Foi com grande satisfação que soube que acabou de ser lançada, pelas Edições 70, a tradução para português de uma das obras mais importantes dos últimos anos, Dívida - Os Primeiros 5000 Anos, de David Graeber.
Uma obra fundamental, lançada originalmente em 2011 que
explica a origem e a história da dívida (e por definição, da moeda) e as
consequências para uma sociedade baseada nela. Partindo da questão moral:
“certamente todos temos de pagar as nossas dívidas”, esta obra segue com uma
enorme erudição, começando por apresentar a destruição do mito da origem da
moeda a partir da troca direta (que ainda povoa hoje quase todos os manuais de Introdução à Economia), até à descrição de como a dívida, ou seja, a economia
monetária, se impôs, ao longo dos séculos, através da
violência, terror, guerra, escravatura, afetando e transformando toda a estrutura
moral das sociedades humanas onde se inseriu, desde tempos bíblicos até hoje. A
história da dívida é uma história de poder onde esta se assume como imposição
económica transformada em código moral: “a dívida é uma promessa corrompida
pela matemática e pela violência”.
A história mostra que
a dívida não é, nem natural, nem única e daí a importância de nos recordarmos que “o
dinheiro não é inefável, que pagar as próprias dívidas não é a essência da
moralidade, que todas estas coisas são arranjos humanos e que, se a
democracia tem algum significado, é a capacidade de todos concordarem em
organizar as coisas de uma forma diferente.”
É uma história particularmente importante para economistas
que continuam a acreditar no mito da neutralidade da moeda e na ideia de que
existe um mercado livre baseado nas livres escolhas de agentes económicos
observando apenas o seu próprio interesse, que nos amarra à ausência de
alternativas.
Infelizmente, o autor deixou-nos, precocemente, em 2020.
Fica a sua obra, da qual destaco também Trabalhos
de Merda (também editado pelas Edições 70) e The
Dawn of Everything: A New History of Humanity (ainda não traduzido para
português).
Pagar uma dívida que não é, não foi nem nunca será nossa é sempre de uma enorme indignidade.
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