terça-feira, 6 de maio de 2008
Globalização no Divã II
Algumas notas soltas para discussão: (1) o nosso capítulo sobre comércio internacional limita-se a recuperar a reflexão de List e a apresentar os contributos de alguns economistas contemporâneos mais ou menos heterodoxos; (2) as tradições com que simpatizamos podem ajudar a superar os estanques termos em que o debate sobre a globalização por vezes se encerra («globalização feliz» ou «orgulhosamente sós em economias locais»); (3) a questão interessante é perceber que o sucesso económico também depende da autonomia e capacidade nacionais para forjar políticas industriais estratégicas; (4) estas políticas devem moldar as forças de mercado numa direcção que permita uma inserção económica internacional que seja o mais vantajosa possível para o país em causa; (5) os países bem sucedidos construíram deliberadamente as suas vantagens competitivas através de um envolvimento activo do Estado totalmente contrário às prescrições universais do «consenso de Washington»; (6) o sistema de regras que estrutura as relações económicas internacionais no quadro da OMC corre o risco de atrofiar «o espaço de desenvolvimento» disponível para os países mais pobres; (7) acho que estas formulações de Dani Rodrik, economista neoclássico de Harvard, servem bem: «o facto de praticamente todos os países avançados terem embarcado no seu crescimento protegidos por barreiras alfandegárias e só terem reduzido a sua protecção subsequentemente oferece uma pista (. . .) No quadro de um conjunto de regras comerciais sensatas, os países industrializados teriam tanto direito de protecção dos seus arranjos sociais (. . .) como as nações em vias de desenvolvimento teriam de adopção de práticas institucionais divergentes»; (8) citações retiradas deste importante livro que vem dar um forte contributo para superar fundamentalismos: afinal o contexto conta e mesmo a economia dominante pode oferecer ‘um conhecimento prudente para uma sociedade decente’. Já agora vejam o que Lawrence Summers escreveu hoje sobre globalização. Alguns economistas de Harvard andam a ficar mesmo atrevidos.
Caro João,
ResponderEliminar1. Excelente debate em que me meti sem querer. Dani Rodrik é um dos meus campeões. Se concordamos os dois com ele, então temos obrigatoriamente de estar de acordo. Assim não pode ser! Com quem nos podemos debater, então? Aguardo com entusiasmo o amável convite que me fizeram para debater (a parte económica?) do vosso livro.
2. A verdade é que estando de acordo sobre algumas coisas básicas, então o debate pode tornar-se mais interessante.
Caro Pedro Lains,
ResponderEliminarObrigado por ter aceite o convite. O Rodrik foi uma das minhas descobertas recentes. É mais um a contribuir (e de que forma!) para que o debate avance (embora tenha muitas dúvidas quanto à sua "one economics"). Do que tenho lido, parece-me que dos vários "lados" a discussão começa a ficar cada vez mais interessante. Por isso teremos muito para discutir.
Como li algures, O Rodrik fala linguagem neoclaassica para poder falar com os noeclaassicos. Ele e o Ricardo Hausmann, devagarinho devagarinho, afastam-se do core dogmaatico e um dia perceberao, tal como muitos outros, que jaa estao muito longe...
ResponderEliminarUm exemplo ee o problem tree de um dos capiitulos. No uultimo curso em growth diagnostics jaa nem apresentaram a "problem tree" (que foi originalmente construido para pensar em El Salvador). Como ee que um modelo neoclaassico de crescimento endoogeno (com agentes representativos) poderia falar de problemas de coordenacao a la Hirshman?!?
O ponto essencial ee obviamente, que se tem que conhecer uma economia para poder falar dela... e que nem todos os problemas sao binding...
Abracos
Joao Pedro Farinha
Caro João Farinha,
ResponderEliminarPois é. Bela dupla. Vão longe. Hei-de discutir o livro do Rodrik no blogue. O Rodrik reduz a economia neoclássica à formalização matemática com o estranho argumento de que não é tão inteligente como o Hirschman...
Na definição do livro cabe tudo. Agentes orientados por propósitos que agem no quadro de constrangimentos criados pelo ambiente. Esta noção do ambiente como constrangimento também é abandonada.
A verdade é que os problemas que ele coloca o obrigam a sair do quadro analítico que ele fixou. Ainda bem.
Já agora: de que curso fala?
Caro Joao,
ResponderEliminarO capiitulo da "problem tree" seraa talvez o mais fraco do livro, que ee, na minha opiniao, muito bom. Mas ao mesmo tempo, esse capiitulo lanca a discussao na direccao certa. Nem todos os "problemas" numa economia pobre sao "binding" a cada momento, e portanto nao faz sentido recomendar uma longa "laundry-list" de reformas que uma economia pobre nao seria nunca capaz de implementar em paralelo, mesmo de acordo com o seu contexto especiifico...
Repara ainda na inconsistencia: no capiitulo das "growth accelerations", ee mesmo muito difiicil encontrar uma regularidade cross-country para o que despoleta esses "growth spurts"... no entanto, aquela "problem tree" para comecar a identificacao dos "binding constraints" para qualquer economia apresenta-se formatada de forma a tratar todos os problemas de falta de crescimento como um problema de falta de investimento privado. Mesmo sendo retirada de um modelo neoclaassico de crescimento endoogeno, um gajo descobre nos ramos coisas que um modelo desses nunca podia oferecer. Ou seja, existem inconsistencias teooricas ali, que os autores reconhecem, recomendando uma aplicacao cuidadosa da "problem tree". Acima de tudo, isto obriga o economista a conhecer e a estudar a economia em que se debruca, e a por de lado dogmas "neoclaassicos", usando linguagem neoclaassica para se entender com outros. Por isso fiz referencia a comentaarios que alertam que estes tipos do CID usam esta linguagem para conversar com economistas neoclaassicos. Mas devagarinho devagarinho...
Outro exemplo do perigo de olhar a shadow-pricing para identificar "binding constraints" ee o de falhar quando, por exemplo, uma economia sofre de "credit rationing". O mesmo Rodrik admite, nos seus papers sobre "modern industrial policy", que bens puublicos que sao necessaarios nao podem ser identificados atravees do "price-mechanism", precisamente pela sua natureza de bem puublico...
Um exemplo que li recentemente aplicado ao paiis onde vivo foi escrito por Alessandro Magnoli Bocchi, e pode-se encontrar aqui:http://ksghome.harvard.edu/~drodrik/Growth_Diagnostics_Index.html
Em breve, estaremos a fazer trabalho semelhante para o Paquistao: http://www.adb.org/Projects/project.asp?id=41661
O curso de que eu falava ee este:
http://ksgexecprogram.harvard.edu/program/wb/overview.aspx
Abracos e obrigado pela oportunidade de sempre encontrar discussoes tao interessantes por aqui
Joao Pedro Farinha
www.adb.org/Documents/Papers/Growth-Diagnostics/growth-diagnostics.pdf
ResponderEliminarJoao Farinha