domingo, 31 de julho de 2016
É basicamente isto
Usar o facto de não ter havido sanções para crer em intervenções avulsas, do Presidente, do ministro de Negócios Estrangeiros e até de dirigentes europeístas de partidos como o Livre, pretender que isso significa que a Europa afinal funciona “bem” e os que a criticam não têm razão é mais uma cegueira a acrescentar a muitas outras que se repetem há quinze anos. Aliás, se, nesta matéria, só houvesse direito a falar caso se tivesse acertado nalguma coisinha nestes últimos anos, nenhum europeísta teria sequer a possibilidade de dizer alguma coisa.
José Pacheco Pereira, Público.
Sendo basicamente isto, tenho uma ou outra divergência sobre temas europeus com Pacheco Pereira, nada de especial, dadas as bem mais importantes convergências soberanistas democráticas: o mito dos pais fundadores europeus e a metáfora da cegueira aplicada às elites do poder europeu que têm o comando da situação no centro.
Os chamados pais fundadores, gente politicamente das direitas na sua maioria (ou das alas direitas de uma social-democracia então genericamente na oposição na sua minoria), tinham desconfianças em relação à democracia de massas, particularmente aplicada ao campo socioeconómico, que tratavam também de conter por via supranacional.
Eu prefiro pensar que “eles” não são cegos, embora o seu até agora globalmente triunfante projecto, com uma cada vez mais transparente orientação de classe, tenha naturalmente de se desenrolar num conflitual contexto de incerteza, o que significa que os efeitos imprevistos, não-intencionais, nunca podem ser erradicados.
Muito clarividente.
ResponderEliminarA Europa nunca foi comuna ou democrática de massas ou o que quer que seja o projecto de esquerda de que se fala e ninguém sabe o que seja - uma vez que já poucos dizem que já se viu algures.
Ainda bem!
Para além de todos os males decorrentes desse vago enunciado, já nos basta o geringonçosos experimentalismo para completar o quadro de miséria em que vivemos e que só a esmoler Europa vai moderando.
O problema da crítica ao processo de integração europeia é não se descortinar a alternativa que cada um dos críticos propõe. Aliás, se olharmos para o que sucedeu no RU, vemos que o novo ministro do Comércio Internacional, Liam Foz, defende um aprofundamento do modelo neoliberal (assim como Lord Lawson, que o João Rodrigues gosta de citar), o que está nas antípodas daquilo que Corbyn parece defender (ele que não parece ter ideias muito claras, note-se). Eu já sei que me irão responder que nada disto tem que ser assim, mas gostava de lhe chamar a atenção para o seguinte artigo: https://www.socialeurope.eu/2016/07/the-united-kingdoms-brexit-vote-leads-to-a-major-economic-shock/. Os autores fazem em relação ao Brexit aquilo que eu ando há anos a pedir que os críticos do Euro façam, ou seja um estudo que nos permita identificar quais os riscos e as oportunidades do abandono da moeda única. Mas não, pessoas como o João Rodrigues ficam-se pela crítica política e moral do projeto. Nem sequer assumem claramente quais as suas opções políticas, aparte alguma admiração confessada pelo marxismo. É que o soberanismo e o patriotismo são dois vasos onde cabem muitas coisas, algumas boas e algumas muito pouco recomendáveis. Os detalhes em política são tremendamente relevantes, e o João Rodrigues e o seu colega Jorge Bateira em particular não parecem nada dispostos a compartilhar esses detalhes das políticas connosco. E, enquanto não o fizerem, duvido que sejam levados minimamente a sério...
ResponderEliminar"Não levados a sério" diz jaime Santos depois dum arrazoado a roçar a má fé e a inquirir pelo passaporte ideológico de quem não bebe as mesmas águas que as dele
ResponderEliminarPara além disto tresandar a vetusto e a hábitos inquisitoriais pouco dignos ( e diga-se com todas as letras, cobardes) verifica-se uma coisa curiosa.
Se não sao levados a sério porque motivo o jaime Santos passa por aqui o tempo? Tem medo que os levem a sério? Tem medo que não sigam o seu gradualismo europeu que só nos tem levado à miséria e decadência? Tem medo de quê afinal o Jaime Santos ? Que se debata o Euro para além do palavreado oco e vazio dos europeístas?
Tem medo que afinal aquela conversa da treta sobre a viória da extrema-direita no Brexit tenha sido mesmo uma conversa da treta à procura de justificaçõe spara aquilo que está à vista de todos?
O falhanço clamoroso desta UE
Independentemente da boçalidade de se pedir para se identificar ideologicamente quem anda há anos a produzir textos dos mais lúcidos na área da economia política ( e não só) sobra outra coisa:
ResponderEliminarA enorme " distracção " que atravessa o quotidiano de Jaime Santos.
A questão da soberania já foi muitas vezes abordada por JR. Por várias e de várias formas. Os detalhes são muito importantes. mas mais importantes são as coisas essenciais. Os detalhes costumam ser de resto um pretexto para que se fuja precisamente ao que é fundamental.
E sobre o tema basta que JS saia da área de conforto e que vá procurar
Essa história da falta de alternativa é uma treta velha.
ResponderEliminarOs neoliberais impingiram-na no processo austeritário. Já antes os ingleses tinham apresentado como sem altenativa o destino da India obrigada a estar incorporada no domínio britânico para poder sobreviver.
Mais recentemente aconteceu o mesmo com a Islândia. Não tinha alternativa, coitada. Se virmos bem o tremendo ressabiamento pelo Brexit é que não se julgava pssível alguèm dizer não a Europa da maneira como os britânicos o fizeram.E vemos todos os europeístas a carpirem o facto junto com o grande poder económico e com a city e com os tubaroes da finança e com todos os que construiram esta UE feita à imagem e semelhança dos interesses económicos da Alemanha e do grande capital
A questão das "alternativas" é uma discussão curiosa... Geralmente, quem clama por alternativas dadas por terceiros são aqueles que se cristalizaram no dogmatismo do caminho único, o tal caminho único que nos trouxe ao miserável estado em que agora nos encontramos nesta UE.
ResponderEliminarJá nem recuo à discussão, à velha discussão, de uma esquerda que tomou como objetivo último da sua existência o ser uma fotocópia aldrabada da direita mais reacionária conseguindo, com essa deriva acéfala, o resultado de ter deitado para o aterro sanitário tudo aquilo que nos poderia salvar do desastre iminente e que faz a esquerda ser esquerda: o anti-imperialismo, o anticolonialismo, o antirracismo, o internacionalismo, a crença na autodeterminação dos povos e a negação de toda e qualquer promiscuidade entre aquilo que é privado e aquilo que a todos pertence. Falo eu aqui da direita neoliberal pura e dura que, face à abertura de fissuras no dique da ortodoxia estrutural europeia, vai tentando colmatar a coisa pondo um dedinho num buraquinho aqui, pondo outro dedinho num buraquinho acolá, esquecendo-se que só tem dez dedos nas mãos... e não reparando que o betão do dique está completamente podre. Trocando a coisa por miúdos, a UE (mais os seus parceiros de estimação, ou melhor, os seus amos - os EUA e a NATO) resolveram fazer entrar no bolo europeu e atlantista tudo o que cheirasse a antigo país socialista, num transe endiabrado para isolar a Alemanha daqueles que, mais tarde ou mais cedo, serão os seus parceiros de eleição: a Federação Russa e a República Popular da China. Daí as magníficas jogadas da destruição da Jugoslávia, do roubo do Kosovo ao país a que sempre pertenceu (criando, no processo, mais um Estado falhado em solo europeu)e da criação de mais uma revolução colorida na Ucrânia (e de mais uma guerra em solo europeu). Se à classe de indigentes mentais que nos governa a coisa pareceu mais ao menos contida na frente Leste do dique (e não me parece que assim seja...),aos anjinhos pareceu-lhes a obra pouca e vai de embarcar em grandes empreitadas "humanitárias" na parte sul do mesmo dique, pelo que rebentaram com a Líbia e tentam o mesmo fazer com a Síria abrindo, no processo, as comportas à mais pavorosa crise de refugiados desde o final da II Guerra Mundial. O dique já requer bem mais do que dez dedos...
Desenganem-se aqueles que tentam encontrar as razões do "Brexit" unicamente nas idiossincrasias internas do saco de gatos lobotomizados que é a UE. Os eleitores Britânicos mostraram-se finalmente fartos da camarilha de cleptocratas que, desde os tempos da defunta senhora Tatcher, os tem privado dos meios de sustento, lhes destruíu a saúde e a educação, lhes fechou as fábricas e as minas e que, ao mesmo tempo, os lançou em desastrosas guerras consecutivas. E nisto de cleptocratas, ficaram os Britânicos com os deles, esperando eu que as mãos lhes não doam e que a devida barrela já começada continue até à higienização total do ambiente político e económico. A coisa desagradável é que os nossos continuam por cá e, pelos vistos, não há meio de a malta se lançar na árdua aplicação intensiva do piaçaba e do sabão macaco.
A não aplicação das sanções não significa que a chantagem não continue.
ResponderEliminarClaro que a chantagem continua. E as facas estão a afiar-se do lado do directório.
ResponderEliminarCom o apoio explícito do inimigo interno que cumpre aquilo que parece ser o destino das "elites" nacionais já desde a crise de 1383-85.
Percebe-se o desnorte de alguns perante este excelente texto de João Rodrigues.
ResponderEliminarDando continuidade a uma longa trajectória feita de coerência, persistência e clareza, JR mostra desta forma lapidar (e convocando José Pacheco Pereira), que o rei vai mesmo nú.
E relembra, num abençoado link, uma informação fundamental:
"Numa parte considerável da sociedade (sobretudo nessa classe média que se imagina cidadã de uma Europa laica, democrática e respeitadora dos Direitos Humanos), defende-se o regresso a um projeto europeu perdido, como se Schäuble fosse (e não é) a antítese de tecnocratas como Schuman (o partidário de Pétain em 1940) e Monnet (horrorizado com o controlo parlamentar da política económica). Há que fazer uma reavaliação muito crítica dessa génese profundamente elitista da construção europeia, feita de despotismo esclarecido, e desta conceção e gestão das políticas europeias sempre cheia de preconceito tecnocrático que entende como populista toda a crítica ao europeísmo rançoso e dogmático, que reivindica a soberania democrática onde ela, mal ou bem, ainda se se tem a sensação de se exercer: à escala nacional".
Percebe-se que tal lembrança faça amargos de boca aos simpatizantes e adeptos do colaboracionista e pró-nazi Pétain ou aos adeptos dos mitos europeus.