sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Porque devemos ter um sector empresarial público (I)


Na passada segunda-feira, no seu monólogo semanal, António Vitorino defendia a privatização dos monopólios naturais, como a rede eléctrica nacional ou o abastecimento de água. Já aqui tínhamos sido muito críticos desta fúria privatizadora do governo, destituída de qualquer racionalidade económica.

Oportunamente, (o recorrente) Ha-Joon Chang publicou um relatório, encomendado pelo departamento dos assuntos económicos e sociais das Nações Unidas, sobre a reforma das empresas públicas. Escrito sem qualquer preconceito, o autor analisa teoricamente as vantagens e desvantagens destas empresas, estuda diferentes casos de (in)sucesso à volta do mundo e apresenta um modelo de reforma. A discussão não é simples e, sobretudo, não é fácil. As empresas públicas são recorrentemente associadas a ineficiência e incompetência. Por isso, voltarei a este relatório. Para já, transcrevo (com uns acrescentos meus) as quatro justificações para a existência destas empresas.

1. Monopólio Natural: em indústrias onde as condições tecnológicas impõem um só fornecedor monopolista, as empresas privadas poderão apropriar-se de rendas e produzir abaixo do nível social óptimo. Ex. Abastecimento de água ou electricidade (como a recentemente privatizada REN).

2. Externalidades: o sector privado pode ter incentivos reduzidos para investir em sectores que produzem bens essenciais para outras indústrias nacionais. Ex. indústria química.

3. Falha dos mercados de capitais: o sector privado pode recusar-se a investir em sectores considerados de alto risco ou com horizontes temporais muito alargados de retorno do investimento. Ex. indústria aeronáutica.

4. Serviços básicos: empresas do sector privado, guiadas pelo lucro, podem recusar (pelo preço ou pelo racionamento) a provisão de bens considerados essenciais aos mais pobres ou àqueles que vivem em zonas remotas (exemplo: transportes colectivos, serviços postais).

5 comentários:

  1. Alguns argumentos (da literatura tradicional) parecem-me fracos, especialmente porque tomam o mercado como o primordial. O Estado parece que é uma espécie de second best, quando não tem necessariamente que ser assim.

    O caso Português é bastante interessante com práticas de gestão arcaicas predominantes em ambos os sectores público e privado. E as modernas apenas uma excepção.

    Especialmente porque é facilmente contornável. Se é monopólio natural, faz-se uma entidade reguladora. Se há externalidades idem aspas. E não há necessidade de haver um sector público. O último argumento é contornável através de uma política assistencialista.

    Acho que se precisa de ir bem mais longe na análise.

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  2. O documento encontra-se aqui:

    http://esaconf.un.org/wb/file.asp?file=SOEReformPolicyNote%2Epdf

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  3. Samir Machel disse:

    «Se é monopólio natural, faz-se uma entidade reguladora. Se há externalidades idem aspas.»


    A entidade reguladora é privada ou pública? É que em qualquer dos casos a corrupção é uma chatice.

    “O financiamento ilegal da Somague ao PSD, através do pagamento de uma factura de 233 415 euros por serviços prestados pela Novodesign àquele partido e à JSD, não vai ser, para já, alvo de inquérito criminal por parte do DIAP”.

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  4. Eu acredito tanto nas entidades reguladoras como no pai natal. O que eu questiono é os argumentos tradicionais que são fracos.

    Creio que o argumento deveria ir noutra linha, mais na escalpelizacao dos incentivos e na possibilidade de cada sector conseguir chegar ao objectivo: o fornceimento de servicos, producao de bens... Por exemplo na saúde, os privados tendem a fornecer menos quantidade de servico pelo mesmo dinheiro: menos camas,... A fiabilidade dos seguros de saúde é uma mentira, portanto uma falsa solução.

    Para tal funcionar e nao ser apenas uma antecamara para o privado implica que o sector público seja dominante, para evitar promiscuidades.

    PS - Como o diogo bem aponta a corrupcao é um problema quer seja privado e público. O regabofe que tem sido em portugal no sector públicos, nas ditas entidades reguladoras e no sector privado é escandaloso! E nao devemos ser complacentes com tal.

    Se a nomeacao dos gestores públicos é o que se sabe, os membros das entidades reguladoras estão sempre em muda para o sector privado...

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