domingo, 15 de julho de 2018
Porno-riquismo
Há um novo estilo emergente de reportagens dedicadas ao porno-riquismo dos novos donos estrangeiros, ou como se o fossem, disto tudo. O porno-riquismo é a nova fase do consumo conspícuo num tempo de capitalismo com desigualdades pornográficas.
Atente-se na capa da última revista do Expresso: “Jantares de 550 euros por pessoa, relógios que custam mais de 20 mil euros, casas alugadas por 1750 euros ao dia. Este é o mapa de um país que está a aprender com os estrangeiros a amar o luxo”.
Um país, realmente. E não se esqueçam de repetir com o Primeiro-Ministro: não há dinheiro.
A reportagem – Portugal, império do luxo –, da autoria de Catarina Nunes, termina com uma pergunta que é todo um programa: “Será que entre a sofisticação de Lisboa e a autenticidade da província, Portugal é o barómetro mundial do novo luxo?”. Será?
E pelo meio temos pérolas de classe como esta:
“Esta cidade da vida de muitos estrangeiros, fervilha alheia à gentrificação, ao desalojamento dos lisboetas e aos preços exorbitantes do imobiliário. Miguel Guedes de Sousa concorda que a capital não pode perder a vivência genuína que cativa os estrangeiros, mas ‘não podemos ter pessoas de classe média ou média baixa a morar em prédios classificados’. A solução para o CEO da Amorim Luxury passa por a Câmara Municipal de Lisboa arranjar alternativas.”
Nesta altura, lembrei-me de Warren Buffet – “a luta de classes existe e a minha classe está a ganhá-la”.
Guedes de Sousa, como nos informa a reportagem, é casado com Paula Amorim. E daí a Amorim Luxury. Paula Amorim é uma das herdeiras da maior fortuna nacional. Como todas as grandes fortunas, esta foi construída com recurso a expedientes duvidosos. Não é só a fase de acumulação original que os tem. Duvidoso é também, como indica o insuspeito Thomas Piketty, este capitalismo cada vez mais de herdeiros. Guedes de Sousa tem o mérito de resumir numa frase, para a questão da habitação, a que condensa todas as contradições de classe, a arrogância do dinheiro quando está concentrado em poucas mãos, quando não tem qualquer medo, nem freios e contrapesos políticos à altura.
Eu bem sei que é fácil uma pessoa deixar-se dominar pelo desespero perante este império do capital. Mas é preciso nunca perder a esperança. As coisas já foram diferentes e podem voltar a sê-lo. Não estamos condenados ao porno-riquismo e ao capitalismo que lhe subjaz. Não podemos estar.
Alterei o texto, colocando um hífen na palavra nova para um tempo de desigualdades pornográficas: porno-riquismo.
Gostei bastante, caro João Rodrigues. É, para mim, uma das razões de dizer "sempre em luta contra os fdp". Não se pode baixar os braços. E se não se conseguir a mudança por via parlamentar, então terá que ser por outras mais drásticas.
ResponderEliminarO que fez Paula Amorim para ser uma das pessoas mais ricas do mundo?
ResponderEliminarO que ela empreendeu?
O que ela criou?
E quem diz Paula Amorim, diz Isabel dos Santos, diz Donald Trump, diz Kylie Jenner...
"A jovem (Kylie Jenner) empresária e estrela de reality show poderá tornar-se a pessoa mais nova de sempre a criar uma fortuna própria de mil milhões de dólares"
https://www.publico.pt/2018/07/11/culto/noticia/kylie-jenner-capa-da-forbes-tem-uma-riqueza-de-900-milhoes-de-dolares-1837643
Enfim, as insanáveis contradições do Capitalismo...
O capitalista tem um sonho, tornar-se aristocrata.
Mais uma vez uma excelente posta
ResponderEliminar"Conspicuous consumption is the spending of money on and the acquiring of luxury goods and services to publicly display economic power…" - Wikipedia
ResponderEliminar«A Solução para o CEO da Amorim Luxury passa por a Câmara Municipal de Lisboa arranjar alternativas.»
ResponderEliminarCom os impostos que ele não paga, já agora.
Mais um exemplo:
ResponderEliminarhttps://inequality.org/wp-content/uploads/2018/06/june-18-greed.png
"As coisas já foram diferentes e podem voltar a sê-lo"
ResponderEliminarQuando?
Como?
Onde?
«Não estamos condenados ao pornoriquismo e ao capitalismo que lhe subjaz. Não podemos estar.»
ResponderEliminarQuem são estes ‘nós’ é uma questão importante:
Nós, os portugueses, vamos enxotar os ricos produzidos por outros capitalistas?
Nós, os portugueses, vamos catar os ricos produzidos pelo nosso capitalismo?
Nós, os unidos trabalhadores do mundo, vamos dar cabo do capitalismo, por fim à globalização, uma moedinha por nação patriótica, e cada um por si?
Aprecio a nota em que se defende a sã utilização do FSE - A União Europeia seguramente agradece.
ResponderEliminarMas o que se diz ter sido o grande impulso da fortuna dos Amorins foi o PREC e a sua prestimosa colaboração com os heroicos ocupas do Alentejo. O negócio da cortiça teve por esses tempos resultados extraordinários.
Nós, os portugueses?
ResponderEliminarHerr José não se terá enganado nesse “ nós”?
Há para aí escritos em que ele defendia a submissão aos credores e agiotas E todo contentinho da Silva
O “ nós “ está esclarecido? Podemos passar a outro assunto?
Mais uma vez José volta ao ataque, bufando contra a Reforma Agrária
ResponderEliminarBufando é mesmo o termo, porque “ ocupas” eram os soldados que Salazar mandava matar e morrer nas colónias, ocupadas por demasiado tempo
Coisas que confirmam coisas do arco da velha. De como estas coisas se convertem em vulgares vende-pátrias, vai a distância que separa estas coisas de um neoliberal aplicado
Mas o motivo desta inquietação de José é outro. Tem que ver com as fraudes e os roubos cometidos pelo patronato e pela UGT em relação aos fundos sociais europeus
Ele, como perito patronal de uma confederação patronal sabe do que falo. Perdão, ele sabe muito mais do que eu falo
Percebe-se que José, depois dos fundos sociais europeus, também se interesse pelo tema da habitação
ResponderEliminarE das alternativas que a câmara tem que arranjar para acolher os que José anda por aqui a lamber as botas
A especulação imobiliária é um assunto rentável
Não é mesmo herr jose?
Anónimo, 16 de julho de 2018 às 11:49,
ResponderEliminarPesquise sobre o período do pós 2ª grande guerra até a era neoliberal ter começado por volta de 1970. Esse período foi marcado por rápida melhoria na condição de vida da pessoa comum, pelo capitalismo ao serviço da produção e não do capitalismo ao serviço da especulação, um capitalismo que tinha o açaime.
Acho curioso o esforço de alguns em tentarem fazer crer que "isto sempre foi assim", não foi e é fácil desmontar tal ideia...
Não é verdadeiramente comovente este sentido panfleto de jose em prol da defesa do porno-riquismo?
ResponderEliminarNão se sabe o que admirar mais. Se a antagónica promoção da "parcimónia dos consumidores" ainda há dias referida numa sua consonante defesa dos anos de chumbo de Passos / Portas, ou se esta verdadeira caridade em estilo lambe-botas para com a porno chachada do império do Capital?
Adivinha-se Jose na Hola com os tiques das tiazorras da dita. O que faz um tipo para ser consonante com a sua classe...
João Rodrigues, gostei imenso do seu artigo "Porno-riquismo" publicado no Le Monde Dilomatique deste mês. Cria fazer um reparo, aliás sem grande importância. Creio que o nome do diretor da Amorim Luxury é Miguel Guedes de Sousa.ou estou enganado?
ResponderEliminarParabéns pelo artigo.
António Mata