sexta-feira, 3 de agosto de 2018
Moralidade e política amoral
Sobre o último caso, que creio encerrado (erros cometem-se e corrigem-se), perdura uma ideia que se vai afirmando quase sem discussão.
É a ideia de que o debate político deve abster-se de considerações de ordem moral; a ideia de que o debate político deve abdicar da moral, e abdicando dela, supõe-se, a política deve ser amoral. Ao mesmo tempo parece emergir um policiamento da linguagem, como se estas questões se dirimissem através de uma autoinfligida, ou mesmo imposta, disciplina, havendo quem se insurja contra o uso de termos como especulação, despejos, poder, interesses, capitalistas (depreende-se que também trabalhadores, embora já em desuso com a força do novo léxico dos colaboradores e afins). Só falta mesmo proibir o uso de expressões como capitalismo ou neoliberalismo. Ficam as “políticas públicas”, espaço tecnocrático onde se opera uma pretensa separação entre factos e valores. Ilusão posta em causa há muito na filosofia e em outros estudos da ciência, já que factos e valores estão entrelaçados.
Esta discussão também já foi travada na economia a propósito dos mercados, supostamente neutros, cuja única missão seria a de realizar uma afetação eficiente de recursos perante a oferta e procura, que se tomam como um dado, dispensando-se a discussão das regras políticas que estruturam os próprios mercados, bem como os pontos de partida e de chegada dos seus vários intervenientes.
Que esta discussão esteja a ser transposta para o debate explicitamente político, parece augurar um novo momento de imperialismo económico neste domínio, em que a política se deve remeter à discussão pretensamente técnica dos custos e benefícios pecuniários de propostas alternativas, deixando de lado as questões do poder e dos valores.
Contudo, as políticas, por definição, visam explicitamente produzir mudanças institucionais e logo têm impacto sobre as relações de força sociais e sobre os valores que são nutridos ou ameaçados.
Como nos mercados, convocam-se questões de economia política e de economia moral, porque se decide o modo como se organiza a vida em sociedade, e logo os interesses que são protegidos e os que são postos em causa (proprietários versus inquilinos, por exemplo). Mas as políticas também veiculam valores (de lógicas mais individualistas às mais coletivistas).
A eliminação no debate político das questões de poder e dos valores e o policiamento da linguagem só servem o status quo. Compreendo que certa direita defenda a política pretensamente amoral, mas a esquerda não se pode deixar enganar.
Pode entender-se que há uma diferença entre as propostas de políticas e os comportamentos dos políticos que as defendem, mas esta separação é tão artificial quanto imoral.
Quanto à chamada violência verbal das esquerdas, fica a pergunta: quais são então as palavras adequadas para denunciar a violência deste sistema?
Os esquerdalhos preocupados com o policiamento da linguagem, quando são estes os maiores polícias da Língua. As mulheres já não abortam (isso é feio e sujo), fazem IVGs (o que está na moda e é asseado); já não há pobres mas há "desfavorecidos"; já não há cegos mas há "invisuais"; já não há pretos mas há "negros"; não há ciganos mas há "povo roma"; já não há sexo, há "género"; não há homossexuais, há "gays & lésbicas", etc.
ResponderEliminarE claro que os direitalhos também têm uma série de eufemismos: "investidor" para especulador; "direitos colaterais" para matança de civis, "políticas de ajustamento" para austeridade, etc.
Cara Ana Santos,
ResponderEliminarConsidero de toda a pertinência o seu texto. Porém, contudo, no entanto, fica-me uma dúvida para a qual muito gostaria de ler o seu comentário, e que é a seguinte.
Dando então de barato que politica e valores são duas faces da mesma moeda, quais os valores morais que se deveriam constitui como crivo para filtrar os politicos?
Cump.
MRocha
Ás 9 e 32 :
ResponderEliminarDe novo o perturbado pimentel ferreira com o seu perturbado discurso. Cada vez mais perturbado,cada vez mais mais reaccionário
E cada vez mais cobarde, tentando fazer passar um discurso de trampa como se de outra coisa se tratasse
Atente-se nisto:
"já não abortam (isso é feio e sujo), fazem IVGs (o que está na moda e é asseado).
IVG? Na moda? Este tipo é um idiota que insulta as mulheres em geral
Asseado? Este tipo quer que as mulheres abortem nas condições em que abortavam no tempo em que o tinham que fazer na clandestinidade.
Que nojo
Um bom texto, Ana Santos. Sucede que há duas questões que não refere.
ResponderEliminarPrimeiro, numa sociedade democrática, ninguém tem o monopólio da moral (isso fica para as sociedades teocráticas). Convém, por isso, ter algum cuidado no respeito que é devido às posições dos outros, em lugar de os considerar todos especuladores ou exploradores ou o que seja à partida. Como bem lembra Rui Tavares, cuja crónica penso que evoca mas a quem não se refere explicitamente, no que faz mal, as questões muito raramente podem ser vistas a preto e branco.
Mais, corre-se o risco, no dia em que se mete a pata na poça e isso vai inevitavelmente acontecer, vide o caso de Robles (e não, aquilo não foi apenas um descuido ou erro como lhe chama) de se ser acusado de hipocrisia e de se cair no ridículo. Aliás, a sátira, que é uma forma de discurso moral, é excelente para contrabalançar a violência verbal: https://www.tsf.pt/politica/interior/ricardo-araujo-e-as-explicacoes-de-ricardo-robles-9655703.html. Nao há nada que resista a uma boa gargalhada e é por isso que os ditadores têm tanto medo dela...
E depois, a política meramente moral redunda na impotência. Quem não é capaz de transigir um pouco com os seus valores não é capaz de conseguir o que quer que seja, salvo se tiver uma maioria absoluta (e mesmo aí há a CRP e bem a impedir as tentações totalitárias).
E quem não indica caminhos alternativos (refiro-me a propostas políticas baseadas em números e em estudos) e só indica objetivos, tarde ou cedo acaba afastado do poder por manifesta incompetência se lá chegar de todo...
Rui Tavares e Robles
ResponderEliminarEis as balizas ideológicas de Jaime Santos. O primeiro como exemplo do não preto nem branco.
O segundo como exemplo dos exemplos que enchem a gaveta de ex-sociais-democratas que se bandearam para os braços dos neoliberais. Com aquele cheiro característico que consome um oportunista ( ou em muitos casos um corrupto) lá para as bandas do PS
Repare-se contudo como JS foge do que é essencial no post e se afunda mais uma vez em duas coisas:
- O justificar que essa história dos "valores" é para ir à bolina, de acordo com o vento, tentando arranjar assim uma espécie de justificação para a traição de quase todos os partidos sociais-democratas da europa. Não se sabe se JS sabe o que são valores. Mas sabe-se que o oportunismo político é indisfarçável e a auto-justificação enjoativa
- O insistir na missa cantada da não existência de "caminhos alternativos", coisa em que afunila para o argumentário dos TINA, aí de braço dado com a tralha neoliberal
Lindos caminhos estes os trilhados por JS, não há dúvida. Nada que uma boa gargalhada não permita pontuar
Caro Jaime Santos, recomendo a leitura deste artigo que faz uma separação clara entre Lei, Ética e Moral(costumes).
ResponderEliminarRogo-lhe que leia
https://www.veraveritas.eu/2014/08/lei-etica-e-costume.html?m=1
Não.
ResponderEliminar8 e 54?
Mais coisas do blog armadilhado ,em que quem lá vai fica hackeado
Ninguém nega que os valores defendidos pelas diversas ideologias e o poder que em final é o alvo de todas elas devam ser discutidos, e a Política sempre se define em relação a uns e outro.
ResponderEliminarE se a moral se reclama de valores, nunca é ideologicamente neutra, mas vai além da ideologia e julga a pessoa na sua relação com os seus valores e os seus actos.
…
É também evidente que a subversão de valores tem na linguagem um dos seus mais eficientes instrumentos. A esquerdalhada faz desse instrumento um uso nauseante, ao ponto de não raro obter efeito contrário aos seus desígnios, mas ainda assim há que reconhecer que a idiotice da classe política assegura-lhe um palco privilegiado.
Desde os ‘portugueses e portuguesas’ às siglas a metro e em língua estrangeira, haverá para todos os gostos. …
Vejamos e assim passa.
Política é ética e ética é moral.
ResponderEliminarSe alguém acredita que faz política sem moral ou sem ética, então é porque está a fazer política segundo alguma ética ou moral alheia. É a ética que permite criar e gerir os espaços de cinzentos, não reduzindo tudo a um absurdo branco e preto. Também é a ética que permite gerir o desfazamento entre a moral desejada e a moral corrente, abrangendo lei e costumes.
É por isso que, perante o caso Robles, nem a especulação deixou de ser má por ter sido praticada por alguém de esquerda, que exercia um cargo público em nome de um partido que diz combater a especulação, nem se justificam os arrufos moralistas que, levados ao limite, significariam que só poderia ser de esquerda quem fosse escravo fugido ou uma espécie de eremita na selva. Querer transformar o mundo não pode implicar que se mantenha um alheamento desse mesmo mundo tal como ele é. Até porque quem está para transformar sabe que é preciso ganhar outros para convergir e moldar esse projecto de transformação, e não ficar-se numa gruta agarrado a uma bandeira.
"refiro-me a propostas políticas baseadas em números e em estudos"
ResponderEliminarPodem ser disparates como o do Alessina, do Rogoff, do Krugman e quejandos? É que as propostas baseadas em números que continua a apoiar continuam a falhar mês após mês após mês, e o FMI, o BCE, a OCDE e o BIS também o apontam, a medo em estudos meio perdidos. E os alemães mais reáccionários também não acreditam (pelos motivos errados, mas pronto). Reformas do Euro, só para propaganda eurófila.
Mas, apesar disso, também não faltam estudos para alternativas, só não encontra porque não procura.
Vitor pimentel ferreira volta mais uma vez ao debate. Desta vez em simplesmente vitor..
ResponderEliminarPrimeiro como anómino. Depois em formato rogatório . Finalmente com aquele jeitinho à vitor. Assim com aquele maneirismo ético "que permite gerir o desfazamento (sic) entre a moral desejada e a moral corrente"
Dá direito à gargalhada, lá isso dá
"Esquerdalhada"?
ResponderEliminarJose faz desse "instrumento" um uso nauseante, ao ponto de não raro obter efeito contrário aos seus desígnios
E está tudo dito
Não Vitor, política não é ética!
ResponderEliminarNem ética é moral!
É favor não misturar os granéis.
Em caso de dúvida basta consultar o Google. :)
S.T.
É confrangedor ver o nível da discussão aqui no blog! Falo do post claro. Tirando os ignorantes, todos sabemos que a política e a economia não são neutras em relação aos valores e moralidade, a ideologia socialista e a liberal têm dos seus pontos axiais diferenças de valores ou morais. A pluralidade moral existe e ninguém tem a resposta certa, porque isso não existe! Dai até ser moralista não tem nada que ver :) É preciso estudar mais e substituir a retórica e o sofisma pela procura da verdade e honestidade intelectual!
ResponderEliminarÉ isso mesmo, anónimo das 22 e 29
ResponderEliminarÊ preciso mesmo estudar mais, muito mais e seguir o conselho de alguém aí de cima, nem que seja ir procurar no Google
É ir estudar o que é isso de moral. E substituir a retórica e o sofisma de quem de forma confrangedora não sabe do que fala
Não esperava que houvesse reacções nem que fossem estas, mas em face de tão pedagógicas recomendações e humildes apreciações,
ResponderEliminar1) esclareço que este vítor não tem nada a ver com o tal de pimentel ferreira.
2) é evidente que a afirmação "política é ética e ética é moral" é simplista e manifestamente atropela a delimitação académica desses conceitos.
3) fui ao google. Decerto que é insuficiência minha, mas as primeiras entradas que encontrei não delimitam propriamente os três conceitos nem os definem de forma a que não se sobreponham. Algum dos doutos eticistas e moralistas (no sentido académico) experimentou?
4) desafio os doutos recomendadores e conceituados conceptualistas a colocar aqui uma definição clara, inequívoca e não polémica definição de cada um dos três conceitos. Até pode ser do google, não me importo.
5) por último, tirando o desastre conceptual que tão prontamente assinalarm, perceberam ou quiseram perceber alguma coisa do post? Esta pergunta é retórica. Não estou sinceramente à espera que percebam ou tentem perceber.
Foi a primeira vez que aqui escrevi e fiz logo alguns amigos. A gente vê-se.
Beijinhos, abraços.
Sim Vitor A primeira vez Vitor. A gente continua a ver-se Vitor Percebemos Vitor. O Google Vitor. Tchau e um queijo Vitor
ResponderEliminarCumprimentos ao SFF David Vitor Ferreira Pimentel, Vitor
Huummm...
ResponderEliminarDeixa cá ver... Há diferenças notórias entre fazer uma busca no Google em português e em inglês.
Experimentem buscar "moral definição" (sem as aspas) e depois "moral definition" (também sem as aspas) e vejam como o resultado é diferente mesmo descontando a língua.
E não é uma questão douta ou académica, longe disso. Mas há que reconhecer que é um campo onde é difícil estabelecer conceitos claros e estanques. E é fácil de facto, sem uma conversa que defina os termos utilizados semear a confusão ou ser mal interpretado.
Ética é usualmente definida como um conjunto de regras exteriores ao sujeito e que este é suposto aplicar nos seus relacionamentos. Eu faço um uso um pouco diferente do termo, no sentido que não é um conjunto de normas exteriores mas algo que procede da própria consciência do sujeito. A sua origem é interna mesmo que em certas fases apareça como externa.
Todos conhecem a história de Pinóquio e do Grilo Falante. (E não, não tem nada que ver com um ex-PM!)
Pois bem, na história de Pinóquio há um grilo a quem é atribuída a missão de impedir o Pinóquio de fazer disparates. É suposto ser a consciência do boneco e é por este sentida como algo de exterior.
Pode-se dizer que o Grilo Falante é a consciência ética do Pinóquio. Repare-se que não é dado ao Pinóquio um conjunto de regras, à moda judaico-cristã. A ética só é sentida como exterior porque não está integrada, mas regula de forma funcional as interações de Pinóquio com o mundo. Só no final da história se dá essa integração.
Repare-se também que a ética não é relativa, é absoluta nos seus julgamentos e não depende de factores culturais. E é dinâmica e funcional porque não assenta em regras rígidas mas numa consciência "em situação".
Por oposição a moral é relativa porque está associada aos conceitos de bem e de mal de uma colectividade. Nesse aspecto é relativa porque diferentes colectividades em diferentes momentos podem criar conjuntos normativos diferentes. A moral é algo de adquirido que se absorve no relacionamento social.
O passo seguinte é o domínio da lei, que são as regras explícitamente estabelecidas para o funcionamento de uma determinada colectividade.
Reparem que estes três níveis podem estar alinhados ou podem estar em contradição entre si.
Normalmente caberá aos chamados "reformadores sociais" a elaboração dos princípios morais que podem (ou não) ser depois plasmados em lei ou regulamento.
A política é a arte de administrar as sociedades humanas. E há muitas formas de o fazer. E como as sociedades humanas não são homogéneas coexistem diferentes normativos morais que grupos humanos tentam impôr uns aos outros.
A lei é aquilo que se entende ser necessário fazer cumprir para o funcionamento das sociedades humanas. Como tem que integrar múltiplos normativos morais representa uma espécie de mínimo múltiplo comum. Aquilo que se entende que todos no grupo têm que respeitar.
S.T.
Como é que se analisa este caso Robles perante este quadro conceptual que descrevi?
ResponderEliminarMuito simples.
Robles não infringiu nenhuma lei da Republica.
Nem sequer fez uso de nenhuma zona cinzenta usando influências indevidas nem quebrou nenhum normativo moral partilhado por toda a sociedade portuguesa.
Quebrou sim a moralidade de um grupo específico, mas que representa uma pequena fracção da sociedade portuguesa.
O que a consciência ética de Robles disse a Robles só ele sabe e apenas perante ela responde. É matéria privada de Robles.
O grupo dos "moralistas ofendidos" deve reflectir no seguinte:
Deve impôr aos seus membros uma regra de vida mais estrita do que a consignada na lei da República?
É justo criar interditos não consignados em regulamentos internos mas apenas em códigos implícitos?
É correcto exigir que um normativo moral seja aplicado antes de ser sufragado quer ao nível interno quer ao nível das leis da República?
Devem criar uma situação de desvantagem para os seus membros na luta pela prosperidade?
Como acham que a questão é vista por potenciais simpatizantes que talvez não estejam de acordo com uma moralidade assim tão estrita? Por exemplo, todos aqueles que tenham feito ou esperem fazer um bom negócio imobiliário.
Quem é que beneficia politicamente com uma discussão de moralidade paroquial que em qualquer partido de centro-esquerda, de centro ou de direita não mereceria senão uma enorme gargalhada?
Acham que algum militante de direita se inibirá de usufruir das amenidades do estado social mesmo quando politicamente o combatem? (Vão sonhando!)
Percebem que o objectivo é conquistar o apoio mais amplo quanto possível para o quadro moral ou ideológico que se defende por forma a transformá-lo em lei e não criar uma comunidade de "fieis crentes" onde só os puros podem entrar?
Percebem que existe um desfasamento temporal entre as regras sociais vigentes e as que se pretendem instituir e que o jogo funciona pelo acordo e não pelo exemplo?
Percebem porque é que noutro comentário classifico o assunto de "pepineira de sacristia"?
Mas se quiserem continuar a dar tiros nos pés, façam favor, prossigam...
S.T.
Ao Vitor do comentário de 7 de agosto de 2018 às 16:54
ResponderEliminarNão tenho maneira de verificar se de facto não tem nada a ver com a hidra "pinentel-aónio-cunhal-cunha-ulisses-vitor, mas talvez alguém tenha ferramentas para tal.
Se se der ao trabalho de ler comentários a posts anteriores compreenderá por que razão o seu pseudo fez franzir algumas sobrancelhas. LOL
Verifique, que é instrutivo.
S.T.