quinta-feira, 4 de abril de 2013
Os gregos vão acabar por sair e nós também
Há uma notícia recente que não teve o devido destaque nas nossas televisões. O governo grego pediu à troika uma moratória para as medidas de austeridade que deveriam ser tomadas de imediato pelo facto de a execução orçamental estar a ficar comprometida pela espiral recessiva. Ou seja, a economia e a sociedade gregas entraram numa agonia terminal. Chipre também acaba de perceber que caiu na armadilha da moeda única. Tanto a Grécia como Chipre acabarão por abandonar a zona euro. Não porque tenham concluído pela existência de benefícios líquidos com a saída, mas apenas porque a vida se tornou absolutamente insuportável para a larga maioria dos seus cidadãos. O mesmo se vai passar em Portugal.
Entretanto, a simples referência nos media à saída de Portugal da zona euro já suscita comentários histéricos. Os que fogem à discussão séria e optam pelo alarmismo têm de ser confrontados com o seguinte: a) não há teoria económica que sustente a ideia de que teríamos um enorme decréscimo do nível de vida; b) os casos de crise que têm algum paralelo com um abandono da zona euro (países asiáticos, Rússia, Argentina) mostram uma rápida recuperação das economias; c) tendo em conta as circunstâncias que hoje vivemos, não há um único caso de sucesso que possa ser invocado em defesa da estratégia do empobrecimento.
Chegado o dia, os nossos bancos fechariam para que se pudesse organizar o controlo dos movimentos de capitais, a nacionalização do sistema bancário e a criação de meios provisórios de pagamento em novos escudos. Cada euro seria convertido em um novo escudo, o que evitaria problemas de leitura dos preços. A nova moeda teria uma depreciação inicial elevada, mas poderia estabilizar em cerca de 30%, tendo em conta que o euro também se depreciaria num contexto de turbulência política na UE. Os depósitos bancários manteriam o seu valor nominal mas perderiam poder de compra através da subida dos preços no consumidor. É certo que os preços dos bens importados sobem 30% de uma só vez. Porém, numa estimativa preliminar, a subida do nível geral dos preços será inferior a dois dígitos. Também haveria uma redução dos salários reais pela diferença entre a subida do nível de preços e a actualização salarial. As pensões mínimas deveriam ser actualizadas de acordo com a inflação. Em todo o caso, num contexto de depressão, o efeito inflacionista da desvalorização tenderia a esbater-se rapidamente. Em contrapartida, o efeito sobre a competitividade-preço das exportações e o estímulo à substituição de importações seria muito importante.
Por outro lado, a perda inicial de poder de compra é mais que compensada pelos efeitos benéficos da nova política económica. Decretando uma moratória ao serviço da dívida pública externa (assunto para outro texto) e recorrendo à colocação de dívida junto das famílias portuguesas, complementada por financiamento directo do Banco de Portugal, o governo pode repor de imediato as pensões, as prestações sociais e os salários da função pública nos níveis anteriores aos cortes. Lançaria também um programa de criação de emprego socialmente útil e um programa criterioso de investimento público mobilizador das pequenas empresas. O crescimento da procura interna retomaria, o fardo da dívida das famílias aliviaria.
Como sair de uma depressão que, pelo menos no Sul da Europa e se nada fizermos, será talvez mais profunda que a dos anos 30 do século xx? Nessa altura os países retomaram a capacidade de desvalorizar a moeda libertando-se do padrão-ouro e, após Bretton Woods, domesticaram a finança e o livre comércio internacional. Hoje os povos europeus vão ter de quebrar as algemas do euro e voltar a domesticar a globalização. Quanto antes, para que a austeridade não produza outra guerra na Europa.
(Artigo no jornal i)
A nossa saída do Euro é inevitável, por muito que não se goste (seria necessário a europa ser outra, que claramente não é) e entretanto já perdemos qaunto? 30000 milhões? e ficámos mais fracos, com tanta gente no desemprego a definhar e empresas destruídas. Quanto amis tarde, pior.
ResponderEliminarA única dúvida que tenho é o que acontecerá com quem tem dívidas e.g. habitação: ficarão em Euros e serãao impagáveis? É que uma boa parte dos Portugueses tem empréstimo...
Seria interessante clarificar este ponto crucial.
O Banco de Portugal já deu indicações (quase em surdina, é certo) que os contratos de crédito firmados em Portugal seriam convertidos na nova moeda, mesmo que uma das partes fosse um banco não residente.
ResponderEliminarNão percebo. O novo escudo teria uma depreciação de cerca de 30% (admitamos). Um escudo passaria a valer 0,7 euro. Mas então o preço de um produto importado de 1 euro passaria a custar 1/0,7 = 1,43 escudos. Ou seja, os preços dos bens importados sobem 43% e não apenas 30%.
ResponderEliminarNão seria viável criar uma moeda comum para, por exemplo, Portugal, Grécia, Espanha, Itália, Chipre?...
ResponderEliminarEsta é a discussão necessária! Espero pelo desenvolvimento.
ResponderEliminarA minha achega é "de mercearia": lembro que há muitos anos, havendo falta de trocos em circulação, os comerciantes emitiam vales escritos à mão que eram descontados nas mesmas lojas nas compras seguintes ou resgatados quando houvesse moedas. Porque não há-de o país emitir moeda própria que circule a par do euro? Já que estamos em economia de guerra...
Há indicadores na economia europeia de que estamos a caminhar de forma lenta para a repetição de aquilo que aconteceu em 1929.
ResponderEliminarNo que diz respeito a Portugal também já há indicadores que a nossa saída do Euro parece ter uma alta probabilidade de vir a acontecer.
O conteúdo deste "post" poderia levar-nos a pensar porque é que as pessoas não entendem como era fácil resolver todos os problemas e voltarmos à maravilhosa vida que tínhamos em 1978/79 82/83 e, sobretudo, antes. Será da idade do autor? O autor e outros que parecem com ele concordar imaginarão como eram as prateleiras dos supermercados nesses tempos? O pessoal que por aqui anda saberá que em Portugal não havia pequeno-almoço? Havia o "café" que, por acaso, tinha pouco café... Isto,meus caros, não é um mero problema terminológico..Era um copo de café (cevada)com uma carcaça com margarina, para os que era... Para muitos outros era uma tigela (malga) de sopa normalmente de couves.
ResponderEliminarIsto apenas para lembrar o cenário que nos espera (não duvido da saída do euro)e não a miragem radiosa que a tal "soberania" monetária nos trará. Com que é que esta gente pretenderá pagar os combustíveis e 58% dos cereais com que se faz o pão e a carne que comemos?? Como?? Eu digo: com FOME!!!!
Aparentemente, esquecemo-nos que sair do euro representa também um default na nossa dívida (é em Euros, lembram-se, se agora é alta, imaginem quando o escudo valer 70% do euro!) e o fim do financiamento da economia portuguesa uma vez que quem nos está a financiar atualmente é a UE (a quem daremos o calote).
ResponderEliminarSem financiamento, o estado não tem dinheiro para pagar ordenados, educação, segurança social, enfim, o tal estado social (ou esquecem-se que ainda estamos a gastar mais do que temos)... o que quer dizer que entramos na bancarrota. Se achamos que 17% de desemprego é muito, esperem até somarmos os funcionários públicos.
Por fim, o que vai acontecer às empresas com financiamentos em euros? Também não pagam a dívida? Então quem nos vai comprar as nossas exportações (lembrem-se que para o bem ou para o mal é a mesma UE a quem daremos o calote que consome a maioria das nossas exportações).
Sugiro que olhem para o exemplo da Argentina - também tinha uma moeda que não controlavam - cambio fixo do peso com o dólar - quando fizeram o default.
Ao anonimo das 23:44,
ResponderEliminarUm euro da Europa do sul não iria eliminar desequilibrios entre economias diferentes.
A Italia seria a nova Alemanha, a longo prazo só mudaria o crededor...
Sou italiano e na Italia tambem se fala em propostas parecidas.
Parece que os nossos paises nunca tiveram uma moeda propria!!!
Cenário de puro terror. Tudo parece fácil... no papel.
ResponderEliminarNacionalizar a banca? Entregar aos partidos políticos, leia-se PS e PSD, a administração da mesma?
Sim, sair do Euro implica provavelmente ficar com uma dívida em Euros. Idealmente a trika deveria ajudar-nos a sair.
ResponderEliminarMas o que significa ficar no Euro? O "ajustamento" não está a dar resultado e mais do mesmo dará resultados ainda piores. Nestes 2 anos de ajustamentoa a dívida aumantou quanto? 30 mil milhões de Euros? Os desempregados de longa duração perdem qualidades de trabalho e tornar-se-ão um fardo. Quanto estaremos a dever daqui a 2 anos? Alguém ainda tem a ilusão que a dívida é pagável com esta depressão?
Continuar nesta direcção é acabar com Portugal, se sairmos de Euro podemos começar a crescer. Com moeda própria pode-se aumentar a massa monetária e pagar aos funcionáriios públicos. A inflação (moderada) pode ser uma coisa positiva pois faz aumentar a capacidade de pagar as dívidas. Poderemos começara a tentar sair do buraco.
Assim só definhamos.
A única possibilidade de nos mantermos no Euro seria aumentar a inflação na zona Euro mas os países do Norte e o BCE não querem , nem vão querer. Com um depressão europeia e 12% de desemprego, nem assim o BCE diminuiu os juros.
Já não tenho fé na Europa. Nunca tive muita, mas nunca pensei que se chegasse a este ponto.
"A nova moeda teria uma depreciação inicial elevada, mas poderia estabilizar em cerca de 30%, tendo em conta que o euro também se depreciaria num contexto de turbulência política na UE."
ResponderEliminarSe a moeda portuguesa desvalorizasse 30% Espanha consideraria isso um acto de guerra, reinstalava as fronteiras e mandaria tropa para as guardar.
É que Portugal é o terceiro cliente de Espanha, depois da França e da Alemanha e maior do que toda a América Latina.
A desvalorização dificilmente seria superior a dez por cento e os bancos centrais do Euro, BCE incluído, sustentariam a nossa moeda para evitar um colapso de Espanha.
Mais, se Portugal saísse do Euro, o Euro não se desvalorizava, antes pelo contrário, valorizava-se.
Seria um estímulo para a reindustrialização do país, captação de investimento, aumento de emprego e das exportações. Estaríamos mais limitados na importação de alguns produtos e na energia, mas o estado seria forçado a retomar medidas de nacionalização e regulamentação; tudo o que o país precisa essencialmente neste momento. Nenhum caminho é fácil mas talvez esta saída seja o melhor "reset" necessário. Parabéns pois necessitamos de novas vozes capazes de fundamentar uma mentalidade alternativa à austeridade do euro e UE.
ResponderEliminarResposta sumária aos comentários:
ResponderEliminara) Contratos entre residentes
Todos os contratos realizados ao abrigo da legislação nacional são convertidos na nova moeda. Isto inclui depósitos bancários e contratos de crédito realizados pelos privados junto dos bancos residentes em Portugal.
b) Dívida pública externa
Os títulos de dívida são convertidos na nova moeda caso tenham sido emitidos ao abrigo da legislação nacional e sejam reembolsáveis em Lisboa (ver no Financial Times artigo do jurista Gilles Thieffry sobre a Grécia).
c) Dívida privada externa
Deveria manter-se em euros para não romper as relações comerciais. O acréscimo nas dívidas resultante da desvalorização deve ser tratado segundo o tipo de empresa (Petrogral, EDP, e outras grandes aguentam com o encargo; pequenas e médias são apoiadas pelo Estado nesse diferencial).
d) Salários de funcionários públicos
Estão garantidos porque o défice orçamental é financiado pela emissão de dívida interna subscrita pelos residentes ou por emissão monetária (Banco de Portugal subtraído ao Sistema Europeu por decreto do governo).
e) Pensões
Estão garantidas porque as pensões pagas em cada mês são financiadas pelos descontos efectuados em cada mês. O défice deste orçamento da segurança social é sempre coberto por transferência do orçamento do Estado (aconteceu pela 1ª vez em 2012 devido à crise actual).
f) financiamento das importações de bens essenciais (divisas)
Quase não é problema porque as contas externas já estão equilibradas. Ainda assim, não será difícil obter crédito comercial externo contra garantias em ouro até que a desvalorização (acompanhada de outras políticas)consolide o equilíbrio da balança de transacções correntes.
g) A nacionalização dos bancos é imprescindível para garantir que os controles dos movimentos de capitais não sejam entregues aos actuais banqueiros e também porque ficam falidos com as suas dívidas ao exterior em euros. Mais tarde pode encontrar-se uma solução nova (socialização em vez de nacionalização) por forma a que os governos não possam servir-se deles arbitrariamente. Alguns poderão ser privatizados. Separar-se-á a actividade de banca comercial da de investimento financeiro.
h) Espanha e Argentina
Uma saída de Portugal do euro obrigaria a Espanha a fazer o mesmo. Aliás, quando um país do Sul sair outros irão atrás, tal como aconteceu na Europa dos anos 30 com o padrão-ouro. O que está a acontecer é um processo de decomposição semelhante em diversos aspectos.
Ao contrário do que alguns afirmam, a Argentina foi conduzida à bancarrota pelas políticas de austeridade ao tentar manter a paridade com o dólar. O crescimento do PIB e do emprego recomeçaram no segundo trimestre após a bancarrota. Não é uma opinião, é um facto.
i) Moeda comum
Após a saída do euro é possível organizar uma zona de moeda comum (bancária como o ECU) ligando as moedas nacionais de alguns países mediante taxas de câmbio ajustáveis. A organização do comércio externo da zona e dos pagamentos entre países deveria inspirar-se nas propostas de Keynes para a conferência de Bretton Woods (ver textos de Jacques Sapir).
Obrigado pelos comentários.
Quanto às dívidas e às relações comerciais com o exterior, ante da nossa adesão ao euro, elas sempre foram feitas, não em escudos mas, na sua larga maioria em USA Dólares, e quando não era em Dólares era noutra qualquer moeda estrangeira e nunca em Ecudos!
ResponderEliminarPortanto, não haveria aqui qualquet diferenºa para a situanção anterior.
A nossa saída do Euro tem aspectos negativos sim senhor! E a nossa teimosa permanência a onde nos leva? De certeza que ao constante enriquecimento dos banqueiros mundiais. Não se esqueçam que são sete mil milhões de euros que pagamos de juros todos os anos e com tendênia para aumentar! Acham que os tubarões estão mais interessados em emprestar à Alemanha, à França e a outros a taxa zero ou próxima? Depois teriam que ir apanhar esses sete mil milhões a outro lado!!
Se não houver uma revolução monetária na Uniao europeia, com a criação de moeda própria para cada país, ou uma moeda para os países pobres(sul da europa),este euro moeda acabará por arruinar e levar à misério os países pobres e pequenos da zona euro, pois é impossível pagar tantos juros aos golipões financeiros que nos levaram a uma total inactividade produtiva e industrial sem a qual um dia para lhes pagarmos os juros ou mais emprestimos, só se levarem os nossos cadáveres.
ResponderEliminarespero que sim e quanto mais cedo melhor
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