domingo, 27 de setembro de 2020

Um número triste, mas revelador


O Expresso chegou ontem ao número 2500 e decidiu assinalar a data. Para lá de um suplemento preguiçoso, convidou Leonor Beleza, Paula Amorim e Joana Vasconcelos para uma ideologicamente reveladora colaboração editorial, tendo o poder de definir os temas a abordar neste número. Estamos perante representantes, respectivamente, do filantrocapitalismo, do capitalismo monopolista de herdeiros e da cultura do porno-riquismo, celebrada, por exemplo, em Versalhes.

Paula Amorim excedeu-se no suplemento de economia: da opinião de Paulo Portas à de Adolfo Mesquita Nunes, este último assalariado de Amorim na Galp; de uma entrevista a Salvador de Mello da CUF,  um capitalista da doença parasitária a uma notícia sobre investimentos na Graça do seu sócio no rentismo fundiário da Comporta, o francês Claudio Berda. 

E que dizer da espiritualidade de um capitalista reformado da indústria farmacêutica, Luís Portela, na revista? Toda uma cultura. Houve de tudo. 

Mas será que houve mesmo um tempo em que esta imprensa teve alguma autonomia real em relação aos interesses e valores dominantes, os da classe dominante? Não sei. Sei que neste tempo não tem qualquer autonomia editorial e já não disfarça.

14 comentários:

  1. Tenho piores notícias:
    Não se trata de representantes da classe dominante; são representantes do modo de produção mundial que, não sendo único andará pelos 99,?? do produto mundial.

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  2. Isto é off-topic para este post, mas toca num assunto debatido ocasionalmente no LdB: Modern Monetary Theory (MMT). Um académico britânico escreveu um texto muito elucidativo, acerca da relação entre MMT e a ideia de "degrowth", isto é, a de procurar alcançar uma maior qualidade de vida, ao mesmo tempo que se *diminui* o crescimento o económico. Mas a razão que me leva a trazer dito texto para aqui, é porque acerta na mouche ao explicar a farça que é a ideia da "responsabilidade fiscal" por parte dos governos (e é também um excelente argumento a favor da recuperação da soberania monetária):

    «All of this raises a question. If governments can create and spend money so easily, then why have they so long told us otherwise? Well, according to MMT economists, the narrative of “fiscal responsibility” is a ruse that’s intended in large part to prevent people from demanding that governments provide job guarantees and universal public services (remember, governments are happy to create money when it comes to financing wars and pumping up asset values, but when it comes to paying for public services, they say it’s not possible). Why would governments do such a thing? Because if people have access to a public job guarantee doing socially useful work, and if they have access to high-quality universal services, then why on earth would they ever agree to do socially unnecessary, meaningless or degrading labour for private firms, if the goal of such firms is primarily to accumulate profit for the holders of capital? They wouldn’t.»

    https://www.jasonhickel.org/blog/2020/9/10/degrowth-and-mmt-a-thought-experiment

    Finalmente, e de modo menos off-topic, também ponderei adquirir esta edição comemorativa do Expresso. Iniciei uma leitura diagonal de um exemplar emprestado por uma pessoa amiga, e bastou encontrar o texto de Miguel Sousa Tavares (cito de memória o título: "Isto é que é mesmo gozar com quem trabalha!") onde, entre muitas outras alarvidades, se denuncia o chamado "imposto Mortágua", que "penaliza quem investe no imobiliário, gerando riqueza e produzindo crescimento económico" (estou a parafrasear, novamente de memória).

    Tendo verificado que o resto do jornal, com parcas excepções, afinava pelo mesmo diapasão, devolvi o exemplar, e não pude evitar pensar: com uma imprensa desta, quem é que precisa de propaganda? (Obviamente que não o adquiri.)

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  3. A MMT, neoliberalismo e degrowth é sinónimo de ricos mais ricos e pobres mais pobres. O degrowth tem sido usado e abusado nas democracias liberais, sobretudo acompanhado da crise climática e da sua agenda da revolução verde. A Neo Zelândia tem um governo que se quer inclinar nesse sentido, criando uma muralha economica, ambiental e social, que considero uma estratégia de isolamento num mundo globalizado em crise. É também um país de fortes desigualdades económicas. Vivem das finanças e do sector primário. O grande problema dessas três ideias é quando começam a entrar nas políticas dos países em desenvolvimento, negado-lhes qualquer futuro. Paulo Seara

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  4. A realidade é que o jornalismo sendo um poder, o 4o, para ser mais preciso, faz com que se torne demasiado apetecível à gula dos grupos económicos que pretendem moldar a sociedade de acordo com os seus interesses. Simples.
    Façamos um exercício:
    - O Coiso do Chega que já tinha escola política no PSD ganhou protagonismo numa eleição autárquica por ter frases polêmicas contudo, mesmo com a máquina eleitoral do PSD atrás de si, não foi além de um sofrível 3o lugar. Caiu no esquecimento e desapareceu com a espuma dos dias... então como é que este personagem ganhou relevância mediática?
    COMO comentadeiro do futebolês nacional
    ONDE na CMTV o seu estilo de combate fácil e popularucho de tasca tornou se a sua imagem de marca
    QUANDO se "altercou" e se "excedeu" no comentário foi "saneado " e a sua ligação à CMTV tinha aparentemente cessado... será?
    PORQUÊ este fim se o coiso até dava canal? Porque havia outros objetivos para o coiso e se Marcelo utilizou um canal para fazer campanha durante 10 anos porque não existir um canal (ou um grupo económico) que fabrique o seu próprio candidato?
    O O QUÊ advém da criação de um partido político que veio abertamente ocupar um espaço no panorama eleitoral que o CDS nunca teve a coragem de assumir ... uma extrema direita em linha político ideologica com o crescimento dos nacionalismos europeus.
    Este exercício é a demonstração prática de como o 4o poder pode ser manipulado para outros interesses que não o simples e mui nobre ofício de informar.


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  5. Lapidar esse fragmento deste texto de Jason Hickel

    Quanto às piores notícias de jose, o que dizer? Desejar-lhe as melhoras e esperar que as piores tenham passado.

    (Não há muito vendia-nos o TINA com aquela pesporrência do género. Agora quer vender-nos os porno-ricos, como "representantes do modo de produção mundial". Tchtchtch )

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  6. pena não ter substituído a página do Louçã

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  7. Por estas e por outras é que não leio o expresso há, pelo menos, 20 anos.

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  8. Caro Paulo Seara,

    «A MMT, neoliberalismo e degrowth é sinónimo de ricos mais ricos e pobres mais pobres. O degrowth tem sido usado e abusado nas democracias liberais, sobretudo acompanhado da crise climática e da sua agenda da revolução verde.»

    Não tenho a mínima dúvida que a ideia de degrowth esteja a ser abusada para manter o status quo. Afinal de contas, isso aconteceu com quase todas -- se não mesmo todas -- as ideias/ideologias da história. Mas uma tal afirmação carece de provas (e o Paulo não as fornece). Jason Hickel, tanto quanto sei, defende exactamente o contrário; basta espreitar a sua feed do twitter. No caso especifico sobre desigualdades, lê-se por exemplo que se deve:

    «Degrow billionaires. Regrow life.» -- https://twitter.com/jasonhickel/status/1257326143914610691

    Estranha maneira de fazer dos ricos mais ricos...

    «O grande problema dessas três ideias é quando começam a entrar nas políticas dos países em desenvolvimento, negado-lhes qualquer futuro.»

    Isto está simplesmente errado. Sugiro a leitura do livro "The Divide", também de Hickel, que trata *especificamente* do caso dos países em desenvolvimento. Uma das grandes promessas do degrowth -- como é explicado no livro -- é precisamente permitir o desenvolvimento desses países, impondo limites à globalização e às instituições que a regulam (FMI, Banco Mundial, etc.):

    https://twitter.com/jasonhickel/status/1125840091379896324

    (Nota: Hickel está longe de ser o único a trabalhar nestes assuntos, mas é, para mim, um dos que melhor o sabe comunicar. É por essa razão que me socorro mais dos seus textos.)

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  9. Já agora caro Paulo Seara, uma pequena adenda ao meu comentário anterior:

    «A MMT, neoliberalismo e degrowth [...]»

    Eu estou convicto de que todos os defensores de MMT e/ou degrowth são, no mínimo, altamente cépticos em relação ao neoliberalismo. Mas se souber de algum exemplo do contrário, sinta-se à vontade para me elucidar...

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  10. Sim, houve um semanário, "O JORNAL",que era relativamente independente do poder económico, por os seus sócios serem jornalistas. Infelizmente, de curta duração.

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  11. «representantes do modo de produção mundial»

    As máquinas (os tais 99,9%) são representadas pela Joana Vasconcelos?

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  12. Paulo Seara está à procura do dicionário holandês-português

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  13. Saia aí uma pergunta-desabafo para o desabafo-resposta de jose. Numa qualquer língua bárbara

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