sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Contra a economia pacóvia

“Como repetidamente tenho afirmado, não há uma crise especificamente portuguesa, mas uma crise financeira da zona euro com repercussões mais graves na sua periferia, de que fazemos parte. Cada dia que passa torna isso mais evidente. A Grécia e a Irlanda (mas também países exteriores à zona euro como a Hungria e os estados bálticos) afundam-se numa situação sem saída à vista, numa prova evidente de que a política de austeridade imposta pelas forças de direita que comandam a União Europeia é errada e contraproducente. É ilusória a ideia de que Portugal ou a Espanha podem safar-se cumprindo as ordens de Bruxelas. No final deste absurdo processo de ajustamento, os países da periferia terão estagnação económica, desemprego elevado e níveis relativos de endividamento ainda maiores durante anos a fio (...) O dilema coloca-se, pois, entre a estagnação duradoura do continente e a reforma da governação política e económica na zona euro.”

João Pinto e Castro é um dos raros economistas que diverge publicamente da economia pacóvia, que nos colocou alegremente neste colete de forças. Somos poucos. E concorde-se ou não, e eu tendo a concordar, é sempre um prazer lê-lo. As divergências estão, talvez, no último e propositadamente ambíguo parágrafo: “Resta a um governo português decente e responsável proteger o seu povo na medida do possível das consequências de uma política sem grandeza e sem visão.” De resto, João Pinto e Castro sabe muito bem que as regras que estão em vigor na UE foram também geradas pela social-democracia das vias da moda. As estruturas que geram resultados de direita tiveram a cumplicidade activa de gente que se diz de esquerda, mas que na realidade passou a alinhar por bitolas intelectuais produzidas na década de noventa pelos Consensos de Washington ou de Berlim. A pergunta que se impõe: o actual governo português protege o povo com o PEC III? Ou estará mais preocupado com as necessidades dos senhores com quem se deixa fotografar em Wall-Street? O que é bom para o BES, não é necessariamente bom para Portugal.

Será que a descrição simples do governo burguês, feita por Marx e Engels em 1848, está a tornar-se verdadeira de novo? Temos de contrariar esta tendência ou aprofundaremos brutalmente a crise de legitimidade das democracias. Não há democracia sem uma economia civilizada. Os sindicatos europeus sabem-no e por isso fazem propostas sensatas, como a de se usar o fundo europeu para criar um programa de investimentos europeus que estimule a economia. E colocar o BCE a operar como um banco central, financiando directamente os Estados em dificuldades. Isto para não falar da emissão de euro-obrigações. Não há moeda única sem política económica digna desse nome.

4 comentários:

  1. As crises da Grécia, Espanha e Irlanda têm factores específicos que nós não tivemos: défices elevados há muito na Grécia (desde antes do início do euro, ocultados nas contas), rebentamento de bolha imobiliária em Espanha e colapso dos bancos na Irlanda (onde o défice estoirou por ainda estarem a injectar dinheiro nos bancos).

    A questão é saber como é que um país que há uns anos não tinha um problema orçamental grave, de repente, está à beira da ruptura.

    A explicação não é difícil: a crise internacional serviu para todo o tipo de despesas mais ou menos absurdas por parte dos governos Sócrates/PS.

    Supostamente as dívidas contraídas para permitir os défices portugueses dos últimos anos deveriam ter feito de nós um dos primeiros países a sair da crise. A realidade mostra que as dívidas e os juros ficam, enquanto os efeitos positivos das despesas desaparecem bem depressa (excepto para alguns, claro; e é aqui que se deve procurar a raíz dos problemas).

    É compreensível que o João Pinto e Castro queira desviar as atenções da governação e por isso defenda que a crise era igual para todos os países.

    A última frase é de uma ternura ao estilo de Salazar: tal como na segunda guerra mundial, o governo protege os portugueses das asneiras dos estrangeiros. E proteger as crianças dos maus passa por não lhes revelar a verdade.

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  2. "A questão é saber como é que um país que há uns anos não tinha um problema orçamental grave, de repente, está à beira da ruptura."

    Depende da definição de "grave", mas a verdade é que mesmo nos melhores anos a nossa situação orçamental não era, digamos assim, muito famosa, tendo alvo de dois procedimentos por défices excessivos em por ter excedido claramente o limiar de 3%, primeiro em 2001 e depois em 2005 e conduziu a um nível de dívida pública que nos punha no limite do "conforto".

    Some-se a isto os claros problemas relacionados de falta de competitividade e grave desequilibrio externo (para os quais contribuem claramente a conjugação de políticas europeias inadequadas e a incapacidade de adpatação da nossa economia - e dos nossos políticos - ao novo regime monetário), junte-se uma política eleitoralista pseudo-keynesiana e temos o cenário que nos conduziu onde estamos.

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  3. Tenho para mim que a economia de que se fala tem pouco de pacóvio, creio até que, do ponto de vista dos interesses que defende, é bem espertalhona.Porquê? Porque creio bem que ela tenta arrastar até onde puder que o mundo veja a tecnologia com base no petróleo, que domina por inteiro,como a única oportunidade de garantir uma vida de bem-estar para os povos. Mentira? Sabemos nós que sim, o problema é que a lógica desta "dinâmica capitalista" envolve quem nos governa a todos os níveis, desde o que vende o pão ao que dá crédito, desde o que reza ao que diz que nos informa? Complicado? Que sei eu!

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  4. A economia de que se fala, não tem nada de pacóvia, terá, isso sim, de espertalhaça, pois tenta arrastar até ao limite do impossível a ideia generalizada de que a técnologia do petróleo, que esta economia controla absolutamente, é a única que pode garantir aos "povos" uma vida de bem-estar e conforto político, social, familiar, o que se queira, afim de obter, para os poucos a quem interessa, avultadissimas receitas e os consequentes privilégios. para tanto, garantiram, a tempo e horas, o controle e a adesão dos que fazem o pão, dos que rezam, dos que dizem que nos informam, dos que nos dão emprego, dos ...Pacóvia? Será que queriam dizer devastadora?

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