É um clássico. Tem sido um clássico.
A direita vai a votos gritando por urgentes reformas e culpam a esquerda da estagnação em que Portugal vive há duas décadas. A direita liberal culpa também PS e PSD, a quem apelidam de centro-esquerda...Mas todo o espectro da direita tem a mesma táctica.
Primeiro, omite o diagnóstico sobre as causas da estagnação. Às vezes, atribui-a levianamente à dita elevada despesa pública ou à excessiva carga fiscal ou ao elevado número de ministérios ou, mais à direita, ao estatismo que confunde com socialismo. Mas não há um diagnóstico consistente. Segundo, essa ausência de diagnóstico permite-lhe omitir a sua própria responsabilidade nessa estagnação. Terceiro, e na falta de diagnóstico, omite quais as reformas que defende para o ultrapassar.
Sempre foi assim. Talvez Cavaco Silva tenha escapado a esta regra. Mas antes de ser governo em 2002, Durão Barroso gritou que "o país está de tanga" e, em Julho de 2002, disse que o país (!) "viveu acima das suas possibilidades, que gastou o que tinha e sobretudo o que não tinha, porque o Governo [Guterres] prometeu tudo a todos"...
Durão Barroso: - Herdámos, assim, uma situação particularmente difícil, com um défice orçamental galopante, desequilíbrios externos incomportáveis, ausência de investimento, um Estado que se transformou num peso morto para a economia e num factor de asfixia para a livre iniciativa dos portugueses"...E nada fez, porque aqui estamos, com o mesmo discurso. Ou melhor fez: o Código do Trabalho de 2003 que embarateceu o factor Trabalho e fragilizou os sindicatos para aumentar a produtividade, mas - que estranho! - não resolveu o problema. José Socrates prometeu o mesmo, e nada fez. Ou melhor fez: novo Código do Trabalho de 2009. E - que estranho! - nada resolveu. Em 2011, Passos Coelho e Paulo Portas enganaram o povo, assustando-o com a bancarrota de José Sócrates que nunca existiu, mas garantindo a todos que não despediria ninguém nem cortaria salários e vencimentos... E nada fez. Ou melhor, fez: despediu, cortou e fez um novo Código do Trabalho de 2012. E - que estranho! - nada resolveu. E agora, mais uma vez, tudo volta ao mesmo de sempre.
O Sr. Telmo Correia (CDS-PP): — Muito bem!
O Orador: — Governar é decidir. E não perdemos tempo a decidir. A decidir, desde logo, uma estratégia capaz de fazer frente à difícil situação do País.
O Sr. Guilherme Silva (PSD): — Muito bem!
O Orador: — Essa estratégia assentou, e assenta, em três eixos essenciais: primeiro, rigor orçamental e saneamento das finanças públicas; segundo, incentivo à produtividade e ao crescimento da economia; terceiro, realização de reformas de fundo há muito reclamadas mas sempre adiadas. Esta era, e é, a estratégia. Cumprimo-la com rigor, vamos continuar a fazê-lo com firmeza, com coragem, sempre, e, cada vez mais, com coragem e com determinação.
A direita queixa-se da subsidio-dependência, mas esquece-se de que os salários são demasiado baixos para serem "competitivos" com os apoios sociais. Queixa-se da falta de mão-de-obra, mas esquece-se de defender um aumento de salários para tornar os empregos mais interessantes, de forma a impedir a emigração. Queixa-se dos salários baixos, mas esquece-se de que defendem o corte nas compensações por despedimento ou do subsídio de desemprego, cortes esses que facilitam que desempregados aceitem salários baixos (FMI dixit). E esquece-se de criticar quem contrata imigrantes a preços miseráveis. Queixa-se de que os aumentos salariais estão acima da produtividade (o que nem tem sido verdade), mas nada dizem sobre como se faz subir a produtividade nacional, se não for cortando salários ou pedindo mais dinheiro... ao Estado. Queixa-se dos impostos (veja-se o texto anterior do José Gusmão), mas esquece-se de dizer quem gostaria de beneficiar no seu "choque fiscal" e como é que isso seria eficaz para aumentar a produtividade. Queixa-se da elevada despesa pública, mas esquece-se de dizer que prestações sociais ou quantos funcionários gostaria de cortar e, sobretudo, esquece-se de dizer qual o efeito a prazo da desalavancagem dos gastos públicos na economia (será que é uma forma de tornar os baixos salários "mais competitivos" com os apoios sociais?). Queixa-se da dita rigidez das leis laborais, mas não diz o que quer fazer para a tornar ainda mais mole do que é e se isso não baixará ainda mais os salários. Queixa-se da elevada dívida pública ou externa, do estatismo, mas não diz o que fazer para a reduzir, se não cortar nos défices orçamentais e, mesmo assim, sem nada dizer sobre como o fazer. Queixa-se da subsidio-dependência...
E entra-se em loop.
Corolário: a direita em Portugal sempre agravou a situação nacional e nada diz sobre o que fará de diferente do que foi feito, nomeadamente face às políticas enquadradas no Menu euro-liberal. E isso por duas séries de razões: a primeira, porque foram as políticas euro-liberais que nos trouxeram aqui, porque as ideias euro-liberais são um instrumento de poder social e político e não de eficácia económica; a segunda porque todos eles sabem que, no momento em que especificarem o seu programa, perderão votos, muitos votos.
As ideias da direita são, pois, um logro.
Ainda hoje, o jornal online Observador promove uma crónica (de André Serpa Soares) que, perante o desastre em que vivemos - "quem é que vive com 581,85 euros por mês?"
- critica PS e PSD e, em linha com o IL, acha que é com mais liberdade e menos Estado
que se resolve o problema. Mas mais uma vez, nada diz sobre o que fazer! A
sua proposta é propor que alguém proponha ideias...
"São precisas e urgentes novas ideias, novas políticas, novos atores" (!!)
Embora sem ideias claras, há uma coisa que todo o espectro de direita sabe e quer. É que há uma reforma que os pode ajudar: uma reforma eleitoral que faça com que os seus partidos partilhem demoradamente o poder, sem instabilidades maiores.
De repente, não se fala de outra coisa senão de "bloco central" ou "diálogo PS/PSD" ou "acordo PS/PSD" ou coligações PSD/CDS/IL. A RTP muda o formato do programa 360 e os dois primeiros convidados - Francisco Assis e e o ministro Augusto Santos Silva - acham que é necessário continuar o entendimento que já existe entre partidos "moderados". Diz Santos Silva:
"Sempre nos entendemos em políticas tão importantes como a política de defesa, externa, europeia, os fundos comunitários (que resulta de um acordo entre PS e PSD), a descentralização (teve um acordo entre o PS e PSD)... [esqueceu-se da política laboral!] Porquê? Porque em áreas de soberania e em que a continuidade das políticas é um factor decisivo, é bom que os partidos que ocupam o centro do sistema - vamos dizer assim, moderados, centro-direita ou centro-esquerda - se entendam. Isso não quer dizer que façam parte do mesmo governo. Pelo contrário: não devem fazer. Para quê? Para que alternância possa funcionar..."
Ou seja, qualquer que seja o vencedor, a política de continuidade será sempre a mesma!
No programa da Antena1 Geometria Variável - todo ele um bloco central, já que os comentadores permanentes são Carlos Coelho (PSD) e Nuno Severiano Teixeira (PS) - o convidado Francisco Pinto Balsemão, militante do PSD, defendeu-o claramente:
"O mais importante são as reformas que não são feitas: a lei eleitoral que não acontece e que tem de acontecer; (...) Circulos uninominais e um círculo nacional: está estudado, está feito". Só falta "perguntar ao PS porque o PSD está de acordo".
E está, de facto, de acordo. Em julho passado, Rui Rio apresentou essa proposta. E com os melhores argumentos "técnicos": “Um dos objetivos é atenuar a diferença que existe entre o litoral e o interior” [onde o PSD reina?], “Aproximar o eleitor ao eleito” [algo próximo do voto maioritário?]. “Aumentar a representatividade relativa do interior” [onde o PSD reina?]. “Não prejudicar os pequenos partidos” [que já foram prejudicados atrás?], sendo que a redução de deputados "far-se-á à custa dos dois principais partidos". Na volta, reduz-se o número de eleitos por círculo, reduz o número de deputados (de 230 para 215), em nome dos ganhos de "eficiência" e da diminuição "o risco de empates e de ingovernabilidade".
A própria IL defende o mesmo no seu dito programa que é bem mais um manifesto:
"Alteração do sistema eleitoral obsoleto. Facilitando candidaturas independentes, o voto deslocalizado ou eletrónico, introduzindo círculos uninominais e um círculo nacional, com maior representatividade das comunidades portuguesas".
E todos se esquecem de dizer que todas as reformas eleitorais em Portugal, feitas em cima do joelho e sem consenso, foram feitas para afastar alguém do poder.
E as ideias? Sobre as ideias, as boas ideias que mudem Portugal, que evitem a estagnação, o seu discurso é o mais... obsoleto e vazio! Nas ideias, a direita tem um enorme défice.
Mas em democracia deveria ser pelas ideias que tudo deveria começar. E não - como parece! - acabar por fechar o sistema às outras ideias.
Diariamente os media falam em candidatos a primeiro ministro,nunca se referem a eleições legislativas,PSD e PS agradecem,sabem que isso os beneficia.
ResponderEliminarE eu à espera que se seguissem as ideias da esquerda exemplificadas pelas acções de SEIS anos de geringonça!!!
ResponderEliminarA política tem sido um palco para disfarçar a ideia que no fundo querem todos o mesmo. Obviamente que o partido comunista, o bloco e o PS querem diferente do PSD, CDS ou do Chega mas nenhum dos partidos parece ter um projecto para a dignidade e isto é de uma enorme gravidade, a constituição define de forma muito clara o que deve ser Portugal e o que é ser um país, a legitimidade democrática não advém de uma qualquer forma de ditadura.
ResponderEliminar..Talvez o grande guião/modelo das reformas estruturais...(seja lá o que isso for).. era o guião do Paulo Portas para a reforma do Estado.Era a ideia de que o programa de governo era o programa da troika ou até ir mais longe.
ResponderEliminarDá sempre jeito ter à mão uma "bengala" para contar histórias aos desatentos e,ainda, mais importante, nunca dizer alguma coisa sobre as ditas reformas.
Claro que há uma dificuldade base:enquanto não se falar a sério sobre a politica monetária e as limitações impostas pelo atual modelo de equilíbrio orçamental, não vamos a lado nenhum.
A abstenção em Portugal é uma maioria e é uma maioria que deixou de acreditar que a política altera a sua condição objectiva.
ResponderEliminarCaro José,
ResponderEliminarTem toda a razão: falta uma Geringonça que ponha em prática uma política verdadeiramente estrutural que quebre a força centrípeta para a estagnação e empobrecimento. Nesse capítulo, ainda falta muito caminho para ser andado, nomeadamente na cabeça dos socialistas, mas creio que um dia lá chegaremos.
Caro João
ResponderEliminarQuando diz «falta muito caminho para ser andado, nomeadamente na cabeça dos socialistas, mas creio que um dia lá chegaremos», ficam-me duas dúvidas:
- Vão os 'socialistas' tornarem-se socialistas revolucionários, ou
- Vão os capitalistas transformarem-se em cooperatiistas?
Caro José,
ResponderEliminarNão feche as opções aos socialistas. Há tantas possibilidades para pessoas bem intencionadas com o bem colectivo...
A culpa da estagnação é da “extrema-esquerda”, o BE e PCP são culpados pois durante os seus governos impuseram um deturpado socialismo (nada a ver com o “socialismo” genuíno do Partido “Socialista”) tão asfixiante que os empreendedores entraram todos em depressão, deixaram de ter motivação e carcanhol (o socialismo inquinado do BE e PCP tudo abocanhou) para empreender!
ResponderEliminarIsto é a inegável História do pós 25 de Abril de 1974!
Não tentem agora empurrar as culpas para os inocentes PS, PSD e CDS!
Francisco Assis e Augusto Santos Silva estão na vanguarda da defesa dos interesses dos trabalhadores! O esforço destes dois anjos - e exemplos máximos do “socialismo” puro - no que diz respeito à causa da classe trabalhadora é irrepreensível!!!
Caro João,
ResponderEliminarO bem colectivo será obra dos que prezem a sociedade mas respeitem as diferenças e as saibam raiz do que é humano; não me incomoda que se digam socialistas por a todos visarem prover.
Os socialistas da igualdade e do 'homem novo' dividem-se entre idiotas e velhacos, e tão perigosos são uns como outros; então, socialismo só há um, e é totalitário.
Caro José,
ResponderEliminarNão coloque a ênfase nos socialistas quando eles apenas pretendem mudar uma sociedade desigual, que trata os seus iguais uns como escravos outros como emanação da divindade. Eu tenderia a olhar mais para o mundo que obriga à rebelião para gerar algum equilíbrio e.... igualdade.
Quanto à sua visão dos socialistas, parece-me muito simplista e arrisca-se a criar falsas sínteses. É como dizer que o mundo se divide entre carecas e não carecas. Até porque a sua dicotomia tende a justificar a desigualdade - imposta! - já que a alternativa seria seempre uma ditadura! Cuidado...