A economia é uma ciência muito conformista. O pluralismo fica para outros. Por isso é que muitos economistas andam sempre às aranhas com a crise. Abundam as metáforas naturais em que a crise se transforma num tufão. Afinal de contas, a crise não passa, para muitos, de um choque «exógeno» que perturba as suas idealizações de mercado. Um fenómeno que cai do céu aos trambolhões e ao qual os pequenos deuses que povoam os seus fechados modelos se adaptam de forma mais ou menos óptima. Questão de fricções quanto muito.
Agora toca a introduzir argumentos ad hoc e a crise torna-se «psicológica e de confiança» (o inefável António Borges ao Expresso). Se não é a psicologia é a «cultura» ou a «moral». É um truque comum: desprezar os poucos economistas que trabalham nestas áreas e depois invocar à pressa os seus temas quando tudo o resto falha. Alguns dos economistas que conseguem explicar a crise financeira trabalham seriamente na área da economia comportamental, com análises que introduziram as lições da psicologia social na Economia, que se desviam das conclusões ortodoxas e que reabilitam o magnífico capítulo XII da Teoria Geral de Keynes: racionalidade limitada, convenções, mimetismo, incerteza radical. No entanto, suspeito que os «argumentos» de Borges não passem de uma muleta necessária para quem andou a saudar as virtudes da expansão dos mercados financeiros liberalizados e agora não sabe o que dizer. Que tal privatizar a CGD ou a Segurança Social?
O Expresso, que escolheu entrevistar apenas economistas de direita, dá também a palavra a Ricardo Reis, um jovem e distinto macroeconomista neoliberal da Universidade de Columbia. Em Portugal ficou conhecido por defender o fim do IRS e por, em Agosto de 2007, ter afirmado com enorme sensatez: «Num mês não se falará nesta crise do crédito». Ricardo Reis diz agora que o Plano de Paulson original era «anticapitalista». Enfim, uma confusão. É o que dá ter o Capitalismo e Liberdade de Friedman como livro favorito.
Por sua vez, Manuel Alves Monteiro, ex-presidente da bolsa, ainda está em negação: «uma crise como outra qualquer (...) há-de passar». Já dizia Keynes: «servem de muito pouco os economistas que se limitam a dizer que depois da tempestade vem a bonança».
Caro Sr. Rodrigues,
ResponderEliminarAs criticas que apresenta no seu "post" parecem-me perfeitamente validas e legitimas (se bem que, como espera, eu discorde). Mas, se me permite, gostava de lhe apontar que eu *nao* previ que a crise ia durar um mes em Agosto de 2007. O que eu disse nessa entrevista foi:
"DE: Esta intervenção conseguirá evitar uma crise económica?
RR: Penso que sim, que se trata apenas de uma crise de liquidez, da qual daqui a um mês ninguém falara. No entanto, os mercados financeiros são hoje tão complexos e interligados que existe o risco de nos precipitarmos para uma crise financeira. Seria irresponsável ignorar esse risco, e os bancos centrais estão atentos."
Ou seja, eu descrevi dois cenarios, apontando que o primeiro era ligeiramente mais provavel, mas realcando que era irresponsavel ignorar ou subestimar o segundo cenario (que acabou por se verificar). O titulo escolhido para a entrevista apontava so para o primeiro cenario, mas nao foi esse o conteudo da minha resposta.
Por fim, note que na mesma altura, num artigo de fundo sobre a crise para o DE (http://ricardoamrreis.blogspot.com/2007/12/explicando-crise-do-subprime.html), escrevi: "O verdadeiro perigo é que os bancos estejam em piores sarilhos do que descobrimos nos últimos dias despoletando uma crise financeira. […] Este é um mau cenário: as crises financeiras têm efeitos imprevisíveis e perigosos."
E, ja' este Marco de 2008 no DE (http://ricardoamrreis.blogspot.com/2008/04/crise-financeira-de-2008_05.html) caracterizava a situacao actual como uma crise financeira muito grave.
Isto nao invalida as suas criticas, mas porque ja varias vezes o titulo que a jornalista escolheu para a entrevista foi interpretado como uma previsao arrojada que eu na realidade nao fiz, gostava de aproveitar a ocasiao do seu post para deixar este esclarecimento.
Atenciosamente,
Ricardo Reis
P.S.: Uma pergunta, se tiver tempo de me esclarecer: o que e' um "economista de direita" e o que e' um "economista neoliberal"?
O dogmatismo de João Rodrigues, e as suas certezas inabaláveis, são uma lição...
ResponderEliminarPVM
Estar cheio de certezas não é mto positivo, nunca foi!
ResponderEliminarRelembro no entanto q as certezas acerca da autoregulação do mercado e da mão invisivel tb existiram e ainda existem por parte de alguns jornalistas/economistas/comentadores nacionais q perante o choque da realidade com as suas crenças optam por defender as suas crenças! Digo eu q o problema para a auto regulação é a natureza do homem, assim sendo a auto regulação é uma quimera!
"Uma pergunta, se tiver tempo de me esclarecer: o que e' um "economista de direita" e o que e' um "economista neoliberal"?"
ResponderEliminarSe me permitem. O conceito económico neoliberal é aplicado através de estados com políticas financeiras mercantilistas e burguesas, logo de direita. Embora os dois conceitos não sejam necessariamente sinónimos, todos os economistas neoliberais são, em principio, de direita.
Se me puder indicar políticos de esquerda com ideias económicas neoliberais agradecia ... No entanto tenha em atenção ao real significado das palavras, principalmente de alguns sectores que se "dizem" de esquerda. Sempre existirão lobos com pele de cordeiro ...
Ricardo Reis: "E, ja' este Marco de 2008 no DE (http://ricardoamrreis.blogspot.com/2008/04/crise-financeira-de-2008_05.html) caracterizava a situacao actual como uma crise financeira muito grave."
ResponderEliminarUau, isso é que é visão! Bem pode limpar a sua pseudo-ciência aos muros, para não dizer a outra coisa...
Depois das vindimas, é sempre mais fácil contar as pipas. Agora o que é bizarro é que um professor da Columbia não enxergue o seu imenso atraso ao dizer "E já em Março de 2008", como se isso soasse a "atempadamente". Que tolinho...