segunda-feira, 15 de abril de 2024

Alojamento Local e crise de habitação: o que a direita finge não perceber

A direita agora no poder (PSD e CDS-PP) e na oposição (IL e Chega), que se prepara para recuar na regulação do Alojamento Local, a par de outros retrocessos graves e contraproducentes em matéria de política de habitação, finge não perceber a natureza da crise que o país atravessa, insistindo que se trata de uma mera questão de «falta de casas» e ignorando, portanto, o impacto das novas procuras especulativas na subida dos preços.


Não sendo obviamente o único fator a impulsionar a subida dos preços, que «descolaram», nos últimos anos, dos rendimentos das famílias (o que deveria, desde logo, fazer pensar quem acha que estamos num quadro convencional de relação entre a oferta e a procura), o Alojamento Local constitui, contudo, o segmento das novas procuras (neste caso para fins turísticos), cuja quantificação e incidência territorial melhor se conseguem apurar.

Assim, e considerando para o efeito o caso de Lisboa, importa continuar a confrontar a direita com alguns factos que contrariam a tese de que o Alojamento Local, tal como as outras novas procuras especulativas, «não tem culpa» pela crise de habitação com que a capital se confronta:

● Sem precedente histórico, Lisboa perdeu cerca de 3 mil casas na última década, invertendo o aumento de 34 mil entre 2001 e 2011. Um «encolher» do parque habitacional que não é possível dissociar da expansão do Alojamento Local no mesmo período. De facto, se as unidades de AL continuassem a ter uma função residencial (e não turística), o número de casas em Lisboa teria atingido um valor próximo de 339 mil em 2021 (cerca de mais 16 mil face a 2011).

● É nas freguesias do centro histórico, nomeadamente Santa Maria Maior e Misericórdia, mas também Santo António e São Vicente, que se concentra a oferta de Alojamento Local. Com valores acima de 10% no peso relativo do AL no stock total (alojamento residencial mais alojamento local), em Santa Maria Maior atinge-se um valor próximo de 40% e no caso da Misericórdia a rondar os 30%.

● De acordo com o INE, são também as freguesias do centro histórico que perdem mais população na última década. Para uma média de -1,4% na cidade, Santa Maria Maior e Misericórdia atingem quebras de população acima de -20%, com redução no número de famílias a superar os -25% (valor médio na cidade de -1,5%). E são também estas freguesias que mais alojamentos perdem no período, com valores acima de -15% (a média da cidade ronda os -2%).

É claro que a expansão desenfreada do Alojamento Local, geradora de um manifesto desequilíbrio entre a função residencial e a função turística, não é o único fator da subida do preço da habitação, que resulta da incidência territorial cumulativa das novas formas de procura especulativa. Mas o seu contributo para a atual situação é inequívoco, desde logo pela redução da oferta. O que é trágico é que, ao retroceder nesta e noutras matérias, com o aplauso da IL e do Chega, a AD não revela apenas a sua incapacidade para responder à crise de habitação, contribuindo ativamente, isso sim, para que a mesma se agrave ainda mais.

9 comentários:

  1. Então, "o impacto das novas procuras especulativas na subida dos preços" não é também um impacto na diminuição de casas disponíveis no mercado habitacional? Você mesmo o mostrou...

    Não vale a pena ficar nessa de contradizer gratuitamente a direita; pelo contrário, vale é mostrar que as soluções da direita são, justamente, as de diminuir o número de casas disponíveis para o mercado habitcional interno, porque promove uma oferta para "procuras especulativas". (E isto sem ir ao fundo da questão, que é fazer da habitação um mercado...). A sua argumentação é bastante atabalhoada.

    (não é a palavra "mera" logo antes de "falta de casas" que lhe garante precisão ao rascunho de artigo, porque, sinceramente, isso é brincar com o sentido do texto, que tem mais um carácter de birra do que e um carácter objetivo - é preciso concluir melhor).

    Cumprimentos.

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  2. O Alojamento Local faz parte dum quadro maior, que é o do crescimento do turismo em Lisboa. é estranho que nunca ninguém se refira ao crescimento desenfreado de unidades hoteleiras nos bairros históricos, como se um hotel não ocupasse edifícios. Se fosse mauzinho diria que taalvez haja uma ligação entre essse silêncio e o facto das grandes beneficiadas do desaparecimento do AL sejam essas unidades hoteleiras. Temos pois: Hotel bom, AL mau.

    A população da zona hiostórica de Lisboa atingiu o pico nos anos 80 e tem vindo a diminuir desde então, mas parece que é o AL,um fenómeno com 10 anos, o único causador disso.
    Vai-me dizer que não é só o AL, mas como é a única coisa que se vê, vamos fingir que é o causador de tudo, porque estudar quais foram os fenómenos que leveram à desertificação da zona histórica é complicado e ninguém está para isso.
    Neste momento na maior parte da zona histórica o acesso por automóvel está fortemente condicionado, não existem escolas, estações de correio ou dependências bancárias. Fazer qualquer obra que não seja clandestina só é possível a quem tem poder e dinheiro para influenciar a Câmara, se não, nem uma janela se pode mudar, alterar os edifícios de modo a conseguir áreas aceitáveis para uma habitação do séc XXI é expressamente proibido (a menos que seja um novo hotel). Só uma pessoa muito ingénua pensa que se esvaziar os AL eles serão postos no mercado de habitação, ficarão como estavam antes do AL, fechados e em ruínas, porque já quase ninguém quer viver ali. Na verdade não há assim tantos hipsters de esquerda.

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  3. Caro Anónimo das 11h26,
    O Alojamento Local tem uma relação direta com a mudança de uso. No caso das procuras especulativas que não tenham que ver com a atividade turística, esse impacto não é linear.
    Seja como for, a partir do momento em que deixamos de poder equacionar a oferta e a procura nos termos de quem procura e quem disponibiliza alojamentos para habitar, a tese da «falta de casas» tem que ser relativizada, importando perguntar para quê e para quem (além de que as novas procuras, que encaram os alojamentos como ativos financeiros, são potencialmente inesgotáveis (pelo que a solução não passa, somente, por construir mais).
    Cumprimentos

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  4. Caro Anónimo das 12h46,
    É claro que a expansão da oferta hoteleira (decorrente da mudança de uso do edificado) tem igualmente impacto na redução do parque habitacional existente. Sugiro, contudo, que compare o impacto de uma e de outra oferta na redução do número de alojamentos para habitar.
    Outra sugestão é a de que compare o ritmo de redução de pessoas, famílias e alojamentos no centro histórico de Lisboa na última década e nas décadas anteriores. Verá que não estamos perante uma mera continuidade de um processo que é, de facto, mais antigo.
    Cumprimentos

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  5. O anónimo das 12:46 veio para aqui disparatar? Uma série de afirmações tiradas apenas da sua cabeça... Vale perguntar: são os outros que não estudam os fenómenos da desertificação das cidades ou é, afinal, você?

    Isso já está relativamente bem enquadrado: desindustrialização, emigração e - para seu pasmo - subida de preços ou especulação imobiliária (onde se inclui AL, mesmo que isso o incomode).

    É que, ao menos, Nuno Serra tenta compreender.

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  6. Caro Nuno Serra, aquilo que falei (11:26) não é difícil de entender...

    Se, para si, "relativizar" significa "colocar objetivamente em relação a", então relativizemos; mas se estamos a falar a mesma coisa e "relativizar" significa, aqui, "encontrar relações para desdizer o outro", então não relativizemos. É o segundo caso que se lê no seu exercício. É você mesmo que não apenas o diz como reafirma na segunda mensagem:

    se "deixarmos de poder equacionar a oferta e a procura nos termos de quem procura e quem disponibiliza alojamentos para habitar, a tese da 'falta de casas' tem que ser relativizada, importando perguntar para quê e para quem". Isto é atabalhoamento, idealismo liberal, etc, lamento dizer-lhe.

    Você sugere não equacionar uma realidade concreta - a existência de um mercado de habitação em PT - para relativizar a "falta de casas" e, ao fazer isso, mais perguntando para quê e para quem - cujas perguntas não saem do funcionamento de mercado (são os dados deste que o informa para quem e para quê). Então, o que realmente está aqui em jogo? É que a "falta de casas" não é - como você foi capaz de demonstrar, pela política de alteração de uso - uma simples falta de construção, como a direita diz estupidamente; no entanto, uma vez que foi também você que trouxe a política nacional para a questão, a qual, independentemente da cor, fala primeiramente para o seus membros internos - ou seja, para quem procura habitação cá - existe de fato, para estes, uma "falta de casas" no invariável mercado - ou, se preferir, na política de marcado - em que estão dentro.

    Importa, isso sim, deixar claro que são essas políticas de mercado da direita (AL, hóteis, plataformas digitais, nómadas, visto gold, crédito desenfreado, procura externa, fundos, casas devolutas, etc) que estão a diminuir casas disponíveis para os que procuram cá. Não é que as casas não existam no concreto, o problema é que, no mesmo concreto, elas não estão disponíveis para o residente médio em PT.

    Cumprimentos

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  7. As afirmações parecem sempre as mesma.
    Parece que há muitas causas para a falta de casas, mas o AL é o culpado. Existem inúmeros estudos sobre a desertificação da zona histórica que são sempre citados mas nunca apresentados, dizer que a construção de dezenas de hóteis por ano não tem influência no mercado de habitação é uma fé, não uma afirmação sustentada em factos.
    O AL é um fenómeno com 10 anos, a desertificação e ruína dos centros históricos começou há mais de 100, e a ruína do edificado só se começou a reverter com o AL. Pretender que o AL é a causa e não o efeito do fenómeno parece um pouco ingénuo.
    Nunca se perguntou porque estava o centro histórico quase deserto no fim do século XX, só subsistindo praticamente as casas de renda controlada? Nunca foi proibido fazer novos arrendamentos ou vender as propriedades para habitação à medida que iam vagando, mas por uma razão qualquer isso não foi feito. Só houve obras quando os edifícios foram afetos a outros destinos. Só um louco pensará que se as novas afetações forem proibidas os proprietários vão destinar os andares para habitação, pura e simplesmente perde-se menos dinheiro deixando-os cair.

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  8. Ao anónimo das 13:49

    Não me incomoda que se diga que o AL contribui para a dertificação da cidade.
    O que me incomoda são os sábios que dizem "Isso já está relativamente bem enquadrado: desindustrialização, emigração e - para seu pasmo - subida de preços ou especulação imobiliária", para depois concluirem que é preciso combater o o AL sem se referirem a nenhuma medida relativamente ao resto.
    Quem lhe diz que a especulação desparece com o AL? A mudança de usos dos edifícios fica limitada ou limitamo-nos a aceitar hóteis tradicionais em vez de AL (porque a procura continua lá)?
    Retirar AL da baixa combate a desindustrialização? De que maneira? Retirando o modo de vida de muitos dos atuais habitantes da zona vamos tornar a zona mais atrativa. Como? substituindo nepaleses por esquerdistas hipsters?
    A ligação entre emigração e AL para mim é misteriosa, mas se diz que se combate o excesso de emigração proibindo o AL, quem sou eu para duvidar.

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  9. Ao anónimo das 17:49,

    Não há um pé de árvore perto de si para faz sombra ao quão disparatado você está sendo, porque já deu para perceber que você ou é um patético "landlord" que só vê o que lhe apetece ou, pior ainda, alguém que sofre as dores de uma franja de gente inútil, improdutiva e parasitária - sem conhecimento de causa algum. (A estranha tara que você tem com os hóteis faz-me pensar que não só é um "landlord", como é também pseudo-empreendedor de uma AL, que quer diminuir a "concorrência" no ramo, os hóteis - ahahah).

    Vamos lá ver, estou em crer que li bem quando você questionava as causas da desertificação dos centros das cidades, certo? Pois bem, a minha resposta não é sabichice, mas trabalho científico português acumulado sobre o assunto e empiricamente constatável. Para compreender com mais profundidade, isso exige não só mais conhecimento, como mais tempo para explicar. Não vou perder muito mais tempo consigo, isso é uma certeza.

    Agora, o que fazer para alterar isso, sem dúvida, em parte recai sobre o que proporciona a subida de preços ou, simplesmente, a especulação imobiliária. E é isto que realmente o incomoda, embora você negue, porque você vem para aqui responder sabe-se lá ao quê e por quê enquanto, na verdade, ninguém disse que a AL é "a" causa de nada, mas "uma" causa que promove a especulação imobiliária, que vivemos e é real. (A AL existe enquanto também existe, aqui, uma forte especulação imobiliária, certo? A sua existência - de uns 10 anos - bate certo com a sobrevalorização dos preços, certo? ou também vai negar, para afirmar o que lhe apetece?). Por que você generaliza coisas que não são generalizáveis, isso é lá consigo... Depois, também ninguém disse que a desindustrialização e a emigração tem alguma coisa a ver com a AL, mas que a AL tem a ver com a especulação dos preços e, consequentemente, com a desertificação das cidades; que, como você disse, já vem de há muito tempo... Aprenda a ler e deixe de ser teimoso e emocionado com assuntos que, claramente, não compreende, nem domina.

    No mais, eu quero é mais que a sua procura que "continua lá" vá mais é para o cano a baixo. Os patetas da AL, que são iguais aos dos hóteis, porque fazem o mesmo que os hóteis fazem (só que em escalas distintas de predação, por caso), estão a retirar habitações do mercado, criado pela política de direita, para depois os seus partidos - de direita - virem dizer que é preciso construir mais (com benefícios fiscais, com terrenos do Estado vendidos ao desbarato, aumento de perímetros urbanos, etc - ou seja, com corrupção), porque, realmente, começa a existir "falta de casas" disponíveis, enquanto elas existem (ora diga lá, o capitalismo é ou não é coisa de maluco?). Tá errado alterar os usos do solo e das propriedades, lamento dizer-lhe, enquanto não há capacidade para produzir para o mercado com habitações 'mercadorizadas' a preços acessíveis. As licenças que hoje são AL foram para habitação, com um custo de produção que hoje não é possível comportar, para vender de modo acessível. Mas pior do que estes patetas, da AL etc, só mesmo os "landlords" das casas devolutas, principalmente aqueles que têm várias. Por isso, já que os privados não são capazes de responder a nada com a sua iniciativa, o que nos resta é além forçar, sim, uma propriedade a ser - imagine-se - uma propriedade (isto é, ter uso, função, produção ou apropriação), temos também de construir habitações em massa pelo Estado, para acabar de vez com o mercado de arrendamento privado; e deixar-vos todos contentes com as AL etc, mas a pagarem as externalidades dessa predação nos valores e dos efeitos ambientais e sociais do turismo.

    Outra coisa: os centros das cidades continuam desertificados, ou seja, com pouca gente a morar neles; isso é outro mito fantástico dos ignorantes da AL, hóteis, etc.

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