Manuel Carvalho deve achar que os leitores do jornal que dirige não têm memória: “Depois de 20 anos de regabofe orçamental, Centeno foi o homem que vergou o défice e nos provou que, sim, o país pode e deve ser governado com contas certas.”
Duas décadas de estagnação, indissociáveis do Euro, não existiram. A maior crise desde a Grande Depressão, a iniciada em 2007-2008, não existiu. E o saldo orçamental não é uma variável fundamentalmente endógena, mais dependente do andamento da economia do que das habilidades dos Ministros das Finanças, como se confirma outra vez com uma previsão de um défice de 6,3% para este ano.
Além disso, a austeridade relativamente suave do primeiro governo Sócrates e a mais intensa dos PEC do segundo governo não existiu. E, claro, também não existiu a versão muito mais violenta do governo da troika.
A desmemória está aí.
Mais à frente, virá exigir novas doses de austeridade, que nunca terá existido, a somar à desvalorização salarial já em curso.
Para lá do moralismo, dada a lógica dos saldos financeiros num país com instrumentos decentes de política económica, contas certas só querem dizer o saldo do sector público necessário para criar o maior volume de emprego possível e assegurar a solvabilidade do sector privado, sem descurar o único equilíbrio que conta, o do saldo externo, para não se cair em dependências externas.
Entretanto, o argumento da melhoria das condições de financiamento, putativa contrapartida da política económica dos credores, já engana menos gente, dado que ficou mais claro que as taxas de juro são um preço político, sendo determinadas pelo Banco Central e não pelos mercados.
Mas, como sabemos, a austeridade é um meio para transferir recursos para os mesmos de sempre. Carvalho deu a linha hoje: “os custos deste orçamento vão andar muitos anos a atormentar-nos”. O que nos atormenta é a crise e falta de instrumentos para a debelar na nossa escala.
Entretanto, Centeno não deixa saudades. Como bem se resume em título do Público: “o homem que sai quando o excedente acaba”. Para lá de um nível de investimento público que atrofiou as capacidades do país, legou um princípio que corre o risco de ser aplicado para lá da banca: pagam e não mandam. Isto, sim, é um regabofe.
O João Rodrigues explanou de forma clara a desonestidade que paira na comunicação social, as pessoas em Portugal têm que ser tomadas como gente respeitável e digna.
ResponderEliminarOs instrumentos só servem para controlar a potência.
ResponderEliminarDa potência não se fala, é só instrumentos...
O Governo sofreu um rude golpe com a saída de ministro de Mário Centeno. Foi um ministro exemplar.
ResponderEliminarDeixando cumprimentos
Será admissível que um diretor de um jornal diário, supostamente generalista e pluralista se entretenha diáriamente a exercícios de propaganda política ordoliberal?
ResponderEliminarBem,parece que a predisposição para a propaganda barata é um dos critérios para ser diretor do público (o anterior era um tal dinis, que nem para limpar retretes servia, mas tinha uma lábia ao nível dos melhores tweeteiros da fake culture).
Centeno não deixa de facto saudades.
ResponderEliminarO LdB, honra lhe seja feita, foi dos poucos blogs que, de uma forma fundamentada e incisiva, ousou desmitificar este "ronaldo das finanças", ou, de acordo com uma caracterização que fez história por motivos opostos, este "o ministro mais revolucinário de sempre". Um jogador ao serviço dum bloco central europeu, que escondeu debaixo do tapete a reestruturação da dívida, que permitiu que a herança troikisto/passista na área do trabalho se mantivesse, que privilegiou regras orçamentais tão do agrado de quem manda na UE
Mário Centeno foi levado ao colo por uma comunicação social cúmplice e subserviente aos interesses que aquele preza e protege.
(Assim não se percebe o que um "anónimo" quer dizer quando fala que "as pessoas em Portugal têm que ser tomadas como gente respeitável e digna". A língua portuguesa é muito traiçoeira,mas dá para nos interrogarmos quem será a gente respeitável e digna que se quer nomear?
Centeno? Manuel Carvalho?
Há aqui algo que não joga. Nem com a bota do Ronaldo, nem com os perdigotos de Manuel Carvalho.)
Caro JE, referia-me a todos mas em particular ao mais irrelevante dos portugueses, aquele que pouco ou nada sabe sobre a sua própria vida.
EliminarMário Centeno fez uma coisa e uma coisa só, ensinou-nos a viver dentro das nossas possibilidades presentes, coisa que se bem me recordo o João Rodrigues apelava aqui há tempos. E fê-lo de facto, em vez de se ficar pela demagogia de Passos e Portas.
ResponderEliminarA Esquerda defende vigorosamente défices orçamentais argumentando que na presença de instrumentos adequados de política económica eles serão naturalmente corrigidos quando o crescimento económico acontecer.
Sucede que isso nunca ocorre e depois fica a dívida que alguém há de ter que pagar. As experiências da 'Economia de Abril', do colapso da URSS (pois, a política financeira de Gorbatchev também deixou a desejar, aconselho-lhe a ver o que Egon Bahr disse a esse respeito) ou dos disparates de Chavéz e Maduro, aí estão para o demonstrar.
Sim, já sei, há a China, com a sua total falta de transparência no que diz respeito à dívida e ao peso da banca sombra. Isto acompanhado pela repressão das liberdades, incluindo a sindical e a destruição ambiental (já para não falar da falta de transparência que atrasou o combate à pandemia). É com este modelo que o PCP sonha? Deus nos livre!
E, naturalmente, a repressão financeira representa uma compressão do rendimento dos depositantes, não é? Aliás, é mais ou menos isto que o BCE faz de momento ao manter as taxas de juros baixas graças à compra de dívida no mercado secundário.
Mas pelo menos assim não temos inflação. E temos ainda outra coisa, o Euro obriga o nosso sector produtivo a saber concorrer, em vez do eterno 'beggar thy neighbour', que explicava a eterna fraqueza da lira e que explica a estagnação presente da Itália.
Que eu saiba, só agora é que exportamos mais do que importamos...
Um País falido, João Rodrigues, com ou sem moeda própria, não tem soberania...
a grande crise depois da grande depressão
ResponderEliminarde 1929 não é a de 2008-2009, a grande crise do capitalismo começa agora em 2020 e dura até sabe-se lá quando de resto os nºs de casos de covirus-19 estão aí para mostrar que a crise está só no começo
2 000 464 US
772 416 Brazil
"Potência e instrumentos"
ResponderEliminarOu de como jose, feito Pitonisa de Delfos, tenta esconder os "regabofes", desta forma tão...potente
Que falta de memória a deste Jaime Santos.
ResponderEliminarDesapareceram os seus elogios ditirâmbicos a Mário Centeno.
O mimoso "o mais revolucionário ministro das finanças" nas palavras de JS, está reduzido agora, nas suas actuais palavras a, "fez uma coisa e uma coisa só"
Para se escudar do confronto com o seu próprio palavreado da treta, JS socorre-se da sua artilharia : Passos e Portas ( como álibis à direita ) arrumados telegraficamente numa única expressão.
Enquanto se serve do "outro lado", da "Economia de Abril" ( mais outra inovação teórica de JS?) URSS,Egon Bahr, Gorbatchev, Chavez,Maduro, China, PCP, espraindo-se por, pelo menos, 10 linhas...
JS, já todos percebemos. Tal como percebemos outra coisa, O que JS tem que fazer para esconder o que andou a dizer e para manter algum grau de seriedade, que abafe ao menos os sorrisos irónicos?
E o que nos ensinou afinal Mário Centeno?
ResponderEliminar"Mário Centeno fez uma coisa e uma coisa só, ensinou-nos a viver dentro das nossas possibilidades presentes!
Mário Centeno como vulgar dono da economia doméstica de qualquer família? Isso, para pior. Porque as nossas possibilidades presentes não passariam pelo Novo Banco e pelas manobras a ele associadas.
Há cerca de ano e meio, JR foi lapidar:
ResponderEliminar"O chamado presidente do chamado Eurogrupo pretende completar a perversa União Bancária, que nos condena a ser controlados por bancos e reguladores estrangeiros. O aprofundamento da convergência com o explicitamente idealizado capitalismo dos EUA passa também por reforçar o peso dos mercados financeiros à escala da União Europeia, a golpes de política, como não podia deixar de ser, através da aposta na União dos Mercados de Capitais. A memória das crises financeiras é mesmo curta. Um dos exemplos que Mário Centeno já deu numa intervenção é revelador da ordem que está a ser criada à escala europeia: tal engenharia política facilitaria, entre outros, «a colocação das poupanças de um pensionista irlandês na Alemanha». As pensões são entendidas aqui não como o resultado de um sistema de repartição como o da Segurança Social portuguesa, mas sim como poupanças individuais a serem jogadas num casino de dimensões europeias. Poucos exemplos ilustram melhor a ideologia da financeirização e da sua expressão ideológica, a neoliberalização, indissociáveis da economia política europeia realmente existente".
Independentemente da simpatia pessoal ( ou não) do próprio, Mario Centeno fez uma opção,colocando-se ao lado da pilhagem dos países periféricos pelos países do centro da zona euro.
Ele por exemplo subscreveu o princípio europeu do «pagam, mas não mandam», ou seja, os contribuintes nacionais pagam, como sempre acabam por pagar, pelos desmandos dos bancos, mas o capital estrangeiro fica com um maior controlo de um sistema assim mais vulnerável.
Ainda JR:
ResponderEliminar"Em segundo lugar, Centeno apostou no respeito mais do que escrupuloso por regras orçamentais crescentemente draconianas, dando a cara pela redução do investimento público nacional para valores mínimos na história da democracia. Portugal é, na União Europeia, o país com menos emprego público, em percentagem do emprego total, e com o investimento público, em percentagem do produto interno bruto (PIB), mais baixo. Os serviços públicos estão e estarão sob pressão"
O objectivo dos Estados é promover o desenvolvimento das sociedades, assegurando que a dívida pública é sustentável (o que depende de vários factores) e não reduzi-la a níveis diminutos. Centeno jogou na continuação dos custos económicos e sociais e no impedir que o Estado cumpra o papel para que existe.
Estava mais interessado noutros campeonatos
Centeno também deixa a sua marca na perpetuação das relações laborais deixadas pela herança troikista e na recusa na renacionalização de sectores estratégicos
ResponderEliminarE afastou da agenda a necessária renegociação e reestruturação da dívida, que era tida como inevitável até por pessoas insuspeitas, como Manuela Ferreira Leite
Um "país falido", dirá JS.
Voltámos a ouvir o estribilho do TINA, usado e abusado por todo o neoliberal de pacotilha e por todos os austeritários em acção e reacção?
Um país necessita de ter instrumentos de soberania económica, financeira e monetária.
Passa por um outro destino, que não a vil e apagada tristeza, de nos reduzirmos a um lugar subalterno a que nos destina esta UE
A economia de Abril foi aquela coisa que em 6 meses reestruturou a economia, acolheu meio milhão de retornados e seguiu a crescer. C'horror!
ResponderEliminarEu ainda não percebi quem vai pagar a dívida do RU, EUA, Japão, Itália e por aí fora. O Alessina também morreu sem perceber; falta ir o resto, como diria Planck, em nome de uma inflação que já quase ninguém se lembra, muito pelo contrário. Mas tem outra solução, deixe de pagar para ter o privilégio de financiar a economia.
Mas pronto, continuemos a apostar na exportação de mão de obra bem qualificada, como elogiam o líder do governo e o da oposição (qual oposição?). Com sorte, daqui a 5 anos a bolha turística recupera e daqui a 10 a economia chega ao mesmo nível. Ainda bem que o Covid equilibra as contas da SS...
Existem uns quantos cativos da cativante forma de pensar a economia em cativações!
ResponderEliminarAliás todo um Mundo Novo se abriu para a direita quando for poder pois apartir de Centeno já não se diz menos investimento público visto que houve uma mudança profunda no léxico político: Cativar.
Mas alegrem-se os frugais cativos e adeptos das cativações pois veio a saber -se que afinal Centeno foi o porta voz do grande artífice das cativações ... Leão é seu nome, nome bastante cativante... mas só para alguns, claro está!
Com sorte, daqui a 5 anos a bolha turística recupera e daqui a 10 a economia chega ao mesmo nível. Ainda bem que o Covid equilibra as contas da quê? só morreram mais 1500 que a mérdia
ResponderEliminar"Com sorte" tenta a sua sorte.
ResponderEliminarMas está com azar.
Ainda não se sabe o número de mortos acima da média ou do que era expectável. O último estudo com alguma credibilidade data do final de Abril.
O que as estatísticas mostram é que morreram até à data, cerca de 1500 ( 1505) pessoas por Covid em Portugal
"Com sorte" está ainda com azar. Compara coisas incomparáveis. Fala do número de mortos após as medidas tomadas pelas autoridades sanitárias, nomeadamente o confinamento.
A pergunta que se põe é: quantos mortos a haver se não se tivessem tomado estas medidas? Se se tivesse procedido como Bolsonaro ou Trump?
"Com sorte" está ainda com mais azar. Não consegue fazer engolir aquele seu engulho pelo facto do SNS, mesmo sob o assalto neoliberal dos últimos anos, ter conseguido resistir melhor do que o serviço de saúde na Holanda.