quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Bem sei, nada sei


Um gráfico ainda pequenito...

Bem sei que há uma imensa incerteza, em face das velhas e das novas variantes, a expressão epidémica do obscurantismo, indissociável do individualismo possessivo no primeiro mundo, mas sobretudo da desigualdade no acesso a vacinas nos outros mundos. E isto num contexto de direitos de propriedade dita privada míopes e injustificados, até tendo em conta o planeamento e os recursos públicos sempre mobilizados.

Bem sei que existe um necessariamente discricionário princípio da precaução, indispensável para enfrentar a incerteza nestes casos, onde mais vale estar vagamente certo do que rigorosamente errado, para retomar Keynes, sempre útil para nos ajudar a pensar na ligação entre conhecimento precário e acção pública decidida.

Agora vem o mas. Mas pergunto a quem sabe e não é só retórica: será que enquadrar a nova vaga pelo prisma das anteriores, tendo em conta que a população adulta está vacinada, não terá efeitos perversos, levando a uma descrença em relação à principal medida de saúde pública?

A comunicação social tem responsabilidades neste contexto de incerteza. Até um jornal de referência como o Público fala sobretudo de contágios, remetendo a realidade mais dramática das mortes e dos internamentos em UCI para um lugar demasiado discreto, incluindo na sua excelente infografia.

Por exemplo, informam-nos que ontem tivemos o maior número de contágios desde 5 de Fevereiro, mas secundariza-se o número de mortos nesses dias: 212 contra 17. Bem sei que estávamos a descer uma onda avassaladora, mas convém não carregar nas tintas para vender jornais. O medo assim induzido é sempre muito mau conselheiro. As vacinas, o SNS, a escola pública ou a segurança social protegem-nos, têm de nos proteger. A confiança é sempre social, porque é parte de um processo institucionalizado.

2 comentários:

  1. Caro Joao Rodrigues,
    O contexto mudou radicalmente desde que a maior parte da populacao passou a estar completamente vacinada. Aquilo que eu arengava por estas caixas de comentarios acerca do valor R e confinamentos deixa de ser valido mp contexto de uma populacao completamente vacinada.

    Sucede porem que as vacinas sao imperfeitas. Nao induzem imunidade esteril e nem sequer se estao a revelar assim tao boas a quebrar cadeias de transmissao. Sao eficazes a prevenir mortalidade e ha duvidas sobre por quanto tempo a proteccao conferida subsiste.
    Estas imperfeicoes misturadas com as caracteristicas do virus (virus-ARN com grande capacidade mutagenica) significa que as vacinas estao a exercer pressao selectiva sobre o virus sem se saber bem em que novo estado de equilibrio chegaremos.

    A melhor previsao de longo prazo que lhe posso dar e uma analogia imperfeita: nas aves de producao ha tambem um coronavirus com grande significado clinico, o Virus da Bronquite Infecciosa - aparte importante aqui: e um virus taxonomicamente muito distinto do COVID, diferente Genero - GamaCoronavirus enquanto que o COVID e um BetaCoronavirus NAO TRANSMISSIVEL a Humanos - em aves de producao e tambem uma pandemia de grande importancia nos sistemas de producao.
    A producao aviaria mundial moderna cresce e floresce num contexto de permanente corrida armada biologica entre vacinas e novas versoes do virus em circulacao e movimento de animais vivos sob condicoes de certificacao veterinaria que impoem um custo a esses movimentos.
    No caso das aves, diferentes variantes do virus tem presenca geografica heterogenia o que significa que cada regiao do globo precisa de um vacinas especificas para as variantes predominantes no seu territorio.

    Centrando-me na sua pergunta:
    "Mas pergunto a quem sabe e não é só retórica: será que enquadrar a nova vaga pelo prisma das anteriores, tendo em conta que a população adulta está vacinada, não terá efeitos perversos, levando a uma descrença em relação à principal medida de saúde pública?"

    Se se esta a referir a confinamentos de larga escala em paises com taxas de vacinacao altas a resposta e nao, o enquadramento operacional de 2020 nao e mais valido porque o contexto nesses paises mudou muito.
    Mas isso tambem nao quer dizer que a pandemia ja acabou. Que o enquadramento operacional actual deveria ser algo muito semelhante ao de 2019...
    Agora urge tentar preservar a eficacia das vacinas - num contexto em que o mundo desenvolvido esta aparentemente contente com uma situacao de acesso desigual as vacinas entao tem de se contentar com a consequencia que essa desigualdade acelera o processo natural de evolucao do virus - as mutacoes sao uma inevitabilidade, mas a velocidade esta correlacionada de forma positiva com a quantidade de virus em circulacao.
    A emergencia de novas variantes poderia ser desacelerada significativamente se a cobertura vacinal mundial fosse maior. Nao o e. Nao o sera com os sistemas de propriedade intelectual em vigor.
    Assim sendo, estamos no reino das "second best choices" - e necessario desacelerar a propagacao de novas variantes para dar tempo de resposta aos sistemas de saude e dar tempo para ver se as vacinas existentes precisam de adaptacao.

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  2. Tudo indica que este coronavírus veio para ficar e ficou mesmo. As vacinas, o grande antidoto para as doenças infeciosas (víricas em particular) e a nossa inteligência imunitária, conseguirão domesticar o "bicho". Provavelmente iremos ter de nos vacinar anualmente, particularmente a população de maior risco, para diminuir a morbimortalidade de um novo agente infecioso.

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