segunda-feira, 27 de março de 2017

A «estabilidade curricular» segundo a PAF

A mesma direita que tentou apropriar-se injustificadamente dos resultados do PISA e alijar responsabilidades pela estagnação do abandono escolar, veio agora rasgar as vestes com a ideia de que o Governo iria proceder a uma reforma curricular, introduzindo mudanças abruptas e instabilidade no sistema educativo.

É preciso ter lata. Desde logo porque, como lembra a insuspeita Clara Viana a partir de dados do CNE, «existiram [entre 2000 e 2015] pelo menos 14 reformas curriculares, sendo o ex-ministro Nuno Crato o campeão destas mudanças», com metade das identificadas no período. Ou seja, em apenas 5 anos, um só ministro (Nuno Crato) foi responsável por tantas alterações curriculares quantas as introduzidas, em 10 anos, por 4 ministros de diferentes governos (sendo que cada um deles procedeu, no máximo, a duas alterações).


A acusação é tanto mais absurda quanto o que está em causa é, sem revogar o currículo nem alterar programas, uma abordagem pedagógica mais flexível, que permite por exemplo definir as «matérias essenciais» em cada disciplina (contrariando desse modo a extensão excessiva dos programas) ou, no âmbito da margem de autonomia da gestão horária pelas escolas (que passa a ser de 25%), trabalhar conteúdos e temas numa lógica interdisciplinar. Ou, ainda, o reforço das opções dos alunos no secundário e, sem aumentar carga letiva, a inclusão da área da cidadania no 2º e 3º ciclo do básico e a atribuição de mais tempo às expressões físico-motoras e artísticas no 1º ciclo. Um processo que tem estado a ser construído em diálogo com as escolas e os agentes educativos, indo ao encontro das preocupações da generalidade das associações de professores e das recomendações de organismos internacionais (como a OCDE), que sublinham a importância das competências e do reforço do trabalho colaborativo nas escolas.

Aliás, é também pelas diferenças no processo, para além dos objetivos, que vale a pena relembrar o parecer do CNE de 2012 sobre a revisão da estrutura curricular de Nuno Crato, a que estavam associadas aberrações pedagógicas como a dualização precoce (com a criação de cursos vocacionais no ensino básico), ou introdução de exames no 4º e 6º ano (em contraciclo com as tendências verificadas a nível europeu). Entre outros aspetos, assinalava então o CNE o facto de não serem explícitas «as razões que justificam a mudança, os fundamentos das opções preconizadas e a oportunidade de uma nova revisão»; a circunstância de a proposta restringir «o âmbito do currículo» e alterar «o seu equilíbrio interno»; ou ainda a eliminação do «espaço específico de livre escolha da escola (...), em sentido contrário (...) à afirmação de aumento gradual da autonomia das escolas», contraditoriamente proclamada pela direita, através de Nuno Crato, nessa proposta de reforma curricular.

19 comentários:

  1. Crato fez alterações a mais e sem sentido.
    Não me parece que isso torne as alterações sem sentido uma coisa desejável.
    O ministro atual diz que vai criar novas disciplinas, aumentar os tempos dados às ciências sociais, manter as horas para português e matemática e manter a carga horária total. Ou não sabe somar ou é mais um caso de delírio de ministro de educação galopante.

    Não sou adepto de empregos fictícios, mas no caso dos ministros de educação abro uma exceção. Por favor paguem a estes imbecis para ficarem quietos em casa, pelo menos não estragavam.

    ResponderEliminar
  2. Os Ministros da Educação sabem, melhor que ninguém, quais os verdadeiros problemas das escolas.
    Também sabem, melhor que ninguém, que os professores (por exemplo) não conhecem os verdadeiros problemas das escolas
    Apesar de terem poder para resolver *alguns* desses problemas, não o exercem para tal, em vez disso, entretêm-se a gerar problemas adicionais ou a resolver problemas não-existentes.

    Muitos têm sido autênticos cata-ventos ideológicos, ao sabor da ideologia do momento e tentam mostrar-se ferverosos adeptos da mudança (não se percebe se é para melhor, ou se basta mudar, para parecer que se fez alguma coisa).
    Também se caracterizam por, aparentemente, perceberem menos de educação e do que se passa nas escolas do que a generalidade dos professores (os tipos úteis para despejar responsabilidades da sua própria incompetência); no entanto, ironia suprema, definem como estes são avaliados ;)

    O principal objectivo do nosso sistema educativo é ir transformando as escolas em reformatórios e depósitos de meninos, quais "orfanatos de dia", um proto-sistema correctivo.
    A aprendizagem, a educação, etc., isso fica para quem a pode pagar, em escolas privadas. Nestas, o "despejo" não é tão evidente e os problemas sociais que a escola não pode resolver são afastados em benefício da maioria dos outros alunos que lá estão (e pagam) para aprender qualquer coisa.

    A verdade é que os miúdos estão tempo demais na escola, em aulas, os professores também, e ninguém quer resolver isso porque "não há onde os largar".

    ResponderEliminar

  3. A escola e´ movimento, mobilidade e irrequietude por natureza e sua estabilidade tem de ser conforme essa mesma natureza. E´ claro que isso exige inteligência do legislador a viver em democracia plena. Ora o que se passa nesta frente, talvez a mais importante para o país, tem tudo a ver com o “Deus Mercado” e menos com a democracia.
    Os ministros não agem de per si, eles fazem parte de governos a que se dava outro tempo o título de “Concelho de Ministros” e do grupo maioritário de deputados eleitos ao Parlamento.
    Me parece que tratar o ministro do ensino ou da educação, ou outro qualquer ministro individualmente, se torna um branqueamento do 1º Ministro e seu governo e do Partido ou força política que lhe proporcionaram tal. De qualquer modo, o mal ou o bem que se faça nesta área tão sensível como e´ a escola, deve-se ao esquema programático de cada partido que ate´ aqui governaram nosso país e, nada mais - são eles PS, PSD + CDS. Esquemas esses não coincidentes com o estipulado constitucional.
    A cultura ou as culturas deste país não devem flutuar conforme a verbe de um qualquer, seja ou não ministro. Ela ou elas tem de assentar em bases democráticas sólidas! de Adelino Silva

    ResponderEliminar
  4. Seguramente um quase nada que geringonce o máximo.

    ResponderEliminar
  5. Deviam ler Popper, para saberem o que é uma Reforma, quanto tempo demora a avaliar a bondade da dita reforma, e quais os requisitos essenciais, a que haja qualquer possibilidade de verdadeiro progresso! De outra forma é a mudança pela mudança, carregada de ideologia, propaganda, optimismo e Espírito de Inovação Bacoca (EIB)! São os amanhãs que cantam que nos levam, qual canto de sereia, contra as rochas...

    ResponderEliminar
  6. Foi em nome da grandeza do Estado (Qual Estado?) que se travaram guerras e se sacrificaram amigos e inimigos. É em nome do bem-estar do Povo (Qual Povo?) que se continua a fazer toda a casta de Barbaridades, na ordem interna, e, também, na ordem externa.
    Ao perdermos em Soberania Nacional perdemos substancialmente em domínio da Cultura Portuguesa… Quem não compreende ou não quer compreender isto, nunca compreenderá a Política dos Europeístas. Por isso mesmo e em nome da “Cultura Europeia” e a tudo que estiver ligada, a Nossa Cultura não podia escapar ao veredito final – Mais um Mercado-Feira!
    de Adelino Silva

    ResponderEliminar
  7. Buáááá.

    Não lemos Popper e a sua obra máxima, o Espírito de Inovação Bacoca (EIB)!
    Lá está tudo desde a inovação até à bondade e o tempo. Carregado de ideologia,como Popper

    ResponderEliminar
  8. Se o anónimo Buáááá acha que, no campo das reformas, Popper é só ideologia, recomendo-lhe Superprevisões, A arte e a ciência da previsão, pela Gradiva na colecção Ciência Aberta, para que fique esclarecido. E se julgar que é tudo treta, pois junte-se aos estudos relatados e faça melhores previsões :))))

    ResponderEliminar
  9. O anónimo 28 de março de 2017 às 08:43 é dos distraidinhos da vida.
    Acha que contra a ideologia de Popper, que não tinha notado, se pode responder com outro texto que alegadamente não será ideológico.

    Deve ser, deve, livro escolhido e publicado pela Gradiva de Guilherme Valente, o editor e promotor de Crato, que se esgadanhava várias páginas em entrevistas recentes por terem acabado os exames da 4ª classe.

    ResponderEliminar
  10. O anónimo Buáááá é provavelmente um desses relativistas em ciência, decerto fruto de leituras apressadas de Thomas Kuhn! Por favor conceda que um cientista que escreve numa Behavioral and Brain Sciences,Philip E. Tetlock, não é desses cientistas maltrapilhos, que necessitam de uma Teoria da Conspiração envolvendo Guilherme Valente :)

    ResponderEliminar
  11. "José", que comentário mais vazio, até me fez lembrar esse grande fisico dos tempos modernos, João Pires da Cruz!!!

    Cumprimentos

    ResponderEliminar
  12. O pior cego é aquele que não quer ver... só assim se justifica o estilo esquivo que usam os demagogos (que vestem decerto a camisola!!!), não aceitando qualquer desafio legítimo, usando a boutade em vez do facto ou do argumento propriamente dito! Discutir assim é inútil!

    ResponderEliminar
  13. Popper é também ideologia.

    Ponto

    ResponderEliminar
  14. Sejamos sérios.

    Quem invoca Popper da forma como o faz, arrastando na sua companhia pequenas pérolas do género "Espírito de Inovação Bacoca (EIB)","carregada de ideologia" e "amanhãs que cantam" não pode depois exigir que o levem a sério

    Quem não quer ser lobo não lhe veste a pele. Quem mostra assim o seu verniz democrático e a sua propensão para a patetice que esconde e mal um cariz ideológico por certo legítimo mas mas com sabor a datado, não pode depois armar-se em virgem impúdica e ofendida.

    Esta explicação devia ser inútil. É a segunda vez que comento Popper. Mas pelo que li em alguns comentários parece ser necessário colocar os pontos nos is.

    Sobra a pedantice. E para esta não tenho a mínima paciência

    ResponderEliminar
  15. O anónimo de 28 de março de 2017 às 14:57 vê bruás em todo o lado. Fala-lhe a vocação hermenêutica, o que se nota.

    Deve ter sido por acaso que ao Valente da Gradiva nunca deu para publicar Thomas S. Khun.

    Já a mim falhou-me a leitura dessa obra onde Kuhn explicava que os autores publicados na Behavioral and Brain Sciences não perfilham ideologias.

    ResponderEliminar
  16. Com nivel caríssimo anónimo das 21 e 55.

    E pronto. Com esta é a terceira vez que falo de Popper. Embora desta vez de fugida

    ResponderEliminar