O manifesto que alguns Ladrões subscreveram (“Manifesto dos 51”), recebeu um comentário desfavorável de André Barata no sítio da SEDES (já aqui comentado). O tema continua na ordem do dia e merece novas leituras. Acima de tudo, o autor esforça-se por mostrar que há grande convergência com o Manifesto dos 28 indo ao ponto de dizer que “no que não repete o documento dos 28, o dos 51 é simplesmente uma reiteração, não argumentada, do apoio à política governamental das grandes obras públicas.” Ao mesmo tempo, manifesta-se surpreendido porque [no Manifesto dos 51] “nem sequer é feita uma referência explícita a nenhum dos projectos particulares de grandes obras públicas que se tem tentado debater.”
Ao que parece, na SEDES há pessoas com dificuldade em perceber que se o Manifesto dos 51 não discute as grandes obras é porque não quer “pôr o carro à frente dos bois”. É porque, antes de uma discussão “projecto a projecto” que sempre deve ser feita com ampla participação e diferentes ângulos de abordagem, é preciso fazer uma escolha política que enquadre aquela discussão: hoje, em Portugal e na UE, qual é a prioridade da política económica? A prioridade dos subscritores do Manifesto dos 51 é o emprego. Com a única e honrosa excepção de José Silva Lopes (p. 10 do Público de 04.07.2009), a prioridade dos subscritores do Manifesto dos 28 é a contenção da despesa pública, como está latente no subtexto e bem à vista no seu ponto 7.
Embora a lista dos exemplos de investimento público que o Manifesto dos 28 recomenda seja longa, e a tipologia consensual, sabemos bem que o volume de recursos financeiros que esses economistas aí aplicariam não tem comparação com o dos projectos agora discutidos. Dito de outro modo: para mim, se após um debate aberto e tecnicamente informado, o próximo governo entender que é do interesse público deixar cair algum daqueles projectos, tanto quanto possível os recursos financeiros libertos devem ser aplicados noutros projectos com grande efeito multiplicador sobre o emprego. Claro que há restrições financeiras, mas é preciso que nos entendamos: por um lado, restrições não são objectivos e, por outro, as restrições não são imutáveis. Daí a necessidade de uma forte intervenção no plano europeu, assunto que já aqui abordei e a que espero voltar.
Já para os subscritores do Manifesto dos 28, um grande projecto cancelado é igual a muito dinheiro poupado. Para estes economistas, a política orçamental deve ser simbólica, quanto baste para disfarçar a falta de convicção no combate à crise. Se alguém tem dúvidas sobre este ponto, aconselho a leitura da entrevista que Luís Campos e Cunha, o líder natural do Manifesto dos 28, deu ao Público (27.06.2009 ) e à Rádio Renascença, onde afirmou: “todas essas pequenas obras são positivas. Eu tenho defendido que não vamos resolver o problema da crise com a política orçamental. A crise é internacional e será resolvida quando se resolver nos mercados internacionais.”
Como se pode ver, em plena crise do capitalismo neo-liberal, Luís Campos e Cunha assume sem complexos a sua fé na auto-suficiência dos mercados, no velho ‘laissez-faire’. Temos pois que não estamos perante um manifesto “mais técnico” que foi de seguida contraditado por um de cariz “mais político”, como o director do Público escreveu há dias em editorial. Estamos, isso sim, perante dois manifestos com diferentes opções para a política económica do País, embora num deles a política venha disfarçada de ciência económica “positiva”, o que quer que isso seja.
Nota final. Luís Campos e Cunha foi (por pouco tempo, é certo) ministro das finanças de um governo do Partido Socialista. Supõe-se que o critério do convite tenha sido o de ter um perfil “mais técnico”.
e' a diferenca entre o centro-esquerda e o centro direita. Nao e' muita, mas ha que vincar se nao perdem o espaco politico.
ResponderEliminarComo é que os 51 encaram o volume dos investimentos públicos? É ilimitado?
ResponderEliminarQuanto à saída da crise, é possível que Portugal resolva a crise só com a sua política orçamental?
Os 51 dizem claramente:
"respondemos a esta ameaça de deflação e de depressão propondo um vigoroso estímulo contracíclico, coordenado à escala europeia e global, que só pode partir dos poderes públicos."
Parece-me uma óptima proposta mas claramente fora do alcance de qualquer governo só por si, quanto mais do governo português.
Ora a questão essencial é saber o que deve fazer Portugal no contexto europeu actual? Avançar sozinho?
Quanto aos projectos concretos, o que acontecerá se se tornarem elefantes brancos a serem pagos durante décadas? Não corremos o risco de amenizar o problema actual e criar um problema muitíssimo maior daqui a poucos anos?
Eu quero ver onde vão andar os 51 quando lá para o ano 2011 vier uma Hiperinflação, decorrente da ressaca da metadona que os governos de centro-esquerda tanto gostam de injectar a torto e a direito na economia, e vierem os credores exigir o pagamento da dívida que já se encontra num ponto proibitivo. Certamente vão congeminar mais meia dúzia de argumentos para voltar a culpar o "Neo-Liberalismo das Costas Largas"
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