quinta-feira, 19 de novembro de 2015

«os economistas» e «os analistas»


1. Nada de novo. Basta lembrar, entre muitos outros exemplos possíveis, um telejornal de Outubro de 2010, em que José Rodrigues dos Santos se referia às declarações de Ferraz da Costa, João Salgueiro, Fernando Ulrich e Mira Amaral como representando a opinião de «os economistas» (na altura a propósito da ausência de acordo entre o governo socialista e o PSD relativamente ao Orçamento de Estado). A tendência para tomar uma parte como o todo, escolhendo a dedo para reforçar o efeito de ressonância e assim favorecer a cultura do pensamento único, constitui de facto, desde há muito, uma poderosa fonte de alimentação do TINA (There Is No Alternative).

2. Oscilando igualmente entre a simples preguiça jornalística (associada ao mau hábito de convidar sempre os mesmos para falar) e um défice intencional de pluralismo no debate (com o objectivo de limitar, manipular e condicionar a informação que chega à opinião pública), é muito frequente encontrar também este tipo de enviesamentos na imprensa económica especializada, sobretudo na análise das oscilações da bolsa e dos mercados de capitais. Recorrendo-se nestes casos à figura, ainda mais obscura, de «os analistas».

3. Um exemplo recente, particularmente escabroso, foi protagonizado pelo Negócios, que tentou sugerir que a queda acentuada das taxas de juro da dívida portuguesa nos últimos dias, associada à manutenção do rating de Portugal acima de «lixo» (pela DRBS), se devia - segundo «os analistas» - à proposta «de Pedro Passos Coelho sobre "a revisão constitucional, de modo a permitir eleições antecipadas antes de Abril"»... Nada mais verosímil, claro.
O que nos vale é que temos, para estas coisas, jornalistas que não alinham em manipulações nem em fantasias e que vão mesmo à fonte. Tendo o Expresso contactado Adriana Alvarado (da própria DRBS), a resposta não podia ser mais clara: «Falámos com Mário Centeno do Partido Socialista na semana passada. Ele garantiu o compromisso com a União Europeia e a política económica europeia, [o] que foi crucial para a confirmação do rating".

O que mais impressiona já nem é, portanto, o despudor com que se fazem deturpações interesseiras e fretes políticos sinistros, sem qualquer escrúpulo de rigor «técnico» e credibilidade jornalística. O que mais impressiona é mesmo haver quem pense que não passamos todos de uma cambada de trouxas, incapazes de perceber as manobras mais toscas de desinformação deliberada.

Adenda: Ainda a propósito de «os economistas», atente-se na lista de nomes dos que vão ser hoje ouvidos por Cavaco Silva, na sua infindável operação de «consulta» e «recolha de informações»: Vítor Bento, Daniel Bessa, João Salgueiro, Luís Campos e Cunha, Teixeira dos Santos, Bagão Félix e Augusto Mateus. Julguem por vós mesmos, descontando um par de nomes que apenas servem para disfarçar o ramalhete de economistas que acham que o país real mora numa folha de excel. É caso para dizer: «diz-me a opinião queres ter e eu digo-te quem deves convidar para ouvir».

7 comentários:

  1. O postal diz tudo, a adenda também. No panorama actual resta-nos os meios de comunicação alternativos, que infelizmente, não são frequentados por toda a gente. No momento político actual terá que haver muita criatividade para fazer face à manipulação e propaganda que nos vai ser arremessada, para mais se sair um governo da vontade da maioria da AR.
    Lembrando Chomsky, os 5 filtros da comunicação, que distorcem os factos e que se interligam, têm a ver com a Propriedade dos meios, o seu Financiamento, a origem (interesses) das Fontes, a Pressão sobre a linha editorial e o que é a Norma da “profissão comunicacional”.

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  2. A mim admira-me que Medina Carreira não esteja no lote dos escutados por Cavaco Silva.

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  3. Se por cá se tenta perceber quais as consequências da golpada do PS e a sua frente de esquerda, lá por fora sabe-se com segurança que se o governo - qualquer que ele seja - ameaçar os credores, cai em três semanas!

    O que sobra dessa certeza é saber-se quantos anos mais viveremos na merda, mas a isso os credores são largamente indiferentes.

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    1. Salvo seja, eu na merda não vivo/nunca vivi, apesar dos assaltos que me fazem eu não me sujeito ao que eles querem. Só vive na merda quem abdica de exigir o que tem direito. Nunca serão credores anunciados por aprendizes de governantes que me fazem ceder.

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  4. Uma precisão ao texto (com que estou, aliás, plenamente de acordo): o artigo do Expresso que relata o contacto com a DBRS não é de Jorge Nascimento Rodrigues, mas sim das jornalistas Elisabete Tavares e Sónia Lourenço. Sobretudo a primeira (a segunda, mais nova, tem vindo a fazer uma evolução interessante também) é uma das raras aparições no comentário da TV que merece ser ouvida. Pena é que apareça cada vez menos (apenas para compor o ramalhete?), antes era das presenças semanais garantida na SICN, no breve comentário económico das manhãs informativas e, claro, 'destoava' dos restantes comentadores. Agora já raramente aparece (uma vez por mês?). Havia ainda um outro, cujo nome não recordo (desapareceu já há tanto tempo...), que também destoava da bem amestrada orquestra de comentadores do pensamento único. Também o calaram - embora aqui não possa adiantar nada para além do seu longo desaparecimento deste espaço de comentário económico.

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  5. boa Nuno, ha um artigo do VB no Observador onde desenvolve a tese de que o PCP se aproximaria do governo, apoiaria o governo porque o controlo do movimento sindical é imprescindível para seu propósito revolucionário, tal como esta escrito no...que fazer de Lenin, por isso arrancaram um compromisso ao PS de reverter as concessões nas trasportadoras. Nem uma única palabra sobre o que esta em causa de facto, que fazer com os transportes públicos de modo a que cumpram a sua função de serviço público de qualidade. Acho que poucas pessoas sabem que o VB deu aulas marxistas, no ISEG, tinha o livrito de Lenin na sua biblioteca, com certeza o Bessa e Mateus devem ter exemplares similares. Ha outra coisa, varios destes economistas tem vivido próximos do poder, realizando consultorias, intermediando negócios, não são isentos ou idóneos, tem interesse directo sobre questões programáticas, logo vão a falar de que? Deste lote todos vão opinar politicamante, representar interesses, como alguem escreveu, serão os assesores da patronal na camara corporativa cavaquista.

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  6. Há uns meses, deste bonito e homogeneo bouquet, para mais tão democraticamente legitimo,faria parte, certamente, o Ricardo Salgado.
    Compreende-se, acima de tudo há que refrear quaisquer impulsos excessivamente parlamentares do nosso sistema politico..

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