quinta-feira, 3 de setembro de 2020

Prioridades especulativas

Em virtude do seu impacto, essencialmente no turismo internacional mas também na procura imobiliária e na contenção do Alojamento Local, tornou-se plausível pensar que a descida de preços da habitação pudesse vir a constituir, pelo menos no médio prazo, um dos poucos «benefícios colaterais» da irrupção da pandemia.

De facto, na sequência do aumento dos valores de aquisição e das rendas ao longo dos últimos anos, sentidos sobretudo nas grandes cidades (e nomeadamente em Lisboa e na AML), dir-se-ia que a crise pandémica poderia estar a contribuir, escrevendo por linhas tortas, para o desejável «arrefecimento» do mercado e a melhoria do acesso à habitação por parte de famílias de rendimentos intermédios e com menores rendimentos.

Desejável descida dos preços e melhoria do acesso? Sim, mas não, ao que parece, para todos os «agentes». De acordo com um artigo recente no The Telegraph, citado pelo Diário Imobiliário, as empresas inglesas do setor parecem estar muito interessadas em conhecer o «segredo de Lisboa, um dos poucos mercados principais do mundo em que os preços das casas ainda podem subir em 2020», ao contrário do que se espera aconteça com Paris, Madrid, Londres, Genebra ou Berlim, que terão neste sentido «um ano difícil pela frente». Um contraste que leva o periódico a perguntar porque não pode o mesmo «acontecer em Londres» e o que se poderá «aprender com uma cidade cujo mercado imobiliário está definido para reverter a tendência de queda».

Os objetivos de uns não são, claro está, os objetivos de outros, com as lógicas do mercado especulativo declaradamente indiferentes a qualquer espécie de ideia de bem comum. Razão pela qual, aliás, vale mesmo muito a pena ler o artigo da Ana Cordeiro Santos na edição de agosto do Le Monde Diplomatique (edição portuguesa), dedicado às contradições entre a função social da habitação e o papel do Estado, por um lado, e as lógicas de financeirização e especulação em que mergulhou o setor, por outro.

7 comentários:

  1. As questões morais só afetam os proprietários quando as consequências das crises os atingem negativamente.
    Se as consequências forem positivas, não há questões morais.
    O futuro visionado do capitalismo do sec XXI é um novo sistema feudal.
    Este objetivo depende da ausência de discussão sobre as privatizações, sobre a moeda, sobre a globalização, sobre as crises, sobre a mercantilização do trabalho, sobre as contradições, sobre as consequências da aplicação massiva da ideologia neoliberal nos ultimos 40 anos.
    Não lhe façamos a vontade.
    Elaborar o que é simples é fazer-lhes a vontade.

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  2. A especulação imobiliária é uma das formas de predação capitalista mais visíveis e com mais impacto na vida das pessoas.

    E depois esta é a deprimente realidade:
    “Desde a crise que o número de jovens até aos 34 anos a morar em casa dos pais tem vindo a aumentar. Isto porque os baixos rendimentos não permitem aceder ao mercado de habitação.”

    https://eco.sapo.pt/2020/07/15/ha-cada-vez-mais-jovens-adultos-a-morar-em-casa-dos-pais-devido-aos-baixos-rendimentos/

    Neoliberalismo intensificou e de que maneira uma economia que não existe para servir o progresso humano.

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  3. Sem espinhas.

    Um apontamento feliz de Nuno Serra, que agarra muito bem o artigo recente do Telegraph

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  4. E agarra tão bem, que tenho que separar esta nota do que escrevo a seguir, para separar as águas, as límpidas das inquinadas

    E o que é isso de inquinadas?

    Mais uma vez joão pimentel ferreira sob anonimato geringonço.

    Chamar para aqui as questões "morais" para os proprietários que afinal não o são (as questões "morais") é repetir a treta da moralidade que afinal não o é. Um frustrado aluno com má nota a filosofia e pedante não diria melhor. JPF veste o casaquinho por inteiro.

    Depois parece que estamos interditos de elaborar o que é simples. Curiosamente Nuno Serra elaborou mesmo um texto que vale pela sua eficácia e pela sua aparente simplicidade.Eis o motivo da proibição?

    Sobra-lhe a "aplicação massiva da ideologia neoliberal nos ultimos 40 anos." Estamos a este nível. A uma espécie de clister com 40 anos

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  5. Gerinçonço mais uma vez faz prova de rebolucionário

    "Desde a crise que o número de jovens até aos 34 anos a morar em casa dos pais tem vindo a aumentar. Isto porque os baixos rendimentos não permitem aceder ao mercado de habitação.”

    Eis preto no branco não uma denúncia,mas sim a tentativa de montar o descontentamento social para os seus peculiares fins

    Que link é este para o qual "geringonço" nos empurra?

    Para o "eco", uma das fontes noticiosas de joão pimentel ferreira himself.Uma das fontes mais duvidosas de notícias "económicas", que papagueia o que o observador vomita.

    Quem tiver pachorra que o leia e o compare com notícias do mesmo assunto noutros artigos. E repare o que o "Eco" omite:

    "O estudo revela que os baixos salários e a instabilidade do emprego são algumas das razões que contribuem para que esta taxa continue a crescer." Alguém lê a palavra salários na fonte do JPF?

    Quem revela o estudo da Gulbenkian ( sem ser o "eco") titula a notícia deste modo:
    "Jovens prolongam estadia em casa dos pais. A culpa é do salário e emprego"

    O "eco" fala na crise: "desde a crise"

    Mas que crise,dita desta forma tão genérica, à boa maneira dos demagogos do eco?

    O que o "eco" se esqueceu? De dizer exactamente isto:Os dados da Gulbenkian analisam a tendência desta taxa desde 2004, ano em que se situava nos 55,2%. Depois, manteve o crescimento até 2010, ano a partir do qual se assistiu a uma ligeira descida. De 2012 (60,5%) até 2017 a trajetória foi de crescimento - à exceção de 2016.

    Ou seja, parece que os anos de chumbo da governança de Passos Coelho contribuíram para os resultados.
    Também parece que o ano em que se procedeu a uma reversão parcial das medidas criminosas do governo troikista teve uma influência positiva

    Mas o que fazer? Geringonço gosta do"Eco". Temos sorte em não haver citações em alemão, como já o fez.

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  6. Vamos aceitar a desvalorização de 40% nos salários, para tornar o país competitivo e assim manter o país na zona euro?

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  7. A pergunta sobre a desvalorização dos salários de 40% é a sério?
    Passos está de volta? Ou um sucedâneo de Passos?
    João pimentel ferreira terá alguma fonte privilegiada?

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