quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

O gado devia ter sido melhor negociado

Quadros de Pessoal, 2012
Faz-me confusão que o Estado pague a todas as empresas para que paguem o salário mínimo.

Primeiro, porque não se trata de uma regalia: trata-se de dignificar o Trabalho, impedindo que haja pessoas que, apesar de trabalhar, sejam pobres.

Segundo, nunca se deveria dar a ideia - às empresas - de que é possível usar a TSU para negociar medidas avulsas e sem que haja alguma prova consistente de que descontos na TSU favoreçam o emprego. As contribuições para a Segurança Social deveriam ser sagradas. Ainda para mais aumentando o apoio dado em 2016, de 0,75 para 1,25 pontos percentuais na TSU patronal de 23,75%, e de forma generalizada, incluindo grandes grupos económicos.

Se em 2016, por cada 25 euros de aumento do salário mínimo (de 505 para 530 euros), o desconto feito foi de 3,9 euros (15,6% do aumento ou 12,8% da massa salarial correspondente), para o aumento que vem para o ano de 27 euros (de 530 para 557 euros), o Estado vai pagar 6,96 euros (ou seja, 24,7% dele ou 20,8% da massa salarial correspondente).

É como se, por um lado, fosse normal criar uma “condição de recursos” para beneficiários sociais, dada a escassez de recursos financeiros da Segurança Social, obrigando-os a provar que não têm dinheito nas contas bancárias nem património; e, por outro, se isente dessa “burocracia” as empresas. Deve ter algo a ver com aquilo que o Presidente da República disse em relação ao acordo: "Quem é que faz o investimento? Os empresários. Portanto tem de haver uma compensação, uma contrapartida, a pensar nos empresários". Ora, que coisa! E os trabalhadores são os beneficiários das empresas?!

Deu para perceber que o ministro do Trabalho José António Vieira da Silva gostaria de não ter de apoiar quem não precisa. Mas o intuito de fechar antes do final do ano um acordo sobre o salário mínimo – consonante com o acordo político – deve tê-lo colocado em estado de necessidade. A ponto do ministro dos Negócios Estrangeiros o ter felicitado naquela forma desabrida. Disse Vieira da Silva, na entrevista que deu ao jornal online Eco: (15:18): “Há sectores da economia que terão mais dificuldades que outros em encaixar este acréscimo de responsabilidades salariais. E nesse sentido tem alguma racionalidade que haja um esforço colectivo que auxilie essas empresas a melhor encaixarem esse acréscimo. Poder-me-á dizer: 'Não são todas as empresas'. É verdade que não são. Mas estas medidas têm sempre esta natureza. Se pudéssemos isolar de forma matemática, científica, esta e aquela empresa que têm mais dificuldade e apoiá-las, a outras que têm menos... Poderá no futuro haver um modelo que se aproxime dessa...” A ideia é os apoios públicos estarem ligados às habilitações literárias do trabalhador. A medida agora aprovada era uma forma de "integrar sectores com dificuldades em integração no mercado de trabalho".

Ora, a redução da TSU patronal para todas os trabalhadores a receber salário mínimo e mesmo aqueles que recebam outras remunerações até 700 euros, está longe desse universo de "empresas em dificuldade".

Não há dados oficiais públicos divulgados que permitam fazer contas. Mas em 2012, os Quadros de Pessoal das empresas – usados pelo Observatório sobre Crises e Alternativas para a elaboração de um estudo sobre o SMN – mostravam que não eram apenas as micro empresas as que usavam pessoal com salário mínimo. É de admitir que, com o aumento para 557 euros, a Segurança Social receberá mais do que perde (e não perde nada porque o Estado vai pagar o desconto). Mas percebe-se que muitas médias e grandes empresas beneficiarão do apoio do Estado. Possivelmente, serão poucas dezenas de milhões de euros, mas são milhões de euros!

Se o Governo não quer criar uma “condição de recursos” para as empresas, talvez possa afunilar este apoio apenas às empresas até certa dimensão. Era o mínimo.

11 comentários:

  1. Como os CEOs gostam da teta do Estado!

    E depois aparecem nas TVs exasperados com a possibilidade do salário mínimo aumentar mais do que eles desejam, ou seja, exasperados sempre que se propõe um aumento nem que seja um aumento de 1 cêntimo...

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  2. O PS e o governo anularam parcialmente uma necessária medida de redistribuição social da riqueza criada, do capital para o trabalho, com uma medida de sinal contrário, do trabalho, via contribuintes, para o capital. Violaram explicitamente o espírito e a letra dos acordos com os partidos à esquerda (Verdes). Mentiram e mentem quando dizem que não. Num muito mau augúrio, deram o tom para a ação governativa em 2017. A política de direita não foi derrotada, foi apenas atenuada. E o que portugal precisa é mesmo de uma política de esquerda.

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  3. O Estado paga o que for preciso para manter a geringonça no poder.
    É a chamada democracia geringonçosa.

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  4. Completamente de acordo com o anónimo das 08 e 10. Infelizmente tem toda a razão

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  5. O problema não são os impostos "per si", que o Estado orçamenta.
    O problema não são décimas de percentagem em aumento de impostos, e a quem.

    O problema é a despesa do Estado.
    O problema é como, sem controlo, o Estado cria despesa "gastando" cada vez mais e pior.
    O problema é o facto, constitucional, de um Primeiro Ministro com um Governo/AR que poderá só vigorar 4 anos ou menos, poder, SEM CONTROLO, (e impunemente) criar excessiva dívida soberana, e a pagar para além de esse período de (des)governo.
    PS. Alguém acredita que estas "Assembleias da República", nomeadas em circuito fechado, controlam alguma coisa?.

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  6. O problema é mesmo a despesa do estado. A despesa que o estado tem para pagar os desmandos da Banca. Para pagar os desmandos de Luís Albuquerque mais os seus Swaps de estimação. Para pagar as rendas das PPP tão auspiciosamente inauguradas por sua exªa, o ex presidente Cavaco Silva. Para pagar os juros duma dívida gerada como foi gerada e directamente para os bolsos também dum punhado de agiotas. Para pagar descidas da TSU patronal, directamente para o bolso dos patrões, à nossa custa.

    Pelo que o anónimo das 14 e 04 pode fazer as fitas do costume tentando minimizar aquilo que é grave, ou seja, aquilo que é denunciado neste post e que é reforçado pelos comentários dos anónimos das 22 e 37 e das 8 e 10.

    Percebe-se que para o sujeito em causa este governo gaste mal e pior. Tinha preferência pelos criminosos da governança neoliberal.
    Percebe-se também que tenha ódio contra a Constituição da República Portuguesa. Mas o que quer fazer, se a democracia derrubou um pateta criminoso a soldo dos eurocratas de Bruxelas, a governar em alemão?

    Quanto a estas assembleias da república... o que quer mesmo fazer? Quer voltar aos idos tempos do fascismo e da cangalhada munificada a soldo dos grandes monopólios?

    Já não basta a ganância e avidez com os gastos do estado em benefício dos grandes interesses económicos. Adivinha-se os apetites anti-democráticos e os desejos ultra-montanos de não respeito pelo voto popular.

    Dizem-se "liberas" e escondem a pesporrência anti-democrática típica

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  7. O estado paga, diz o das 12 e 12....

    Por isso ainda ecoam por estas bandas os berros deste sujeito para que o estado continuasse a pagar as rendas de meia dúzia de Patrões de colégios privados.

    É a chamada democracia do patronato. Da parte de um "perito", ele próprio patrão, a soldo das confederações patronais. No sentido literal do termo

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  8. "O gado devia ter sido melhor negociado"

    Não será "melhor negociado", mas "mais bem negociado".

    N.Abreu

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  9. as boas intenções de Vieira da Silva talvez sejam excesso de boa vontade:

    http://temposmodernos.blogs.sapo.pt/traicao-para-o-natal-463938

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  10. Apetece dizer que o Estado somos todos nós e que o aparelho desse mesmo Estado se deveria conter nos formais adornos clientelares.
    Governar um país para todo o povo não e´ a mesma coisa que governar um partido a´ esquerda ou a´ direita. E´ governar com verdade – com as capacidades desse mesmo povo – não tem de ser clientelar e no entanto acontece! Confunde-se governar a´ esquerda ou a´ direita com o partido governista; daí o aumento do despesismo.
    As clientelas têm de ser saciadas com “tachos” do melhor que houver. Que vai desde a gerência de banco ate´ ao encarregado de fábrica, negócios interpares e fuga ao fisco. Tudo legal, pois o legislador (força dominante) assim preparou!
    Fazendo o PS parte dessa mesma força dominante poucochinho se pode esperar (migalhas) dele, mesmo com os partidos mais a´ esquerda a apoiar, o que dói muito e confunde ainda mais o povo…
    De adelino

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  11. Aquela descida de 1,25% da TSU favorecendo o patronato (medida ainda que “provisória” mas sem fim à vista, e contemplando apenas os trabalhadores abrangidos pelo salário mínimo) é um sapo demasiado grande para engolir e que muitos portugueses também vão demorar a esquecer.

    É também o primeiro sério golpe na estabilidade da maioria parlamentar.
    Em especial por parte do PCP, tardio como sempre nas suas reacções, mas que não irá esquecer facilmente o grande sapo que António Costa o obrigou a engolir.

    Nada ficará como antes depois deste acordo de concertação social. Longos meses levarão o PCP e o BE a digerir e a esquecer tão indigesto repasto.

    O PSD que se apresse a mudar de líder e a deixar de vez Passos Coelho e o seu discurso sempre igual, de cortes punitivos (os portugueses viviam acima das suas possibilidades) e da austeridade perpétua redentora.

    Passos Coelho com tal discurso é o cimento que cola esta maioria parlamentar.

    E apesar do abalo deste episódio da TSU, a maioria parlamentar continuará estável dada a força do “cimento-cola Passos Coelho”.

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