Rui Tavares dedica a sua crónica do Público de hoje aos "vendilhões de apocalipses". Segundo o historiador, dizer que estamos a aproximar-nos da próxima crise financeira é o mesmo que anunciar que estamos mais perto do próximo grande terramoto de Lisboa - ambas as afirmações são óbvias, mas pouco úteis.
A metáfora soa bem, mas não funciona. Primeiro porque temos mais dados sobre a primeira do que sobre o segundo (o gráfico ao lado é bem ilustrativo do ponto onde estamos na euforia das bolsas). Depois, porque sabemos o que poderia ter sido feito para evitar o último colapso (em termos gerais, regulação financeira), o que não foi feito para evitar o que vem a caminho e a luta política que continua a ter de ser feita para travar a irracionalidade da finança liberalizada.
A versão do capitalismo não neoliberal acabou definitivamente em 2008, resta-nos agora apenas o capitalismo degenerado neoliberal e a transformação do que ainda resta da democracia em algo semelhante aquilo que chamamos fascismo.
ResponderEliminarE chegamos a este ponto com a ajuda de uma certa esquerda acrítica, tomada por uma acefalia terminal ao que parece...
Meia-dúzia de linhas em cheio.
ResponderEliminarDá para Tavares, para as previsões e para o alerta seriíssimo.
Com as soluções e com a necessidade cada vez mais urgente de se lutar contra a irracionalidade da finança liberalizada
https://www.home.saxo/campaigns/outrageous-predictions-2018?int_cmpid=op18-button1/#/appShell
ResponderEliminar(Saxo Bank is a Danish investment bank specializing in online trading and investment)
Em 2018, a economia mundial será abalada por uma onda de impactos, tais como perda de independência e enfraquecimento da supervisão e controle dos bancos centrais norte-americanos e japoneses, queda do índice S&P 500, tensões políticas na União Europeia e perda de interesse na moeda virtual bitcoin pelos seus investidores
"Em 2018, a Bolsa de Energia Internacional de Xangai iniciará negociações utilizando contratos futuros petrolíferos em yuan, e este passo causará grandes mudanças geopolíticas e financeiras", assinalaram especialistas. Como vai reagir Trump ?
Por enquanto, no mercado mundial de contratos futuros petrolíferos são negociados dois contratos padrões – BRENT e WTI, ambos em dólares
Esquece-se Rui Tavares que nenhum dos problemas estruturais do Euro foi resolvido e parece não ter consciência da precaridade da situação portuguesa e de todos os outros periféricos, banca italiana à cabeça. O Euro é como um edifício que não caiu num terramoto mas sofreu danos estruturais tão profundos que não resistirá a uma réplica mais forte. E não temos que temer a sua queda que até seria uma benção, mas devemos recear a sua implosão descontrolada que essa sim poderá causar graves danos.
ResponderEliminarPara já não falar das bolhas especulativas que o QE de Draghi alimentou durante anos.
"Efeitos colaterais", dir-me-ão, mas ainda agora rebentou mais uma:
https://www.lesechos.fr/finance-marches/marches-financiers/030994285219-la-bce-piegee-par-les-obligations-steinhoff-2136585.php
Muito sucintamente: O BCE, no âmbito das suas compras de títulos de divida privada coomprou obrigações de uma empresa de origem sul-africana chamada Steinhoff. Um escandalo contabilistico (mais um...) já cortou o valor das ditas obrigações em 40%.
Sem falar que do lado de lá do Atlântico a febre da desregulação financeira já eliminou a maior parte dos impedimentos a uma nova crise semelhante à do sub-prime...
E depois temos a bitcoin a atingir valores estratosféricos sem qualquer suporte utilitário.
Que mais? Ha, a China também está obesa de crédito mal-parado pelo que está em dieta creditícia...
Digamos que massa térmica para uma grande fogueira nos mercados não falta. É só o embaraço da escolha de ver qual vai ser o ponto de ignição de onde vai sair o próximo cisne negro.
Lembro-me de me ensinarem que o crédito cria moeda.
ResponderEliminarTambém me disseram que moeda a mais dá inflação, especulação e outros fenómenos perigosos.
Fico um tanto perplexo que os defensores de mais regulação sejam normalmente os maiores apologistas da desregulação dos Estados, patrocinadores de défices e dívida pública.
Liberalização de políticas públicas e peias para os privados sempre me recorda que anda por aí quem tenha grande vocação para se livrar dos mercados e se instalar a pastorear os povos.
Leia-se, a propósito deste assunto, um artigo de Carlos Carvalhas que foi publicado há cerca de um ano e meio e convém não ignorar (https://www.abrilabril.pt/uma-nova-explosao):
ResponderEliminar"Agudizam-se as contradições e conjugam-se factores que poderão levar a uma nova explosão na crise que persiste, e com efeitos mais devastadores do que as anteriores.
Ela pode dar-se a qualquer momento e poderá ser muito difícil evitá-la. A sensação que se tem é que os principais decisores – designadamente os governadores de bancos centrais, ministros das finanças e banqueiros – perderam o controlo da situação.
Não querem resolver o problema das dívidas nem eliminar a parte que cresceu com a agiotagem dos mercados, apesar de saberem que estas são impagáveis.
Injectam liquidez nos bancos a níveis sem precedentes tentando deste modo, segundo dizem, vencer a deflação. Mas, não só a pressão deflacionista se mantém, como a liquidez não chega às empresas, nem à economia em geral, pois os banqueiros preferem a rentabilidade fácil – produtos derivados, especulação – e as negociatas do costume, aumentando ainda mais o capital fictício.
O dito reforço da regulamentação bancária ficou, no essencial, pelas aparências para a opinião pública ver, e a banca sombra - banca paralela – continua a crescer sem regulamentação que se veja.
A paranóia da redução dos défices públicos, a qualquer preço, tolhe o investimento público e pressiona os salários para a sua baixa. Sem mercado interno e com os mercados externos a serem atingidos por diversas crises, o investimento produtivo privado não avança e prefere as actividades de casino, alimentando com os bancos as pirâmides tipo Dona Branca ou Ponzi.
Wolfgang Münchau afirmava, num artigo publicado no Diário de Notícias, em 14 de Dezembro de 2015: «o objectivo oficial dos programas do Banco Central Europeu (BCE) de compra de activos do sector público e privado – o chamado Quantitative Easing (QE), é alcançar um nível de inflação mais elevado». Acrescentava ainda que a «monetização da dívida é a razão do QE» mas que, certamente, poucos governadores do BCE o reconheceriam!
Concluía, afirmando que «a zona Euro iria continuar com a impressão de dinheiro à moda antiga, sob um qualquer disfarce geral».
Simplesmente, o colocar as rotativas a imprimir euros a todo o vapor, sem resolver o problema do poder aquisitivo das massas, da sobreacumulação, da actividade económica e do investimento, é a fuga para a frente, alimentando novas e mais volumosas «bolhas» especulativas.
A japonização das economias da União Europeia (UE) é uma ameaça real, por isso não faltam as propostas de injecções monetárias, ou as do tipo de Ben Bernanke, de lançamento de obrigações perpétuas, ou ainda as do tipo Helicopter Money.
Ao longo destes anos, cortaram-se salários, pensões e serviços públicos, canalizando milhões para a banca privada, que o mesmo é dizer para os banqueiros e grandes accionistas, sempre com o argumento de que a banca é fundamental para a economia. A banca é, os banqueiros é que não.
O processo foi tão evidente e escandaloso que a UE inventou a «resolução bancária» para dar a ideia de que, no futuro, os contribuintes não iriam ser chamados a pagar a factura.
Mas, perante a sucessão de casos de bancos à beira do precipício – Itália, Alemanha – renovam-se as propostas dos «bancos maus» para o Estado pagar a factura, como aquela que Vítor Constâncio também veio agora propor em Madrid: «uma reflexão profunda sobre a possibilidade de um pequeno apoio público, para melhorar alguns sectores bancários».
Repare-se na expressão deste «socialista»: «um pequeno» apoio público, isto é, uns tremoços e uns amendoins. Um pequeno apoio público para os bancos privados, para a oligarquia da crise.
O que nos dirá o Vítor Constâncio, do BPN, na próxima explosão? Certamente o que nos disse Carlos Costa: «sinto a frustração de um polícia que chega sempre atrasado ao local do homicídio»."
Faz parte da natureza das crises financeiras essa indeterminação do timing de que fala Tavares.
ResponderEliminarSer capaz de identificar as causas e os pontos prováveis de ignição já não é tarefa fácil.
Os chamados "cisnes negros" têm duas origens:
Ou a inevitabilidade que poucos analistas conseguiram prever como no caso de Nassin Taleb.
Ou uma situação de todos conhecida como instável mas que um imponderável ou factor aleatório age como espoleta e coloca a situação fora de controle.
Tomemos como exemplo um caso conhecido: A D. Branca!
Uma boa parte dos que lá puseram dinheiro sabia perfeitamente que aquilo era um esquema piramidal e que mais cedo ou mais tarde estoirava. A questão estava muito justamente em saber quando. E aí só quem tivesse informação dos fluxos de caixa da D. Branca é que podia fazer uma estimativa acertada. E ainda assim dependeria de quantos "investidores" decidissem ir lá exigir o reembolso. Timing aleatório. E no entanto inevitável.
Rui Tavares ao exigir um timing está a ser irrealista porque ninguém tem acesso nem é capaz de processar todos esses factores aleatórios. Além disso a citação de Keynes tem um sentido diverso daquele que Tavares lhe atribui. Era escusado...
Todos nós sabemos que o Euro como está a longo prazo é insustentável. É argumentável que perante uma qualquer emergência os decisores (Eurogrupo, Merkel, BCE) tomarão a decisão certa. No entanto no passado já tomaram decisões erradas com consequências pesadas. Quando tomarão uma decisão fatal e irreversível?
A tarefa do analista é justamente identificar os pontos de stress do sistema para os resolver ou para os explorar. O quando é pedir demasiado.
Jose, dinheiro!=moeda!=riqueza.
ResponderEliminarÉ extraordinário como há tantos "esquerdistas" que não passam de idiotas úteis ao neoliberalismo. E nisto, ninguém notou que o Brexit vai trazer mais investimento directo do estado, essencial para o relançamento económico, Theresa May dixit. Uma machadada a ter em atenção se se mantiver o plano, para arrumar com a TINA.
Em comentário lá mais para cima, às 19:49, alguém aflorou um tema que vai ter enormes repercusssões no futuro:
ResponderEliminarA tentativa concertada por parte da Rússia, China, e Irão de desdolarizar as trocas comerciais entre si e se posivel com terceiros. Se forem bem sucedidos imaginem o que vai acontecer à notinha verde e sobretudo à descomunal divida emitida pelo FED...
Um pouco desfocado este comentário do jose.
ResponderEliminarAgora volta às suas reminiscências adolescentes, sabe-se lá de que tempos. Quase que.
Tudo isto para se insurgir contra a regulação dos mercados e da financeirização da economia.
Assim em jeito mansinho, acompanhado das maviosas recordações de outros tempos a ver se passa.
Onde não se oculta a defesa da dita desregulação ( longe os tempos do patrioteirismo colonial) nem aquele odiozito ao Estado , traduzido naquelas acusações aos apologistas da desregulaçáo dos Estados ( bebe ou é outra cosia?) mais o défice e a dívida pública (aquela que derivou da privada e do dinheiro dado aos bancos e aos banqueiros?)
Um homem dos mercados uberalles, ainda por cima com a cegueira própria de quem não se apercebe da próxima crise inevitável?
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Ou será que o "consultor financeiro" está na crista da onda da especulação financeira?
Rui Tavares critica em concreto duas pessoas: Rui Rio e Francisco Louçã. Ao primeiro convém prever a crise porque a utiliza como um bicho-papão contra as políticas do atual Governo. A posição do segundo é mais complexa, já que até as apoia, só que as considera insustentáveis dentro do Euro (que considera ser ele próprio insustentável). Sucede que o próprio Louçã aceita que ninguém sabe muito bem o que fazer numa situação de crise em que seja preciso sair da moeda única. Ora, aqui a citação de Keynes cai como sopa em mel, apenas precisamos de a parafrasear: de pouco servem os economistas que preveem catástrofes se não nos souberem dizer o que fazer pelo menos para mitigar os seus efeitos e minorar as suas consequências. Se o objetivo é o aproveitamento da crise para chegar ao poder, estamos conversados e desenganem-se, que a Direita chega lá primeiro. Têm os recursos e podem pagar as melhores cabeças... Se o objetivo é minorar o sofrimento coletivo, então desculpem que vos diga, mas tardam as soluções detalhadas...
ResponderEliminarDizer-se, escrevendo, que "é óbvio" a "próxima crise financeira" como se de um ciclo perfeito se tratasse é a mesma coisa que acreditar no determinismo da História. Esse "achismo" tem tanto de irracional como de falso.
ResponderEliminarA citação de Keynes que Tavares usa tem o sentido de exigir aos economistas algo mais do que a simples afirmação de que a crise acabará por se resolver com uma solução qualquer caída do céu aos trambolhões.
ResponderEliminarTem portanto o sentido de exigir soluções, isto no contexto de uma crise.
Rui Tavares usa-a num contexto que ele já não considera de crise (vá-se lá saber porquê) no sentido de exigir dos economistas orientações sobre o que fazer. Neste caso na bonança segundo ele.
"A utilidade real do discurso político e económico está em dizer-nos o que fazer durante a tormenta e o que fazer durante a bonança, e não em levar-nos a agir durante a bonança como se estivéssemos na tormenta e vice-versa."
Rui Tavares insiste em não perceber que a tormenta ainda não acabou e não acabará enquanto não forem resolvidos os problemas que lhe deram origem. Ora existe um bloqueio fundamental à resolução desses problemas: O país com a economia mais poderosa da Europa lucra descomunalmente com o Euro e logo não tem nenhum interesse em modificar o status quo.
Portanto engana-se redondamente Rui Tavares ao tentar exigir soluções aos economistas porque os economistas já deram o seu veredito há muito:
Só há duas soluções para a trapalhada do Euro. Ou se dissolve de forma controlada ou se convence quem ilegitimamente dele beneficia a compensar os outros países, ou seja criar um sistema de transferências internas dentro da zona Euro.
Só que, feitas as contas aos montantes necessários se verifica que seriam irónicamente sensívelmente iguais aos excedentes comerciais da Alemanha.
Ironia das ironias! A Alemanha teria que usar os seus preciosos e mal-adquiridos superavits para compensar a competitividade que rouba aos seus parceiros no Euro. Por otras palavras, passava a dar com uma mão aquilo que tirava com a outra.
É este o dilema do Euro, e engana-se Rui Tavares a pedir soluções aos economistas, porque a solução é politica e não económica.
Nuno Gonçalo Simões:
ResponderEliminarCiclo perfeito?
Mas alguém falou em ciclo perfeito? Pelo contrário, vamos lá ler o que se escreve e como se escreve.
Ciclos perfeitos só mesmo no computador de alguns aprendizes de matemática que nos tentam impingir formulazinhas matemáticas a apregoar economia da treta. Talvez estudar mais economia política...?
Quanto ao facto de nos estarmos a aproximar da próxima crise financeira é algo que, face aos dados que dispomos, parece tão inevitável como o ar que respiramos. É inútil assim falarmos em "achismos" irracionais e falsos.
É que olhar e ver o mundo com olhos críticos e pensar com a sua própria cabeça não chega.
É necessário evitar o que parece vir inexoravelmente a caminho. Meter mãos à luta.
"Luta política que continua a ter de ser feita para travar a irracionalidade da finança liberalizada".
Já agora parabéns ao autor do post e a alguns dos comentários a este.