O Instituto +Liberdade, uma espécie de think thank não oficial da IL, publicou recentemente um gráfico em que sugere que os «portugueses utilizam cada vez menos os transportes colectivos (comboio, autocarro ou metro) nas deslocações para o trabalho ou local de estudo», num tom de aclamação do transporte individual. Para o efeito, recorre aos dados dos três últimos recenseamentos (2001, 2011 e 2021), ignorando olimpicamente que no ano de 2021 estávamos em plena pandemia, o que obviamente impede qualquer comparação séria com os censos anteriores.
A marosca (ou incompreensível leviandade) foi oportunamente assinalada pelo República dos Pijamas, que para o efeito partilhou gráficos ilustrativos da queda do número de passageiros nos comboios suburbanos (-84% entre dezembro de 2019 e abril de 2020) e no sistema metropolitano (-88%, no mesmo período). Isto é, uma variação consentânea com a descida, a nível nacional, para o transporte público rodoviário (excluindo táxis) e ferroviário, entre 2019 e 2020, na ordem dos -428 mil (-44%), como mostra o gráfico da direita.
Dado que a pandemia afetou incomparavelmente mais o transporte público que o privado, por óbvias razões, o ano de 2021 não serve, portanto, para o pretendido. Se o +Liberdade/IL quisesse fazer uma análise séria (ou sem ser em cima do joelho), utilizaria para por defeito o ano de 2019 (pré-pandemia). E se assim procedesse, chegaria a conclusões bem diferentes das conclusões a que chegou, como mostra a estimativa feita para esse ano na tabela seguinte.
De facto, comparando 2011 com 2019, constata-se que o transporte público é a única modalidade a registar um aumento de passageiros (a rondar os +0,6%), tendo o automóvel perdido cerca de 43 mil no mesmo período (-1,2%). O que significa que, em termos relativos, o automóvel assume em 2019 uma percentagem de 62,9% (e não os 66% que o gráfico do +Liberdade exibe), passando o peso relativo do transporte público de 16,5% em 2011 para 17,2% em 2019. O que não permite que se diga, como faz o +Liberdade na sua publicação, que nas últimas três décadas «o automóvel vai substituindo os restantes meios de transporte». Diz que são factos, mas vai-se ver e afinal não.
E mesmo que fossem factos, dificilmente seriam de aplaudir. O desperdício energético e o impacto ambiental da utilização generalizada do automóvel dificilmente é compatível com preocupações ambientais. Mas isso não deve preocupar a IL. São mais do tipo suicida...
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