terça-feira, 31 de outubro de 2023
Escalões de IRS: queremos mesmo voltar aos anos 90?
domingo, 29 de outubro de 2023
sexta-feira, 27 de outubro de 2023
Viragem para a direita?
A jornalista Ana Sá Lopes defendeu recentemente que “não é fácil ser-se oposição de direita por estes dias”, ao considerar que o governo do PS se teria apropriado do seu programa em matéria de finanças públicas.
Do continuado sacrifício do investimento em infraestruturas e serviços públicos, desta forma cada vez mais degradados, à aposta na redução de impostos diretos, mais progressivos, acompanhado de reforços dos impostos indiretos, mais regressivos, é caso para dizer: não é fácil ser-se defensor de políticas de esquerda por estes dias.
A aposta em novas privatizações – da TAP à EFACEC –, ou numa política de habitação centrada em transferência de rendimentos para os proprietários, sob a forma de benefícios fiscais, por exemplo, só confirmam a orientação neoliberal geral do atual governo.
O resto do artigo pode ser lido no setenta e quatro.
quarta-feira, 25 de outubro de 2023
Da ocupação sufocante
«Num momento crucial como este, é vital ter princípios claros – começando pelo princípio fundamental de respeitar e proteger os civis. Condenei inequivocamente os atos de terror horríveis e sem precedentes de 7 de outubro, perpetrados pelo Hamas em Israel. Nada pode justificar o assassinato, ferimento e rapto deliberados de civis – ou o lançamento de foguetes contra alvos civis. Todos os reféns devem ser tratados com humanidade e libertados imediatamente e sem condições.
(...) É importante reconhecer também que os ataques do Hamas não surgiram do vácuo. O povo palestiniano tem estado sujeito a 56 anos de ocupação sufocante. Viram as suas terras serem continuamente devoradas por colonatos e assoladas pela violência. A sua economia foi sufocada, as suas populações deslocadas e as suas casas demolidas. As esperanças de uma solução política para a sua difícil situação têm vindo a desaparecer. Mas as queixas do povo palestiniano não podem justificar os terríveis ataques do Hamas e esses terríveis ataques não podem justificar a punição coletiva do povo palestiniano.»
Excertos da corajosa intervenção de António Guterres na reunião do Conselho de Segurança que ontem decorreu nas Nações Unidas. Uma intervenção que vale mesmo a pena ler na íntegra (e cuja tradução pode ser consultada em Ler Mais).
terça-feira, 24 de outubro de 2023
Alguém me explica o que são “contas certas”?
A explicação repetida por António Costa e Fernando Medina para o aforro forçado é que Portugal tem de sair do pódio dos países mais endividados da zona euro, para nos protegermos de futuras instabilidades financeiras. Parecem ignorar que dos oito países da UE que foram sujeitos a programas de resgate em 2010-2012, só dois tinham então rácios da dívida superiores à média da zona euro. Se o objetivo é prevenir a repetição da troika, o governo está a olhar para o alvo errado.
Se o objetivo é antes garantir a sustentabilidade da dívida pública a prazo (o que é positivo e desejável), para isso não são necessários excedentes orçamentais. Ao contrário do que se pensa, não é preciso ter saldos positivos para reduzir a dívida. Por exemplo, nos últimos 10 anos para os quais existem dados disponíveis no Eurostat, a dívida pública do conjunto dos países da UE desceu, enquanto os saldos orçamentais foram em média 2,6% do PIB (ou seja, houve défices e não excedentes). A explicação não é intuitiva, mas é fácil de compreender: dentro de certos limites, o crescimento anual das economias permite pagar os défices anuais ao mesmo tempo que se abate a dívida. Tendo em conta as previsões de crescimento económico e de taxas de juro para os próximos anos, Portugal continuaria numa trajectória de redução sustentada da dívida pública mesmo que tivesse défices orçamentais na ordem de 1% do PIB.
A expressão “contas certas” merece um prémio de marketing político, mas é difícil associá-la com rigor às opções orçamentais do governo. O que Costa e Medina estão a fazer com os nossos recursos parece-se cada vez mais com uma pessoa a quem chove em casa mas não faz obras, que está doente mas não vai ao médico e que abdica investir na educação dos filhos, porque tem de encher o mealheiro, não vá alguma coisa acontecer no futuro. Chamar a isto “contas certas” é um pouco absurdo. Mas em termos políticos funciona.
O resto do meu artigo pode ser lido no site do Público.
Investimento público: para o ano é que é, não era?
segunda-feira, 23 de outubro de 2023
Da série: Não há Alojamento Local a mais
«Em setembro de 2023, Nova Iorque começou a aplicar um regulamento que visa acabar com todos os Alojamentos Locais ilegais. A Airbnb apressou-se a reagir, declarando que a iniciativa do governo da cidade representava uma proibição "de facto" do AL na cidade. De sublinhar que, em 8 de outubro, existiam, em Nova Iorque 44,5 mil casas em Airbnb. Comparativamente, Lisboa, na mesma data tinha na plataforma de agregação airDNA 18 mil casas. (...) Estes números são, contudo, subavaliados, porque existem mais operadores, tais como a VRBO e a Booking.com, para além de muitos operadores de menor dimensão e de outros que não estão presentes em nenhuma destas redes. Mas é impossível fazer esta comparação sem ter em conta que Nova Iorque tem 8.804.190 habitantes e 44,5 mil casas em AL mas que Lisboa tem apenas 547.773 habitantes em 323.981 alojamentos e mais de 18 mil AL. Estes números significam que, para Nova Iorque a proporção de casas em AL é de 0,505% enquanto em Lisboa a proporção é de 3,29%. Ou seja: 6,52 vezes mais! (...) A 8 de Outubro existiam no Idealista 12 mil casas em arrendamento: imaginemos que este valor era reforçado com as 18 mil casas em AL na mesma data: que tipo de descida de preços poderíamos esperar de um aumento de 150% no número total de casas disponíveis para arrendamento?»
Excertos do recente artigo de Rui Pedro Martins no Público, «O conflito entre Alojamento Local e a necessidade urgente de habitação em Lisboa e Nova Iorque», a ler na íntegra. Para quem continua a achar que Lisboa não tem Alojamento Local (AL) a mais, ou que esta modalidade de oferta turística não contribui para a redução do acesso à habitação pelas famílias, a comparação com Nova Iorque é esclarecedora.
Quando se pondera o número de unidades de AL (cerca de 45 mil em Nova Iorque e 18 mil em Lisboa) pela população residente e o total de alojamentos nas duas cidades, o resultado é esmagador. Nova Iorque tem cerca de 5 unidades de Alojamento Local por cada mil habitantes e Lisboa 33 (cerca de 7 vezes mais). E na ponderação por mil alojamentos, Nova Iorque tem cerca de 12 unidades de AL e Lisboa 56 (cerca de 5 vezes mais).
Encontrando-se portanto, em termos comparativos, numa posição bem menos preocupante, mas percebendo o impacto que o AL tem na redução da oferta de habitações para fins residenciais, Nova Iorque não prescindiu de adotar mecanismos de regulação mais eficazes, em que, «para se poderem registar, os proprietários não podem colocar em AL uma casa completa». Ou seja, a oferta apenas pode ser criada na residência habitual dos proprietários, impedindo assim a sua transferência para o setor do turismo e a respetiva mudança de uso. Nada para que Carlos Moedas - o autarca que até participa em manifestações de agentes do setor - pareça estar disponível.
sábado, 21 de outubro de 2023
Megafone #14 - Orçamento do Estado para 2024: quem serve o PS?
O IRC em Portugal é mesmo o "2º mais pesado da OCDE"?
Esta semana, o jornal ECO publicou uma notícia em que se lê que, em Portugal, o imposto sobre as empresas é "o segundo mais elevado entre os 38 países da OCDE", citando dados de dois institutos liberais - o Tax Foundation e o +Liberdade - que apontam para a fraca competitividade fiscal do país. O estatuto editorial do ECO diz que o seu objetivo é "contribuir para uma sociedade informada" e "separar o que interessa do que é dispensável" na análise económica. Se fosse verdade, não tentariam induzir-nos em erro sobre o IRC que a maioria das empresas paga em Portugal.
sexta-feira, 20 de outubro de 2023
A Comissão Europeia já percebeu a nova questão da habitação?
Assumindo que «a crise da habitação está presente em toda a UE», o comissário europeu do Emprego e Direitos Sociais, Nicolas Schmit, afirma serem necessários «investimentos públicos e privados massivos em habitação a preços acessíveis para evitar que as pessoas sejam empurradas para a pobreza», assegurando que a Comissão está disponível para «apoiar os Estados-membros nos seus esforços para proporcionar habitação a preços acessíveis sob forma de várias iniciativas e instrumentos de financiamento». Na linha da tese simplista de que o problema é, apenas, de oferta («falta de casas»), bastando portanto construir mais.
Talvez valesse por isso a pena que o comissário europeu do Emprego e Direitos Sociais se detivesse um pouco sobre a evolução, na última década, do número de famílias (procura) e de alojamentos (oferta). Se o fizesse, constataria que o aumento do número de alojamentos na Europa entre 2011 e 2020 (mais 15 milhões de fogos) foi até superior ao do número de famílias (mais 12 milhões), não sustentando, portanto, a tese da «falta de casas» e, consequentemente, o disparar dos preços da habitação (que aumentam cerca de 25%, muito acima da variação do número de famílias e de alojamentos).
Tudo indica, portanto, que a Comissão Europeia ainda não percebeu que a crise de habitação que hoje atravessa a Europa se explica sobretudo pelo impacto das novas procuras (indissociáveis da intensificação do turismo e de dinâmicas especulativas diversas, que encaram a habitação como um mero «ativo financeiro»). Isto é, investimentos potencialmente inesgotáveis e com os quais as famílias dificilmente podem competir. Investimentos que, a manter-se, têm capacidade de absorver uma parte significativa da nova oferta de alojamentos, impedindo portanto a descida dos preços e mantendo a habitação inacessível para a maioria das famílias.
Em suma, não basta criar programas de «investimentos públicos e privados massivos» na construção de habitação, de resto severamente prejudicados pelas lógicas da austeridade orçamental e monetária europeias. É preciso que a Comissão Europeia considere a adoção de mecanismos de regulação das procuras especulativas, permitindo desde logo que os Estados membros os apliquem. Aliás, não é o próprio comissário europeu que refere que «a regulação da habitação social e a preços acessíveis é uma competência nacional»?
segunda-feira, 16 de outubro de 2023
Solidariedade com o povo palestiniano
sexta-feira, 13 de outubro de 2023
Economistas neoliberais nos seus labirintos
«Em termos históricos, a evidência é irrefutável: se os salários reais tivessem acompanhado a produtividade, a parcela de riqueza que remunera o trabalho tinha-se mantido constante. E, na realidade, não é isso que se passa. Se em 1999 (início do euro), a parcela de PIB que remunerava o trabalho se situava em 60%, em 2016 já só representava 51%. E no final de 2022, seis anos mais tarde, e depois de uma muito tímida recuperação, obtida no contexto da pandemia e, entretanto, já em processo de reversão, aquela parcela ronda uns recuados e socialmente injustos 53%.
Neste contexto de distribuição regressiva do rendimento, talvez nem seja assim tão difícil perceber a resistência de Ricardo Reis em admitir o erro. É que o que está em causa é mesmo muito mais do que um simples «lapso», num programa televisivo de comentário político-económico. É a própria capacidade para, respeitando os factos históricos, continuar a justificar uma «economia do pingo» que não pinga. Ou seja, a crença na trickle-down economics, segundo a qual «os grandes devem ter tudo, pois, ao terem tudo, deixam pingar recursos para baixo, para o resto da economia. Se não forem tributados, se puderem amassar o máximo de massa possível, acumularão recursos que depois serão largados na economia.
(...) O que poderá justificar um tão incompreensível afastamento da realidade? A convicção inabalável de que há leis intrínsecas e imutáveis, além de eminentemente técnicas, e por isso alheias às dinâmicas sociais e políticas? Ou estamos perante uma instrumentalização da ciência em defesa dos interesses dominantes, mesmo que tal implique um distanciamento deliberado da realidade?».
Do artigo publicado no número de outubro do Le Monde Diplomatique - Edição Portuguesa.
quinta-feira, 12 de outubro de 2023
Que economia é que saiu reforçada do programa da Troika?
sábado, 7 de outubro de 2023
sexta-feira, 6 de outubro de 2023
Até quando a especulação quiser?
«Como sustentar a tese, simplista, de que a questão se resume a um problema de "falta de casas", quando a relação entre famílias e alojamentos se manteve praticamente inalterada nos últimos dez anos? Porque se considera que deveria ter-se construído mais neste período, quando o acréscimo no número de famílias foi, em traços gerais, acompanhado pelo aumento do número de fogos?
A resposta a estas questões reside naquilo que muitos insistem em não querer reconhecer (por razões ideológicas expectáveis): existem hoje novas procuras de habitação, de natureza eminentemente especulativa, que a encaram como um ativo financeiro, um objeto de investimento, e não pela sua função residencial (e, já agora, social).
(...) As políticas de habitação com capacidade para responder a uma crise habitacional como a que estamos a atravessar, tanto à escala nacional como europeia, deverão ir além do reforço do parque habitacional público, que é fundamental, e de instrumentos que mitiguem, no imediato, o impacto da crise.
Isto é, adotando medidas robustas de regulação do mercado, capazes de diferenciar os investimentos orientados para a oferta de habitação a preços compatíveis com os rendimentos das famílias, dos investimentos de natureza rentista e especulativa. Sem esta linha de resposta, apenas resta a esperança de que, por uma qualquer razão, estes investimentos, potencialmente inesgotáveis, deixem o imobiliário e se desloquem para outros domínios.».
O resto da crónica pode ser lido no Setenta e Quatro.
quarta-feira, 4 de outubro de 2023
Um jornal contra a austeridade perpétua
A perspectiva da austeridade perpétua encontra-se aqui com a do iminente desastre climático. Os que estão sempre prontos, no espaço político e mediático, a criticar as acções e as «propostas irrealistas» dos jovens que lutam por um planeta onde se possa viver deviam dedicar algum tempo a analisar as «soluções» propostas pela Comissão Europeia. Umas são falsas, outras desastrosas.
segunda-feira, 2 de outubro de 2023
Expliquem-me, por favor...
…de onde veio esta ideia de que uma renda tinha de cobrir (e até ultrapassar) o valor da prestação paga pelo senhorio?
@rottenstein1 |
Isto é: vejo amiúde gente a defender que as rendas não estão assim tão altas, ou podiam até subir, porque se tem assistido a uma subida das prestações (em resultado da subida da Euribor). O raciocínio é algo como: com uma prestação de 500€ e uma renda de 700€ considera-se que a diferença (200€) é o lucro do dito arrendamento. No entanto, contabilisticamente, esta conta não faz o menor sentido.
Em primeiro lugar, a prestação depende de diversos fatores que dependem (quase) exclusivamente do comprador, por exemplo, do número de anos do crédito, da % de capitais próprios investidos na compra do imóvel. Logo por aí, a relação entre prestação e renda deixa de fazer qualquer sentido. Por exemplo, um proprietário pode reduzir o prazo numa ótica de reduzir os custos com o financiamento, mas aumentando a prestação. Da mesma forma, o proprietário pode amortizar grande parte do crédito antecipadamente) ou pode não haver crédito nenhum. Por que razão o valor da prestação há de ser indicativo do que quer que seja?
Em segundo lugar, contabilisticamente, os 500€ da prestação não são uma despesa, mas a soma de uma despesa (com o financiamento, i.e. os juros) mais um investimento (i.e. a amortização). Contabilisticamente significa que os juros são, de facto, uma despesa que sai da riqueza em numerário (que está no ativo) e sai do capital próprio do dito proprietário. Mas a amortização corresponde apenas a transformar um ativo (dinheiro) noutro ativo (o imóvel), bem como passar um passivo (o crédito) para um capital próprio (o mesmo imóvel).
Há obviamente a possibilidade de haver perdas, isto é, depreciações, e num qualquer negócio isso teria de ser tido em conta para a determinação do preço, mas mais uma vez, isso nada tem a ver com o valor da prestação.
É claro que em termos de caixa é fácil fazer a conta simples entre saídas e entradas de numerário. Mas isto não é o lucro ou a rentabilidade de um negócio, mas apenas retrata a liquidez de curto prazo do mesmo. Portanto, para se ver se um negócio imobiliário dá lucro tem de se ter em conta: os custos de financiamento, o valor futuro do imóvel, e os restantes custos (de manutenção, gestão, impostos, condomínio). Se a receita for maior do que a soma destes custos há um lucro. Se a receita for menor, há um prejuízo. A prestação não é nada para aqui chamada.
E mesmo com isto, há mais uma palavra a dizer: se, por algum motivo, os custos do negócio subirem, não é mecânico que tal subida se deva refletir no preço (i.e. renda). Num negócio normal, esse custo é repartido entre empresa e consumidor dependendo das condições do mercado. O risco de perda não é o que usam para justificar o privilégio do lucro? Pois bem.
Mas eu acho que isto é bem mais do que um mero erro contabilístico. Parece-me claro que este aparente equívoco é, na verdade, apenas um artifício usado por muitos para justificar aumentos desproporcionais de renda num mercado onde se tornou regra esperar enriquecer muito e em pouco tempo.
É por isso que não bate a bota com a perdigota. No discurso individual, não há senhorio que esteja a ganhar muito dinheiro e são sempre uns pobres coitados. Mas depois, todos sabemos dos aumentos dos preços, aumentos das rendas, e somos obrigados a ouvir falar no grande dinamismo do mercado imobiliário, como bem mostra Nuno Serra aqui.
De qualquer forma, tudo isto é apenas mais um argumento para aquilo que já sabemos: direitos de cidadania não deviam sequer estar sujeitos aos desmandos do mercado. E é o Estado que tem de agir, principalmente através da criação de uma oferta pública de habitação a preços acessíveis digna desse nome.
Guerra entre as classes...
Um jornalista do Financial Times dormiu no gabinete de Winston Churchill no War Office, agora transformado em hotel de luxo, depois de uma remodelação de mais de mil milhões de euros. Não pagou entre dezoito e vinte e cinco mil libras por noite, o preço do quarto a partir da semana passada. O porno-riquismo, ou seja, o consumo conspícuo na era das desigualdades pornográficas, vem do centro para a periferia emuladora.