Sinceramente, ainda não consegui compreender esta ovação nacional à escolha de um ministro português e de ser Mário Centeno, actual ministro português das Finanças, para um posto num organismo inexistente e opaco na hierarquia institucional comunitária como é o eurogrupo.
Tal como Durão Barroso também era o nosso "português na Comissão Europeia" e acabou gordo no Goldman Sachs, Centeno não irá ser nem presidente, nem português, nem socialista, nem ministro das Finanças.
A partir deste momento, Centeno será - na prática - o embaixador no governo português dos governos conservadores que o apoiaram. Centeno sentar-se-á e tentará convencer o governo português das coisas com que se irá comprometer no seio do eurogrupo.
O seu discurso irá ter tantas nuances quantas pessoas que o influenciarão. Pela sua voz, ouviremos nalguns momentos o tom áspero da chanceler alemã, ou a voz artificial de Rajoy, ou o tom de pó de talco de Macron.
Se esta nomeação tem algum significado político, foi o de dar um novo peso político a Centeno dentro do governo português. E não será com os melhores fins. Ele não será a bissetriz: ele será a tentativa para que não haja necessidade de bissetriz. O próprio Marcelo Rebelo de Sousa já veio avisar de que Portugal terá de dar o exemplo ao eurogrupo... O PSD já o colou ao velho programa de que até se quer esquecer agora, para mais tarde o aplicar: "Quem preside é o guardião das regras europeias".
Em vez de mais uma voz discordante da política seguida, em vez de uma forma de inverter verdadeiramente os "erros" da política de direita, em vez de uma verdadeira alteração da correlação de forças no eurogrupo, Centeno será o salvo conduto para salvar a cara dessa direita. Ele será a possibilidade efectiva de reformatar uma direita derrotada, dando-lhe o colorido que a esquerda conseguiu em Portugal e permitindo a transmissão da ideia de que até a esquerda segue as ideias da direita. Será mais um socialista a ser promovido para levar a cabo o que disse estar contra. Ou para levar a cabo a parte do contra do que Centeno disse defender, como é o dossier das políticas laborais de direita, em que Centeno se assemelha tanto a Macron, o que poderá ter alguma influência no seio do governo de esquerda ou entre o governo e os seus apoios parlamentares.
Na ausência de qualquer compromisso público para as suas novas funções, Centeno será - na prática - a nova cara da direita conservadora que, daqui a pouco, daqui a muito pouco, irá querer impor a velha receita do passado.
Dois bons posts,um a seguir ao outro, sobre esta coisa do Eurogrupo e de Centeno.
ResponderEliminarBoas malhas
O ministro das Finanças português foi eleito para a presidência do grupo que reúne os 19 ministros das Finanças dos países da zona euro. É neste fórum que são tomadas muitas das decisões relativas a questões de soberania orçamental, como a aprovação dos vistos prévios a que os orçamentos nacionais estão sujeitos ou, como aconteceu em 2016, a aplicação de sanções aos países «incumpridores».
ResponderEliminarA informação foi confirmada oficialmente pelo gabinete de imprensa do Conselho da União Europeia (UE), pouco depois das 16h, após duas rondas de votações. O ministro das Finanças assume as suas novas funções, que acumula com o lugar no Governo português, a 13 de Janeiro. A partir daí, torna-se no porta-voz das decisões do Eurogrupo – onde o peso da posição de países como a Alemanha e a França se sobrepõe, muitas vezes, aos próprios interesses dos estados sobre os quais incidem as decisões.
Mário Centeno foi chamado pelo PS para chefiar um grupo de economistas que ajudou a formular o programa eleitoral para as eleições legislativas de 2015. Muitas das medidas mais polémicas, como a criação do regime de «despedimento conciliatório», a descida das contribuições para a Segurança Social ou a criação de um subsídio directo aos baixos salários, acabaram por ficar pelo caminho com a solução política saída das eleições de 4 de Outubro de 2015.
Se muitas das propostas da equipa liderada por Centeno acabaram travadas pelo novo quadro parlamentar – limitando ou influenciando fortemente a acção do Governo do PS em diversas matérias, como se viu na última discussão orçamental –, a sua eleição para o Eurogrupo coloca em evidência a opção do Executivo (e do PS) pelo cumprimento escrupuloso das imposições europeias.
O ministro das Finanças tem sido o rosto, mais ou menos visível, da inflexibilidade perante as metas orçamentais arbitrárias fixadas pelas instituições da UE. No Orçamento do Estado para 2018, por exemplo, o défice orçamental foi perspectivado para 1% do produto interno bruto (PIB), sendo apenas ajustado para 1,1% após as medidas para a floresta.
Cada décima do défice vai custar 200 milhões de euros ao País no próximo ano – o suficiente para construir mais de três hospitais como os previstos para o Seixal ou para Évora. E a diferença para o limite de 3% que consta dos tratados é de 20 décimas, ou 4 mil milhões de euros.
Estas são as principais limitações ao rumo de reposição de rendimentos e direitos iniciado em 2015. Apesar destes constrangimentos, foi possível a Assembleia da República aprovar medidas como os aumentos extraordinário de pensões de 2017 e 2018, a redução dos impostos sobre os rendimentos do trabalho, a reposição de feriados ou o fim dos cortes salariais e do congelamento das progressões nas carreiras para os trabalhadores da Administração Pública.
Um dos argumentos avançados a favor da eleição de Centeno para a presidência do Eurogrupo foram os resultados da economia nos últimos dois anos. Curiosamente, o crescimento económico do último ano – o mais pujante desde a entrada em circulação da moeda única – e a redução do desemprego para níveis de 2008 foram conseguidos muito à custa do consumo interno: um resultado alcançado com medidas muito diferentes da receita única de cortes, defendida para Portugal por Bruxelas.
Em que serve a eleição de Centeno à Europa?
ResponderEliminarA austeridade serve-se à esquerdalhada, em quatro andamentos:
- o primeiro é à bruta, para que se saiba que cretinice tem consequências
– depois propaganda e sopas, e vejam como estão felizes,
- …desde que continuam a baixar o défice.
- Se se convencerem que têm que convencer quem poupou a investir, quem o fez lá lhes irá comprar mais umas peças...e consolidadas as reformas, talvez saiam das cozinhas e copas para as fábricas.
Se isso é verdade, então defenda abertamente que os parceiros de Esquerda do Governo apresentem uma moção de censura, João Ramos de Almeida. E assim, o mais provável é que a Direita regresse ao Governo de Portugal. Como as eleições só serão em Fevereiro ou Março, ela já terá um Rio ou um Lopes para as disputar. E depois poderá provar se Centeno é afinal igual a essa Direita... E tem ainda o bónus de que ele deverá ter que abandonar a presidência do Eurogrupo.
ResponderEliminarHá uma certa Esquerda da Esquerda que sofre de uma dissonância cognitiva. Ainda não percebeu que terá que correr muita água debaixo das pontes para que o PS mude de posição relativamente à Europa, por convicção e sobretudo por pragmatismo, na falta de soluções concretas para uma saída do Euro (o PCP não tem mesmo ninguém que tivesse sido capaz de estudar essa saída nos anos que passaram desde 2011? É só retórica?).
E depois, sofre de duplicidade. Abertamente diz que não acredita na possibilidade de reforma da Europa, secretamente deseja é que a UE falhe, com todas as consequências que isso terá para o povo português... Quanto pior melhor...
Sejam construtivos. Façam propostas ao Governo no sentido da reforma das instituições europeias. Não serão todas aceites, mas se permitirem uma melhoria ainda que ligeira das nossas condições de vida, as pessoas não se esquecerão disso nas urnas... Mas suspeito que o reformismo não vos está no sangue, porque será sempre visto como uma rendição...
Desculpará a questão, mas julgo-a inevitável: se esta eleição é assim tão irrelevante, porque raios lhe dedicam tantas teclas ?!
ResponderEliminarMRocha
Caro Jaime Santos,
ResponderEliminarConcordo consigo. Não no seu optimismo de que as propostas de reforma da UE sejam eficazes, mas na necessidade de ter ideias claras sobre o que deveria ser feito. Mais não fosse para convencer o PS e para convencer os portugueses.
Tem toda a razão nesse aspecto. E não tem sido fácil à esquerda ter ideias claras e programáticas. Não se trata de "reformismo" rejeitado: muitas vezes trata-se na dificuldade de reunir as pessoas capazes em torno de um objectivo. Muitas vezes, existe a percepção de algo que não é a solução, sem que se tenha um pensamento estruturado sobre o que deveria ser a alternativa. E isso não é pecado: apenas falta de organização e de pensamento fundamentado, aliado a um conjunto de evidências que provam a ineficácia - face aos objetivos propalados - do vigente.
Caro MRocha,
Ao contrário do que diz, a escolha de Centeno tem muita importância, como atrás se expôs.
Curioso o menu que um tipo aí em cima serve como programa austeritário. À esquerdalhada mais as sopas e a cretinice e as consequências e a felicidade. Com as cozinhas e as copas em passo de ganso em direcção aos "soldados do trabalho" tão queridas a este tipo de patronato
ResponderEliminarPercebe-se que está abandalhado. E que só lhe saia a porrada prometida mais a raiva impotente associada.
À espera definitivamente de melhores dias
Porquê uma moção de censura?
ResponderEliminarQuem não é por mim é contra mim?
Que tristeza ver extrapolar assim alguém que não se veda no seu europeísmo ledo e cego e em que se adivinha um desejo insano e censório de calar as vozes críticas à entronização de Centeno.
Ainda ecoam os ecos que consideravam este o maior revolucionário de. Agora quase que se adivinha o seu papel de servo de Merckel e de Macron
E tem outro significado - o PS vai fazer o possivel e(admite-se) o impossivel por forçar a maioria absoluta em 2019. A disfuncionalidade que esta eleiçao/nomeaçao vai criar no funcionamento da soluçao politica de governo em Portugal nao demorara a evidenciar-se. Este governo nao pode ter como ministro das finanças o ventriloquo do ministro das finanças alemao. Nem PCP nem BE podem aceitar isso, e nao vao aceitar. Tem de ser mais assertivos com o governo. Ontem era tarde.
ResponderEliminarPode ser que a esquerda acorde depois do PS conseguir a maioria absoluta e de Centeno se tornar porta-voz do Eurogrupo: a austeridade continua, agora sobre a forma de cativações, escondida pelo aumento das receitas do turismo, e com umas reposições para inglês ver (migalhas). Totós!
ResponderEliminarPropostas de esquerda? Uma economia baseada no pleno emprego, não na estabilidade da inflação, na mobilidade do capital e no défice: política de salários miseráveis por outras palavras. É o que há, seja no Euro, no EMS ou no ERM II.
ResponderEliminarhttp://bilbo.economicoutlook.net/blog/?p=37495&
Reformas...
ResponderEliminarAs verdadeiras e genuínas reformas só são possíveis quando há alguma coisa a ganhar no longo prazo e não muito a perder no curto prazo.
Quando alguém, pessoa, entidade ou país beneficia por acidente, habilidade ou trafulhice de uma situação vantajosa, e simultâneamente tem o poder de bloquear mudanças, é pouco viável que as "reformas" sejam possíveis.
É o caso presente da Alemanha:
Criou uma situação de vantagem através de "reformas" de dumping salarial em que durante anos manteve uma inflação abaixo da dos seus parceiros da UE.
Conquistou mercados nos parceiros do Sul e rebentou com concorrentes nesses mesmos mercados em conluio com outro grande manipulador de cambios, a China.
Beneficiou de uma moeda artificialmente subavaliada em relação à força e produtividade da sua economia interna.
Exportou capital e criou excedentes comerciais descomunais.
E querem os senhores que o governo alemão, protector e instrumento dos sectores financeiro e exportador germânicos, abdique destas monumentais vantagens? Por alminha de quem?
Inflação? Nein!
Renegociação das dívidas? Nein!
Aumentos salariais para os assalariados alemães em linha com a produtividade da economia? Nein!
Mutualização das dívidas soberanas? Nein!
Renegociação dos tratados? Nie! Niemals!
Está bem de ver porquê. Qualquer aumento de inflação na Alemanha, além de diminuir a sua competitividade exportadora teria o efeito de desvalorizar os excedentes comerciais acumulados e os créditos que os bancos alemães têm sobre as economias dos parceiros do Sul.
Por isso a Alemanha resistirá, bloqueará, e tudo fará para preservar o presente estado das coisas. E para isso manipulará, intimidará e comprará quem fôr necessário para preservar o status quo.
Só quando já não fôr possível fazer absolutamente mais nada poderá aceitar uma das duas únicas reais soluções:
Aceitar transferências compensatórias para os países periféricos sob qualquer forma disfarçada palatável para os eleitores alemães.
Aceitar dissolver o Euro.
Todas as outras pretensas "soluções" são adiamentos, falsas soluções, ou como dizem os camones: "Kicking the can down the road".
Neste contexto a escolha de Centeno com apoio alemão é significativa porque corresponde à percepção de que as condições se agudizam (e não tem a ver com Portugal) e é necessário introduzir uma variável (alguém com uma auréola de mago da economia que aparentemente consegue fazer omoletas sem partir os ovos) que impeça o sistema de estoirar.
Agora insisto: Isso não tem a ver com Portugal.
Por que será por exemplo que o BCE se propõe acabar com a garantia europeia de depósitos bancários de 100.000€ por depositante?
Será para aumentar a confiança no sistema bancário?
Quem adivinha?
A mania de se ver os acontecimentos exclusivamente através do prisma nacional é extremamente limitadora e pode conduzir a graves erros de avaliação.
ResponderEliminarHá alturas em que é necessário reflectir maduramente, e, sem deixar de divulgar o conhecimento dos mecanismos em jogo, estabilizar a nossa posição e esperar que outro forcado com maior capado se encaixe nos cornos do touro para nós lhe agarrarmos o rabo.
Perceber a situação com clareza e saber até onde é que a nossa mão alcança é meio caminho para o exito.
Dito isto, o ano que se avizinha promete ser interessante.
Agora sim os camaradas e os "bloquistas" saltam fora. Centeno quer contas públicas equilibradas, mas a esquerda lusa tem um relação amor-ódio aos agiotas. Por um lado adora ministros perdulários com o social na boca, desprezam o défice "tirânico de Bruxelas" esquecendo-se que o défice vai direitinho à dívida, mas num lapso lobotómico dizem no segundo seguinte que a dívida não é para pagar. A esquerda portuguesa sofre de lobotomia política. À segunda a dívida não se paga. À terça deve-se contrair mais dívida com mais défice. À quarta restrutura-se o que se deve. À quinta pede-se mais.
ResponderEliminarPelas 16 e 24 temos um comentário curioso. Fala em "camaradas" e em bloquistas.
ResponderEliminarOs bloquistas pelos vistos não são camaradas.
Os camaradas serão apenas a expressão um pouco bovina do seu anti-comunismo primário?
Porque o curioso no comentário referido é o tentar-se fugir do que se discute, se debate, se denuncia e se desmascara. Para se refugiar em joguinhos de palavras mais ou menos idiotas, sem qualquer sustentação factual, entregando-se de corpo e alma à propaganda neoliberal do costume.
ResponderEliminarTraduzida nestas patetices rudimentares ( mas que lhe vêem do fundo da alma, talvez irritado pela denúncia do papel da Alemanha):
"a esquerda lusa tem um relação amor-ódio aos agiotas"
Faz lembrar um desvairado apatetado que dizia que a esquerda gostava dos agiotas, enquanto ele próprio defendia os credores e os agiotas. Mais o serviço da dívida e o processo austeritário
E ainda mais se assemelha ao citado sujeito quando é usado este tipo de vocabulário pouco sério e trauliteiro:
ResponderEliminar( a esquerda) "adora ministros perdulários com o social na boca".
Esta forma de se exprimir é uma tristeza.
O mesmo sujeito de que falamos tinha raiva ao estado social. E defendia a privatização da saúde e da educação, com a segurança social a reboque.
O estado social só mesmo para perdulários, diria aquele fulano. E tentaria vender Bruxelas e as suas políticas mais a submissão à dívida e aos credores ( ocultando o autêntico assalto ao estado praticado pelas hordas neoliberais e a transformação da dívida privada em dívida pública)
A lobotomia política de que fala afinal não é mais do que a sua própria lobotomia. Política e ética. Política porque vive da aldrabice e da má-fé. Ética porque se faz passar por uma série de nicks com que se traveste para parecer muitos:
À segunda a dívida não se paga e usa o nick de Aonio Eliphis. À terça deve-se contrair mais dívida e usa o de Tiago. À quarta reestrutura-se o que se deve e usa o nick de Pedro. À quinta pede-se mais e usa o dum anónimo
À sexta queria assinar como João Pimentel Ferreira, mas falta-lhe a coragem para o fazer
Para estas posições fantasma são escolhidos os fantoches mais fraquitos, pois estes são mais dóceis e submissos, cumprindo assim cegamente as ordens das centrais de comando dos bastidores sem causar problemas. No caso deste Centeno, além de possuir os atributos atrás citados, não possui também nem vergonha nem respeito por si próprio, o que se revela na expressão sabuja e obscena do aperto de mão ao holandês que ainda há pouco tempo proferiu insinuações idiotas, ordinárias e insultuosas sobre o comportamento social dos políticos do Sul da Europa.
ResponderEliminarMas a sabujice também é bem paga.....