quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

O rigor é um lugar estranho

Quando apresentou a proposta de Orçamento do Estado para 2022, António Costa fez questão de sublinhar a «forte aposta» no investimento público. A chegada dos primeiros montantes do Fundo de Recuperação europeu, no âmbito do qual Portugal receberá cerca de 13,9 mil milhões de euros em subvenções até 2026, contribuiu para o entusiasmo do primeiro-ministro e dos restantes membros do governo. O ministro das Finanças, João Leão, chegou mesmo a dizer que estávamos perante o maior impulso macroeconómico das últimas décadas. Mas a verdade é que, como assinalou a Comissão Europeia. a proposta do governo deixaria o país na cauda da Europa no que diz respeito a este indicador.

Não é um fenómeno novo. Em 2016, sobre o tema do investimento público, Costa dizia que «há duas formas de estar na vida, os que ficam à espera que aconteça e os que fazem acontecer». colocando-se, sem hesitação, do lado dos segundos. Em 2017, o primeiro-ministro prometia aumentar o investimento público em 20% e distribuir fundos por «escolas, centros de saúde, hospitais, instalações de forças de segurança [e] rodovias». Em 2018, anunciava novamente «um crescimento mais significativo» desta rubrica. Em 2019, garantia que o país estava no «momento certo» para reforçar o investimento público, algo que considerava «absolutamente essencial». Em 2020, já com o país a enfrentar a pandemia, o investimento passara a ser «absolutamente inadiável». Chegando a 2021, salientou que «nestes momentos de crise, é mesmo a altura de apostar em fazer aquilo que há muito está por fazer» no que toca ao investimento, assegurando que o histórico do governo a este respeito «não são números no ar, é obra concreta». Em todos estes anos, o país registou os níveis de investimento público mais baixos da sua história recente e foi sistematicamente o país da União Europeia que menos investiu. E este (suposto) rigor orçamental tem enormes custos para o país.

O resto deste texto pode ser lido no Le Monde diplomatique - edição portuguesa, em papel ou online


3 comentários:

  1. O que o gráfico mostra é um aumento moderado mas consistente do investimento público depois do mínimo absoluto de 2016. Para sermos rigorosos, temos de perceber de onde partimos. E isto num cenário em que as contas públicas têm sido razoavelmente controladas. De nada vale falar do que se fez em 2010, porque sabemos bem as condições na altura e depois o que se seguiu...

    A questão é outra, Vicente Ferreira. Hipérboles costistas à parte, a Esquerda continua a achar que os déficits não importam, enquanto Costa não quer dar passos maiores do que a perna...

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  2. Há já não poucos anos por esta altura os mais altos responsáveis da nação dizem “Este é o ano de viragem!”… nunca é…

    António Costa é um neoliberal, este “socialista” tal como tantos outros do Partido - que não é - Socialista acreditam nas “contas certas”, ou seja, acreditam na austeridade permanente, acreditam, apesar de não o admitirem, na supremacia dos ditos “mercados-livres”.

    As “elites” portuguesas são elites subalternas, todavia, “elites”.
    António Costa, Marcelo Rebelo de Sousa e outros (as) fazem parte do grupo que alguns chamam “elites”, estas “elites” têm vida confortável, não são o alvo da austeridade, não sentem urgência da mudança.
    As “elites” portuguesas servem “elites” que estão numa posição superior, nomeadamente as da Alemanha, e são recompensadas por seus serviços.
    António Costa, Marcelo estão a gerir o declínio da população portuguesa, é-lhes indiferente os sacrifícios causados pelas regras europeístas, eles só querem saber se se vão manter nas posições que ocupam e se os da sua casta têm futuro garantido nas ditas “elites”.

    A mudança vem da base, do povo.

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  3. Jaime Santos: o gráfico não mostra o que diz e o texto explica precisamente porque é que devíamos ter aproveitado o período de taxas de juro próximas de 0 para ter défices maiores. O efeito multiplicador do investimento significa que os défices orçamentais são perfeitamente compatíveis com a redução da dívida pública em percentagem do PIB.

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