sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O que nos dizem os rankings (I)

Os grandes adeptos do ranking de escolas têm tendência a encarar a hierarquia que deles resulta como uma forma de instaurar a competição entre estabelecimentos de ensino, atribuindo-lhe um sentido quase darwinista de selecção natural. Nesses termos, os rankings servem para fazer justiça: as boas escolas são premiadas pela posição favorável que obtém na lista ordenada e os fracos resultados das escolas pior qualificadas ficam justiceiramente expostos aos olhos de todos.

O pressuposto desta perspectiva é simples: o desempenho de cada estabelecimento de ensino – medido através dos resultados dos seus alunos – reflecte o mérito ou demérito dos professores e órgãos directivos. E porque se trata de uma simples competição entre unidades escolares, os rankings são geralmente apreciados com destaque para as (10, 20 ou 30) melhores e piores escolas. Quanto à importância do perfil dos estudantes que acolhem ou das características dos contextos em que os estabelecimentos de ensino se inserem, reina em regra o silêncio. Presume-se um “tipo ideal” de aluno em territórios educativos “planos” e, por isso, irrelevantes para a análise.

Contudo, se olharmos para os resultados dos exames nacionais a partir de uma perspectiva territorial (agregando os resultados das escolas de cada concelho e convertendo todas as classificações para uma escala de zero a cem), verificamos que os rankings são afinal, essencialmente, um retrato das desigualdades de desenvolvimento do país. No mapa, relativo a 2010, é nítida a prevalência das melhores classificações médias na faixa litoral de Lisboa a Viana do Castelo, que contrasta com resultados menos expressivos no Sul e no interior do continente. Ou seja, é em regra nos territórios mais urbanizados e desenvolvidos (com o que isso significa em termos de níveis de habilitações escolares e acesso à informação e à cultura, por exemplo), que encontramos os melhores “desempenhos escolares”.

A forte dependência dos resultados dos exames, face às características dos contextos territoriais, torna-se aliás muito clara quando constatamos, por exemplo, que as capitais de distrito obtêm uma média (57,3%) superior ao valor de referência nacional (53,5%). Com algumas excepções, é nítida a tendência, nas regiões do interior e do Sul, para que concelhos com maiores níveis de desenvolvimento se destaquem pela positiva.

Significa isto que não há mérito (ou demérito) próprio das escolas nos resultados dos seus alunos, e que tudo se resume a uma simples refracção das características dos contextos sociais em que se inserem? Certamente que não. A questão é que hierarquizar estabelecimentos de ensino, descurando em absoluto o meio envolvente, pode levar a premiar sem fundamento uma escola que acolhe excelentes alunos e condenar uma outra que obtém resultados apreciáveis face às características do meio social em que se insere. São razões desta natureza que também explicam, de resto, parte das diferenças de resultados muitas vezes identificadas entre escolas do ensino público e escolas do ensino privado.

8 comentários:

  1. Muito bom ponto.
    O que sugere? Um factor ponderador a nivel nacional? Ou um agregar de escolas regionalmente e fazer varios rankings mais locais?
    Presumo que a segunda estrategia seria melhor ja que para uma familia, especialmente de parcos recursos e portanto com menor possibilidade de mobilidade o que interessa mais uma comparacao local.

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  2. Ao ler este post não posso deixar de recomendar este artigo no NY Review of Books que reflecte sobre esta temática:
    http://www.nybooks.com/articles/archives/2010/nov/11/myth-charter-schools/

    Mais importante do que investir na educação seria, segundo a autora, investir num estado social mais forte.

    Abraço

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  3. Os rankings dizem-nos que se seleccionarmos os alunos a pente fino eles tiram 10% melhor nota que nas escolas públicas... AI!

    COmo disse o JP:
    "O Ranking é uma falácia... Os betinhos estudam toda uma vida em escolas privadas. Vão para universidades privadas e fazem licenciaturas em Economia, Gestão, Direito, etc... Depois, através de amizades, saem para os cargos públicos de chefia e acabam por governar, levando o país para a situação em que está. A verdadeira avaliação nunca lhes foi feita neste percurso. Contudo, o Público pode fazer um outro Ranking: classificar a origem dos alunos mais bem cotados nas universidades e nos cursos de maior exigência. Em Medicina e Arquitectura irão perceber que a maioria dos alunos vêm das públicas. Não querendo ser um ultra-determinista, mas é um facto de que o meio determina o produto social. As escolas públicas aceitam tudo, pois é esse o seu papel. Ao contrário dos colégios betos, é inclusiva. Está na constituição: o Estado tem de garantir a educação para todos. Quem conhece as escolas públicas sabem que este facto é real. As turmas CEF são um exemplo disso. Num colégio de freiras, esses alunos nunca passariam do portão de entrada. Proponho que todos os alunos, de privadas ou de públicas, façam os exames num mesmo espaço e veremos se estes resultados se mantêm."

    Destruam o Ensino Público, privatizem tudo, façam do Ensino e Saúde um privilégio. Voltem ao 28 de Maio de 1926. Talvez assim a tugalhada acorde. Ah, espera... ele aguentou manso durante 48 anos até uns heróis se mexerem! Depois é que berrou, agachado atrás do herói!

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  4. Caro Lowlander,
    O seu comentário suscita aquela que é porventura a mais importante questão relativa aos rankings: para que servem? Em que podem ser úteis? Voltarei a essa questão em próximos posts.
    Desde já, importa sublinhar que mesmo aplicados a nível local, os rankings continuarão a espelhar em larga medida o tipo de alunos que cada escola acolhe (colocando portanto idêbticas reservas a tomá-los como expressão pura da capacidade de desempenho de cada estabelecimento de ensino).

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  5. Caro Anónimo, obrigado pela referência ao texto do NY Review of Books, que merece de facto ser lido (e que desconhecia).
    Um abraço

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  6. Caro Zuruspa,
    A demagogia dos rankings alimenta-se, efectivamente, do simplismo com que são em regra analisados. E tende a ofuscar as diferenças essenciais entre o ensino público e o privado (cuja qualidade - como procurarei demonstrar em próximos posts - não é "elástica", como tentam sugerir os defensores do cheque-ensino).

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  7. Compreendo que os rankings tenham que ser aperfeiçoados com factores de correção,sociais,e outros, mas escolas que estão sistematicamente nos primeiros lugares são boas escolas e as que ficam, sistematicamente, nos últimos são más escolas. Não se trata de uma competição trata-se de saber onde o estado deve alocar os seus meios financeiros e técnicos para melhorar as escolas que precisam de ser melhoradas.
    O grande erro, são os meus amigos que o praticam ao verem nos kankings simples classificações.Sabem também como eu que a solução não é acabar com os rankigs,é aperfeiçoá-los.

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  8. Caro Luís Moreira,
    Não se trata de facto de acabar com os rankings. Apenas de não tentar extrair deles o que eles não dizem. Uma boa escola é-o porque recebe bons alunos ou por mérito do desempenho dos seus professores? O que os rankings nos dizem é que - em regra - os resultados espelham fundamentalmente o território em que a escola se insere. Daí a sua utilidade, de facto, para fundamentar políticas de diferenciação e apoio a escolas com resultados menos favoráveis.

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