«Era insustentável manter uma União Europeia com instituições dos anos cinquenta, quando hoje, com vinte e sete membros, se tornava indispensável criar condições para que o interesse comum europeu e a vontade dos cidadãos pudessem ser garantidos». Este é o argumento fundamental apresentado por Guilherme d'Oliveira Martins (hoje no Público) para apresentar o novo Tratado da UE como uma vitória. É um avanço face a grande parte dos comentadores e jornalistas, para quem a grande vitória consiste em ter um tratado europeu com Lisboa no nome. E é mais honesto do que a falta de argumentação que caracteriza algumas intervenções (ver post anterior do João).
Mas a defesa que G.O.M. faz do Tratado de Lisboa é envergonhada e o autor não o esconde: «No futuro teremos de ser mais audaciosos quanto ao governo económico da União, quanto à coordenação de políticas económicas e sociais (de acordo com a actualíssima Estratégia de Lisboa) e quanto à cidadania europeia - para que fique claro que a legitimidade europeia é dupla, dos Estados e das pessoas». O que fica por dizer é que este Tratado torna praticamente inviável uma alteração no rumo que a UE vem tomando desde Maastricht. Os domínios em que as decisões são tomadas por maioria dos votos do Conselho (permitindo que as decisões sejam tomadas contra a vontade de alguns países) são aqueles que visam garantir o funcionamento de um mercado interno livre da interferência dos Estados, inviabilizando assim a adopção de políticas públicas de desenvolvimento ao nível nacional. Pelo contrário, mantém-se o princípio do consenso (que garante a possibilidade de qualquer Estado vetar uma decisão, mesmo que os restantes 26 estejam de acordo) em todos os domínios em que a UE poderia fazer a diferença enquanto projecto de desenvolvimento de natureza democrática e social - leis laborais, direitos sociais, harmonização dos níveis de imposto sobre os lucros. Qualquer avanço no sentido da democratização da UE - que hoje tem um Parlamento eleito que pouco pode propor ou decidir, uma comissão europeia não eleita que propõe o que quer, e um conselho de ministros que quase tudo decide à porta fechada, muitas vezes sem estar mandatado para tal - está também ele dependente de um acordo entre todos os 27 estados.
Ou seja, a UE está blindada numa trajectória neoliberal e com este Tratado são cada vez menos as possibilidades de poder ser algo diferente do que é - mesmo que essa fosse a vontade da generalidade dos europeus. Esta Europa de mercado e anti-democrática desencanta cada vez mais. E seria bom que nos fosse dada uma oportunidade para o afirmarmos nas urnas. Demasiado bom, ao que parece.
Caro Ricardo,
ResponderEliminarA UE está em um trajecto mas não será liberal...social democrata, isso sim.
Ainda fazemos campanha do mesmo lado...por razões diferentes mas unidas...