesmo que funcione bem) para que, interesseiramente, se tranforme num nicho de mercado, do qual alguém - poucos, muitos poucos, os donos das empresas fornecedoras desse novo produto privado - possam beneficiar do valor acrescentado que essa actividade propicia. E se essa provisão colectivo não for rentável, então o sector privado tudo fará para o que seja, mesmo que se se aumente os preços, contenham ou baixem os salários dos trabalhadores, se retraia a provisão - em amplitude ou em dimensão - antes fornecida colectivamente.
O curioso é que, a meio dessa “aventura” interesseira, a realidade começou a fustigar os pressupostos da teoria.
Mesmo a direcção do Público que, como se nota até esteve de acordo com a redução do défice orçamental, percebia há dez anos que, aliviando a austeridade e a política do “Choque e Pavor” que Passos Coelho e Paulo Portas empreenderam desde 2011, a economia começava a respirar. Porque “austeridade a mais” implicava uma @espiral recessiva”... que, segundo a direcção do Público - se manifestava na Grécia em todo o seu horror. O caso grego era visto então como uma antecipação do que poderia ainda vir a acontecer a Portugal.
Recorde-se que nesta altura, a "espiral recessiva" já se manifestava igualmente em Portugal e de forma bem expressiva. O INE iria contabilizar em 2013 quase 1,5 milhões de
desempregados (em sentido lato), numa taxa de desemprego (em sentido lato) que rondaria os 25%! Mas o Público não os via. Apenas via a Grécia. E apenas a via as repercussões que a austeridade poderia ter na actividade dos nossos “empresários” e no nível de consumo dos nossos "consumidores". Como se a sociedade se dividisse nesses dois grupos: os que produzem (os donos das empresas) e os que consomem (todos).
É interessante verificar como a comunicação social absorve - tão facilmente - o ponto de vista dominante, precisamente aquele que se coloca nos sapatos dos empresários e que oblitera sempre da equação do pensamento a forma como o rendimento se reparte numa sociedade. E como se reparte, na maior parte das vezes, de forma desigual.
terça-feira, 22 de agosto de 2023
A questão
Em Fevereiro, o governo anunciou um pacote de medidas para enfrentar uma crise habitacional que, não sendo nova, assumiu proporções verdadeiramente catastróficas. Os partidos da direita neoliberal, que não podem limitar-se a saudar, por estratégia de oposição, os incentivos fiscais e estímulos à iniciativa privada que o pacote contém, inventaram um suposto «ataque ao direito de propriedade» para desviar as atenções do essencial: o investimento especulativo no imobiliário é a causa do problema e impede o direito à função social da habitação.
segunda-feira, 21 de agosto de 2023
O porno-riquismo tem mandamentos
domingo, 20 de agosto de 2023
Nacionalismo de esquerda
Através de Pedro Pinheiro, fiquei a saber que ontem se assinalaram os setenta anos do golpe, orquestrado pelos serviços secretos britânicos e norte-americanos, que derrubou o governo democrático de um nacionalista de esquerda chamado Mohammed Mossadegh no Irão. A nacionalização da companhia petrolífera anglo-iraniana foi o pecado mortal.
sábado, 19 de agosto de 2023
sexta-feira, 18 de agosto de 2023
Querido diário - Lições do Pontal
Público, 17/8/2013 |
Há dez anos, Pedro Passos Coelho foi à festa do Pontal para, aliviando-se “de um emaranhado de frases sem ordem, sem clareza e sem gramática” (Vasco Pulido Valente dixit, Público, 18/8/2013), pressionar o Tribunal Constitucional.
“Qualquer decisão constitucional não afectará simplesmente o Governo. Afectará o país. Esses riscos existem, eu tenho que ser transparente. Se esse risco se concretizar [o TC declarar a requalificação inconstitucional] alguns dos objectivos terão que andar para trás.”
Em causa, estavam diplomas para a requalificação/despedimento dos funcionários públicos e a perspectiva seria - como se imagina - não uma expansão do funcionalismo, com vista à prestação de melhores serviços públicos, mas a sua contracção - mesmo sem qualquer reforma do Estado (que Paulo Portas não conseguira mostrar) - visando apenas a estrita redução do défice orçamental.
Interessante verificar que, dez anos passados, o PSD - desta vez chefiados pelo então líder da bancada parlamentar de Passos Coelho - tenha gritado, na mesma festa do Pontal, contra os maus serviços públicos prestados apesar da dita elevada carga fiscal. Só faltou Montenegro defender - e imagina-se por que não o fez - que essa melhoria seria conseguida com uma redução do número de funcionários públicos. Não, o discurso agora é outro. Visa reduzir a carga fiscal, para se obter uma menor arrecadação de impostos que, por sua vez, levará a prazo... a uma redução da Função Pública.
Há dez anos e apesar dos abraços da praxe no local, Passos Coelho não convenceu. Eis o editorial do Público de há dez anos que reflecte essa descrença em Passos Coelho.
Público, 18/8/2013 |
E não convenceu, primeiro, porque trazia consigo um historial de incongruências e de previsões falhadas. Não por qualquer erro técnico, mas fruto de um grave erro teórico-político: o de pensar que a austeridade teria um efeito positivo e rendentor na actividade económica.
Público, 17/8/2013 |
Depois, porque o discurso de Passos Coelho reflecte a cabeça perdida de alguém que, apesar de ter cometido esse grave erro, cegamente, nem se apercebe que o cometeu. No fundo, não se apercebeu do hiato que vai entre uma teoria económica neoliberal montada com um fim - o da concentração da riqueza em alguns - e o discurso político subjacente - o de conseguir-se a prosperidade para todos (como se a riqueza de alguns transbordasse, a prazo, para a prosperidade de todos).
Aliás, tal como hoje: não bate certo o programa político da coligação PSD/CDS que sempre visou uma desvalorização salarial - aliás, conseguida! - com o atual discurso da direita e da extrema-direita que, face à realidade de baixos salários, chora e defende uma valorização salarial (embora apenas à custa do Estado). Tal como não bate certo o discurso político do PS que, contraditoriamente, mantém o edifício institucional criado pela direita para conseguir uma desvalorização salarial e, simultanemaente, defende como exaltante uma leve subida do peso dos salários no PIB, num contexto de elevada inflação não compensada por uma subida salarial, a qual redundou numa transferência do Trabalho para o Capital superior à aplicada por Passos Coelho e Paulo Portas no tempo da troica (imprescindível ler aqui o caderno nº18, de Diogo Martins e Vicente Ferreira).
É essa incongruência que talvez explique a atravessia no deserto da direita portuguesa, durante quase dez anos. Talvez seja um aviso para o actual PS. E para o seu eleitorado. E para todos nós.
A economia moral de Francisco
“Reparai, quando alguém tem de levantar ou ajudar uma pessoa a levantar-se, que gesto faz? Olha-a de cima para baixo. Trata-se da única ocasião, do único momento em que é lícito olhar uma pessoa de cima para baixo: quando queremos ajudá-la a levantar-se.”
quinta-feira, 17 de agosto de 2023
Nunca se esqueçam
A excelente Jacobin Brasil lembrava ontem os 204 anos do massacre de Peterloo na Manchester da primeira revolução industrial, quando a cavalaria carregou sobre dezenas de milhares de trabalhadores reunidos para exigir o sufrágio universal, que só começou a chegar um século depois e à sombra da Revolução de Outubro. Em 1819, só 2% da população podia votar.
quarta-feira, 16 de agosto de 2023
A contra-reforma fiscal e social
O PSD apresentou, na sua festa do Pontal, um conjunto de propostas fiscais que fazem parte - avisa o partido - de "uma reforma fiscal profunda" que "melhore a sua equidade" no sistema. Mas a versão anunciada não faz muito pela equidade (muito pelo contrário) e, nalguns aspectos, representa um pé-na-porta para uma contra-reforma inconstitucional.
O PS respondeu bem à proposta do PSD: 1) é incoerente (o PSD quis primeiro baixar o IRC e só depois o IRS, agora quer o contrário); 2) é regressiva (dá mais dinheiro a quem mais recebe); 3) é “profundamente enganadora” para os jovens (ao propor uma taxa de 15%, dá mais dinheiro a quem mais recebe); 4) Não responde estruturalmente aos desafios da produtividade: desvia salários para prémios e a produtividade não se resolve com prémios salariais; 5) prejudica a carreira contributiva dos trabalhadores e reduz, a prazo, apoios sociais (ao isentar os prémios de TSU); 6) agrava a desigualdade (dá mais dinheiro aos CEO de empresas do que aos jovens que recebem um salários médio); 7) limita a acção do Estado ao reduzir a receita fiscal.
Mas o PS acaba por omitir - tanto quando o PSD - os problemas de base. E tal como o PSD, esquiva-se a um diagnóstico e a uma verdadeira terapia.
Falso Diagnóstico
Há muito que o PSD confunde observação com diagnóstico. Apenas apresenta indicadores do empobrecimento dos trabalhadores e do país, da subida da emigração dos jovens, da baixa produtividade nacional. Mas não dá alguma explicação, não defende uma tese ou ideia sobre a causa. Apenas conclui que há uma elevada carga fiscal (misturando impostos com contribuições sociais, ou seja, alinhando visivelmente com o ponto de vista dos grandes empresários...) e zás! Conclui que essa é a raiz dos males no país. Por acaso político, esse é o mesmo falso “diagnóstico” que a extrema-direita faz.
É enganador: mostra gráficos da subida abrupta lá em 2011/2013... e omite que essa subida foi aprovada pelo
PSD/CDS, quando as suas ideias de corte nos vencimentos da Função
Pública foi chumbada pelo Tribunal Constitucinal; e a de corte de 7% nos
salários - pelo aumento da TSU dos trabalhadores (de 11% para 18%) e
redução da patroal (de 23,75 para 18%) - foi chumbada nas ruas. Ou seja, escamoteia - tanto como o PS - as políticas que conduziram a uma pronunciada desvalorização salarial.
É duplamente enganador, porque é ineficaz: é um pobre diagnóstico que deixa de lado o que é estrutural, o que
tem efectivamente gerado o empobrecimento nacional. Ou seja, a aposta
nacional em sectores de actividade de baixo valor acrescentado (em que
assenta a "indústria" do turismo), de baixos salários, que explicam a
crescente emigração de jovens qualificados e o progressivo recurso a
imigrantes, à medida que já não é possível baixar mais os salários
médios nacionais. E enquanto isso não mudar, o afunilamento económico de Portugal não se alterará, por muito que dêem dinheiros aos empresários.
Ou seja, o PSD - e o PS caminha no mesmo sentido - insiste numa tese, que revela o que há de pior na Política: aposta em medidas fáceis e ineficázes - reduzir impostos - mantendo os défices estruturais e, ao mesmo tempo, retirando meios ao Estado, para que possa intervir na sociedade, incapacitando-o ainda mais de se dotar de melhores serviços públicos e de ter um papel na verdadeira mudança do país.
Terapêutica em contra-reforma
Para não parar neste querido mês de Agosto
terça-feira, 15 de agosto de 2023
Livros de ladrões - não são um slogan
Este livro teve uma gestação longa, iniciada com quatro palestras que proferi na Culturgest (Lisboa) em 2014, com o mesmo título. Na realidade, fui escrevendo, sozinho e com outros, ao longo destes anos sobre a teoria prática neoliberal. O meu contributo, de 2022, para a série livros de ladrões na última década.
A economia de férias
Na última semana, a chegada de mais de 1 milhão de pessoas para as Jornadas Mundiais da Juventude captou a atenção do país. No entanto, apesar da dimensão do evento, este não é o único número notável sobre o afluxo de visitantes a Lisboa e a Portugal. Numa entrevista recente, o presidente da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Moedas, disse que a cidade deveria registar um número recorde de 19 milhões de estadias até ao final do ano, bem acima dos valores pré-pandemia.
segunda-feira, 14 de agosto de 2023
Livros de ladrões - força de e do trabalho
É tão simples
Revista Manifesto nº 7 - Apresentação em Tavira
Publicado recentemente, o nº 7 da Revista Manifesto, com um dossier dedicado à questão da Guerra, será apresentado no próximo dia 18 de agosto, sexta-feira, a partir das 22h00, na Casa das Artes de Tavira (Rua João Vaz Corte Real, nº 96). As intervenções iniciais estão a cargo de Diogo Martins e Nuno Serra, seguindo-se um período de debate.
Esta edição da revista, disponível em várias papelarias e livrarias, pode ser adquirida aqui. Excertos do editorial deste número e a lista de artigos estão também acessíveis na página da Fórum Manifesto.
domingo, 13 de agosto de 2023
Cada vez mais ricos, cada vez mais à vontade...
Já nem há vergonha.
As imobiliárias vendem cada vez mais a ideia de que “nós, os ricos, os cada vez mais ricos, estamos para ficar”, pressupondo-se o esquecimento social do que se passa com os "outros": “os pobres, os trabalhadores pobres, que morram atirados para a sarjeta”. O site idealista divulgou, nos seus mails promocionais, uma entrevista ao venezuelano Federico Rosales, sócio do italiano Filippo Buffa. As declarações são tão cruas que se tornam interessantes da sua visão do que se passa. Começa assim a introdução:
Se há segmento no imobiliário que já mostrou ser resiliente a crises é o residencial de luxo. E nem a pandemia ou os efeitos da guerra na Ucrânia - um aumento brutal dos custos da energia e da taxa de inflação que forçou [!] o Banco Central Europeu (BCE) a subir as taxas de juro diretoras -, parecem estar a deixar marcas neste nicho de mercado em Portugal. Pelo contrário. [tudo como se fosse uma coisa boa... Que descaramento, mas real].
E vem a voz do investidor... :
“Teremos um projeto de ultra-ultraluxo, não apenas de ultraluxo (…). É um mercado que tem procura em Portugal”. "Não costumamos falar disso, mas a verdade é que vendemos a penthouse (...) por um valor superior ao pago por Ronaldo: por 16.800 euros/m2. E vendemo-lo por videochamada. (...) Há portugueses que compram para arrendar, norte-americanos que compram por uma questão de investimento e trazem depois outros norte-americanos. Gostamos muito dos clientes norte-americanos, porque são muito honestos com os preços. Mas também temos famílias de portugueses que compram para viver. Os franceses também compram muito por uma questão de investimento.
Os cidadãos dos EUA são os principais clientes?
São os melhores pagadores e são dos principais players. Como os brasileiros. A qualidade dos clientes brasileiros melhorou, agora são mais justos com os preços. Diria que os nossos principais clientes são brasileiros, norte-americanos, portugueses e depois investidores nórdicos. (...) O nosso ADN é residencial de luxo e ultra-ultraluxo. Em Portugal há mercado para todos os segmentos, creio que não é o facto de haver escassa oferta, mas sim alta procura. [Claro porque o mercado foi deixado à solta desde a lei Cristas (PSD/CDS), não devidamente alterada pelos governos PS] (...) Já não investimos [em Espanha]; a aposta agora é Portugal e é uma aposta mais a longo prazo. Os fundamentals de Portugal estão mais de acordo com a nossa filosofia. [Temos notado!] (...) Já não é como em 2017 (...), que se pensava: “E se”. Já não é assim, já chegaram os investidores, já regressaram os portugueses que estavam no estrangeiro [ah pois! Quem serão eles? Porque estavam no estrangeiro e voltaram? Serão aqueles que beneficiaram da amnistia fiscal dada pelo PSD/CDS em 2012?]. Ou seja, já não é pensar que Portugal pode ser uma aposta, mas sim que Portugal é uma aposta. (...) Gostamos muito do Porto. É uma cidade que tem um potencial brutal, [Cuidado, Porto...] mas estamos muito focados em Lisboa. [Por que será?] Ainda há muito para fazer [Imagine-se o que ainda virá!]. Acreditamos que acrescentamos mais valor aqui, não estando tão dispersos. E, na verdade, o interior do país está já aqui ao lado [O interior que se cuide... e os trabalhadres que se ponham a pau porque não vai sobrar nada para eles]. A mensagem que quero deixar é que o desenvolvimento imobiliário em Portugal não é uma dúvida, mas sim uma realidade. O país está a crescer e assim vai continuar.
Assim!
Portugal que - segundo os jornalistas das televisões - esteve no centro do mundo com as Jornadas Mundiais da Juventude - está no centro do investimento imobiliário de luxo - do ultra-ultra luxo - na mesma altura em que se sabe que a juventude não pode sair de casa dos pais antes dos ... 34 anos.
Mais interessante: isto já dura há bastante tempo. Em 2011, escrevia-se no Público: Mais de metade da geração 18-28 adia a saída da casa dos pais por não ter condições para o fazer.
E vai continuar a fazê-lo porque para quem manda neste país - e como disse Augusto Santos Silva, em democracia, “os bancos não obedecem ao Governo” - há duas certezas: o mercado deve ser estimulado, para gerar procura de investidores, e a retribuição salarial deve ser mantida baixa para que a oferta possa ser competitiva. No caminho, os trabalhadores, os jovens trabalhadores, terão de amochar diante da subida dos preços de luxo, de ultra-luxo, do ultra-ultra-luxo das casas e dos lucros seus promotores. E ainda por cima, tributados com taxas fiscais bem abaixo das praticadas aos trabalhadores.
Englobe-se os rendimentos, aplique-se as mesmas taxas fiscais a todos os tipos de rendimento, resista-se aos gritos dos ultra-neoliberais no Parlamento que apenas ecoam os do BCE, da Comissão Europeia, no fundo em defesa do sector financeiro e dos mais poderosos; e veremos se o mercado não estabiliza.
Livros de ladrões - com todos
Os economistas no sentido em que eu os trato são uma espécie de núncios e arautos dos mercados. Escrevi uma crónica contra esses economistas, os que em geral têm acesso às televisões. Não são todos. Eu frequento um blogue de economistas que se chama Ladrões de Bicicletas, em que se fala de outra forma. Curiosamente, o título não remete para a economia, mas para a arte e o cinema. Não sou tão insano que não saiba que as realidades económicas existem, o que me parece é que lá por serem realidade não são necessariamente verdadeiras.
sábado, 12 de agosto de 2023
Livros de ladrões - do endividamento à habitação
Em 2016, este livro identificou algumas das especificidades nacionais do fenómeno da financeirização do capitalismo em Portugal, considerando que este é indissociável da europeização da economia política, culminando no euro. Daí à desfinanceirização, implicando uma ruptura de fundo, é só um passo que demos na proposta.
Em 2019, este livro, com um título inspirado no clássico de Friedrich Engels, fixou coletivamente os principais contornos de um sistema de provisão crucial e que muitos julgavam politicamente resolvido por via de políticas neoliberais. Estavam errados.
sexta-feira, 11 de agosto de 2023
Querido diário - Em democracia, “os bancos não obedecem ao Governo”?
Página do 1º Governo Costa |
O Governo venezuelano anunciou esta quarta-feira o desbloqueio de 1.5 mil milhões de dólares (1.3 mil milhões de euros) que estavam retidos em Portugal em contas de instituições e empresas venezuelanas no Novo Banco. (...) Os fundos que a Venezuela afirma que vão ser desbloqueados foram retidos depois de, em Janeiro de 2019, o líder opositor Juan Guaidó declarar publicamente que assumiria as funções de Presidente interino da Venezuela, até afastar Nicolás Maduro do poder. Guaidó foi apoiado por mais de 50 países, entre os quais Portugal. (...) A 4 de Fevereiro de 2019, a Comissão de Finanças do Parlamento da Venezuela, maioritariamente da oposição, pediu a Guaidó que protegesse os activos da Venezuela em Portugal. “Fizemos chegar (…) a informação sobre as contas nas quais se encontram os activos do Estado venezuelano em Portugal, para pedir perante o Novo Banco e o Governo [português] a protecção dos activos da Venezuela nesse país”, anunciou então a comissão. Um dia depois, Carlos Paparoni anunciou que o Novo Banco suspendeu uma transferência de fundos do Estado venezuelano, de 1.200 milhões de dólares (1.050 mil milhões de euros), que tinham como destino o banco Bandes do Paraguai. Em Abril de 2019, o Presidente Nicolás Maduro exortou o Governo português a desbloquear os activos do Estado venezuelano retidos no Novo Banco, alegando que os fundos seriam usados para comprar "medicamentos e alimentos". (...) A 3 de Maio de 2019, 19 organizações de defesa dos direitos humanos e movimentos sociais venezuelanos foram até à sede da Embaixada de Portugal em Caracas para pedir o desbloqueio dos fundos. Num comunicado enviado à Agência Lusa, o Ministério das Relações Exteriores da Venezuela explicou que foi entregue “uma carta onde solicitam os bons ofícios do Governo português para que sejam desbloqueados 1.543 milhões de euros que foram ilegalmente retidos”. Segundo o comunicado, a representação diplomática portuguesa mostrou-se “aberta à solicitação e manifestou a disposição de tramitar o requerimento”.
Agora vem, a parte interessante:
A 14 de Maio de 2019, o ex-ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, afirmou à imprensa em Bruxelas que Portugal é “um Estado de Direito, uma democracia política e uma economia de mercado” e, portanto, “os bancos não obedecem ao Governo. Santos Silva disse ter conhecimento do “diferendo entre um banco português e os seus depositantes” e que esse diferendo, como é “natural num Estado de Direito”, está já colocado em sede legal e judicial.
É assim que pensa a direita do PS. E já há muito tempo. Pelo menos,
desde 1989, quando aceitou rever a Constituição com Cavaco Silva.
Em Fevereiro de 2021, a ONU pediu aos Governos e bancos, incluindo de Portugal, que descongelem os activos venezuelanos que se encontram retidos, para permitir que a Venezuela atenda as necessidades humanitárias da sua população.
Debalde. O caso, pelos vistos, ainda corre nos tribunais.
A verdade pode não tardar. A vergonha alheia é que é eterna.