segunda-feira, 17 de novembro de 2014

A reforma da reforma do IRC

Esteve bem António Costa ao anunciar que iria colocar em causa o acordo a que chegou o PS de António José Seguro com a Maioria sobre a reforma do IRC. Mas esteve mal ao argumentar que o faria porque “as condições do acordo não foram cumpridas (...) nomeadamente em matéria de uma avaliação séria do impacto [da descida do IRC em 2014] e sobre a necessidade de novos passos serem acompanhados por evoluções em outras impostos, designadamente IRS e IVA”. 

Estas afirmações têm subjacente uma parca – para não dizer pobre – avaliação do conjunto de disposições legais do próprio IRC como imposto sobre o rendimento empresarial e que estão, efectivamente, na base da sua curta eficácia e da enorme evasão fiscal que se verifica.

A prova de como a lei foi, desde a sua criação em 1988, desvirtuando o quadro inicial do imposto revela-se na evolução verificada nas duas últimas décadas. Como decorre dos valores da própria administração fiscal,  foi crescendo nesse período o hiato entre os resultados positivos e a matéria colectável, mercê de deduções, isenções, benefícios fiscais, etc. que retiraram à matéria colectável parte considerável dos lucros das empresas que deixaram de ser tributados. 
Veja-se o gráfico acima.
 
Desde 1993 a 2012, esse hiato passou de 27% dos resultados para cerca de metade dos resultados, atingindo 70% em 2010 (ver gráfico ao lado)

Esta questão é fundamental para perceber que, mais do que discutir uma descida de taxas de IRC, conviria primeiro discutir o que determina a sua Matéria Colectável. Porque à medida que sobe o hiato entre resultados e matéria colectável, a taxa efectiva de IRC (IRC Liquidado / resultados positivos) tende a reduzir-se. E foi o que se passou (ver gráfico em baixo). 

Bem pode António Lobo Xavier, presidente da comissão de reforma, lembrar que as empresas pagam mais taxas além da taxa de IRS propriamente dita. Porque, na realidade, o que se passa é que há uma parcela de lucros que não é tributada e, por isso, o Estado vai criando mais taxas para obviar uma situação que parece não querer encarar. 

E estamos a falar apenas de resultados positivos, já não mencionando os prejuízos cujos montantes podem ser abatidos aos lucros dos exercícios futuros. E esta reforma do IRC alargou consideravelmente o período de reporte de prejuízos.  

Outra questão essencial – antes de aprovar descidas de taxas de IRC - seria discutir um plano de combate à elevada evasão fiscal em IRC e que faz com que o IRC liquidado seja pago sobretudo por grandes empresas e que faz com que a reforma aprovada com o acordo do PS tenha favorecido sobretudo essas grandes empresas.

Portanto, mais do que pôr em causa a reforma do IRC por desequilíbrio face ao IRS e IVA (o que é justo) seria, antes de mais, de repensar os impostos sobre o rendimento que, cada vez mais, estão aquém das intenções iniciais da reforma de 1988 que os criou.  

16 comentários:

  1. A mensagem de Costa é clara: está de regresso a canalha populista, estatizante e das negociatas.
    Para os investidores também é clara: pântano a evitar!

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  2. A mensagem deste post é clara:

    -"IRC como imposto sobre o rendimento empresarial ... sua curta eficácia e enorme evasão fiscal que se verifica"
    -"na realidade, o que se passa é que há uma parcela de lucros que não é tributada "
    -" o IRC liquidado seja pago sobretudo por grandes empresas e que faz com que a reforma aprovada com o acordo do PS tenha favorecido sobretudo essas grandes empresas. "
    -"mais do que pôr em causa a reforma do IRC por desequilíbrio face ao IRS e IVA (o que é justo) seria, antes de mais, de repensar os impostos sobre o rendimento que, cada vez mais, estão aquém das intenções iniciais da reforma de 1988 que os criou"

    Não é com Costa que está de regresso a canalha populista , das negociatas e do pântano. Tanto a canalha como as negociatas nunca abandonaram o poder. Fazem parte do próprio poder. São a sua seiva e constituem a mais evidente demonstração do poder de classe que temos e que (se) governa.

    "Esquecer" a cena patética e triste de ver a cúpula da governação neoliberal afundar-se em escândalos como os que assistimos nos últimos dias é portentosamente esclarecedor. Os lugares destinados aos príncipes dos boys, os lugares ocupados pela coorte da direita e da extrema-direita esvaziados do seu conteúdo pela pratica daqueles.
    Os esforços hercúleos de portas para tentar que o seu nome não apareça nas notícias, ligado aos vistos gold, manipulando ex-colegas de profissão e contactando as direcções dos media são por demais indicativos do tipo de "gente" que ´"comanda" o país.

    O pântano está aí e sempre esteve. Mais lamacento e mais podre.

    Entretanto para culminar a choldra de país em que vivemos temos uma figura entre o sinistro, a ignorância e a má fé como presidente da república, onde o silêncio sobre o acontecido raia a cumplicidade criminosa

    A Canalha que nos governa?

    Há uma série de outros adjectivos a somar a este. Mais graves, mais certeiros,mais directos. Andam por aí na boca de muitos e só por não ser aqui o lugar adequado é que me abstenho de os reproduzir

    De

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  3. O João Ramos de Almeida é um dos poucos jornalistas que escreve com verdade e profundidade sobre impostos.
    Mas, infelizmente o "mercado" na Tugalândia não gosta de bom jornalismo, só gosta de "lixo" pronto a comer.

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  4. Nas empresas há tributações autónomas, além de tudo o mais de taxas e IMI e por aí fora.
    Se tivessem de pagar (cash!) 35% sobre os lucros só se safavam os não transacionáveis e os que encontrassem modo de fugir a impostos (no passado, boa parte dos suprimentos nas empresas eram autofinanciamento com matéria colectável foragida).
    As isenções fiscais servem para contrabalançar taxas excessivas e promover auto-financiamento e investimento.
    Se o combate à fuga a impostos é eficiente os impostos têm de baixar.
    SE querem emprego TÊM que se conformar com empresas com bons lucros pós-impostos (para desgosto de DE e congéneres).

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  5. Caro José,
    A questão que se coloca é apenas de transparência. Todas as opções políticas são possíveis, incluindo a de não tributar o rendimento empresarial se se achar que isso promove mais o emprego. Mas tal como está é apenas um simulacro de situação em que, sob a capa de reduzir o fardo sobre as empresas, se está a esvaziá-lo, sem se prestar contas dos efeitos das medidas fiscais e sem medir a sua eficácia.E, claro está, afunilando a discussão do IRC para as "elevadas" taxas, contribui-se - em muito - para esse "nevoeiro".É apenas isso que se pretende alertar com este post.

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  6. Caro João.
    Estou de acordo consigo, mas a farsa em que vivemos há anos - dependemos das empresas mas o 'correcto' é odiá-las - coloca os governos a teren que protegê-las por caminhos ínvios.
    Ao serviço desse 'ideal', em vez de se pôr o esforço numa ética empresarial e uma jurisprudência rigorosa, tudo são pretextos para diabolizar as empresas e o capital que incorporam.
    O investidor é herói por um dia, no seguinte é ladrão.

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  7. Caro José,
    É tão defensável dizer que dependemos das empresas, como sustentar que as empresas dependem de vários factores, como dos seus trabalhadores, dos consumidores, do Estado (que por sua vez depende da economia e dos contribuintes, etc., etc..) A questão nunca se pode pôr nesses termos, mas apenas para onde vamos e que tudo - tanto o esforço como o resultado - seja devidamente repartido por esta Comunidade em que estamos. Todos dependemos de todos. É assim por definição. E se formos ver à História, verá que há razões profundas para se achar que o esforço até agora feito - em termos acumulados - esteve muito mais de um dos lados. E que o poder sempre esteve muito mais de outros lados. E por isso vivemos ainda nesta desarmonia social, onde os consensos são mal recebidos. Não é por acaso. Não acho que somos todos anginhos, mas por isso alerto-o para que não se deixe enreder no papel messiânico das empresas. Estamos todos juntos e convém que haja uma justa repartição do esforço e do rendimento.

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  8. Os comentários do jose são a demonstração cabal da existência de facto da luta de classes.

    Jose pugna pelos lucros chorudos para as suas "empresas".
    Vai mais longe.Exige baixa de impostos para os seus congéneres.E ameaça com a fuga aos impostos se tal não se der.

    Exemplar este discurso quando comparado com o discurso do mesmo jose a raiar o ódio contra quem é responsável pela criação dessa mesma riqueza, ou seja os trabalhadores

    De

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  9. Infelizmente há mais:

    "Dependemos das empresas"
    Quem diz isso, também isso é aquela figura sinistra e apatetada do presidente da república , o américo thomaz do governo.

    Para desgosto do sr jose este é mais um axioma.Neoliberal e tal.E como todos os axiomas carece de fundamentação.

    O carácter divino da figura real desapareceu há muito.

    O do mito das empresas como mola da economia persiste nesta sociedade corrupta e podre. A que se segue a reivindicação sem peias e sem vergonha do direito ao lucro e ao saque. "Pos-impostos" porque os heróis de ontem e os ladrões de hoje assim o exigem.

    Infelizmente para o sr jose , para "desgosto " do sr jose a história mostra que o lugar dos axiomas, deste e doutro tipo, é o lixo.

    De

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  10. Mas infelizmente há mais.

    Esta frase "O investidor é herói por um dia, no seguinte é ladrão." é todo um programa ideológico.

    Talvez seja uma "desculpa" esfarrapada pelo facto de vermos os heróis desta direita e desta extrema-direita,"empresários de sucesso" ,ou "patrões sem escrúpulos",ou capangas do poder político ao serviço do poder económico, serem inicialmente alvo da alienação e endeusamento pelos media fidelizados e pelos "bons rapazes" habituais. Para no fim, um a um, muitos acabarem por serem identificados pelo que de facto são- Uns ladrões e uns corruptos.

    De

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  11. E a este propósito cabe aqui este portentoso post do Nuno Ramos de Almeida, publicado no jornal I

    "A corrupção em Portugal não acontece porque há alguns vígaros que prevaricam; existe e prospera porque há gente que se apropriou indevidamente da democracia e do Estado

    Uma das pessoas mais fantásticas que conheci foi a minha tia-avó. Foi expulsa do ensino pelo regime salazarista. Trabalhou para a Organização Mundial de Saúde (OMS) um pouco por todo o mundo. Há duas histórias que ela contava a que vou fazer apelo nesta crónica. Falam de coisas diferentes, mas podem ter uma relação mais profunda do que parece à partida.

    A minha tia estudou nos Estados Unidos no tempo do McCartismo. Vivia-se em plena guerra fria, as autoridades de Washington imaginavam comunistas em cima de todas as árvores a destruírem o "modo de vida americano". Vários realizadores, jornalistas, actores, professores e intelectuais foram expulsos da sua profissão devido a alegadas simpatias pelo comunismo. Na universidade os alunos temiam ser prejudicados por causa das suas ideias políticas. Numa das aulas um professor deu aos estudantes um teste para determinar a sua posição no eixo esquerda-direita. Era uma auto-avaliação, os professores não tinham acesso a ela. A minha tia e um outro português preencheram descontraidamente e deu "de extrema-esquerda". Já o americano que estava ao lado, com medo de represálias, respondeu a tudo "não sei": deu da "direita liberal".
    (Cont)

    (De)

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  12. (Cont)
    "Segunda história. Durante o seu TRABALHO, a minha parente viveu no Irão do xá. Dava aulas de Enfermagem na universidade e trabalhava para a OMS. Na universidade, a omnipresente polícia política, Savak, fazia desaparecer qualquer estudante vagamente opositor. No entanto, a vida económica pretendia reger-se por padrões do "mercado livre" de uma forma cinicamente transparente. Um dia a minha tia foi ao banco trocar dólares pela moeda local e a pessoa do guichet quase se recusou a fazer-lhe o câmbio e apontava reiteradamente para um senhor que tinha uma mesinha junto ao banco e que fazia as trocas de divisas do mercado negro. Num regime despótico, desigual e de mercado, como a ditadura do xá, o mercado negro fazia parte do sistema. Era uma componente importante do que permitia a manutenção do estado das coisas.

    Temos normalmente a ideia que a corrupção é um desvio do sistema, algo que é um caso de polícia e não de política. Mas isso é na maioria das vezes falso. Os casos de corrupção reiterada a que assistimos em Portugal, os das falências fraudulentas dos bancos, os dos contratos desastrosos que o Estado fez das PPP, os do tráfico de influências potenciados pela circulação directa dos políticos entre ministérios e altos cargos nos grupos financeiros, as tramóias nos vistos GOLD, a contratação de escritórios que preparam simultaneamente as privatizações para o Estado e para os tipos que vão comprar as empresas por tuta-e-meia, não se devem a termos em cada esquina um Vale e Azevedo, mas a termos um regime de poder político em que um grupo social se apoderou dos bens públicos e do Estado em seu benefício.

    Não é preciso ser particularmente revolucionário para perceber que a corrupção é um dado permanente deste regime que expulsou o povo da democracia. Como escrevia o historiador social-democrata Tony Judt: "A desigualdade é corrosiva. Apodrece as sociedades a partir de dentro." E isto liga-se à primeira história. Num país cada vez mais injusto do ponto de vista económico, político, social, o que se pede não é que se diga "não sei", mas que as pessoas sejam capazes de mostrar que não querem mais esta situação. Aquilo que sustenta os corruptos é o nosso silêncio e a nossa incapacidade de imaginar uma solução radicalmente diferente da rotatividade contentinha que temos vivido nos últimos 40 anos entre os mesmos grupos de interesses."
    NRA

    Como diz e bem Nuno Ramos de Almeida,"ISTO É MAIS UM PROBLEMA DE POLÍTICA QUE DE POLÍCIA"

    (De)

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  13. Diz o João que se evite o «papel messiânico das empresas»
    Quando falo em «pôr o esforço numa ética empresarial e uma jurisprudência rigorosa» estou a recusar qualquer messianismo mas sim a focar o necessário esforço colectico de fazer as empresas prósperas mas socialmente reconhecidas e auditadas.
    Os que, como DE, as querem num dos lados da barricada da luta de classes, cumprem um dogma ideológico mas cavam as desgraças que depois vêm lamentar com a pieguice dos irresposáveis.

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  14. Não deixa de ser curioso ver a pieguice como o sr jose aborda o tema das "empresas" e
    a defesa, um pouco canhestra confessemos, do seu papel messiânico.
    Para depois tentar o recuo indispensável face ao que disse e escreveu.

    Embora ainda seja mais curioso o silêncio confrangedor sobre a sua "justificação" para a fuga aos impostos e para os "heróis" que afinal não passam de patifes. O sr jose por exemplo fartou-se de endeusar alguns deles e o seu direito ao saque, perdão ao "justo lucro" , agora acrescido de "isenção de impostos".
    Dogmas ideológicos ao serviço da sua classe, sem qualquer sombra de dúvida

    Mas há uma questão que não pode passar em claro.
    É este apelo em surdina que a lei não é igual para todos.Que existe leis para o cidadão, que são para cumprir, e leis para as "empresas" que são para subverter.

    Ora isto é a antítese da democracia.

    E não deixa de ser irónico vir-se falar em" reconhecimento e em auditorias" . Os "reconhecimentos e as auditorias como as do Banco de Portugal?As dos vistos gold?As dos Swap? As dos submarinos?

    Alguns dos auditores estavam ligados umbilicalmente à mafia, aos grandes interesses económicos..Portugueses, belgas,alemães. singravam no barco do saque e da corrupção.
    Depois iam festejar.E mandavam a conta para os orçamentos do estado nacionais.

    De

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  15. Quero esclarecer DE que se o cito é como exemplo de irresponsabilidade e de ruído ideológico.
    A democracia política, tal como é entendida no Ocidente, dispensa a justiça popular, repudia a calúnia, e valoriza que a opinião política não seja configurada em ladaínhas, responsos e exorcismos.

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  16. "quero esclarecer" etc e tal e "justiça popular, repudia a calúnia, e valoriza que a opinião política não seja configurada em ladaínhas, responsos e exorcismos."?


    -Falamos de impostos
    -Falamos na defesa messiânica das empresas
    -Falamos na abordagem piegas das empresas por parte do sr jose
    -Falamos na cumplicidade patente e no branqueamento dos heróis de ontem que afinal não passam de refinados patifes corruptos e corruptores
    -Falamos nos apelos sub-reptícios ao tratamento fiscal desigual dos cidadãos e das empresas
    -Falamos na antítese da democracia
    Falamos na farsa das auditorias
    e dos auditores corruptos e cúmplices como demonstrado à exaustão.

    E o sr jose perante tudo isto sai- se com uma ladainha, em jeito de responso e exorcismo?

    Muito curioso de facto.

    Embora continue o pavoroso silêncio sobre a substância dos factos.

    De

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