Depois do plano de emergência do PSD, participei no “duelo” do Expresso da semana passada, tendo, uma vez mais, Pedro Brinca como oponente: O plano apresentando pelo Governo é o plano de que o país precisa? Não:
O plano apresentado pelo governo fica aquém do que seria necessário para compensar a perda de poder de compra das famílias trabalhadoras, não contribuindo para enfrentar os problemas com que o país se depara.
Embora ajudem a mitigar o efeito da subida da inflação, que é puxada pelos custos da energia, os apoios anunciados não acompanham o crescimento dos preços. E isto é assim, desde logo, pelo caráter excecional e modesto de medidas muito inferiores ao acréscimo de receita fiscal que o Estado teve, só no primeiro semestre, devido a essa mesma inflação. Irá então ocorrer uma perda do poder de compra associado aos salários, pensões e prestações sociais. As previsões de redução do défice e da dívida pública deste ano são, em si, reveladoras do objetivo principal do Governo.
Antecipa-se, portanto, um aumento das desigualdades sociais, uma vez que o cabaz de compras das famílias de mais baixos rendimentos é composto pelos bens e serviços que mais aumentos sofrem, mas também pela discrepância na distribuição de rendimentos entre o trabalho e o capital. De facto, a quebra do valor real dos salários, ao mesmo tempo que um conjunto significativo de setores continua a auferir lucros extraordinários com a crise que ficarão por taxar, traduz-se numa transferência de rendimentos dos trabalhadores para o capital superior à registada no período da Troika. O limite da atualização das rendas para 2% não deixará de produzir o mesmo efeito, já que os senhorios serão devidamente compensados por via fiscal. Por outro lado, não se prevê qualquer apoio para as famílias com empréstimos à habitação. A nefasta subida da taxa de juro por parte do BCE irá trazer dificuldades acrescidas para as famílias com hipotecas, gerando fragilidade financeira acrescida na economia portuguesa.
Com os salários, diretos e indiretos, crescentemente desalinhados com a inflação, que continuará elevada no próximo ano, acentuar-se-ão as já gritantes desigualdades sociais. Por sua vez, o efeito da degradação do poder de compra sobre a procura fomentará a recessão pondo em causa o almejado controlo da dívida pública.
As medidas de controlo dos custos da energia, que contemplam a redução do IVA sobre a eletricidade e a redução do imposto sobre produtos petrolíferos, não vão no sentido desejável face à necessidade de redução do consumo dos combustíveis fósseis. Seriam bem mais acertadas medidas de reforço dos transportes públicos, como a redução dos preços ou mesmo a gratuidade dos passes, com a devida atenção para a especificidade das zonas do interior onde escasseiam as redes de transporte público.
Em suma, ao não resolver o problema da perda de poder de compra das famílias, o plano do Governo não conseguirá evitar a recessão que será prejudicial ao equilíbrio das contas, nem combater a inflação cujas causas não se encontram numa procura cada vez mais estrangulada.
«um conjunto significativo de setores continua a auferir lucros extraordinários com a crise que ficarão por taxar»
ResponderEliminar- Quais sejam e qual dimensão sempre fica por dizer
- Sempre serão taxados
- Sempre a inflação requer acréscimos de capital
Há inflação que se resolva sem acréscimos de produtividade ou diminuição de consumo?
Se calhar, as propostas para as pessoas deixarem de ir de carro para o trabalho deviam incluir o pagamento e inclusão dos movimentos pendulares de/para o trabalho no salário e no horário de trabalho.
ResponderEliminarÉ que não é benéfico para os trabalhadores perderem ainda mais tempo nas suas deslocações de e para o trabalho.