terça-feira, 24 de abril de 2018

Efeitos perversos

Paremos para pensar. 

Dois senhorios são proprietários de dois prédios iguais para arrendamento e praticam a mesma renda.

O senhorio "mau" decide aproveitar para fazer arrendamento de curto prazo. Isso permitirá um aumento mais rápido das rendas, com potencial despejo de quem não aceite. O senhorio "bom" faz um arrendamento de longo prazo com aumentos mais condicionados de renda e mantendo os inquilinos.

O Governo quer transformar o senhorio "mau" em "bom", graças a uma descida para metade do IRS sentido pelo senhorio "bom".
 
Quando é que isso acontecerá?

Leitura de economista: o senhorio "mau" vai querer ser "bom" se a redução fiscal for superior ao que ganharia com os sucessivos aumentos de renda. Isso quer dizer que a medida só será eficaz se o aumento da renda praticado pelo senhorio "mau" for inferior a um certo limiar abaixo do qual ele sente que há mais vantagens em ser "bom". Exemplo muito simplista (sem contar com a estrutura de custos de cada senhorio): se a renda inicial fosse de 200 euros e o senhorio bom aumentar para 250 euros (mais 25%) e o senhorio "mau" para 300 euros (mais 50%), os rendimentos disponíveis dos dois senhorios assemelham-se. Mas se o senhorio "mau" aumentar para 400 euros, já ganha mais com o aumento do que ser senhorio "bom". 

Se o senhorio "mau" achar que quer continuar a ser "mau" - ou mesmo "muito mau" - tenderá a aumentar mais o valor da renda, para lá desse limiar. Até porque tem procura para tal, vinda do estrangeiro. Por outras palavras, a medida pode ter o efeito perverso de conseguir o contrário do desejado e não suster o aumento das rendas. 

Segunda questão. Por que razão decidiu o Governo desagravar a tributação dos senhorios "bons" e não agravar a dos senhorios "maus"? É que ao fazer isso, vai criar desigualdades fiscais relativamente a outros tipos de rendimentos.

Os rendimentos do trabalho e das pensões, por exemplo, chegam a ter taxas de tributação marginais três vezes superiores aos dos senhorios "bons". Há rendimentos de capital que ficam a acima da taxa sentida pelos senhorios "bons". Está o Governo a querer fazer transferir os trabalhadores por conta de outrem, pensionistas e detentores de outro tipo de capital para os transformar a todos em proprietários prediais "bons"?

Não sei porquê, mas parece que as coisas não terão sido suficientemente pensadas, de forma articulada.  

9 comentários:

  1. O texto é bem acertado quando a questão do arrendamento é tratada pelo critério da 'bondade'.

    As rendas de pensões majoradas, desproporcionadas, vigarizadas ou inventadas são por definição boas.
    As rendas do imobiliário são por definição más e devem ser tornadas boas.

    ResponderEliminar
  2. O josé está mesmo inquieto

    Pelo 25 de Abril? Pelas rendas de que vivem por aí muito trapaceiro à custa dos demais?

    ResponderEliminar
  3. Este é um texto oportuno. Que faz lembrar que algumas iniciativas têm que ser bem pensadas antes de.

    E que é altura de mexer na trampa legislativa de Cristas e da sua lei dos senhorios. E de investigar a máfia que prosperou à conta de tais coisas

    O direito à habitação não pode estar completamente nas mãos de rentistas ávidos a tentar fugir da devida tributação fiscal

    ResponderEliminar
  4. "Por que razão decidiu o Governo desagravar a tributação dos senhorios "bons" e não agravar a dos senhorios "maus"?"

    Esta é sem duvida a pergunta que se impõe, um dos governos decide despejar as pessoas o outro decide baixar os impostos aos proprietários ambos na mesma linha, dar força ao rendimento do capital.

    ResponderEliminar
  5. Acabe-se com o capital em Portugal, vamos voltar ao ano de 1892.

    ResponderEliminar
  6. vitor pimentel ferreira a mostrar sempre os seus "conhecimentos" histriónicos, perdão, históricos.

    Quer regressar ao passado. Sobretudo ao modelo de relações laborais do século XIX.

    É ele, Passos, a troika, Cristas, ...

    ResponderEliminar
  7. Nao consigo entender esta intervencao do Governo naquilo que e considerado privado. Porque razao tem os senhorios de desempenhar um papel social, que pertence ao Estado, por forma a manterem rendas baixas? Quando alguem compra uma casa para poder usufruir de lagum proveito, nao pensa que tem de substitiir o Rstado na sua funcao social... existem muitas casa pertencentes ao estado que estao, ha anos, devolutas... cedam- nas a quem precisa e deix em paz os senhorios.

    ResponderEliminar
  8. Jose Martins não consegue perceber ?

    Pena. Ele que esteja mais atento aos preceitos constitucionais, em primeiro lugar.
    Depois ele que esteja mais atento ao que se tem publicado, também aqui no LdB sobre o tema.
    Depois ele que volte a ler este post porque parece que o não fez.Ou se o fez, nem sequer o percebeu

    "Por que razão decidiu o Governo desagravar a tributação dos senhorios "bons" e não agravar a dos senhorios "maus"? É que ao fazer isso, vai criar desigualdades fiscais relativamente a outros tipos de rendimentos."

    "Os rendimentos do trabalho e das pensões, por exemplo, chegam a ter taxas de tributação marginais três vezes superiores aos dos senhorios "bons"."

    E que leia por exemplo Ana Santos:

    " Resulta das políticas que promoveram a liberalização do mercado da habitação e vêm aliciando os muito ricos para o investimento especulativo na habitação através de uma panóplia de incentivos fiscais, da qual a nova geração de medidas não se distingue. Talvez resida aqui a novidade destas políticas...

    " o que faz falta é uma provisão pública de habitação capaz de moldar a oferta e controlar os preços"

    Também a máfia reivindicava a não intromissão governamental nos seus negócios particulares

    ResponderEliminar
  9. Olhai...

    Passei por aqui só para deixar uma curiosa comparação dos 25 melhores mercados de arrendamento imobiliário do mundo.

    http://www.businessinsider.com/best-countries-to-buy-rental-property-earn-passive-income-2018-5#3-costa-rica-23
    S.T.

    ResponderEliminar