sexta-feira, 29 de novembro de 2024

Fiabilidade dos números ou manobra de evasão?

Volksvargas, A vida e a morte de uma aldrabice em três actos

1. Em mais uma surpreendente notícia veiculada através do Expresso, o ministro da Educação Fernando Alexandre vem agora dizer que, por falta de fiabilidade dos dados, afinal não é possível aferir o objetivo a que se propôs em junho: no final do 1º período, a «redução em pelo menos 90% do número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo em relação a 2023/24» (Plano +Aulas +Sucesso, página 12). Isto é, uma redução relativamente aos alunos que, em dezembro do ano passado, não tinham aulas a pelo menos uma disciplina.

2. Sejamos claros: o problema começa aqui, o problema está aqui e sempre esteve aqui. Na forma como o governo fixou a fórmula de cálculo do seu objetivo, que num erro grosseiro e inaceitável manipulação de dados compara o que não é comparável. Fernando Alexandre não pode, seriamente, ponderar o universo de alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina desde o início do ano letivo, com o total de alunos sem aulas a uma disciplina num dado momento (e que inclui, portanto, os alunos que começaram o ano letivo com todos os professores). O erro da fórmula é, nestes termos, alheio à fiabilidade dos dados. Mesmo com dados fiáveis a fórmula continua a ser errada.

3. Mas o argumento tem um outro problema, não menos grave. Se é legítimo duvidar da capacidade dos serviços para apurar, passo a passo, o número de alunos sem aulas desde o início do ano letivo, já não colhe a dúvida relativamente à capacidade de saber, a cada momento, quantos alunos estão sem aulas a uma ou mais disciplinas. Duvidar disso seria duvidar dos horários não preenchidos que as escolas comunicam regularmente ao ministério da Educação, e que permitem estimar o número de alunos sem aulas, independentemente de estes se encontrarem, ou não, nessa situação desde o início do ano letivo.

4. Aqui entramos numa dimensão ainda mais problemática. Foi o próprio ministério da Educação que referiu, ao Expresso da semana passada, a existência de um total de 41 mil alunos sem aulas a pelo menos uma disciplina. Estando ou não nessa situação desde o início do ano letivo, a verdade é que é este o universo que importa considerar para aferir a melhoria da situação face a 2023. E o que nos dizem as estimativas, como a da Fenprof (cerca de 31 mil alunos no final de novembro do ano passado), é que o universo global de alunos sem aulas a todas as disciplinas se agravou.

5. Face ao total de alunos que chegou ao final do 1º período do ano passado sem aulas a pelo menos uma disciplina (os tais cerca de 21 mil), isto significa que o ministério da Educação tem agora menos de um mês para se aproximar desse valor, objetivo que se afigura pouco exequível. Por isso - e não pela questão relativa ao grau de fiabilidade dos números - é legítimo supor que o ministro Fernando Alexandre, ao desqualificar os dados (e o trabalho da DGEstE), está na verdade apenas a tentar não ser confrontado pela realidade, que o obrigaria a reconhecer o fracasso das medidas adotadas. Se assim não é, espera-se que pelo menos compare a situação do total de alunos sem aulas no final de dezembro deste ano com a situação no ano anterior. Para que não suceda, a uma aldrabice descarada, uma desculpa esfarrapada.

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