Miguel Sousa Tavares (MST) escreve no Expresso desta semana um texto em que ataca “a doutrina instalada da bondade de uma alta carga fiscal sobre a produção de riqueza”, segundo ele “um credo cultivado por economistas próximos da extrema-esquerda, com audição privilegiada na nossa imprensa.” Escreve o texto à boleia de um estudo recente da Fundação Francisco Manuel dos Santos, que elogia por “aportar rigor técnico àquilo que o senso comum já concluíra por si”, de acordo com o qual “baixar de forma assertiva, e não apenas cosmética, o IRC sobre as empresas produziria resultados imediatos e duradouros na economia”. Afirma ainda que se trata “da receita irlandesa, cujos resultados estão à vista, para poderem ser invejados ou desdenhados”.
Em meia dúzia de linhas faz aquilo que não se deve fazer num debate sério: (i) tenta desqualificar quem pensa de forma diferente, não pelos argumentos que usa, mas por estar num campo político diferente do seu; (ii) declara como definitivo o resultado de um estudo, que é apenas um entre muitos, não pelos seus méritos ou fragilidades, mas por validar o suposto 'senso comum'; e (iii) reduz o desempenho da economia irlandesa à questão fiscal, como se a história de alguma economia nacional fosse assim tão simples.
Como contributo para a reflexão, deixo aqui três ideias. Primeiro, os economistas que põem em causa a bondade das descidas de impostos sobre os lucros incluem os prémios Nobel Joseph Stiglitz e Paul Krugman, ou Thomas Piketty (se estes são de ‘extrema-esquerda’, estamos conversados). Segundo, os argumentos usados por estes e outros economistas para criticar a descida de impostos sobre lucros baseiam-se não apenas nos efeitos distributivos (quem ganha e quem perde), mas também na relação cada vez menos estreita que existe entre lucros depois de impostos e investimento produtivo; ambos os aspectos põem em causa a relação entre baixa de IRC e crescimento económico. Terceiro, explicar o desempenho da economia irlandesa ignorando as décadas de atracção selectiva de investimento estrangeiro, a língua inglesa, as ligações históricas à diáspora nos EUA ou o investimento massivo (desde a década de 1960) na educação e formação avançada (em particular na área da engenharia), simplesmente não é sério.
O MST tinha de pagar o preço de escrever contra a linha editorial do Expresso, no caso da guerra da Ucrânia. Já começou.
ResponderEliminarNão sei bem como classificar a personagem: se como parasita sério ou sério e parasita. Mas encontra-se no seu pleno direito.
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