sexta-feira, 26 de novembro de 2010

A desigualdade provoca as crises (ou «O dia em que o FMI fez um discurso à Ladrões»)

A desigualdade de rendimentos pressupõe a perda de poder de compra das classes desfavorecidas, com implicações na redução da procura agregada. Esta quebra da pocura não é compensada pelo aumento de poder de compra das classes mais ricas, pois uma boa parte do aumento de rendimentos destas últimas dirige-se a investimentos em activos financeiros (logo contribuindo essencialmente para fazer crescer o valor desses activos, mas não a actividade económica em geral). É verdade que parte da riqueza acrescida dos mais ricos é reciclada sob a foma de crédito aos menos favorecidos, promovendo o consumo por parte destes. Mas como o rendimento destes últimos não aumenta (apenas consomem mais), crescem os riscos de os empréstimos não serem pagos. Com eles crescem também os riscos de ocorrência de crises financeiras. A menos que as crises dêm origem a uma deflação muito acentuada dos preços dos activos financeiros, ou a um aumento do poder de compra das classes menos favorecidas, os riscos de novas crise não diminuem (que é, basicamente, o que está acontecer neste momento).

Este tipo de análise já surgiu várias vezes neste blog. Agora houve alguém no FMI que resolveu pôr isto sob a forma de um modelo formal. Talvez isto ajude a que a mensagem ganhe direitos de cidadania no mundo dos 'economistas a sério' (se não mesmo junto daqueles que aparecem todos os dias a falar na televisão, jurando que a crise se deve ao crescimento excessivo dos salários ou ao desmesurado Estado Social).

5 comentários:

  1. É óbvio que houve alguém dos LdB que se infiltrou no FMI e fez sair essa declaraçäo. Eles väo desmentir toda esta cabala em breve.

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  2. Muito interessante, principalmente a forma como modelam o problema (ainda que nao seja, de todo, a minha area).
    Claro que 'the devil is in the details' e seria apenas justo mencionarem que as conclusões que tiram se baseiam num modelo de objectividade muito discutivel (aquelas utilidades e distribuições). É que o modelo parece estar feito à medida das conclusões a tirar... Sendo prática corrente em investigação (falo por mim), em que o proposito é mais desenhar um modelo que me tirar as conclusões que quero, é bom ter cuidado em extrapolar os resultados para a vida real.

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  3. correção a uma frase no meu comentario de cima:
    "(...) em que o proposito é mais desenhar um modelo que me __permita__ tirar as conclusões que quero (...)"

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  4. Vitor Jesus, você (e os que näo vêm o realmente inevitável, que é o fim do neoliberalismo) parece os "comunistas ortodoxos" de 1989, o barco a afundar-se e eles "näo, isto é tudo passageiro"... a vida real já demonstrou, ao longo destes 30 anos que o neoliberalismo só cria é desigualdade social e crises recorrentes.

    Para amais informaçäo, leiam "5 ideias económicas mortas-vivas que se recusam a finar" por exemplo em http://www.foreignpolicy.com/articles/2010/10/15/five_zombie_economic_ideas_that_refuse_to_die

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  5. Meua amigos,

    Os LdB publicaram outro trabalho com a chancela FMI: "Growth and Crisis, unavoidable connection?", Working Paper WP/10/267...Para disfarçar, aparece como autor um tal Roberto Piazza.
    Eu, que não sou economista, nem percebo nada de economia - por isso, leio "religiosamente" o LdB, peço o favor de nos interpretarem este estudo, onde me parece que se conclui que a limitação dos capitais/investimentos conduzem à deterioração do bem estar social (a tradução é minha ... do inglês técnico do artigo).
    Obrigada, desde já.

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