quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Mitos laborais

Fonte: DGERT; INE, Inquérito ao Emprego
Anteontem, a propósito de mais uma invectiva comunitária para que Portugal desregule os contratos de trabalho, a RTP convidou Marco Capitão Ferreira e o André Macedo (minuto 11), actual director-adjunto de informação da RTP, para debater o tema.

A Comissão Europeia apresentara mais um estudo em que voltou a defender aquela estranha ideia de que, para combater a precariedade laboral nalguns contratos, o melhor é alargar a precariedade a todos os contratos, através do fim aos entraves ao despedimento individual nos contratos "permanentes": 
“Há espaço para ir mais longe em reformas que reduzam a proteção laboral excessiva nos contratos permanentes em países como Portugal e Espanha, por exemplo”.
Um dia, esta ideia será politicamente assumida como estúpida, como o foram os critérios de Maastricht na moeda única, cujo papel, apesar disso, seria reforçado no Tratado Orçamental em pleno vigor. Mas até lá, essa estupidez adopta hoje em dia a forma de pressões políticas graves, de que o Governo nacional muito receia. Leia-se neste artigo do Luís Reis Ribeiro uma súmula das pressões recentes.

Ora, no debate da RTP André Macedo - apesar de considerar o estudo como um "mantra" que a Comissão repete como "música celestial" - acabou por tecer a mesma ideia de outra forma. Há os trabalhadores precários - "que vivem durante anos e anos numa situação de precariedade e de desprotecção social" - e depois há os outros, mas que já podem ser afastados por despedimento colectivo: "As empresas usaram e abusaram do despedimento colectivo que é abolutamente cego, é uma brutalidade que é feita". A sua ideia é, pois, a de que, após as alterações laborais de 2003, 2009 e 2012, "neste momento o mercado funciona razoavelmente".

Mas esta ideia está errada, por duas razões.

A primeira é que o despedimento colectivo não tem uma importância maior na explicação do despedimento de contratos permanentes. Se olharmos para os números da Direcção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (ver gráfico acima), o despedimento colectivo está longe - muito longe! - de explicar a imensa massa de trabalhadores que perderam o seu trabalho. De 2005 a 2012, os despedimentos colectivos afastaram 34 mil pessoas, quando nesse mesmo período, foram destruídos 372,4 mil empregos de contratos ditos "permanentes". Ou seja, o despedimento colectivo nem explica 10% desse movimento, sem que a legislação laboral tivesse exercido qualquer obstáculo. Mesmo de 2013 a 2016, já em fase de recuperação, o número de despedimentos colectivos atingiu 25,4 mil pessoas, enquanto se verificava a criação de 242 mil postos de trabalho com contratos permanentes.

Se a lei é proteccionista aos olhos da Comissão Europeia, e de André Macedo (mais por omissão), na prática a teoria é outra.

Fonte: INE, Inquérito ao Emprego
A segunda é que os fluxos de criação e destruição de emprego são bem mais vastos do que os números da criação e destruição líquida de emprego possam mostrar. O que quer dizer que o mercado de trabalho está hoje extremamente flexibilizado - leia-se desregulado - e permite uma reciclagem dos contratos "permanentes", no sentido de substituir contratos mais antigos por contratos mais recentes, com condições contratuais e remuneratórias bem mais recuadas.

E até sem grande oposição dos trabalhadores visados que sabem que, mesmo em despedimentos ilegais, não só terão de depositar a compensação por despedimento numa conta bancária em nome da empresa até ao desfecho da queixa judicial; como terão de lidar com um corpo de magistrados laborais progressivamente mais compreensivos ao lado empresarial.

A segmentação e a rigidez legal são, pois, falsas questões e um pretexto para uma desestabilização laboral, que permita a manutenção de uma baixa salarial.

Ao contrário do que diz André Macedo, o mercado NÃO "funciona razoavelmente". Ou melhor, funciona "razoavelmente" numa certa lógica, desastrosa. Funciona no sentido de uma progressiva precarização das relações contratuais que as medidas propostas apenas acelerarão, com impactos nos baixos rendimentos dos portugueses, na desarticulação de uma relação social e psicológica saudável, com impactos orçamentais, demográficos e nos fluxos migratórios, que, na prática, representam um uso do erário público nacional para formar quadros qualificados que se deslocarão, a prazo, para o centro europeu.

Se isto não foi bem pensado, pelo menos parece bem que sim. Convinha, pois, que também nós pensássemos que país estamos nós a defender.

17 comentários:

  1. A precariedade no trabalho não é algo recente, houve e continua a haver uma certa conivência com essa forma de exploração, quem teve e continua a ter os contratos protegidos continua muito pouco sensível à realidade dos demais, parece-me obvio que tem de haver uma uniformização e não estou a falar de nivelar por baixo mas também aqui tem de se falar de igualdade, não há sociedades saudáveis sem uma igualdade efectiva, da mesma forma que não se deve colocar nos mesmos termos o rendimento do trabalho e o rendimento do capital, não têm o mesmo propósito.

    ResponderEliminar
  2. O mercado de trabalho para os comentadores que são pagos para difundir os interesses dos patrões não está nada mau, era isso que André Macedo gostaria de dizer mas não pode por razões óbvias...

    ResponderEliminar
  3. Sem querer defender o modelo americano, que desprezo, reparo que os autores deste blogue, falaciosamente, não conseguem olhar de fronte para as evidências. O factor mais importante para o emprego e a qualidade desse emprego em termos remuneratórios e de benefícios laborais, sem dúvida que é o crescimento económico. Mas a flexibilidade laboral toma também um papel relevante e há literatura sobre isso, mormente da OCDE. Basta analisar a taxa de desemprego nos EUA ou Reino Unido, que tiveram sempre, mesmo em tempos de crise, valores abaixo dos restantes países da Europa. A razão para tal? Um mercado de trabalho muito mais flexível, ou desregulado se quiserdes.

    Nunca nenhum neoliberal referiu que o despedimento coletivo toma um papel importante no mundo do despedimento. O que se refere, é que quanto maior a liberalização/desregulamentação, mais rapidamente uma pessoas desempregada encontra emprego e mais facilmente tem um contrato de trabalho, em contraste com a precariedade dos falsos recibos verdes, por exemplo.

    O seu segundo gráfico não considera os falsos recibos verdes, por isso, diria que não tem validade científica, pois Portugal vive uma situação laboral dicotómica entre a precariedade dos falsos recibos verdes e o garantismo de quem tem contrato de trabalho.

    Recordo ainda o autor que há um estudo da OCDE encomendado pelo anterior governo e "escondido" por este, que refere exatamente que o comportamento positivo do emprego, também se deve à reforma laboral de 2013.

    Cumprimentos

    ResponderEliminar
  4. 95% do trabalho criado na era de Obama foi trabalho precário.

    https://www.investing.com/news/economy-news/nearly-95-of-all-job-growth-during-obama-era-part-time,-contract-work-449057

    Os magníficos EUA e a sua "recuperação"!

    Na Alemanha, país que os Pafientos tanto gostam, recentemente os trabalhadores da indústria automóvel conseguiram diminuir para 28 horas de laboração e um aumento de mais de 4%.
    Enquanto isso, na Autoeuropa, é aquilo que se sabe...

    As patranhas neoliberais são facilmente desmontáveis, se não tivesse os média ao seu lado e o exército de comentadores pagos o game-over ao neoliberalismo já tinha acontecido.

    ResponderEliminar
  5. Os autores deste blog não conseguem olhar de frente para as evidências?

    Ó caro Aonio esta só mesmo como anedota, a fazer lembrar os seus versos, que o seu alter ego João Pimentel Ferreira declamou para gáudio do pagode.

    A qualidade literária e cívica dos seus poemas está aqui retratada.

    https://www.youtube.com/watch?v=1KvlJHinE_M

    Então como é que alguém que não consegue assumir de frente a sua multiplicação de nicks e que insiste nesta espécie de fraude de neoliberal a fazer publicidade à própria fraude tem a lata de vir falar em "olhar de frente"?

    O disfarce será para ocultar que tudo isto já foi debatido com o mesmo interveniente mas usando este outros nicks? E que o mesmo aonio ou João Pimentel ou Tiago ou da Cruz ou Marvilense, etc etc etc se retirou de forma tão pouco digna desse mesmo debate?


    ResponderEliminar
  6. Para não se repetirem argumentos que arruinaram estas odes idiotas à OCDE e aos neoliberais e aos despedimentos e à desregulação e à flexibilidade e à reforma laboral daquele criminoso do Passos. veja-se por exemplo aqui:

    https://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2016/03/virar-pagina-no-debate-sobre-trabalho-e_19.html

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2016/10/por-que-defende-o-patronato-posicoes.html

    https://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2016/12/tiveram-e-tem-razao.html

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/05/legalizar-selva.html

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/07/precariedade-e-socialismo.html?m=1

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/08/precariedade-e-um-conceito-bem.html

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/09/falsa-questao.html

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/09/e-pur-si-muove-o-mercado-de-trabalho-e.html

    http://ladroesdebicicletas.blogspot.pt/2017/10/a-nossa-economia-politica-e-o-trabalho.html


    Em todos participou um dos nicks do João Pimentel Ferreira. Em todos se repete e repete

    Francamente será que o caro Aonio, só porque muda de máscara, pretende vender mais uma vez a banha da cobra neoliberal como se de coisa séria e honrada se tratasse?

    ResponderEliminar
  7. Há descuidos fatais:

    "Nunca nenhum neoliberal referiu que o despedimento coletivo toma um papel importante no mundo do despedimento"

    Era mesmo o que mais faltava. O que eles querem mesmo são despedimentos, sejam colectivos ou não. Sonham com a desregulação do mercado laboral, com a maior flexibilidade, com os ontens que cantavam os Reagan e as Thatcher.

    Como é que eles iriam admitir as fdputice que defendem e praticam?

    ResponderEliminar
  8. A forma de ddespedimento mais eficiente e económica, largamente praticado pelas empresas mais pequenas, é:
    1 - Pela irresponsabilização dos gerentes e administradores contida na lei, levar a empresa à falência, preferentemente pelas mãos de terceiros.
    2 - Em paralelo, retomar o negócio tornado rentável e limpo da carga de direitos acumulados.

    Paga o Fundo de Garantia e o Desemprego, e todos ficam felizes.

    ResponderEliminar
  9. Outro reflexo da elevada rigidez laboral, está na quantidade abismal de empresas de trabalho temporário, autênticos parasitas intermediários que ficam com metade do dinheiro dos trabalhadores. Mas tal só acontece, porque é um expediente para ter flexibilidade, o que o Código do Trabalho não consagra nem permite. Nunca vi um país com tanta empresa de trabalho temporário como Portugal, exatamente porque ainda temos das leis laborais menos flexíveis. Também não conheço mais nenhum país europeu, que pague 14 meses de salário por 11 de trabalho. Porque não diluir os 14 meses por 12, sem perda de rendimento anual? Toda a lógica do Código do Trabalho, leva apenas a situações dicotómicas, pobres e iletrados com contratos precários, funcionários públicos e letrados, com o garantismo e segurança da Lei. A esquerda nunca há de perceber que não é a Lei que paga salários ou que cria emprego, são as empresas e a economia. E 80% das empresas, ao contrário da cartilha comunista, são de facto pequenas empresas, sendo também as pequenas empresas ou em nome individual, que pagam piores salários.

    ResponderEliminar
  10. "Na Alemanha, (...), recentemente os trabalhadores da indústria automóvel conseguiram diminuir para 28 horas de laboração e um aumento de mais de 4%."

    A própria Mariana Mortágua defendeu recentemente na SIC o modelo alemão, referindo o contrato coletivo de trabalho. Essa comparação com Portugal é ingénua e redutora, pois Portugal não tem o tecido industrial da Alemanha, de grandes, exportadoras e lucrativas empresas privadas do setor industrial.

    Ora vejamos:

    "As empresas portuguesas são das mais pequenas da Europa, apresentando, em média, 3,3 pessoas ao serviço, de acordo com dados recolhidos em 23 países da União Europeia (UE) pelo portal estatístico Pordata."

    https://www.publico.pt/2016/12/24/economia/noticia/empresas-portuguesas-sao-das-mais-pequenas-da-uniao-europeia-1756014

    "As micro, pequenas e médias empresas eram em 2008 responsáveis por quase três quartos dos empregados no sector privado não financeiro em Portugal e mais de metade do volume de negócios. Entre todas as 350 mil empresas portuguesas, mais de 85% empregam menos de 10 trabalhadores."

    http://www.jornaldenegocios.pt/economia/detalhe/mais_de_85_das_empresas_em_portugal_satildeo_micro

    É disto que estamos a falar quando falamos de Código do Trabalho. E não julgo que um empresário que gira uma empresa com 10 trabalhadores seja propriamente um "porco-capitalista-neo-liberal"!

    Cumprimentos

    ResponderEliminar
  11. "Um porco-capitalista neoliberal"?

    Mas ó caro Aonio Pimentel Ferreira isso é uma recaída da série dos seus poemas dedicados à sua namorada?


    Mas sejamos sérios:
    ""Na Alemanha, (...), recentemente os trabalhadores da indústria automóvel conseguiram diminuir para 28 horas de laboração e um aumento de mais de 4%."

    E conseguiram porquê?

    Porque ousaram lutar e mandar para as urtigas a conversa da treta aqui em cima assumida pelo caro Pimentel Ferreira.

    ResponderEliminar
  12. "Um porco-capitalista neoliberal"?

    Mas ó caro Aonio Pimentel Ferreira isso é uma recaída da série dos seus poemas dedicados à sua namorada?


    Mas sejamos sérios:
    ""Na Alemanha, (...), recentemente os trabalhadores da indústria automóvel conseguiram diminuir para 28 horas de laboração e um aumento de mais de 4%."

    E conseguiram porquê?

    Porque ousaram lutar e mandar para as urtigas a conversa da treta aqui em cima assumida pelo caro Pimentel Ferreira.

    E isso deixou o caro Aonio pimentel ferreira nesse estado confrangedor aí em cima demonstrado.

    ResponderEliminar
  13. O aonio eliphis dizia no período negro da governança neoliberal, precisamente em Setembro de 2014, esta frase onde demonstrava o que fazia mover a tralha neoliberal ultramontana:

    "o neoliberalismo do Passos Coelho só peca por defeito, e esbarra numa CRP de cariz socialista que deve ser revista".

    Percebe-se o que o rapazote defendia e o que queria. Era daqueles que queria mais.

    Agora também se percebe o que quer. Só que ainda não reparou que este discurso canhestro apresentado aí em cima já teve melhores dias. E que o nem o ódio à CRP nem a sebentice do seu anti-comunismo primário ou o seu ranger de dentes ao designado"garantismo legal" são justificações para o que quer que seja.

    Quanto muito para a demonstração que esta malta para além de não ter memória não tem é mesmo vergonha.

    É nisto que estão transformados os despeitados pafiosos ressabiados

    ResponderEliminar
  14. " Também não conheço mais nenhum país europeu, que pague 14 meses de salário por 11 de trabalho"

    Conhece pouco o Aonio. Mais parece o Relvas com aquele discurso em 2011 para tentar justificar o assalto ao bolso dos portugueses

    Entre o conhecer pouco e o mentir vai a distância do conhecimento do eliphis:

    Por exemplo aqui ao lado em Espanha.

    Mas diacho, Espanha não faz fronteira com a Alemanha e isso invalida-o ,não é mesmo ó aonio?

    ResponderEliminar
  15. Os trabalhadores alemães - se disso houver necessidade - são capazes de diminuir salários e aumentar o tempo de trabalho.

    Lutam pelo seu bem estar, mas não são nem comunas nem sacadores, e bem merecem o que alcançam.

    ResponderEliminar
  16. "O aonio eliphis dizia no período negro da governança neoliberal, precisamente em Setembro de 2014, esta frase onde demonstrava o que fazia mover a tralha neoliberal ultramontana:

    "o neoliberalismo do Passos Coelho só peca por defeito, e esbarra numa CRP de cariz socialista que deve ser revista"."

    Quero apenas frisar que nunca proferi nem escrevi esta frase! Não lhe fica bem dizer que disse uma coisa que não disse.

    Em relação ao pagamento a 12 meses ou 14 meses, como referi não defendo o corte salarial, apenas a distribuição por 12 meses, e não 14, ou pelo menos a liberdade do trabalhador para receber 12 meses, o que a esquerda chumbou.

    Em relação a Espanha, Grécia ou Portugal, não haverá uma relação, que quanto mais parcelado é o salário anual, mais baixo é no cômputo geral?

    https://en.wikipedia.org/wiki/List_of_European_countries_by_average_wage

    ResponderEliminar
  17. Ó aonio...

    Mente e continua a mentir

    Vamos lá a pedir desculpa antes de continuarmos

    ResponderEliminar