Excertos de um texto publicado em Esquerda.net, acessível aqui.
"O euro chegou aos vinte anos sem grandes motivos para festejo. Apesar dos retratos entusiastas – Trichet, ex-presidente do BCE, descreveu o euro como um “sucesso histórico (...) em termos de credibilidade, resiliência, capacidade de adaptação, apoio popular e crescimento real”, enquanto Juncker elogiou a “prosperidade e proteção” trazida pela moeda única – a história é um pouco diferente. Mais de uma década depois da crise financeira de 2007-08, a recuperação na União Europeia tem sido dececionante, e os ténues sinais positivos nos números do crescimento económico e do emprego não têm sido acompanhados pelos salários, cuja estagnação surpreende as instituições europeias. O agravamento da desigualdade é um dos traços principais dos últimos dez anos.
A conclusão do QE no final de 2018, e a consequente subida esperada das taxas de juro, poderia colocar em causa a recuperação da atividade económica na zona euro e fazer reemergir problemas que apenas foram ocultados na última década. Draghi não perdeu tempo e lançou um novo programa de estímulos monetários e facilitação do crédito aos bancos há poucos dias – “num quarto escuro, movemo-nos com passos curtos”, justificou o presidente do BCE.
No entanto, os “passos curtos” não serão suficientes para evitar a recessão que se aproxima. O FMI já anunciou previsões em baixa para o crescimento em 2019, e os analistas começam a suspeitar que o abrandamento pode não ser passageiro. Os índices financeiros continuam a sugerir bolhas especulativas nos mercados de ações e obrigações (Alan Greenspan alertou há mais de um ano), e a volatilidade crescente revela o nervosismo dos investidores – prudente, o The Economist avisa que é provável que “este ano seja mais acidentado que o costume”. É por esta combinação explosiva que no seu recente livro Crashed: How a Decade of Financial Crises Changed the World, Adam Tooze afirma que “o cenário com que nos deparamos agora não é de repetição, mas de mutação e metástases”. Uma década de estagnação acentuou os desequilíbrios da Zona Euro e revelou a desorientação das elites europeias."
O resto do texto pode ser lido aqui.
Sem dúvida, mas as nuvens no horizonte agora devem-se em grande medida a eventos (aumento do protecionismo, instabilidade política em lugares como o RU e os EUA) que a UE não criou. Pode claro dizer-se que a crise de 2007-2008 plantou as raízes dos problemas atuais, o que é verdade, mas a resposta dos populismos não está propriamente a resultar, pois não?
ResponderEliminarDepois, convenhamos, as Esquerdas permanecem na margem a gritar contra o centro sem que se perceba por um momento como é que se vai dar a volta a isto. Alguém apresentou desde 2012 um plano detalhado e consistente de como pode um País como a Itália ou Portugal abandonar a MU sem destruir uma parte significativa da sua Economia e das poupanças dos seus cidadãos?
Quais as medidas de mitigação para as mais que prováveis consequências negativas de algo profundamente disruptivo (e que até pode ter consequências positivas a prazo). A isto, a Esquerda diz nada. É uma verdadeira TINA por falta de comparência.
Dá vontade de rir ouvir o PCP dizer que é preciso preparar a saída da moeda única. Como, senhores?
E convém lembrar que não haverá mudanças sem consequências negativas. Afirmar o contrário é da mais reles demagogia. Vejam-se os disparates de Corbyn no RU, sem cheta e sem plano...
Esperar pela crise para cavalgar nela não é solução. Até porque, como já se viu, a Extrema-Direita joga esse jogo bem melhor...
Curto comentário apenas para refutar a tese de que a EU esteja inocentezinha no aumento do proteccionismo e instabilidade política no RU e EUA.
ResponderEliminarComo se sabe, graças às políticas mercantilistas e batota monetária do núcleo da EU, vulgo Alemanha, a balança comercial com os USA é largamente excedentária.
Só quem fôr tolinho é que não percebe que isso corresponde a um continuado abuso da potência hegemónica mundial por parte da Alemanha. A situação complica-se quando o estado vassalo, neste caso a Alemanha, se recusa a comprar gás liquefeito mais caro do que a Gazprom russa o vende. E ainda por cima apoiam a construção de mais um gasoduto (Nordstream2) que ainda vai permitir um maior afluxo de gás russo mais barato.
Ainda para mais com a guerra na Síria a evoluir numa direcção contrária aos interesses americanos em controlar o trânsito de gás quatari e genéricamente do Golfo Pérsico para os mercados europeus, o controle dos mercados mundiais da energia balança perigosamente a favor da Russia.
Compreendem agora a intensificação dos esforços americanos para controlarem a Venezuela?
As tretas "socialistas" de um lado e as "democráticas" por outro apenas tentam disfarçar um conflito que resulta de uma renovada aplicação da doutrina Monroe exacerbada pela perda de influência noutras partes do globo. É tudo tão transparente!
Não é de estranhar que os USA tentem ressarcir-se de uma maneira ou de outra. Os equilíbrios geopolíticos são feitos de compromissos. A Alemanha, com a sua economia de merceeiro está a pôr em causa muitas décadas de atlantismo. E com o descaramento e falta de subtileza que caracteriza a actual política externa americana, Trump já fez saber que o guarda-chuva da defesa da Europa não é de borla.
Neste contexto o euro aparece como "arma de exportação maciça", forçando, com a sua batota cambial o resto do mundo a comprar produtos alemães. Pode chegar um ponto em que os USA possam ser tentados a pôr fim à experiência desse Frankenstein monetário. Se a EU não serve para conter a Rússia, e monetáriamente é um parasita, qual é a sua utilidade?
E assim um comentário que se dizia curto, já vai nisto. :)
Isto tudo para explicar que Jaime Santos olha para a árvore mas não vê a floresta. LOL
S.T.
Sempre suspeito que o foco ma política monetária acontece na razão inversa do conhecimento que se tem da multidão de variáveis que determinam o sucesso económico, a qualquer dimensão de actividade.
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ResponderEliminarA dita "comunicação social" nunca escreve (diz o que pensam os verdadeiros homens e mulheres de esquerda), porque tem estado ao longo dos anos a defender interesses da burguesia (e alguma dela reacionária). Como todos sabem ninguém votou para a ENTRADA da CEE/UE e do euro em Portugal, que eu saiba?! junto um texto(…)
TSF e Parlamento Europeu Violam Princípio de Imparcialidade!
O programa A Hora da Europa da rádio TSF decorreu hoje, a partir das 10H15, na Faculdade de Letras de Lisboa, com um designado debate com os eurodeputados europeus, tendo aquela estação de rádio referido, com acinte, ter o dito programa contado com o apoio do Parlamento Europeu.
Para o referido debate – que foi moderado por Ricardo Alexandre - foram convidados os europdeputados Paulo Rangel (PSD), João Pimenta Lopes (CDU), Nuno Melo (CDS), Marisa Matias (BE), António Marinho e Pinto (PDR) e Manuel Pizarro (PS), alegadamente para opinarem sobre as grandes questões que interessam à União Europeia.
Ou seja, pelos vistos a TSF e o Parlamento Europeu consideram ser estas entidades quem decide sobre quais as questões que mais interessam aos povos europeus e quem deve falar sobre eles.
Como comprova a filosofia que presidiu ao anúncio do debate por parte da TSF, o que está em preparação, quer por parte da UE, quer por parte dos órgãos de comunicação social, quer ainda por parte das entidades que supostamente deveriam agir sobre os atropelos ao tratamento imparcial que deverá ser observado em relação a todas as candidaturas, é a manipulação mais miserável da consciência do eleitorado que está em marcha.
Ou seja, no caso em concreto – que é um indicador seguro do que a restante comunicação social se prepara para replicar – só terão direito à palavra os candidatos que tecerem elogios à UE e aos benefícios que alegam ter havido para o povo português da adesão de Portugal à União Europeia e à Zona Euro.
Tal como o PCTP/MRPP alertava na sua NOTA À IMPRENSA do passado dia 13 de Março, “após a designação da data do sufrágio em causa pelo Presidente da República, entrou imediatamente em vigor o princípio da igualdade de tratamento das candidaturas anunciadas, bem como a proibição por parte dos poderes públicos, desde logo do governo, de manipularem a consciência do eleitorado, intervindo directa ou indirectamente na campanha eleitoral”.
O debate em questão, sublinha a denúncia que nessa mesma nota fazíamos ao afirmar que já estava em curso, “mais uma vez, uma campanha de intoxicação da opinião pública, no sentido de restringir o debate e a propaganda apenas aos que estão com a Europa, isto é, que aceitem como única via para o futuro do povo e do País a permanência de Portugal no Euro e na chamada União (?) Europeia”
Tendo em linha de conta este episódio e as réplicas que certamente se sucederão, reiteramos a exigência que nessa nota fazíamos de que, “quer por parte da Comissão Nacional de Eleições, quer especialmente pelo Presidente da República, seja exercida uma rigorosa vigilância e repressão sobre as violações dos princípios da imparcialidade e isenção”.
19MAR19
Retirado do jornal online "Luta Popular"
Já agora, as investidas de Jaime Santos contra o PCP evocam-me irresistivelmente aquele personagem ibérico saído das páginas de Cervantes.
ResponderEliminarE para história de proveito e exemplo, esta real, lembro um certo episódio da Marinha, em que um capitão, useiro e vezeiro em fazer aproximações a um certo cais de atraque a toda a velocidade para depois meter à ré no último momento, certa vez recebe da casa das máquinas a comunicação de que a máquina não invertia. O homem entrou em pânico: "Estamos f.....s!"
Salvou o navio o imediato, que com a maior frieza bradou a ordem: "Lança ferro!"
Também o actual curso dos acontecimentos é um desastre europeísta anunciado. Quem se atreverá a bradar "Lança ferro!"? É isso, encalhar na praia ou abalroar o cais. Como vai ser?
S.T.
PS
Não posso deixar de felicitar mais uma vez Vicente Ferreira por mais uma boa síntese.
Claro que para Jaime Santos as fontes citadas devem ser todas um bando de comunistas, embora no mundo da economia sejam todos reputados economistas, professores em prestigiosas universidades e até articulistas do NYT, do Project Syndicate, etc.
Enfim, PPP (Picardias Provincianas Portuguesas).
Um artigo interessante sobre as complexidades do ethos alemão para lá da sobresimplificação de considerar o AfD como a "má" extrema-direita.
ResponderEliminarA importância consiste em conter elementos históricos e culturais úteis para se compreender a natureza da contestação interna alemã para lá dos estereótipos.
https://www.strategic-culture.org/news/2019/03/18/eu-reichstaat-systemic-disarray-long-war-portends.html
Tiragostos:
"An ambitious ‘Empire project’, but the experience increasingly is being questioned: “Germany has not created stability… but instability in Europe. Germany’s rhetoric focuses on stability: it talks about a ‘stability union’ and is proud of its Stabilitätskultur, or ‘stability culture’. But its definition of the concept is extremely narrow: when Germany talks about stability, it means price stability, and nothing else. In fact, in attempting to export its ‘stability culture’, Germany has in a broader sense created instability … Many other eurozone countries see the rules as serving Germany’s national interests, rather than their own, explains Hans Kundnani in The Paradox of German Power."
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" And here lies the kernel of the crisis. There has been a call from all sides to try something different: such as relaxing the fiscal rules that are destroying public services, or simply to touch the ‘live wire’ of reform of the financial and banking system.
And here is the rub: All such initiatives are prohibited in this locked-down treaty system. Everyone might think to revise those treaties, but that is not going to happen. The treaties are untouchable, precisely because Germany believes (or, says it believes) that to loosen its disciplined hold over the monetary system, will be to open Pandora’s Box to the ghosts of inflation and social instability arising, to haunt us anew."
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" So, a deadlocked system stands in direct collision with a widening insurrection against a Euro-Reichstaat, and against the inequalities and social fragmentation inherent in a hyper-financialised world.
Can the EU reform? Can it survive? The options are difficult: If the rest of Europe cannot survive the Bundesbank ‘lock’ on the Euro, then the obvious solution would be for Germany, and its export-surplus allies, to leave. But who can force the German Establishment to yield up such a clear and present benefit? Draghi’s replacement as head of the ECB is likely to be another Bundesbank nominee. And the paradigm of a hyper-financialised, fiat credit-led, world is not just the creation of Europe. It is embedded in the US too. The EU marches in step with it, and its beneficiaries intend to claw-down all who threaten it."
Hoje lamento mas têm que usar o googletranslate.
Os trechos a bold foram assinalados por mim.
S.T.
Acabo de ver a conferência de imprensa de Tusk e Juncker.
ResponderEliminarParece-me óbvio que a EU "blinked", pestanejou, isto é, não aguentou a tensão de perder as vantagens já negociadas. Há a distinta possibilidade de que o aparente brexit-caos britânico seja uma brilhante táctica negocial.
Fartava-me de rir se viesse a ser revelado que a soberba da EU tinha sido ludibriada por um governo UK a fingir-se "insano" e "instável". Afinal dizia-se que a EU poderia ditar as condições que quisesse.
S.T.