Falta cerca de semana e meia para o dia das eleições e muita coisa pode ainda acontecer. Porém, se considerarmos o conjunto de sondagens realizadas até ao início da campanha, relacionando-as com os resultados das legislativas de 2019, parece haver pouca margem para a narrativa de «fim de ciclo», pelo menos ao nível da relação de forças entre esquerda e direita. De facto, associando a esquerda ao conjunto de partidos que pode fazer parte de um processo de convergência nesse campo (incluindo agora o Livre, que começou entretanto a aparecer nas sondagens), constata-se uma redução do seu peso relativo em cerca de 2,5 pontos percentuais entre 2019 e janeiro de 2022 (ou seja, de 56,6 para 54,0%), com a direita a aumentar aproximadamente 8 p.p. no mesmo período, mas a não conseguir atingir a maioria (ficando-se por cerca de 43% em janeiro de 2022).
Aliás, se considerarmos apenas a evolução desde setembro de 2021, a diminuição das intenções de voto à esquerda passa a rondar os 1,5 pontos percentuais, com a direita a aumentar apenas cerca de 2 p.p. E se for tida em conta a evolução mais recente, entre as médias de dezembro de 2021 e janeiro de 2022, verifica-se até um atenuar dessas tendências, com a direita a aumentar apenas 0,7 p.p. e os partidos à esquerda, no seu conjunto, a inverter o declínio, passando de um total de 51,4 para 54,0% (ou seja, um aumento a rondar os 3 p.p.). No período considerado (setembro a janeiro), dezembro é o mês em que a direita alcança o seu melhor resultado global (44,2%), decaindo contudo 1,3 p.p. no mês seguinte (ao mesmo tempo que a esquerda recupera, entre dezembro e janeiro, 2,6 p.p.).
Não se sabe o que estará por detrás desta aparente inversão na tendência de subida da direita a partir do início de janeiro. Mas uma das explicações pode residir, sobretudo no caso do PSD e da IL, no gradual desvelar da verdadeira natureza dos seus programas, com a ajuda dos debates televisivos, que vem romper com uma certa ideia de moderação a que tem sido associado Rui Rio (vejam-se agora as propostas concretas orientadas para a privatização da saúde ou da segurança social) e exacerbar a fúria liberal de Cotrim e da IL (bem patente na proposta de Taxa Plana no IRS). Ou seja, a mostrar que afinal Passos está vivo, tendo politicamente reincarnado a dobrar.
Boa. Agora só tens de repetir esta análise considerando o facto político mais revelador do fim de ciclo: o PAN pode fazer parte da soma dos partidos da Direita, bastando para isso a Rui Rio dar à Inês Real uma ou duas medidas simbólicas e prometer não ultrapassar as "linhas verdes" do PAN. EM termos percentuais, parece que não muda muito, mas como sabemos o que conta são os deputados, e os círculos eleitorais urbanos podem fazer da IL e do PAN os "king makers" de Rui Rio. Ou mesmo tempo, pequenas alterações de votos no interior do país podem mudar aqui e ali um deputado do rosa para o laranja, na quantidade suficiente para o António Costa até ganhar em votos, mas ficar atrás da Direita em deputados, e com essa mesma Direita ao alcance da maioria perante a adição do PAN. Reparem que nem o CDS torna a coisa incompatível, pois o PAN continuou sempre a apoiar um governo que deu vouchers para a compra de gasóleo e a manter o financiamento público da tourada. Estamos perante um "queijo Limiano" em versão biológica, ou melhor, animalista.
ResponderEliminarVem aí a Animalgonça, ou Gerinbesta, que é a soma dos animalistas com os animais (fascistas) e seus amigos... É que é preciso ter também outra coisa em atenção, já que está a olhar tanto para as sondagens: o voto no PS é sempre mais baixo, o voto no PSD tem sido mais alto, e o voto indeciso à Esquerda pode desinchar em PS em favor dos seus ex-parceiros, agora que está óbvia para todos a FARSA que foi aquele abanar do orçamento no debate com Rio: "ou me aprovam isto, ou me aprovam isto, não faço cedências, e vou voltar a pôr este orçamento a votos, especialidade para quê (?) se já disse que não era possível negociar mais nada à Esquerda" - aliás aqui já se nota um fim de ciclo, mas é no do comentariado que, após andar um mês em finais de Outubro e Novembro a falar do "eleitorado que vai castigar a Esquerda", agora já nem tem coragem de chegar perto dessa narrativa. Se já na altura saiu uma sondagem a dizer que a maioria (+30%) culpava o PS pela crise política, imagine-se o que diriam agora os números se se repetisse a pergunta... Quantos eleitores é que desmobilizaram do PS devido à arrogância de Costa? Eis a questão para dia 30, que pode confirmar a mudança de ciclo.
Neste início de 20/01/2022, a dez dias das eleições e com a campanha já nas ruas, as estimativas divulgadas em https://sondagens.rr.sapo.pt são ligeiramente diferentes: PS com 38.23%, PSD com 29.77%, Chega com 7.3%, BE com 6.09%, CDU com 5.22%, IL com 4.62%, PAN com 1.91%, CDS com 1.22% e Livre com 1.18%.
ResponderEliminarVejamos então as possibilidades, agora que António Costa assumiu a sua vontade de não repetir acordos de "geringonça " à esquerda:
a) O plano A de Costa - maioria absoluta do PS sozinho (38.23%) - não parece possível;
b) O plano B de Costa - maioria absoluta da troika PS + PAN + Livre (41.32%) parece difícil de concretizar;
c) O plano C de Costa - maiorias pontuais PS/PSD, nomeadamente para garantir a aprovação de propostas de orçamentos do estado, numa governação à Guterres - é concretizável no curto prazo, mas só dura enquanto o PSD deixar.
Os planos de Costa só parecem estar a ser particularmente bem sucedidos no que se refere a um certo esvaziamento do BE (os 6.09% de agora face aos 9.5 % de 2019), podendo este partido perder mais de 1/3 do seu eleitorado até às eleições seguintes...
Entretanto, a campanha anda mesmo nas ruas:
https://expresso.pt/eleicoes-legislativas-2022/ps-nao-quer-geringonca-mas-vai-poder-livrar-se-dela-oliveira-lanca-a-duvida/
A. Correia