quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

O declínio editorial não é o mundo


O declínio editorial é público, expresso e observável. É tão banal, que já nem sequer é notícia. E é levado a cabo de forma transparente em múltiplos suportes, em particular na televisão. Esta última depende mais dos jornais do que se reconhece do ponto de vista editorial. 

Uma das suas principais traduções é o já estudado enviesamento para a direita no comentário político, cujo pico é a televisão para milhões, com os facilitadores Marques Mendes e Paulo Portas, péssimos exemplos para a juventude, ainda para mais sem contraditório. 

Esta comunicação social é subsidiada pelo Estado, mas, e para usar por uma vez as ferramentas da economia convencional, deve ser antes taxada, dadas as externalidades negativas que gera, sob a forma de poluição ideológica, de lixo editorial e de ameaças ao pluralismo democrático. 

Isto está de tal ordem que o marxismo mais simples explica o essencial: tudo passa pelas relações de propriedade, dado que a ideologia dominante é a das classes proprietárias dos aparelhos ideológicos dominantes. 

De forma um pouco mais sofisticada, é preciso também atentar no enfraquecimento dos freios e contrapesos jornalísticos, do poder dos sindicatos às comissões de trabalhadores, passando pelos conselhos de redação. Sem esquecer o estiolamento da propriedade pública e cooperativa. Obviamente, estamos sempre a falar das relações sociais de produção. E aqui a precariedade e o medo do despedimento reinam, para já não falar de outros incentivos à viragem para a direita. 

E é preciso valorizar as ideologias das frações da burguesia que investem na comunicação social. Sem ser necessário muito capital, adquire-se muito “capital” político. A viragem para a direita não pode ser desligada do controlo crescente da comunicação social por parte de exploradores turísticos, como Mário Ferreira, ou de gente com ligações familiares à extrema-direita, como Marco Galinha. Este último é tão poderoso quanto descarado na sua interferência, como denunciado por Sandra Monteiro num informativo artigo no Le Monde diplomatique – edição portuguesa

Termino por agora esta série, dando outra vez a palavra a Sandra Monteiro, diretora de um jornal cooperativo e em contracorrente (faz-se o melhor que se pode com pouquíssimos meios...): 

 “Não nos escondemos atrás de uma concepção neoliberal dos media, nem da democracia, para achar que as nossas páginas são meros espaços onde cabe tudo, sejam opiniões infundadas ou comentários ofensivos e discriminatórios (racistas ou sexistas, mas também classistas…), sejam formas de corrosão da racionalidade pela arbitrariedade. Não somos um espaço, muito menos neutro. Somos um projecto, exigente com a verdade e respeitador do jornalismo como garante da democracia.”

1 comentário:

  1. Apesar do peso crescente das redes sociais ( podendo ser ainda mais perigosas...) sem dúvida que a "manipulação" da informação pelos grandes mídias prepara o terreno e "adoba" os comportamentos políticos/ sociais que invadem o nosso presente : populismo, regressão nos direitos laborais/sociais, idolatria do consumo, do sucesso individual, da "fábula" da meritocracia, da criação de riqueza para a sua "distribuição quando deus quiser", enfim a adulação do liberalismo com menos liberdade para quem perde o comboio da dita riqueza...

    ResponderEliminar